sábado, 23 de abril de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 3


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair

CAPÍTULO 3


PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

ESTELA
LOURENÇO
MARIA DE LARA
JERÔNIMO
RITINHA
JUCA CIPÓ
JOÃO
CEMA
PREFEITO JORGINHO
DUDA
POTIRA
SEBASTIÃO
BRAZ CANOEIRO
E O POVO DE COROADO

CENA 1 - FAZENDA DE PEDRO BARROS - CASA GRANDE - SALA - INT. - DIA.

Na sala – em silencio – Lourenço abraçava Estela. Lábios unidos na expressão do desejo. O choque de Lara foi imenso. Em segundos a visão do passado surgiu-lhe viva, real. O pai – quinze anos mais moço – arma em punho, esbofeteava a mãe. O revólver imenso apontado contra o peito. A mão enorme num vaivém incessante. Ao fundo a figura sinistra do homem indefinido, assistindo á cena. Uma visão que a acompanhava desde menina. Lara levou as mãos á cabeça.  “Aquela dor maldita...” Atravessou a sala e num gesto de desespero, desapareceu pela mesma porta onde, minutos antes, o pai, encolerizado, saíra aos gritos de “Juca Cipó”.

Estela e Lourenço afastaram-se ante a inesperada visão da moça.


ESTELA  -  Lara! Maria de Lara! Minha filha!

Reinava silencio na casa grande.

CENA 2 - COROADO - ESTAÇÃO - EXT. DIA.

Na pequena estação de Coroado o apito do trem deu início á loucura.


HOMEM   -  Pessoal, lá vem o trem!

Durante todo o dia a vida da cidadezinha se transformara num esperar-que-não-tinha-fim. Os preparativos para a chegada começaram manhã cedinho. Por ordem do prefeito foi decretado feriado municipal. O velho juiz de direito, severo e resoluto, adiara seus compromissos – “casamento só amanhã” – e o delegado Falcão, terno branco, camisa aberta ao peito, palito no canto da boca, arregimentara todos os seus homens – quatro ou cinco, se tanto – para conter os excessos de alegria com a promessa de xadrez. Bebia-se como nunca em Coroado.

HOMEM  -  Pessoal, o trem chegou!

A um sinal do prefeito, a banda atacou, enchedo de som a pracinha. A multidão delirava.

Ritinha sentia o coração desordenar-se. As palavras de Sinhana ecoavam em seus ouvidos  -  "... de mim que sou sua mãe, eu sei que se lembra...” Eduardo menino. Quanta recordação!

De repente o ranger de freios.


JERÔNIMO  -  Duda tá chegando, Ritinha.

O trem sustinha o ritmo. Começava a parar. Num dos degraus um jovem acenou á multidão. 

RITINHA  -  (sem se conter) Olha lá ele! É o Duda!

O povo acompanhava o coro enquanto a bandinha acelerava o ritmo do dobrado militar.

HOMEM 2  -  Duda chegou! Viva o Duda!

CENA 3 - RANCHO DOS CORAGEM - INT. - DIA.
  
O velho Bastião suportava a solidão de espera. Nem mesmo a volta triunfal de seu menino pudera levantar-lhe as forças. O danado do mal tinha coisa do diabo – pensava lá consigo. Leve tropel, distante, dizia-lhe que alguém se aproximava do rancho humilde. “Devia ser o Duda”. O garimpeiro ajeitou os fiapos de cabelos, esticou os vincos corroídos da calça surrada e procurou conter as emoções que talvez não pudesse suportar. Não teve tempo para muito... Lourenço, Juca Cipó e dois capangas aparecerem no momento em que seus braços fracos – abriam-se para acolher o filho que regressava.


LOURENÇO  -  Vamos dar um susto no velho, Juca. Ele já foi moço. Assustou muita gente.

JUCA CIPÓ  -  Deixa comigo.

Bastião recuou, apavorado
.

JUCA CIPÓ  -  É mais um conselho, velho. Um aviso pro seu filho não ser besta de vender diamante pros gringos.

Juca suspendeu o revólver e o baixou violentamente sobre a cabeça encanecida do garimpeiro.

CENA 4 - ESTRADA DE CHÃO - EXT. - NOITE.


João Coragem, em seu cavalo, dirigia-se ao rancho, em trote macio.

A estrada serpenteava, banhada pela luz da lua. De repente o grito. O vulto que cambaleava. Da margem da estrada a moça divisou o cavaleiro. No alto, a lua lembrava um diamante colossal. Maria de Lara caiu ao chão. Os olhos de João Coragem não queriam acreditar. 


JOÃO  -  (reconhecendo a jovem) Santo Deus! O rubim do coronel!

