domingo, 1 de abril de 2012

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 30

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes]
http://youtu.be/zIuryHGvAVc

CAPÍTULO 30

Participam deste capítulo:

RODOLFO AUGUSTO (Ary Fontoura)
DELEGADO FONTOURA (Urbano Lóes)
MARIO MALUCO (Osmar Prado)
RICARDINHO (Carlos Vereza)
JUREMA (Arlete Salles)
HELÔ (Dina Sfat)
RENATÃO (Jardel Filho)
KONSTANTÓPULUS (Lajar Muzuris)
SAMUCA  (Paulo José)
MARISA (Maria Pompeu)
EMILIANO (Paulo Padilha)
MARIETA (Wanda Lacerda)
VÍTOR (Francisco Cuoco)
TIÃO

CENA 1  -  APARTAMENTO DE EMILIANO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

VÍTOR E EMILIANO  TOMAVAM O CAFÉ DA MANHÃ, QUANDO MARIETA VEIO DA SALA COM O JORNAL NA MÃO.

MARIETA  -  Saiu outra reportagem na “Folha do Rio” falando de Nívea.

VÍTOR TOMOU-LHE O JORNAL DAS MÃOS, INTERESSADO.

VÍTOR  -  Eles agora estão passando, sùbitamente, a outro tom. Focalizam até milagres e aparições no local em que ela morreu.

MARIETA  -  Diz aí que um garoto a viu e chegou a falar com ela! Isso é um aviso, Vítor, para você não fazer o que está fazendo...

VÍTOR  -  A senhora está falando do meu noivado com Helô?

MARIETA  -  (em tom de acusação)  Você sabe que sim.

EMILIANO  -  (repreendeu a mulher) Marieta, por favor, não vamos começar tudo de novo!

VÍTOR ACHOU MELHOR BATER EM RETIRADA.

VÍTOR  -  Bom, eu vou indo, que tenho umas coisas pra resolver. Tenham um ótimo dia!

CORTA PARA:

CENA 2  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  DIA

“ALELUIA! ALELUIA!” KONSTANTÓPULUS ABRIU A PORTA. ERA SAMUCA, QUE ENTROU, COM UMA MALA NAS MÃOS.

SAMUCA  -  Renatão tá em casa, Konstan?

RENATÃO ENTROU NA SALA E DEPAROU COM O AMIGO, OLHAR ABATIDO E CABISBAIXO.

SAMUCA  -  Renatão, meu velho, só conto com você, agora! Fui expulso da Pensão Primavera, debaixo de sapatadas da D. Didi e da Maria Lúcia...

RENATÃO  -  Samuca, você apronta cada uma! Tem que dar graças a Deus de não estar atrás das grades!

SAMUCA  -  Por enquanto, meu amigo... por enquanto. Tenho um prazo pra repor o prejuízo na pensão... ou então eles mandam a polícia atrás de mim!

RENATÃO  -  Konstan, acomoda o Samuca no quarto dos fundos. (e para Samuca)  Fica tranquilo, velho. Não ia te deixar na mão num momento desses, ia?

EMOCIONADO, SAMUCA ABRAÇOU, TEATRALMENTE O AMIGO, COM OS OLHOS CHEIOS DE LÁGRIMAS.

SAMUCA  -  Eu sabia que podia contar com você, meu velho! Obrigado! Obrigado! Obrigado! Você é um pai pra mim!

RENATÃO  -  (empurrando-o) Pai?!

SAMUCA  -  (consertou) Foi mal... Quis dizer, irmão... Um irmão!

CORTA PARA:

CENA 3  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

VÍTOR CHEGOU AO APARTAMENTO DE OLIVEIRA E ENCONTROU HELÔ LENDO A “FOLHA DO RIO”.

HELÔ  -  Jornaleco sensacionalista! Tá na cara que tudo isso é pra vender mais jornal!

VÍTOR  -  Temos que tirar essa história a limpo pra saber se tem algum fundamento...

HELÔ  -  Será que você tá acreditando nessa história?

VÍTOR  -  Não... em princípio, não.

HELÕ  -  Por quê “em princípio”?

VÍTOR  -  Porque, até que fique provado o contrário, devemos sempre descrer de qualquer manifestação divina desta natureza. Um milagre é a quebra das leis da natureza. Se Nívea tivesse realmente aparecido ao garoto, teria havido um milagre. Mas são muito raros os milagres, ou não seriam milagres.

HELÔ -  E por que Deus teria decidido fazer isso através de Nívea e em pleno Castelinho? Decididamente, é um local muito prosaico e por onde eu não acredito que nem Deus nem santo algum jamais tenha passado.

VÍTOR  -  Impossível, você acha! Pois saiba que os santos eram criaturas humanas que alcançaram a santidade.

HELÔ RIU, NERVOSA E AGRESSIVA.

HELÔ  -  Estou percebendo. Você quer dizer que Nívea também podia... No fundo, você está acreditando nessa história besta! No fundo, você quer acreditar, porque quer se amarrar nela de novo! Já que perdeu a mulher, quer agora se amarrar numa santa!

VÍTOR BALANÇOU A CABEÇA, DESOLADO.

VÍTOR  -  O que está acontecendo com todo mundo? Parece que hoje, todos decidiram me provocar! Com licença. Vou dar uma volta!

HELÔ  -  (falou, insegura) Vítor! Espere...  Aonde você vai? Quer... companhia?

VÍTOR  -  Não, obrigado. Vou caminhar um pouco. Preciso ficar sozinho. Com licença.

E SAIU.

CORTA PARA:

CENA  4  -  APARTAMENTO DE JUREMA  -  SALA  -  INT.  – DIA.

JUREMA LEU A MANCHETE DA “FOLHA DO RIO” E ENTREGOU O JORNAL A RICARDINHO, QUE PASSOU A LER COM ENORME INTERESSE, SOB O OLHAR ASSUSTADO DE MARIO MALUCO.

