terça-feira, 24 de abril de 2012

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 37

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
http://youtu.be/zIuryHGvAVc

CAPÍTULO 37

Personagens deste capítulo:

EMILIANO
MARIETA
DELEGADO FONTOURA
DETETIVE JONAS
RENATÃO
SAMUCA
TIA COLÓ
CARLINHA
KONSTANTÓPULUS
RICARDINHO
MARIO MALUCO
MÃOZINHA DE VELUDO
VERINHA
MARCOS
MARISA
VÍTOR
HELÔ

CENA 1  -  APARTAMENTO DE EMILIANO  -  QUARTO  -  INT.  -  DIA

Continuação imediata da última cena do capítulo anterior.

MARIETA NÃO TEVE RESPOSTA PARA DAR, FACE À ACUSAÇÃO DO MARIDO.

EMILIANO  -  Eu já desconfiava! Apesar de muito disfarçada, esta letra é sua!

MARIETA  -  (olhou-o com ar de desafio) Pois bem, é! Fui eu que escrevi! E daí?!

EMILIANO  -  Você tem noção da indignidade que está cometendo?

MARIETA  -  Indignidade o quê! Indignidade é aquela assassina ficar solta, impune! Todos estão cegos! A polícia, você, Vítor, que chegou ao ponto de ficar noivo daquela.... Não suporto a idéia de vê-lo nos braços dela! (desviou o olhar de Emiliano) Entenda, ele é como meu filho! E ela... ela é culpada de muitas coisas!

EMILIANO  -  Você fala... como se... como se quisesse ele pra você! É isso, Marieta?

MARIETA  -  (estremeceu) Você está louco! Como pode falar um absurdo desses? Eu já disse que gosto do Vítor como um filho! Eu me preocupo com ele, com seu futuro... porque ele é como se fosse uma parte... da minha Nívea!

MARIETA ESCONDEU O ROSTO ENTRE AS MÃOS E PRORROMPEU NUM PRANTO CONVULSIVO. EMILIANO ABRAÇOU A MULHER, PENALIZADO.

EMILIANO  -  Fique tranquila... que esse assunto morre aqui. Ninguém precisa saber das cartas... Ninguém.

CORTA PARA:

CENA 2  -  DELEGACIA  -  SALA DO DELEGADO FONTOURA  -  INT.  -  DIA.

DETETIVE JONAS  -  (entrando na sala) Tenho uma boa notícia, doutor Fontoura: descobri onde seu filho Mario está morando!

FONTOURA ERGUEU OS OLHOS, COM EXPRESSÃO DE ALÍVIO.

DELEGADO FONTOURA  -  Sério? Onde?

DETETIVE JONAS  -  No apartamento de Jurema! Ricardinho tem as chaves e levou Mariozinho pra morar lá.

DELEGADO FONTOURA  -  (respirou fundo) Ainda bem! A saída daquele irresponsável de casa está mexendo com meus nervos! Qual a idade do seu filho, Jonas?

DETETIVE JONAS  -  Oito anos.

DELEGADO FONTOURA  -  Pois então, aproveite bem esta fase. Você não imagina as dores de cabeça que tenho graças a Mario e Verinha! Pra eles, não faz diferença alguma que o pai seja o temido Delegado Fontoura, o eterno caçador de doidinhos da motocicleta e espantalho das gangues da Curva do Calombo... Como quase todos os jovens modernos, ou que assim se julgam, a família é o que menos conta para eles...

CORTA PARA:

CENA  3  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  DIA

RENATÃO ESTAVA NERVOSO, PREOCUPADO. SAMUCA LIA UM FOLHETO SOBRE INVESTIMENTOS E TIA COLÓ, SENTADA A UM CANTO DA SALA, FAZIA TRICÔ, ENQUANTO CARLINHA BRINCAVA COM SUAS BONECAS. KONSTANTÓPULUS, ENCOSTADO NUM DIVÃ, TINHA CARA DE PROFUNDO TÉDIO.

SÚBITO, QUEBRANDO O SILÊNCIO, RENATÃO DEU UM BERRO, ASSUSTANDO TODO MUNDO.

TIA COLÓ  -  (levou a mão ao peito, nervosa) Virgem Santíssima! Que foi, Natinho?

RENATÃO  -  Não posso mais! Não aguento mais!

TIA COLÓ  -  O que é que você não aguenta mais, meu Deus? Enxaqueca! Tá sentindo alguma dor?

RENATÃO  -  É, tia Coló. Isso mesmo. Estou com uma terrível enxaqueca!

TIA COLÓ  - Coitadinho! Deve estar sofrendo tanto! (levantou-se) Vem, Carlinha! Vamos na farmácia, buscar um remédio pro seu pai!