Rápido o rapaz saltou da montaria e suspendeu nos braços o corpo inanimado da moça.  

CENA 5 - RIACHO AO PÉ DA SERRA - EXT. - NOITE.

Próximo a um riacho que corria da serra, João Coragem percebeu alguém ás margens das águas. Reconheceu Cema, mulher de Braz Canoeiro.  A jovem mulher recolhia ervas á beira do riacho numa expressão de sofrimento.


JOÃO  -  (gritou) Cema!  Quer me ajudar aqui?

Cema ergueu os olhos. Reconheceu João Coragem, com a moça desmaiada, os cabelos dourados caindo-lhe sobre os ombros.

JOÃO  -  Que é que a gente faz quando uma mulher tem esse negócio que parece que tá morta, mas não tá?

CEMA  -  Jogá água na cara dela, seu João.  (levantou-se, na mão um punhado de ervas) E eu lhe pergunto.O que é que a gente faz quando tem na garganta uma revolta, como eu?
 
JOÃO  -  Revolta, Cema, de que?

CEMA  -  Então...não soube o que fizeram com o meu Braz?

JOÃO  -  Braz! Aquele santo home? O que fizeram com ele?

CEMA  -  Tá morrendo, seu João! Ta morrendo!

Com um soluço a mulher do garimpeiro correu em direção á casa, distante alguns metros do local.

João voltou os olhos para a moça, deitada na margem do riacho. Os raios prateados da lua aumentavam-lhe a brancura da face. Com as mãos em concha,  salpicou pingos de água fresca do riacho sobre o rosto impassível. A jovem reagiu, balançou a cabeça com gestos nervosos. João segurou-a pelos ombros. Os olhos grandes fitaram com espanto a fisionomia do rapaz.


MARIA DE LARA  -  Quem é você?

JOÃO  -  Sou João, moça. Tá em companhia de gente de bem.

MARIA DE LARA  -  (olhando longamente a região, parecendo desligada de tudo) O que estou fazendo aqui?

JOÃO  -  Eu é que pergunto. Encontrei você meio zonza, andando pela estrada. Parecia carecer de ajuda. Apeei do meu cavalo e lhe ajudei. Foi a sorte. A moça virou os olhos e caiu nos meus braços.

MARIA DE LARA  -  Eu caí?
  
JOÃO  -  (pareceu esquecer a pergunta) Não sei se tou enganado, mas parece que já lhe vi em outro lugar.
 
MARIA DE LARA  -  (tentando levantar-se, nervosa) Acho que está enganado. Eu não sou daqui.

JOÃO  -  Tá bem, eu acredito, mas você tá precisando de ajuda. Eu lhe levo até na casa do Braz Canoeiro, que é aqui perto. Depois dum cafezinho, vai se sentir mais forte.

Os dois seguiram para o casebre próximo.

CENA 6 - COROADO - PRAÇA - EXT. DIA.


Em Coroado, a festa atingira o auge. Duda, abraçado a mãe e ao irmão Jerônimo, ouvia o discurso de saudação do prefeito Jorginho. A emoção lhe provocava lágrimas. A cada frase o povo aplaudia.
Ritinha permanecia inerte, olhar no rosto de Duda, como a esperar um sorriso do amigo de infância. Em certo instante os olhares se cruzaram. O coração da jovem palpitou mais forte. Fora um momento só. Duda não a reconhecera. A voz do prefeito se destacava no vozerio geral.


PREFEITO  -  Se me permitem o trocadilho, Duda saiu de Coroado de cabeça limpa e voltou com a coroa do rei. Via o nosso Duda! Viva o nosso rei!

A banda reiniciou o dobrado, enquanto a multidão carregava sobre os ombros o novo ídolo da cidade.
Lágrimas espocavam dos olhos de Ritinha.  A decepção ferira-lhe o amor-próprio. E com as lágrimas a banhar-lhe a face, deitou o rosto sobre os ombros de Domingas, sua confidente e mãe de criação.


DOMINGAS  -  Toma jeito, Rita. Não fica assim. Chorando que nem bebê por uma coisa á toa...

Jerônimo, que assistia á cena, aproximou-se da moça.

A banda se afastava, enquanto os brados de Viva Duda! Se confundiam com os gritos da multidão.


RITINHA - (levantando os olhos, ao notar a presença do irmão de Duda)  Ele nem me reconheceu, Jerônimo.

JERÕNIMO  -  Pudera, Ritinha. Quando saiu daqui, ocê era menina, feia,  sardenta, de trancinha. Agora ta uma moça... bonita que nem sei.
  
DOMINGAS  -  Já disse prela. Num falta home bão que te queira. Fica aí pensando no Duda, dia e noite, feito uma boba.