JUREMA  -  Ela já apareceu para algumas pessoas no lugar em que foi assassinada, diz aí...

RICARDINHO  -  (com ironia)  Não vá me dizer que você acredita nisso, Jurema!

JUREMA  -  Lógico que eu acredito. Eu sou espírita...

MARIO MALUCO  -  (com pavor)  Me diz onde é pra eu não passar por lá... Nossa!

RICARDINHO  -  Besteira! Quem é que vai acreditar nisso?

CORTA PARA:

CENA  5  -  PRAIA DE IPANEMA  -  EXT.  -  DIA.

VÍTOR CAMINHAVA PELO CALÇADÃO, TENTANDO PÔR AS IDÉIAS EM ORDEM, QUANDO, DE REPENTE, PAROU AO OBSERVAR UMA PELADA ENTRE MENINOS, NA AREIA DA PRAIA. RECONHECEU ENTRE ELES TIÃO. ERA O GAROTO QUE VIRA A APARIÇÃO DE NÍVEA. VÍTOR DELE SE APROXIMOU.

VÍTOR  -  Escute, você não é o Tião? Eu quero falar com você. Eu vi o seu retrato no jornal.

O GAROTO REAGIU ENVAIDECIDO.

TIÃO  -  Maneiro, né, tio?

VÍTOR ACERCOU-SE UM POUCO DELE, AMIGÁVEL.

VÍTOR  -  Tião, você viu mesmo essa moça? (e apontou para a fotografia de Nívea publicada na “Folha do Rio”).

TIÃO  -  Vi, sim.

VÍTOR  -  Como é que foi? Conte pra mim...

TIÃO  -  Agora não posso. Só quando acabar a pelada. Aliás... (fez uma reticência significativa e mordeu o lábio) tenho ordem pra não falar com ninguém sobre isso.

VÍTOR ERGUEU-SE, BASTANTE INTERESSADO.

VÍTOR  -  Do moço do jornal?

TIÃO  -  Não!  Ai, me larga!

TIÃO DESPRENDEU-SE DAS MÃOS DE VÍTOR E SAIU CORRENDO PARA O MEIO DOS OUTROS.

CORTA PARA:

CENA 6  -  APARTAMENTO DE JUREMA  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

JUREMA SERVIU O CAFÉZINHO E SENTOU-SE AO LADO DE LEOPOLDO.

LEOPOLDO  -  Confesso que estou preocupado com as aparições dessa moça, Nívea...

JUREMA  -  Mas por que tanta preocupação com essa história?

LEOPOLDO  -  Essa gente acredita em tudo! Se Ricardinho for mesmo denunciado, a coisa vai piorar pro lado dele!

JUREMA  -  Por quê?

LEOPOLDO  -  Qual o júri que vai absolver um réu acusado de ter assassinado uma santa? Ou pelo menos uma moça com essa auréola de santidade?

JUREMA  -  Sabe que você está cheio de razão? Minha Nossa Senhora...

CORTA PARA:

CENA  7  -  DELEGACIA  -  SALA DO DELEGADO FONTOURA  -  INT.  -  DIA.

DELEGADO FONTOURA  -  Seu nome?

RODOLFO AUGUSTO  -  Rodolfo Augusto Bittencourt. Bittencourt com dois “t”.

DELEGADO FONTOURA  -  Com dois “t”... Profissão?

RODOLFO AUGUSTO  -  Eu sou estilista. Sabe, seu delegado, a  costura e as  fantasias de carnaval são minhas duas  grandes paixões.

DELEGADO FONTOURA  -  (encarou-o fixamente) Estou me lembrando do senhor, nos jornais ou nas revistas... O senhor não venceu o concurso do teatro Municipal, no ano passado?

RODOLFO AUGUSTO  -  Não, foi o Evandro de Castro Lima. Aliás, uma injustiça! O senhor se lembra da minha fantasia?

DELEGADO FONTOURA  -  Não.

RODOLFO AUGUSTO  -  Era o “Mistério Amazonense”. Usei trezentas vitórias-régias, duas cobras vivas, duas mil penas de pavão... (no entusiasmo da descrição, levantou-se e desfilou para o delegado) Quando eu desfilei no Municipal, ficou todo mundo de boca aberta...

DELEGADO FONTOURA  -  (olhou detidamente para Rodolfo Augusto) Onde o senhor se encontrava na noite em que Nívea Louzada foi assassinada?

RODOLFO AUGUSTO COLOCOU O DEDO MÍNIMO NA TESTA, REVIROU OS OLHOS ONDE SE NOTAVA UMA ACENTUADA CAMADA DE RÍMEL.

RODOLFO AUGUSTO  -  No apartamento de Danusa Miranda, jogando buraco.

DELEGADO FONTOURA  -  O senhor não notou alguma coisa de anormal, naquela noite?

RODOLFO AUGUSTO  -  Sim, ouvi gritos... os gritos de Nívea, quando era perseguida pelo assassino...

DELEGADO FONTOURA  -  Como o senhor sabe que os gritos eram de Nívea?

RODOLFO AUGUSTO  -  (um pouco nervoso)  Bem, eu... eu supunha, apenas...

DELEGADO FONTOURA  -  Então, o senhor ouviu os gritos e não teve a curiosidade de ir ver quem gritava?

RODOLFO AUGUSTO  -  Eu fui até a janela... Mas a noite estava muito escura... céu nublado, ameaçando chuva.

DELEGADO FONTOURA  -  (insistiu)  O senhor não viu nada?

RODOLFO AUGUSTO  -  (pensou um instante) Sim, eu vi. Vi um vulto, correndo pela calçada da praia. Não deu pra ver quem era. Tive ímpetos de ir socorrer a pobre moça, mas eu pensei... o senhor compreende, essas coisas sempre dão complicações... no mínimo, polícia, depoimentos, escândalo!...