TIA COLÓ SEGUROU A MÃO DA MENINA E ENCAMINHARAM-SE PARA A PORTA, DE ONDE PAROU E FITOU O SOBRINHO, PENALIZADA.

TIA COLÓ  -  Aguenta firme, Natinho. Não demoramos.

E SAÍRAM.                                                         

RENATÃO  -  Não aguento mais, Samuca. Decididamente, não nasci para viver em família. Estou cheio! Cheio!

SAMUCA  -  Também, vou te contar, Renatão... Depois dessa tua regeneração, este apartamento tá de encher o reservatório do Guandu!

KONSTANTÓPULUS  -  O vizinho de baixo veio perguntar se o senhor estava doente. Ele tinha feito uma promessa pro senhor mudar daqui e está achando que foi milagre...

SAMUCA  -  Não há dúvida, se você continua assim, acaba santo!

RENATÃO  -  Mas o que é que vocês queriam que eu fizesse? Com essa mulher me vigiando, escarafunchando a minha vida, botando detetive pra me seguir? Eu tinha que dar uma de Santo Agostinho. Mas não dá mais... não dá! Sabe quantas garotas eu já botei pra correr, depois que passei a tirar onda de santarrão? Dezessete!

SAMUCA  -  Tive uma idéia! Por que você não faz um acordo com sua ex-mulher? Uma trégua, no mínimo...

RENATÃO  -  (estalou os dedos) Taí... isso mesmo! Vou deixar ela pensar que fizemos uma trégua... e parto pro ataque!

CORTA PARA:

CENA  4  -  APARTAMENTO DE JUREMA  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

A CAMPAINHA TOCOU E RICARDINHO ABRIU A PORTA. ERA O DELEGADO FONTOURA.

DELEGADO FONTOURA  -  (entrando) Onde está Mario? Eu sei que ele está aqui!

RICARDINHO  -  Qual é, delega... não tenho nada pra dizer a você, sacou?

DELEGADO FONTOURA  -  (vencido, mudou o tom) Compreenda, por favor. Não é o policial que está pedindo, mas o pai do seu amigo.

RICARDINHO  -  (irônico)  Não acredito no que eu tou vendo: o delegado Fontoura se humilhando!

DELEGADO FONTOURA  -  Já lhe disse que quem está aqui não é o delegado, mas um pai que precisa ter notícias do filho!

A HUMILHAÇÃO DE FONTOURA, ENTRETANTO, NÃO COMOVEU RICARDINHO. PELO CONTRÁRIO, FÊ-LO RIR, HUMORÍSTICO E SARCÁSTICO.

RICARDINHO  -  Olha aqui, seu delega, não posso lhe dizer se o Mario Maluco está ou não residindo no apartamento. Isso é problema seu. Que se vire! E agora, se me dá licença, vou ter que sair! Tou atrasadão!

FONTOURA BALANÇOU A CABEÇA E SAIU, CABISBAIXO.

CENA  5  -  CASTELINHO  -  INT.  -  NOITE.

MARIO MALUCO ENTROU NO BAR E A PRIMEIRA PESSOA QUE VIU SENTADA A UMA MESA FOI O MÃOZINHA DE VELUDO. ÊSTE TAMBÉM O RECONHECEU.

MÃOZINHA  -  Você não é amigo do Samuca? Senta aí.

MARIO HESITOU UM POUCO, MAS AFINAL SENTOU-SE.

MÃOZINHA  -  Pois é, acho que o vi no enterro dele.

MARIO MALUCO  -  É verdade. Eu estive lá. Cascata, hem? Ele não tinha morrido, nem nada...

MÃOZINHA  -  Coisa esquisita. Sabe que até hoje eu tou meio encafifado? Aquele troço de morrer e não morrer! Se eu não o tivesse visto no pijama de madeira... (e apontando para o bar) Toma um chope?

MARIO MALUCO  -  Tou duro. Tu paga?

MÃOZINHA  -  Não tou convidando? Garçom, traz um duplo aqui pro garotão. (e voltando-se para mario Maluco, com ar de quem não acredita) Mas tu andas duro assim por quê?

VINTE MINUTOS DEPOIS, QUANDO A PILHA DE DESCANSOS MOSTRAVA QUE JÁ HAVIAM TOMADO PELO MENOS UMA DÚZIA DE CANECAS DE CHOPE...

MARIO MALUCO  -  Me mandei de casa. Não quero pedir dinheiro pro velho, tu entendeu?

MÃOZINHA  -  Garoto novo é moleza! Tenho um jeito de faturar uma grana firme, mole, mole.