RITINHA  -  Me leva embora, Domingas. Não quero nunca mais ver a cara dele. Nem a raça de vocês.

Ritinha se afastou a passos rápidos, quase correndo, na tentativa de conter as lágrimas que não cessavam de cair. Jerônimo, tristonho, observava a retirada da jovem. Ao longe o carro de Duda se perdia no meio da turba.

CORTA PARA:

CENA 7 - RANCHO DOS CORAGEM - INT. - DIA.

No chão do rancho o velho Sebastião permanecia desacordado. Um filete de sangue traça um risco escuro no alto da fronte do garimpeiro idoso. Potira estacou repentinamente ao ver o corpo do pai de criação. Mestiça de cabelos longos e olhos sombrios, desde criança fora criada pela família Coragem. Amava o velho garimpeiro com amor de filha verdadeira. E havia quem dissesse que a indiazinha dos Coragem era produto de antiga paixão do velho de Sinhana, durante suas andanças pelo sertão de Goiás.
Potira sacudiu o pai de criação e o arrastou para uma esteira, no quarto de Jerônimo. Retirou a rolha de uma garrafa de aguardente e despejou um gole na boca do ancião.
Sebastião voltou a si, meio zonzo.


POTIRA  -  Me fala, padrim... que lhe aconteceu?

O velho, gemendo, colocou a mão na cabeça.

POTIRA  -  Um galo feio. Alguém lhe bateu?

SEBASTIÃO  -  Os maldito... dos jagunço de Barros... tiveram aqui, Potira.

POTIRA  -  Os home de Pedro Barros?

SEBASTIÃO  -  Viero me assustá. Se aproveitaro... os marvado... de eu ser velho e doente. Com meus filhos eles não se mete...

POTIRA  -  (revoltada)  Diz pros menino, conta tudo. Os menino dá uma lição neles.

SEBASTIÃO  -  Não... não. Depois da festança eu conto.

CORTA PARA:

CENA 8  -  CABANA DE BRAZ CANOEIRO  -  QUARTO  -  INT. - DIA.

Braz Canoeiro gemia, amparado pelos braços de Cema. O castigo de Juca Cipó fora terrível.

CORTA PARA:

CENA 9  -  CABANA DE BRAZ CANOEIRO - SALA  -  INT. - DIA.


João Coragem observava as reações da jovem que vira no carro do coronel Pedro Barros. Era bela. De traços finos e sorriso triste.

JOÃO  -  Tá melhor, moça?

MARIA DE LARA  -  Sim, um pouco, obrigada... mas por que esse homem está gemendo tanto?

JOÃO  -  É Braz Canoeiro. Deram uma purga nele e ainda por cima quase mataram ele de pancada...

MARIA DE LARA  -  Quem bateu nele?
  
CEMA  -  (aparecendo na sala)  Os bandido de Pedro Barros.

A moça estremeceu.

CEMA  -  Meu Braz era meia-praça dele. Antes donte os home cismaro que meu Braz engoliu um diamante. Quase mataro ele pra devolvê o que ele num tinha. (e continuando o relato) Esse ainda escapou com vida. Mês passado mataro um alugado porquê num queria mais trabalhá preles.
  
JOÃO   -  (sério) Todos nós somos, mais ou menos, escravo de Pedro Barros... ele é o dono de quase todas as serra do garimpo. Todos sofremo a opressão do domínio dele. Eu nem tanto, que tenho meu próprio garimpo e coragem pra enfrentá esse home.

No quarto Braz gemeu mais alto, um gemido rouco, quase estrangulado. João e Cema correram para o local.

Só, na sala, a jovem não se sentia bem. Pela janela viu o cavalo do homem que lhe prestara ajuda. O tropel despertou a atenção de João Coragem. Correu para a porta. Era tarde. A moça já se perdia na escuridão da estrada.

JOÃO  -  Danada! Fugiu no meu cavalo!

FIM DO CAPÍTULO 3 
Sinhana(Zilka Salaberry) e Ritinha (Regina Duarte)


E NO PRÓXIMO CAPÍTULO...

#JOÃO CORAGEM VAI Á FAZENDA DE PEDRO BARROS Á PROCURA DE SEU CAVALO E MOSTRAR SUA INDIGNAÇÃO PELA VIOLENCIA PRATICADA PELOS JAGUNÇOS CONTRA BRAZ CANOEIRO, E DESAFIA O CORONEL.

#RITINHA, AUXILIADA POR DOMINGAS, SE ARRUMA PARA IR AO BAILE EM HOMENAGEM A DUDA.


NÃO PERCA O CAPÍTULO 4 DE

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