DELEGADO FONTOURA  -  O senhor sabe que, se tivesse chegado à porta e gritado qualquer coisa, uma frase qualquer, o assassino, possivelmente, teria fugido e Nívea não teria morrido?

RODOLFO AUGUSTO  -  Mas por que o senhor faz essa pergunta a mim, somente? Outras pessoas também ouviram ela gritar e não foram em seu socorro, não fizeram nada!

DELEGADO FONTOURA  -  (pensativo)  Eu sei. Todas essas pessoas podiam ter impedido que uma pobre moça indefesa fosse assassinada. E, tanto quanto o senhor, merecem o meu desprezo. (e com o dedo em riste) Pode sair. O senhor me enoja!

CORTA PARA:

CENA 8  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

SAMUCA  -  Konstantópulus, eu olhei do terraço, tem um carro da polícia lá embaixo e dois tiras olhando cá pra cima... Onde está Renatão?

KONSTANTÓPULUS -  Eu não sei, seu Samuca. O patrão desapareceu.

O MORDOMO FEZ UM SINAL MOSTRANDO MARISA SENTADA A UM CANTO DA SALA, LENDO UMA REVISTA.

SAMUCA  -  (sussurrou no ouvido do mordomo) É a Madame X?

KONSTANTÓPULUS  -  Ela mesma! Tá à espera dele!

SAMUCA  -  (dirigindo-se à mulher) Bom dia! 

MARISA  -  (ergueu os olhos da revista) Bom dia! Estou esperando seu “sócio” de moradia! O senhor, por acaso, sabe onde ele se escondeu?

SAMUCA  -  Olha, ele não se escondeu...

MARISA  -  (cortou)  Estou aqui para ver minha filha, por determinação do juiz. Renatão tem um prazo até meio-dia para apresentá-la. Se não o fizer, os policiais lá embaixo vão prendê-lo! É melhor que o senhor e esse mordomo cúmplice façam ele saber  disso agora, ou vai ser pior para todos!

SAMUCA E KONSTANTÓPULUS OLHARAM-SE, PREOCUPADOS.

SAMUCA  -  Caramba! Sujou pro Renatão!...

FIM DO CAPÍTULO 30
Rodolfo Augusto (Ary Fontoura)
e no próximo capítulo...

*** Helô deixa o pai, Oliveira Ramos, preocupado com a decisão de ter a presença da mãe em seu casamento com Vítor. Que mistério haverá por trás da história da ex-mulher do banqueiro?

*** Vítor, com sua extrema ingenuidade de ex-seminarista, confessa a Helô que beijou-a pensando em Nívea!

*** O Delegado Fontoura, inconformado com o ritmo lento das investigações da morte de Nívea, resolve forjar uma armadilha para descobrir o(a)  verdadeiro (a) assassino(a)!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 31 DE


ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 29

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
http://youtu.be/zIuryHGvAVc

CAPÍTULO 29

Participam deste capítulo:

JOANINHA (Susana Moraes)
SAMUCA (Paulo José)
HELÔ (Dina Sfat)
VÍTOR (Francisco Cuoco)
SUSI (Maria Cláudia)
RENATÃO (Jardel Filho)
MARISA (Maria Pompeu)
EMILIANO (Paulo Padilha)
MARIETA (Wanda Lacerda)
ZÉ GREGÓRIO (Adalberto Silva)
D. DIDI (Gracinda Freire)
MARIA LÚCIA (Aizita Nascimento)
OLIVEIRA RAMOS (Mario Lago)
RICARDINHO (Carlos Vereza)
JUREMA (Arlete Salles)
ALBERTO

CENA 1  -  BÚZIOS  -  PRAIA DE GERIBÁ  -  EXT.  -  TARDE.

Continuação Imediata da Última Cena do Capítulo Anterior

HELÔ  -  (tentando disfarçar a emoção) Vítor... como me encontrou aqui? Você não devia  ter vindo. Por favor, vá embora. Eu... eu  não quero me machucar mais uma vez!...

VÍTOR  -  (segurou-a pelos ombros e olhou-a nos olhos) Escuta, Helô: pare de agir como uma criança mimada! Você tem que me ouvir!

HELÔ  -  (irredutível) Eu não quero! Eu decidi que vou tirar você da minha vida. Por isso chamei meus amigos pra passar uns dias comigo... eles vieram dispostos a me ajudar... e quando tento me convencer que tenho que parar de pensar em você, você aparece, de repente, e me pede em casamento! Olha aqui: você não tem o direito de brincar com meus sentimentos! Você não pode...

NUM IMPULSO, VÍTOR TOMOU-A NOS BRAÇOS E BEIJOU-A NOS LÁBIOS. HELÔ, A PRINCÍPIO, TENTOU RESISTIR, MAS AOS POUCOS, ENTREGOU-SE.

VÍTOR  -  (segurou-a pelos cabelos, com delicadeza) Eu não vim a Búzios; não fiz uma viagem de ônibus de mais de duas horas pra brincar com seus sentimentos. Vou repetir: Heloísa Oliveira Ramos, você quer se casar comigo?

HELÔ  -  (ainda desconfiada) Você... tá falando sério?

VÍTOR  -  Como nunca falei em toda a minha vida! E então... aceita?

O ROSTO DE HELÔ DESANUVIOU-SE. AOS POUCOS, DEIXOU-SE TOMAR PELA EMOÇÃO.

HELÔ  -  (sorriu, feliz) Aceito. É o que mais quero nesta vida. Eu te amo, Vítor. Te amo como nunca amei ninguém. 

VÍTOR ABRAÇOU-A E BEIJARAM-SE OUTRA VEZ, TENDO COMO CENÁRIO O MAR AZUL DE BÚZIOS DAQUELE FIM DE TARDE.