MARIO MALUCO  -  (os olhos brilhando à menção do dinheiro) Tou nessa boca!

MÃOZINHA   -  Tu topa?

MARIO RECOSTOU-SE NA CADEIRA, ANTES DE RESPONDER.

MARIO MALUCO  -  Preciso saber, antes, qual é a parada.

MÃOZINHA  -  (riu alto)  É mole, vai por mim. Uma moleza!

OLHOU PARA OS LADOS E COMEÇOU A EXPLICAR AO RAPAZ DO QUE SE TRATAVA.

CORTA PARA:

CENA  6  -  PRAIA DE IPANEMA  -  EXT.  -  NOITE.

MARCOS E VERINHA ESTAVAM SENTADOS NA AREIA, BEIJANDO-SE.

VERINHA  -  Eu tenho uma coisa pra te dizer... (fez uma pausa e baixou os olhos) Aquilo que desconfiava... bem, agora tenho certeza.

MARCOS  -  (sem entender) Do que você tá falando?

VERINHA  -  Eu tou grávida! Vou ter um filho seu, Marcos.

MARCOS  -  (se espantou) Não! Você tá brincando... Puxa vida, que azar! (houve uma pausa) E agora? Que é que você vai fazer?

VERINHA FITOU-O, ATORDOADA.

VERINHA  -  O que é que eu vou fazer? Você fala como se eu tivesse feito esse filho sozinha!

MARCOS  -  Escuta aqui, Verinha, eu não quero ter filho! Isso não tá nos meus planos e...

VERINHA  -  (levantou-se, indignada) Você tá sendo egoísta e covarde!

MARCOS  -  Temos que dar um jeito de tirar esse filho. Vou tentar arrumar o dinheiro com meu velho...

VERINHA NÃO SE CONTEVE. DEU-LHE VIOLENTA BOFETADA, FAZENDO MARCOS CAMBALEAR E QUASE CAIR.

VERINHA  -  Canalha!

MARCOS  -  Sua... sua louca!

VERINHA  -  (com firmeza)  Louca eu tava quando me envolvi com um tipo como você! Some da minha vida, Marcos! Não quero te ver nunca mais! Nunca mais, entendeu?

VERINHA DEU-LHE AS COSTAS. MARCOS FICOU PARADO, MASSAGEANDO O ROSTO.

MARCOS  -  Caramba!... Que mão pesada!

CORTA PARA;

CENA 7  -  APARTAMENTO DE MARISA  -  SALA  -  INT.  NOITE.

MARISA  -  Francamente, Renatão. Quando a criada me disse que era você, não acreditei. Não esperava que viesse visitar-me. Toma alguma coisa?

RENATÃO  -  (ressabiado, olhou em volta)  Esse apartamento é seu?

MARISA  -  Não. Pretendo me demorar muito pouco no Brasil.

RENATÃO  -  (criou alma nova) O armador sueco já lhe mandou chamar?

MARISA  -  Não. Eu só tenho aqui um objetivo, e você sabe qual é.

RENATÃO  -  (olhou-a, fixamente) Você não mudou nada. Nem no físico, nem no caráter.

MARISA  -  Sabe, eu agora seria até capaz de gamar por você. Pena que sejamos inimigos...

RENATÃO  -  Em toda batalha sempre pode haver uma trégua.

MARISA  -  Você é um sem-vergonha, Renato. Afinal, veio aqui para quê?

RENATÃO  -  Para isso. Para lhe propor uma trégua. Podemos entrar num acordo, não?

MARISA SERVIU MAIS UMA DOSE DE UÍSQUE AO EX-MARIDO E A SI TAMBÉM. BRINDARAM.

RENATÃO  -  (gritou, com o ar de quem tramava alguma coisa) Ao cessar fogo!

CORTA PARA:

CENA  8  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  SAGUÃO  -  INT.  -  NOITE.

NO SAGUÃO DA CASA DE OLIVEIRA RAMOS, VÍTOR SE DESPEDIA DE HELÔ.

HELÔ  -  Amanhã vai ser nosso último dia de solteiros. Você não vai se despedir da vida de solteiro? É costume fazer uma farra.

VÍTOR  -  (sorriu) Seria justo se fosse me despedir, realmente, de alguma coisa.

HELÔ  -  Mas você vai ser meu marido. Isso não muda a sua vida?

VÍTOR  -  Muda. Muito.

HELÔ  -  Então, depois de amanhã, não será mais pecado nos beijarmos?

VÍTOR  -  Já nos beijamos antes. Mas, depois de casados, vai ser diferente.

HELÔ  -  Pois então, vamos aproveitar!

BEIJARAM-SE ARDENTEMENTE.

CORTA PARA:

CENA  9  -  APARTAMENTO DE MARISA  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

RENATÃO DESPEJOU MAIS UMA DOSE DE UÍSQUE NO COPO DE MARISA, QUE BEBEU IMEDIATAMENTE. FALAVAM, AGORA, SOBRE OS EX-MARIDOS DELA, O NÚMERO 1, O 2, O 3, O 3-A... A MULHER ESTAVA CAINDO DE BÊBADA. ENQUANTO ISSO, RENATÃO APENAS FINGIA, E ENCHIA O COPO DA MULHER, DISTRAINDO-A O MAIS QUE PODIA.

SÚBITO, MARISA VIU TUDO RODAR E CAIU SEM SENTIDOS. RENATÃO AMPAROU-A, LEVANDO-A PARA O SOFÁ. COLOCOU UM COPO NA SUA MÃO DIREITA E UMA GARRAFA ABERTA NO CHÃO. QUEBROU OUTRA GARRAFA, VIROU DUAS CADEIRAS, DESARRUMOU POR COMPLETO A SALA E ENTORTOU UM QUADRO, PROCURANDO DAR A PIOR IMPRESSÃO POSSÍVEL. DEPOIS, FOI AO TELEFONE E DISCOU UM NÚMERO.

RENATÃO  -  Alô? É da Rádio Patrulha? Meu amigo, eu sou um morador aqui da Rua Montenegro. No apartamento em cima do meu tem uma mulher embriagada, quebrando tudo, jogando garrafas pela janela, gritando palavrões. Tome nota; Montenegro, 320, apartamento 301. Venham depressa, antes que ela toque fogo no prédio!

RENATÃO DESLIGOU. APANHOU OUTRO COPO E COLOCOU NA MÃO ESQUERDA DA MULHER, ESTENDIDA SOBRE O DIVÃ. PEGOU UMA GARRAFA E JOGOU PELA JANELA. EM SEGUIDA, SAIU CALMAMENTE, DEIXANDO A PORTA ENTREABERTA.

FIM DO CAPÍTULO  37
Renatão (Jardel Filho)

e no próximo capítulo...

***  O plano de Renatão surtirá efeito? Marisa será presa?

*** Samuca está no hospital, acompanhando D. Consuelo, quando Joaninha chega, furiosa!

*** Na Igreja de São José, Vítor e Helô casam-se, e uma mulher misteriosa assiste à cerimônia, com lágrimas nos olhos!

 NÃO PERCA O CAPÍTULO 38 DE

sábado, 21 de abril de 2012

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 36

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
http://youtu.be/zIuryHGvAVc

CAPÍTULO 36
 Participam deste capítulo:

VÍTOR
VERINHA
MARCOS
RENATÃO
TIA COLÓ
SUSI
OLIVEIRA RAMOS
HELÔ
SAMUCA
D. SOLEDAD
JOANINHA
MARIETA
EMILIANO
MÉDICO

Continuação imediata da última cena do capítulo anterior.

CENA 1  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  SALA DE JANTAR  -  INTERIOR  -  NOITE

HELÔ EMPALIDECEU, LEVANTOU-SE, VISÌVELMENTE CHOCADA, E ATIROU A CARTA SOBRE A MESA.

OLIVEIRA RAMOS  -  (indignado) Mas isso é um absurdo, uma brincadeira de mau gosto! Filha, você não pode dar importância a essa covardia. Veja só, o remetente nem teve coragem de se identificar!

HELÔ  -  Vou pro meu quarto. Com licença!

OLIVEIRA RAMOS  -  (levantou a mão, tentando detê-la) Helô! Filha, não vá...

SUSI  -  (segurou o braço do marido) Deixa, Oliveira. Ela quer ficar sozinha...

O BANQUEIRO BALANÇOU A CABEÇA, DESOLADO.

OLIVEIRA RAMOS  -  Quem será o covarde que escreveu isso?

CORTA PARA:

CENA 2  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

SAMUCA  -  Profissão desgraçada essa que eu arranjei! (dizia, deitado no sofá de Renatão).

RENATÃO  -  (preparando uma dose de uísque) Ué, por que, cara? Pensei que você tava se divertindo...

SAMUCA  -  Divertindo? Faz  dois  meses  que  estou distraindo  uma  turista  mexicana. Dona  Consuelo. A  mulher  deve andar pela casa dos setenta anos. Veste-se de maneira espalhafatosa e é feia como a necessidade! Me contratou como seu cicerone pelo tempo em que ficar no Rio. Sabe que a velha gamou por mim? Nem quer mais voltar para o México! E é podre de rica, a desgraçada!