CORTA PARA:

CENA 2  - APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

MARISA ERA UMA MULHER DE 30 ANOS, MUITO BONITA E EXCEPCIONALMENTE ELEGANTE. MANEIRAS SOFISTICADAS, DE QUEM SABE-SE IRRESISTÍVEL. DIANTE DELA, RENATÃO ERA OUTRO HOMEM. TÍMIDO, QUASE ANGUSTIADO. ELA O ESMAGAVA COM SEU CHARME, SEU AR IRÔNICO.

MARISA  -  Onde está Carlinha?

RENATÃO  -  Eu não pude trazê-la... É verdade. Ela está doente. Nada grave, mas está febril.

MARISA  -  Ah, é assim... Pois bem, eu vou agora mesmo à casa do juiz. Você se recusa a cumprir o que ele determinou.

A MULHER FEZ MENÇÃO DE LEVANTAR-SE. RENATÃO A IMPEDIU COM UM GESTO.

RENATÃO  -  Marisa, vamos conversar. Eu preciso lhe explicar umas coisas... Você saiu daqui há oito anos, depois de fazer o que fez comigo...

MARISA  -  (cortou)  E agora você quer se vingar!

RENATÃO  -  Não. É que eu disse a Carlinha que a mãe dela morreu. Afinal, o que eu poderia fazer...quando você se mandou? A verdade era muito pior! Agora você está morta! Entendeu isso? Morta!

MARISA  -  (indignada)  Você não tinha esse direito, Renatão! Não podia fazer isso comigo!

RENATÃO  -  Minha cara, se tem alguém aqui que não pode usar as palavras “direitos e deveres”, esse alguém é você! Abandonou sua filha há quase sete anos, casou pela quinta vez com o tal armador sueco, ficou podre de rica! Eu nem esperava vê-la outra vez. Agora volta, de repente, falando em direitos?

MARISA  -  Nada disso importa agora (decidida)  O que quero é ver minha filha! Nem que, para isso, tenha que meter você na cadeia!

MARISA SAIU, FURIOSA, DEIXANDO RENATÃO PARADO NO MEIO DA SALA, BOQUIABERTO.

CORTA PARA:

CENA 3  -  BOATE  -  PISTA DE DANÇA  -  INT.  -  NOITE. 

SEQUENCIA MOSTRANDO, NA BOATE LOTADA, A CHEGADA DE OLIVEIRA RAMOS E SUSI. ELA, MUITO ANIMADA, PUXANDO O BANQUEIRO PARA A PISTA. OLIVEIRA SE RECUSANDO, NO INÍCIO, MAS DEPOIS FOI CEDENDO. DANÇAVA DESAJEITADAMENTE, FORA DO RITMO, APENAS PARA AGRADAR A NOIVA.

CORTA PARA:

CENA 4  -  CLUBE  -  SAUNA  -  INT.  -  DIA.
 
OLIVEIRA RAMOS E MAIS DOIS SENHORES TOMAVAM UMA SAUNA, QUANDO RENATÃO ENTROU. O BANQUEIRO SAIU DA SALA ENFUMAÇADA PARA FALAR COM O PLAYBOY.

RENATÃO  -  Bom dia, doutor Oliveira! Lembra daquele medicamento japonês que lhe prometi?

OLIVEIRA RAMOS  - (vivamente interessado) Ah, sim, conseguiu?

RENATÃO  -  (entregando-lhe duas caixas de medicamento)  Lógico! Não prometi?

OLIVEIRA RAMOS  -  Graças a Deus! Sabe que eu não aguento mais! Toda noite, boate. No fim de semana, escalar montanhas... Só um filho, um filho é a solução!

RENATÃO  -  É um remédio à base de hormônios. A última palavra da ciência. Sei de um caso de um amigo, jovem ainda, casado há cinco anos, sempre esperando um filho e nada... Ele julgava que a culpa era da mulher e não era, era dele. Hoje, tem gêmeos.

OLIVEIRA RAMOS  -  (excitado)  Eu não ambiciono tanto. Um bastava. Vou começar hoje mesmo, porque ou essa criança nasce, ou eu morro!

CORTA PARA:

CENA  5 -  APARTAMENTO DE JUREMA  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

A CAMPAINHA TOCOU. JUREMA ABRIU A PORTA E RICARDINHO ENTROU. BEIJOU-A NO ROSTO E DESABOU NO SOFÁ.

JUREMA  -  Finalmente! Faz uma semana que você não aparece.

RICARDINHO  -  Fala, mulher. O que você tem de tão urgente pra falar comigo?
 
JUREMA  -  Você sabe que o inquérito já está na mão do promotor? Sabe que você é indiciado? Sabe que pode ser preso?

RICARDINHO  -  (fitou-a, desconfiado)  Como você soube disso?

JUREMA  -  Foi seu pai, Leopoldo, que me disse. Apesar de você pouco se importar com ele, vem sempre aqui saber notícias suas...

RICARDINHO  -  E agora... o que vamos fazer?

JUREMA  -  (fazendo um gesto de desânimo)  Se você quiser, a gente se manda daqui. Pra qualquer lugar, antes que eles te peguem!

RICARDINHO  -  Não, não concordo com isso. Se a gente fizer isso, eu tou perdido. É o mesmo que confessar. Não, não vou fugir. Vamos, isto sim, andar por aí?

JUREMA  - Pra onde?

RICARDINHO  -  Sei lá, dar umas voltas de moto. No caminho, a gente vê...

CORTA PARA:

CENA 6  -  APARTAMENTO DE EMILIANO   -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

EMILIANO GIROU A CHAVE NA FECHADURA E ENTROU.  MARIETA ESTRANHOU A EXPRESSÃO DE PREOCUPAÇÃO DO MARIDO.

MARIETA  -  Que cara é essa, homem?

EMILIANO  -  Vítor pediu Helô em casamento.

MARIETA  -  (chocada)  O quê?! Não pode ser...
   