RENATÃO  -  Aproveita. Casa com ela.

SAMUCA  -  (pensou um pouco) Até que gostei da idéia. Mas, e Joaninha? Se ela não fosse tão careta, bem que se podia dar um jeito de harmonizar tudo e ninguém sair perdendo. Não, não daria certo! Sabe, Renatão, o negócio é bolar um macete qualquer pra tirar o dinheiro dessa velha, sem precisar casar. Puxa, ela podia morrer de repente e me deixar uma herança, não podia?

TIA COLÓ APARECEU NA SALA, TRAJANDO UM PIJAMA FLORAL ESTAMPADO.

TIA COLÓ  -  (com o dedo na boca em sinal de silencio) Psiu! Falem baixo que a Carlinha está dormindo! Boa noite, Renatinho. Até amanhã, Samuca. Ah, não durmam muito tarde, que não é bom pra saúde... Outra coisa, Renatinho... tome um copo de leite morno antes de dormir. É bom pra ter um sono tranquilo.  Você pode fazer o mesmo, Samuca. Até amanhã, meninos (e retirou-se, deixando os dois boquiabertos).

SAMUCA  -  Leite morno antes de dormir... Cara, eu não acredito que ouvi isso!

RENATÃO  -  (tentou minimizar) Deixa ela... Coitada da tia Coló... sem noção...

CORTA PARA:

CENA 3  -  APARTAMENTO DE EMILIANO  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

VÍTOR ENTROU NO APARTAMENTO DE EMILIANO TENTANDO DISFARÇAR   OS   HEMATOMAS   PROVOCADOS  PELA  BRIGA COM RICARDINHO NA PRAIA. EMILIANO LIA  UM LIVRO E MARIETA ASSISTIA TV.

MARIETA  -  Vítor, deixei seu jantar no fogão (olhou com mais atenção e percebeu as manchas vermelhas no rosto do rapaz) Mas... o que é isso? Você está machucado! E suas roupas... estão sujas! O que aconteceu com você, meu Deus?

EMILIANO E MARIETA ACERCARAM-SE DO RAPAZ, ASSUSTADOS.

EMILIANO  -  Rapaz, o que fizeram com você! Foi assaltado?

VÍTOR RESPIROU FUNDO. ACHOU MELHOR CONTAR A VERDADE.

VÍTOR  -  Tive uma briga com Ricardinho na praia. Ele me provocou, me atacou... Rolamos na areia...

MARIETA  -  Que horror! Aquele marginal! Devia ser preso!

VÍTOR  -  Agora está tudo bem. Não se preocupem. Já passou.

MARIETA  -  Vou fazer umas compressas para pôr nesses machucados! Se não cuidar, vai ficar com o rosto todo roxo!

VÍTOR  -  Não é preciso, D. Marieta...        

MARIETA  -  (insistiu) Precisa sim! Sente aí. Descanse um pouco enquanto preparo as compressas!

MARIETA ENCAMINHOU-SE PARA A COZINHA. VÍTOR SENTOU-SE NA POLTRONA, AO LADO DE EMILIANO.

EMILIANO  -  Rapaz, a briga foi feia, hem?

VÍTOR  -  Uma vergonha, seu Emiliano. Rolamos na areia como dois moleques! (levou a mão ao canto da boca, em sinal de dor) Ai!
 
CENA 4  -  APARTAMENTO DO DELEGADO FONTOURA  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

JÁ PASSAVA DA MEIA-NOITE. MARCOS E VERINHA ENTRARAM, CAUTELOSOS, PARA NÃO ACORDAR FONTOURA E ADELAIDE. FALAVAM ABAFADAMENTE.

MARCOS  -  Tem certeza que não há perigo de seu pai acordar?

VERINHA  -  Não. Eles dormem com o ar ligado e isso abafa qualquer ruído... vem! (puxou-o para o seu quarto).

CORTA PARA:

CENA 5  -  APARTAMENTO DO DELEGADO FONTOURA  -  QUARTO DE VERINHA   - INT. -  NOITE.

MARCOS PUXOU VERINHA PARA SI E BEIJARAM-SE COM ARDOR. CAÍRAM NA CAMA, OS CORPOS COLADOS UM NO OUTRO.

CORTA PARA:

CENA 6  -  LAGOA RODRIGO DE FREITAS  -  IGREJA SÃO JOSÉ  -  INT.  -  DIA

SAMUCA  MOSTRAVA O INTERIOR DA IGREJA A D. CONSUELO, QUE ACOMPANHAVA-O, DE BRAÇOS DADOS.