EMILIANO  -  Foi o Dr. Oliveira Ramos que me disse. O noivado já é oficial.

MARIETA  -  E por que ele não nos comunicou?

EMILIANO  -  Talvez esteja constrangido ou envergonhado!

MARIETA  -  Sim, porque só tem cinco meses que Nívea morreu! Mas logo com essa  Helô?! Com tanta mulher no mundo...

DE REPENTE, A PORTA SE ABRIU E VÍTOR ENTROU. EMILIANO FEZ SINAL PARA MARIETA CALAR.

VÍTOR  -  (sentindo o clima estranho)  Boa noite!

MARIETA VIROU-LHE O ROSTO. VÍTOR HESITOU UM POUCO, E DIRIGIU-SE PARA O QUARTO.

MARIETA  -  E nós recebemos ele aqui em nossa casa como um filho... pra ele fazer isso conosco. Essa sujeita! Ele me decepcionou e vou dizer-lhe isso na cara!

GERMANO  -  (tentou detê-la) Marieta! Espere! Não faça...

ERA TARDE. MARIETA BATEU NA PORTA E ENTROU NO QUARTO DE VÍTOR.

CORTA PARA:

CENA 7  -  APARTAMENTO DE EMILIANO  -  QUARTO DE VÍTOR  -  INT.  -  NOITE.

VÍTOR ESTAVA DE COSTAS E VOLTOU-SE AO VER MARIETA ENTRAR. ERA ALGO CONSTRANGEDOR. A RELAÇÃO ENTRE AMBOS TINHA ALGO DE INCESTUOSO DA PARTE DELA. CLARO, ELE NÃO ERA SEU FILHO, MAS ELA ASSUMIRA ESSA MATERNIDADE AO MESMO TEMPO EM QUE, INCONSCIENTEMENTE,   O  DESEJAVA   COMO  HOMEM.  POR ISSO, A SUA INDIGNAÇÃO ERA MAIS DE MULHER TRAÍDA DO QUE A DE MÃE-SOGRA.

MARIETA  -  Eu soube... Emiliano me contou... você e Helô...

VÍTOR  - É verdade. Nós vamos nos casar. Eu ia dizer a vocês. Estava esperando criar coragem.

MARIETA  -  Coragem?... Por quê? Porque você tem consciência do erro que vai cometer!

VÍTOR  -  A senhora acha que está errado?

MARIETA  -  Acho que você não tinha o direito de fazer isso. Com Nívea, comigo, com você mesmo! Você nos traiu! Você nos traiu a todos!

VÍTOR  -  D. Marieta, eu posso explicar... Eu não vou me casar por amor. É porque Helô precisa de mim. E no fundo, ainda é Nívea, em parte, que me prende a ela.

MARIETA  -  (perplexa) Mas isso é um absurdo!

EMILIANO ENTROU NO QUARTO.

EMILIANO  -  Marieta, tenha calma! Afinal, Vítor não é nosso filho, nem genro, e mesmo que fôsse, nós não teríamos o direito de interferir!

MARIETA BALANÇOU A CABEÇA, DESOLADA E RETIROU-SE DO QUARTO.

VÍTOR  -  Seu Emiliano, eu lamento muito...

EMILIANO  -  (tranquilizou-o) Eu é que peço desculpas pela reação de Marieta. Fique tranquilo, rapaz. Ela está de cabeça quente. Precisa de um tempo para compreender...

CORTA PARA:

CENA 8  -  PENSÃO PRIMAVERA  -  REFEITÓRIO  -  INT.  -  DIA.

SENTADO A UMA MESA AO LADO DE ALBERTO, COM A ATENÇÃO VOLTADA PARA O RADINHO DE PILHA, SAMUCA NEM PISCAVA.

LOCUTOR  -  (off)  “E atenção, senhores ouvintes. Para os resultados dos jogos de hoje. Coríntians 1 x Santos 1; Ponte Preta 0 x Portuguesa 1; Flamengo 0 x Vasco 1; Botafogo 3 x Santos 1...”    

À PROPORÇÃO QUE O LOCUTOR ANUNCIAVA, SAMUCA CONFERIA NO  SEU   CARTÃO  E  A  EUFORIA  IA  TOMANDO CONTA DO SEU ROSTO. ATÉ QUE ELE QUIS GRITAR E NÃO CONSEGUIU.

ALBERTO  -  Minha Nossa Senhora, gente! Ei, vem alguém aqui! Samuca tá tendo um troço! Depressa!

JOANINHA ENTROU CORRENDO NA SALA, SEGUIDA DE D. DIDI, ZÉ GREGÓRIO E MARIA LÚCIA.

JOANINHA  -  Samuca, meu amor!... Que foi?...

ALBERTO  -  Não sei, dona! Ele tava aqui, conversando comigo, ouvindo o rádio, de repente esbugalhou os olhos e perdeu a fala!

JOANINHA  -  Samuca! Fale! Será que ele vai morrer de novo! Samuca, fale, o que foi?... A Loteria Esportiva...

SAMUCA  -  Acertei! (gritou, voltando a si) Fiz treze pontos! Treze pontos! Ganhei a bolada! Tou bilionário!

SAMUCA PARECIA UM LOUCO. LEVANTOU-SE E COMEÇOU A QUEBRAR OS MÓVEIS, A LOUÇA, TUDO...

SAMUCA  -  Posso quebrar tudo o que quiser! Vamos quebrar a pensão! Eu pagarei, sou rico, tenho dez milhões!

DONA DIDI, ZÉ GREGÓRIO, MARIA LÚCIA E JOANINHA ASSISTIAM ESTARRECIDOS. A LOUCURA TINHA SE APOSSADO DO RAPAZ, DE SEUS AMIGOS, DE TODOS.

SAMUCA  -  Quebrem tudo! Essa velharia, esses móveis, eu pago! Vamos tocar fogo na casa!...