SAMUCA  -  Está gostando do passeio?

D. CONSUELO  -  (fitava-o, embevecida) Es todo tan maravilloso, Samuquito... Todo tan hermoso!

SAMUCA TENTOU DISFARÇAR O EMBARAÇO DIANTE DOS OLHARES APAIXONADOS DA VELHA SENHORA.

SAMUCA  -  Então... vamos?
 
D. CONSUELO RIA, MUITO NERVOSA.

D. CONSUELO  -  Com usted a mi lado, yo no tengo miedo de nada.  Usted me inspira tanta confiança, tanta simpatia... (dizia, lançando olhares ternos ao rapaz).

SAMUCA SORRIU, SEM GRAÇA.

D. CONSUELO  -  Sabes, Samuquito... yo soy una mujer rica. Tengo muchas fábricas, petróleo, todos los bienes de mi esposo muerto, que se parece mucho a ti, o viceversa. Cuando te miro me recuerdas mucho de esto...

OS OLHOS DE SAMUCA BRILHARAM.

SAMUCA  -  Fico feliz em saber que lhe trago boas lembranças do seu falecido...

D. CONSUELO  -  Ahora podemos ir, Samuquito.

CORTA PARA:

CENA  7  -  APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS  -  SALA  -  INT.  -  DIA.

VÍTOR FOI Á CASA DO BANQUEIRO VER HELÔ E ESTRANHOU A EXPRESSÃO SOMBRIA DA NOIVA.

VÍTOR  -  O que aconteceu com você? Parece tão perturbada...

HELÔ  -  (estendeu-lhe o envelope com a carta anônima) Veja isso! Recebi ontem.

VÍTOR ABRIU O ENVELOPE E LEU A CARTA.

VÍTOR  -  Isso é um absurdo! Não tem fundamento! Você não pode dar importancia a uma bobagem dessas.

HELÔ  -  Me senti péssima quando li isso...

VÍTOR  -  Vem aqui... (abraçou-a, carinhosamente)  Esqueça isso. Tem alguém querendo desestabilizar a gente... não podemos entrar nesse jogo... nem dar ouvido a essas calúnias. (mudou de assunto) Ah, tenho novidades! Estou procurando emprego.

HELÔ  -  Que tipo de emprego?

VÍTOR  -  Eu não te falei que sou professor de Geografia? Pois então... estou procurando colocação na minha área. E tenho duas entrevistas marcadas para amanhã!

HELÔ  -  (beijou-o, animada) Que bom, meu amor!
    
CORTA PARA:

CENA  8  -  SALÃO DE MARIETA  -  INT.  -  DIA.

D. CONSUELO ESTAVA SENTADA NA CADEIRA DE CABELEREIRO, RECEBENDO OS ÚLTIMOS RETOQUES DE  MARIETA, QUANDO SENTIU-SE MAL.

D. CONSUELO  -  (levou a mão ao coração, nervosa)  Mi corazón... Dios mio...

MARIETA  -  Senhora, está passando mal? (chamou a assistente) Gina, traga um copo d’água, rápido!

D. CONSUELO BEBEU A ÁGUA. RESPIROU FUNDO, MAIS CALMA.

D. CONSUELO  -  Gracias... estoy mejor ahora...

MARIETA  -  De qualquer maneira, não convém deixar a senhora voltar para casa sozinha. Quer que telefone para alguém vir pegá-la?

D. CONSUELO  -  (gemeu) Yo estoy en el hotel...

MARIETA  -  (indagou, aflita) Não tem uma pessoa, um conhecido, que venha pegar a senhora aqui?

D. CONSUELO  -  Sí, hay un muchacho... El telefono está em mi bolsa... Su nombre es Samuca!

MINUTOS DEPOIS, SAMUCA FOI BUSCÁ-LA. SAÍRAM DE BRAÇO, ELA AMPARADA NOS SEUS, E ELE MUITO ENCABULADO COM OS OLHARES TERNOS DA VELHA.

CORTA PARA:

CENA  9  -  HOTEL IPANEMA PLAZA  -  SUÍTE  -  INT.  -  DIA.

O MÉDICO TOMOU A PRESSÃO DE D. CONSUELO. OLHOU PARA ELA, COM AR SÉRIO.

MÉDICO  -  O seu estado de saúde é realmente grave... Sinto muito, senhora...

D. CONSUELO  -  Sí, yo sé. Los médicos en México me deram solamente seis meses de vida. Yo sé que estoy condenada!

CORTA PARA:

CENA 10  -  PENSÃO PRIMAVERA  -  RECEPÇÃO  -  INT.  -  DIA.

JOANINHA PROCUROU MARIA LÚCIA PARA DESABAFAR. ESTAVA MUITO  PREOCUPADA COM O COMPORTAMENTO DO NAMORADO, SAMUCA.

MARIA LÚCIA  -  (deixou seus afazeres de lado e puxou a amiga para o sofá) Vem, Joaninha, senta aqui. Vamos conversar. O quê que tá acontecendo?

JOANINHA  -  Ai, amiga, pela primeira vez, eu tou desconfiada que o Samuca tá me traindo.

MARIA LÚCIA  -  (surpresa) Nossa! Tem certeza? O Samuca é tão apaixonado por você...
 
JOANINHA  - Pois é, mas com esse novo trabalho de guia turístico, ele conheceu uma mulher muito rica, e fica levando ela pra cima e pra baixo, pra mostrar a cidade. Isso tá me deixando muito irritada e... Ah, Maria Lúcia, não sei, não... Você conhece a idéia fixa do Samuca em ficar rico...
MARIA LÚCIA  -  Amiga, esse é o trabalho dele! Do que você tem medo?

JOANINHA  -  Quer saber? Tenho medo... que ele se venda! Pronto, falei!

MARIA LÚCIA  - Que é isso, Joana! O Samuca é meio enrolado, mas é do bem. Ele nunca faria isso com você!

JOANINHA  -  Será? E se eu te disser que ele deixou escapar que a velha mexicana gamou nele?

MARIA LÚCIA  -  Jura?

JOANINHA  -  Pois é... disse que é uma velha, mas não sei não... pode ter dito isso pra eu não ficar com ciúmes. Agora vive bancando a babá, e faz todas as vontades dela... Ontem liguei pra ele e tava no apartamento dela, no Hotel Ipanema Plaza, imagina! Agora me diz, Maria Lúcia, tenho ou não tenho motivos pra ficar com a pulga atrás da orelha?

MARIA LÚCIA  -  Calma, Joaninha... você tem que conversar com ele. Eu acho que não tem motivos pra ficar assim... Quem sabe ele só tá tentando faturar uns trocados a mais... O mais importante é que ele tá trabalhando...

JOANINHA  -  (levantou-se, decidida) Quer saber? Eu vou tirar essa história a limpo agora mesmo!

MARIA LÚCIA  -  Calma, Joana! Não vá fazer nenhuma besteira...

JOANINHA  -  (encaminhou-se para a porta, pisando firme) Ele que me  aguarde! 
 
MARIA LÚCIA  -  Joana... espera! Não vá fazer nada que...

ERA INÚTIL. JOANINHA ACABARA DE SAIR DA PENSÃO.

CORTA PARA:

CENA 11  -  APARTAMENTO DE EMILIANO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.  

ERAM QUASE 5 DA TARDE QUANDO VÍTOR VOLTOU PARA CASA E ESTRANHOU A PRESENÇA DE EMILIANO, QUE VOLTARA CEDO DO BANCO.

VÍTOR  -  Seu Emiliano, voltou mais cedo... Aconteceu alguma coisa?

EMILIANO  -  Me senti mal e saí mais cedo... mas já está tudo bem.

VÍTOR  -  D. Marieta já chegou?

EMILIANO  -  Não, mas deve estar chegando a qualquer momento... (mostrou-lhe o envelope sobre a mesa)  Chegou esta carta pra você.

VÍTOR EXAMINOU O ENVELOPE COM CURIOSIDADE.

VÍTOR  -  Estranho... não tem remetente... (abriu e leu)  Fizeram o mesmo com Helô. A coitada estava deprimida porque também recebeu uma carta anônima acusando-a de ser a assassina de Nívea!

EMILIANO  -  (arregalou os olhos) Que insensatez! Quem faria uma maldade dessas?

VÍTOR  -  Não sei. Leia.

EMILIANO  -  “Você está sendo enganado. Sua noivinha Heloísa Oliveira Ramos é a verdadeira assassina de Nívea Louzada.  Logo  a  verdade  será  descoberta!  Assinado:  um  amigo” (levantou os olhos para o rapaz)  Vítor, isso não tem cabimento! Você não pode se deixar abalar por uma calúnia dessas!

VÍTOR  -  Eu sei, seu Emiliano. Mas não posso deixar de me perturbar com tanta leviandade. Como o ser humano pode ser capaz de um ato desses?

CORTA PARA:

CENA  12  -  HOTEL IPANEMA PLAZA  -  QUARTO DE D. CONSUELO  -  SALETA DE ESPERA  -  INT.  -  TARDE.

NA SALETA DE ESPERA, SAMUCA ANDAVA DE UM LADO PARA O OUTRO. O MÉDICO SAIU DO QUARTO.