D. DIDI  -  Meu Deus!.... Gente, parem com isso!... Que loucura!

MARIA LÚCIA  -  Gente do Céu... o Samuca pirou!

CORTA PARA:

CENA  9  -  PENSÃO PRIMAVERA  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

JÁ ERA BASTANTE TARDE, OS MAIORES DESATINOS HAVIAM SIDO COMETIDOS NA PENSÃO PRIMAVERA, QUANDO O TELEFONE TOCOU.

EMPREGADO – Pro senhor, doutor Samuca.

O RAPAZ FEZ MENÇÃO DE LEVANTAR-SE.

D. DIDI  -  Não se incomode, eu levo o telefone até aí.

D. DIDI LEVOU O APARELHO ATÉ A MESA. SAMUCA ATENDEU. SÚBITO, COMEÇOU A FICAR VERDE.

SAMUCA  -  Não!... Não pode ser!... (e caiu no chão, desmaiado).

ZÉ GREGÓRIO PEGOU O TELEFONE, TROCOU ALGUMAS PALAVRAS COM O INTERLOCUTOR E DESLIGOU, ENCARANDO A  TODOS COM OS OLHOS ARREGALADOS.

ZÉ GREGÓRIO  -  Gente... vinte mil pessoas acertaram na Loteria Esportiva! Sabe quanto vai dar para cada um? Nem trezentos contos...
 

FIM DO CAPÍTULO 29

 e no próximo capítulo...
*** As reportagens sobre a "Santa de Ipanema" provocam as mais diversas reações em nossos personagens: ciúmes em Helô, o temor de Leopoldo que seu filho Ricardinho se encrenque ainda mais e a busca da verdade por Vítor.

*** Depois do quebra-quebra promovido na Pensão Primavera, Samuca é expulso a sapatadas por D. Didi e Maria Lúcia!

*** Marisa procura Renatão, disposta a tudo para ver a filha!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 30 DE
          

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 28

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
 
CAPÍTULO 28

Participam deste capítulo:

HELÔ (Dina Sfat)
VÍTOR (Francisco Cuoco)
MARIA LÚCIA (Aizita Nascimento)
D. DIDI (Gracinda Freire)
SAMUCA (Paulo José)
TIA COLÓ (Henriqueta Brieba)
RENATÃO (Jardel Filho)
OLIVEIRA RAMOS (Mario Lago)
MISS JULY (Lidia Mattos)
ARAKEN TEIXEIRA (Ivan Cândido)
GOUVEIA NETO (Fernando José)
DELEGADO FONTOURA (Urbano Lóes)
ADELAIDE (Agnes Fontoura)
RICARDINHO (Carlos Vereza)
MARIO MALUCO (Osmar Prado)
VERINHA (Djenane Machado)
CRIADA

CENA 1  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  QUARTO DE HELÔ  -  INT.  -  DIA.

FIM DE TARDE. O SOL COLORIA AS ÁGUAS DO MAR DE DOURADO, ANUNCIANDO SUA DESPEDIDA. HELÔ ESTAVA DE PÉ DIANTE DA JANELA, MAS PARECIA NÃO VER TODA A BELEZA QUE SE DESCORTINAVA DIANTE DE SEUS OLHOS. UM SÓ PENSAMENTO POVOAVA SUA CABEÇA – VÍTOR.

VÍTOR  -  (murmurou)  A essas horas ele já deve estar em São Paulo...

LIMPOU UMA LÁGRIMA QUE, TEIMOSAMENTE, INSISTIA EM MOLHAR-LHE A FACE. MISS JULY BATEU LEVEMENTE NA PORTA E ENTROU.

MISS JULY  -  (com ar de mistério e um brilho de alegria no olhar)  Querida... visita para você!

HELÔ  -  (voltou-se) Quem é?

MISS JULY  -  Surpresa! Você nem imagina...

HELÔ  -  Fala de uma vez, Miss July, que hoje não estou para...

VÍTOR  -  (cortou, entrando)  Com licença. Sou eu, Helô. Preciso falar com você. Pode ser aqui mesmo, no seu quarto?

HELÔ ARREGALOU OS OLHOS, TOMADA PELA EMOÇÃO.

HELÔ  -  Vítor! Você aqui? Mas você... não viajou?

VÍTOR  -  Não. Mudei de idéia. Podemos conversar agora?

MISS JULY  -  (animada)  Vou me retirar para vocês conversarem à vontade! Com licença!

MISS JULY SAIU, FECHANDO A PORTA ATRÁS DE SI. VÍTOR E HELÔ ESTAVAM PARADOS, FRENTE À FRENTE.

HELÔ  -  Você disse que quer falar comigo...

VÍTOR  -  Helô, eu soube o que aconteceu com você, ontem. O acidente. Fiquei muito preocupado.

HELÔ  -  Como soube? Pensei que nem estava mais no Rio...

VÍTOR  -  Isso não importa. Eu pensei melhor... e vou esperar mais um pouco... pensar mais... para não tomar uma decisão precipitada.

HELÔ  -  (com altivez, a voz pausada)  Vítor, eu posso entender que você não me ama e sou obrigada a aceitar isso... Agora a sua piedade, eu não vou suportar. Por favor, vai embora.

VÍTOR  -  Escuta, Helô, não é nada disso...  Eu pensei melhor e vi que estava agindo levianamente. Eu decidi que quero te conhecer melhor, conviver mais com você...

HELÔ  -  (seca)  Foi meu pai, não foi? Foi ele que procurou você e pediu um pouco de piedade para a filha coitadinha, desmiolada e suicida... Pois eu te liberto desta missão triste e maçante! Por favor, sai.

VÍTOR  -  (súplice)  Helô, não é nada disso, você está enganada. Eu não sinto pena de você!

HELÔ  -  (mal podia segurar as lágrimas)  Você está sendo patético, Vítor Mariano. (dirigiu-se para a porta e abriu) Por favor...

VÍTOR  -  (insistiu) Por favor, seja razoável. Vamos conversar...

HELÔ  -  (irredutível) Vá em-bo-ra! Sai do meu quarto!

VÍTOR PERCEBEU QUE NÃO HAVIA MAIS NADA A FAZER ALI E RETIROU-SE.

CORTA PARA:

CENA  2  -  BANCO OLIVEIRA RAMOS  -  SALA DE OLIVEIRA   -  INT.  -   NOITE.

FIM DE EXPEDIENTE.  OLIVEIRA RAMOS PREPARAVA-SE PARA IR EMBORA, QUANDO A SECRETÁRIA ANUNCIOU A CHEGADA DE RENATÃO.

OLIVEIRA RAMOS  -  (no interfone) Renatão? Mas a esta hora, D. Virgínia? Não, não, espere... está bem, mande-o entrar.

RENATÃO ENTROU, AFLITO.

RENATÃO  -  Doutor Oliveira, mil perdões! Sei que já encerrou o expediente, mas é urgente! Estou desesperado!

OLIVEIRA RAMOS  -  O que aconteceu? Você está tão nervoso, rapaz!

RENATÃO  -  Trata-se de Carlinha, minha filha de sete anos que mora em Niterói com a avó. Recebi uma intimação judicial. É para dar a Madame X o direito de vê-la!

OLIVEIRA RAMOS  -  Quem é essa Madame X?

RENATÃO  - É Marisa, minha ex-mulher. Abandonou a menina, ainda um bebê, e foi morar na Europa. Carlinha acredita que a mãe está morta e agora, ela está de volta, procurando seus direitos! Isso é uma coisa que eu não posso permitir. De jeito nenhum! Vou preso, mas não obedeço! Por favor, me ajude, Oliveira!

CORTA PARA:

CENA 3  -  CASTELINHO  -  INT.  -  NOITE.

ÀQUELA HORA, O MOVIMENTO NO CASTELINHO ERA INTENSO. ARAKEN  PEDIU  MAIS  UM  CHOPE  E CONSULTOU O RELOGIO. EM SEGUIDA, DIVISOU, COM ALÍVIO, A CHEGADA DE VÍTOR QUE, AO AVISTÁ-LO, APROXIMOU-SE E SENTOU À SUA MESA.

VÍTOR  -  Boa noite, seu Araken Teixeira. O senhor queria falar comigo?

ARAKEN -  Obrigado por ter vindo, padre. Eu preciso sim, falar com o senhor.

VÍTOR  -  Por favor, não me chame de padre. Eu, agora, sou um cidadão como qualquer outro...

ARAKEN  -  Desculpe, eu não sabia.

VÍTOR  -  Tudo bem. Mas me diga... em que posso ajudá-lo?

ARAKEN  -  Eu sou jornalista. Trabalho para a “Folha do Rio” e estamos iniciando uma série de reportagens sobre Nívea Louzada. Eu gostaria de entrevistá-lo.

VÍTOR  -  Que tipo de reportagem?

ARAKEN  -   O senhor sabia que o local onde a moça foi encontrada morta recebe inúmeras visitas todos os dias e que tem gente que acredita que ela é uma santa? Como religioso, eu gostaria de saber sua opinião a respeito...

VÍTOR FITOU O JORNALISTA NOS OLHOS, COM TRISTEZA E INDIGNAÇÃO.

VÍTOR  -  É inacreditável até que ponto o ser humano pode chegar. Como pôde crer que eu contribuiria para esse desrespeito, para essa exploração sensacionalista à memória de Nívea? Seu Araken, apesar da sua deformação profissional, espero que tenha um mínimo de consciência e desista dessa matéria sórdida! Não tenho mais nada a fazer aqui. Com licença.

VÍTOR LEVANTOU-SE E RETIROU-SE DO LOCAL.

CORTA PARA:

CENA 4  -  FOLHA DO RIO  -  SALA DE GOUVEIA NETO  -  INT.  -  DIA.

GOUVEIA NETO  -  Araken, meus parabéns! Excelente a primeira reportagem sobre Nívea, a santa de Ipanema. Qual foi a reação dos entrevistados?

ARAKEN  -  Ontem estive com o padre, e me senti muito mal diante dele. É um sujeito impressionante. Ele me olhou dentro dos olhos e parece que viu até o fundo da minha alma. Me senti nu diante dele. Nu e envergonhado. Falando com franqueza, acho que ele percebeu toda a tramóia que nós estamos preparando...

CORTA PARA:

CENA 5  -  NITERÓI  -  CASA DA TIA COLÓ  -  SALA - INT.  -  DIA.     

TIA COLÓ  -  Renatinho, que bom que você veio, meu filho! Carlinha nem queria ir pra escola, ansiosa pelo passeio que você prometeu a ela!

RENATÃO  -  Ela já chegou?

TIA COLÓ  -  Ainda não, mas deve chegar a qualquer momento. É só esperar um pouquinho.

RENATÃO  -  Eu mudei de idéia. Não vou mais levar Carlinha a esse passeio.

TIA COLÓ   -  Mas por quê? Ela estava tão feliz...

RENATÃO  -  Bem, eu ia levar minha filha pra falar com uma pessoa e acho melhor a senhora saber. Marisa voltou. E quer ver Carlinha.

TIA COLÓ  -  Meu Deus! Então ela voltou!

RENATÃO  -  Pois é, julguei que ela nunca mais voltasse. Há quase sete anos que estava fora do Brasil.

TIA COLÓ  -  Mas ela não tem direito nenhum!...

RENATÃO  -  O juiz acha que tem. E resolveu que ela deve visitar a menina uma vez por semana.

TIA COLÓ  -  Como mãe dela?

RENATÃO  -  Pois é! Aí é que tá o problema!

CORTA PARA:

CENA 6  -  PRAIA DE IPANEMA  -  CALÇADÃO  -  EXT.  – DIA. 