SAMUCA  -  (correu ao seu encontro) Doutor... o que está acontecendo? Como ela está?

MÉDICO  -  O senhor é filho dela?

SAMUCA  -  Não. Nada disso. Sou empregado da Agencia de Turismo Boa Companhia. Tou em serviço.

MÉDICO  -  Ela diz que os médicos mexicanos lhe deram seis meses de vida!

SAMUCA  -  (arregalou os olhos, mal disfarçando a emoção) Seis meses!

O MÉDICO RETIROU-SE.

SAMUCA  -  (para si) Não é possível! Aí está a minha grande chance de ficar rico!

FOI INTERROMPIDO PELO CHAMADO NERVOSO DE D. CONSUELO.

D. CONSUELO  -  Samuca? Samuquito, donde estás? No me dejes sola!

O RAPAZ ENTROU NO QUARTO E ACERCOU-SE DELA. D. CONSUELO TOMOU-LHE A MÃO E APERTOU-A CONTRA O ROSTO. LÁ FORA OUVIU-SE UMA GRITARIA INFERNAL.

CENA  13  -  HOTEL IPANEMA PLAZA  -  SALETA  -  INT.  -  TARDE

JOANINHA  -  Que não pode entrar o quê! Eu sei que ele está aqui e vou entrar, nem que seja no peito!

A MOÇA ESTAVA INSULTADA, NERVOSA. DOIS FUNCIONÁRIOS DO HOTEL TENTAVAM BARRAR SUA PASSAGEM, MAS ENTROU CORRENDO NA SALETA. SAMUCA APARECEU NA PORTA.

SAMUCA  -  Joaninha! Que é isso?

JOANINHA  -  Então é aqui que você trabalha! No quarto da gringa! Imagino o tipo de trabalho que você está fazendo!

SAMUCA  -  Pelo amor de Deus, pare de gritar! É que a velhota está doente. Teve um ataque do coração, quase morreu.. E tá desenganada pelos médicos!

JOANINHA  -  (desconfiada) Ah, é? Pois quero ver com meus próprios olhos!

FEZ  MENÇÃO DE ENTRAR NO QUARTO DE CONSUELO. SAMUCA SEGUROU-A PELO BRAÇO.

SAMUCA  -  Joaninha, não faça isso! Seria uma desumanidade. Que é que os mexicanos vão pensar de nós? Da nossa hospitalidade?

JOANINHA LARGOU-SE, SÚBITO, DE SUAS MÃOS E EMPURROU A PORTA DO QUARTO. A VELHA ESTAVA ESTIRADA NA CAMA, COBERTA POR UM LENÇOL.
 
JOANINHA  -  (sussurrou) Nossa! Que é aquilo! Puxa!

SAMUCA  -  Convenceu-se?

JOANINHA  -  É... é preciso ter estômago de avestruz!

SAMUCA  -  Eu não lhe disse? Só mesmo muita necessidade de trabalhar, como eu tenho. Muito espírito de sacrifício!

A VOZ DE CONSUELO CHEGOU ATÉ ELES.

D. CONSUELO  -  Samuca?... Samuquito?... Donde estás, mi amor?...

JOANINHA ENCAROU SAMUCA, COM RAIVA, DEU-LHE AS COSTAS E SAIU.

CORTA PARA:

CENA  14 -  APARTAMENTO DE EMILIANO   -  QUARTO  -  INT.  -  NOITE.

EMILIANO OUVIU UM RUÍDO NA PORTA E ENTROU NO QUARTO Á PROCURA DE MARIETA. PELO BARULHO DO CHUVEIRO, COMPREENDEU QUE ELA ESTAVA NO BANHO. EMILIANO, PORÉM, NOTOU QUE A SUA BOLSA ESTAVA SOBRE A CAMA. INSTINTIVAMENTE, ABRIU A BOLSA E, PARA SUA SURPRÊSA, ENCONTROU UMA CARTA. MARIETA SAIU DO BANHEIRO E EMPALIDECEU.

MARIETA  -  O que você está fazendo?               

EMILIANO  -  (mostrou-lhe a carta, acusador) Você escreveu esta carta, como escreveu todas as outras! Então você é a autora das cartas anônimas! Você, Marieta!


FIM DO CAPÍTULO 36
 Consuelo (Estelita Bell)

 e no próximo capítulo...

*** O delegado Fontoura descobre onde o filho Mario Maluco está morando e vai à sua procura.

*** Renatão tem um surto, pois não aguenta mais a vida em familia, e arma um plano maquiavélico para afastar Madame X de uma vez por todas de sua vida!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 37 DE