VÍTOR  CAMINHAVA, DISTRAÍDO PELO CALÇADÃO. COMO FLASHES DE UM FILME, REVIA HELÔ CAMINHANDO A SEU LADO EM TERESÓPOLIS;  NO CARRO, QUANDO COMUNICAVA A ELA SUA IDA PARA SÃO PAULO E NO QUARTO DA JOVEM, QUANDO ELA, SEGURANDO-SE PARA NÃO CHORAR, PEDIU-LHE PARA IR EMBORA.

CORTA PARA:

CENA 7  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  SALA   -  INT.  -  DIA.

A CAMPAINHA TOCOU. MISS JULY ABRIU A PORTA. ERA VÍTOR.

VÍTOR  -  Desculpe, Miss July. Eu preciso ver Helô. Estou muito preocupado com ela. Sabe me dizer se... ela está mais calma?

MISS JULY  -  Helô não está em casa, Vítor. Ela viajou.

VÍTOR  -  (surpreso) Viajou? Mas... quando? Para onde?

MISS JULY  -  Bem... ela disse que não nasceu para viver sofrendo por quem não merece... e ligou para as antigas amizades... que, aqui entre nós, eu preferia que se mantivessem bem longe dela!

VÍTOR  -  Que... que amizades?

MISS JULY  -  Um tal de Ricardinho, Mario Maluco, Verinha e outras companhias nada recomendáveis, do tipo que só arrumam confusão. Até detida pela polícia, junto com eles, ela já foi!

VÍTOR  -  (cenho franzido, ar de preocupação)  Sabe para onde eles foram, Miss July?

MISS JULY  -  Para Búzios. O doutor Oliveira tem uma casa na praia de Geribá. Eles foram para lá.

CORTA PARA:

CENA  8  -  APARTAMENTO DO DELEGADO FONTOURA  -  SALA  -  INT.   -  DIA

DELEGADO FONTOURA  -  Mas eles foram com quem?

ADELAIDE   -  Com uma turma de moças e rapazes, Zélio. Vera disse que iam para a casa de Helô, em Búzios.

DELEGADO FONTOURA  -  E o pai de Helô, a família, está lá?

ADELAIDE  -  Isso eu não sei. Sei apenas que Verinha foi com o irmão.

DELEGADO FONTOURA  -  Mas é outro irresponsável! Sabe como é que ele é conhecido nas rodas de Ipanema? Por Mario Maluco. Seu filho.

ADELAIDE  -  Mas isso é apelido.

DELEGADO FONTOURA  -  Todo apelido tem uma razão de ser. E imagine você a minha situação: eu, o Delegado Zélio Fontoura, tenho um filho que é conhecido por Mario Maluco. Eu, que faço campanha contra os loucos do volante, os doidinhos da motocicleta e marginais que infestam o bairro. Muita gente há de dizer: mas por que ele não começa por sua própria casa?

ADELAIDE  -  Ah, relaxa, homem. Deixa eles se divertirem. O que pode acontecer de mal?

CORTA PARA:

CENA  9  -  PENSÃO PRIMAVERA  -  SALA DE JANTAR  -  INT.  -  DIA.

SAMUCA TINHA ACABADO DE ALMOÇAR E CONFERIA O SEU TALÃO DE MEGA-SENA.

SAMUCA  -  ... 23, 35, 47, 49...  Puxa vida! Que azar! (deu um murro na mesa que assustou D. Didi do outro lado do balcão).

D. DIDI  -  (gritou) Cuidado pra não quebrar a mesa, seu Samuca!

SAMUCA COÇOU A CABEÇA, ENQUANTO D. DIDI E MARIA LÚCIA RIAM, DIVERTIDAS.

MARIA LÚCIA  -  Nunca vi ninguém tão obcecado pra ficar rico!

D. DIDI  -  Conhece aquele ditado: “água mole em pedra dura”? Pois eu aposto que, um dia, ele consegue!

CORTA PARA:

CENA  10  -  BÚZIOS  -  CASA DE OLIVEIRA RAMOS  -  EXT.  -  DIA.

VÍTOR ADMIROU, POR SOBRE OS MUROS, A BELEZA DO IMÓVEL À BEIRA-MAR. TOCOU A CAMPAINHA E UMA CRIADA VEIO ATENDER. DO PORTÃO ABERTO, VÍTOR VIU QUANDO RICARDINHO E MARIO MALUCO DAVAM SALTOS - MORTAIS NA MAIOR ALGAZARRA, NA ENORME PISCINA.

VÍTOR  -  Boa tarde. Helô está?

A CRIADA FEZ QUE NÃO COM A CABEÇA E APONTOU A PRAIA A POUCOS METROS DE DISTANCIA DA CASA.

CORTA PARA:

CENA  11  -  BÚZIOS  -  PRAIA DE GERIBÁ  -  EXT.  -  TARDE.

HELÔ FECHOU OS OLHOS E RESPIROU FUNDO, RELAXADA, SENTINDO A BRISA DO MAR ACARICIAR SEU CORPO. A VOZ A FEZ VOLTAR-SE, COMO UMA ALUCINAÇÃO.

VÍTOR  -  Você está linda assim, sabia?

HELÔ  -  Vítor!

VÍTOR  -  Eu precisava vir, Helô! Estou aqui... para pedir sua mão em casamento. Você aceita?

FIM DO CAPÍTULO 28

e no próximo capítulo...

*** Helô tenta resistir ao pedido de casamento, com medo de sofrer mais uma vez! Conseguirá Vítor dobrá-la e mostrar que está sendo sincero?

*** Jurema propõe a Ricardinho que fujam, pois ele está prestes a ser preso pelo assasinato de Nívea!

*** Samuca, o sempre atrapalhado Samuca, com sua idéia fixa de enriquecer, mete-se desta vez numa "baita" e muito divertida encrenca!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 29 DE