quinta-feira, 16 de junho de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 33


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO  33


PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

MARIA DE LARA
DR. RAFAEL
JERÔNIMO
POTIRA


CENA 1  -  FLORESTA   -   EXT.  -  DIA.

Durante algum tempo, Maria de Lara perambulou pelas imediações da fazenda. Acordara pela madrugada e, após as orações da manhã, se decidira pelo passeio ao campo. O vestido leve e rodado facilitava-lhe os movimentos e a moça, correndo de árvore em árvore, admirava as flores, a algazarra dos pássaros, o lento curso do riacho de águas claras. Afastara-se demais da casa-grande e agora avistava o casebre abandonado, um ponto branco no fundo verde da floresta. Dirigiu-se para lá.

CORTA PARA:


CENA 2  -  CASEBRE NA FLORESTA  -  INT.  -  DIA.

A desordem no interior da construção rústica dava-lhe a impressão de um bazar desarrumado. Sobre o velho baú, um vestido estampado chamou-lhe a atenção. Colocou-o diante do corpo.  As sandálias atiradas no chão; sobre a mesinha de madeira, gasta pelo tempo, uma bolsa de couro cru, de alças longas. Lara sentiu, mais do que ouviu, o ranger da porta que se abriu. Rafael apareceu.


DR. RAFAEL  -  Bom dia, Lara. Preciso falar com você.

Lara voltou-se, surpresa. Havia certo descontrole em seus gestos. O médico percebeu-lhe o nervosismo e a indecisão.

DR. RAFAEL  -  Queria conversar mais um pouco com você.

MARIA DE LARA  -  O senhor quer saber o que eu penso de tudo isto? Acho que estou perdendo o juízo. Que estou ficando louca!

DR. RAFAEL  -  (comedido)   Não, não, tire isso da cabeça.

A expressão da jovem se modificou.

MARIA DE LARA  -  Eu não lhe disse ontem... eu ouço vozes. Hoje... ela voltou a falar comigo...

DR. RAFAEL  -  Quem?

MARIA DE LARA  -  Uma voz somente... que me persegue!

DR. RAFAEL  -  Há quanto tempo ouve esta voz?

MARIA DE LARA  -  Já há algum tempo... desde que cheguei aqui, creio.

DR. RAFAEL  -  E que lhe diz a tal voz?

MARIA DE LARA   -  Ela... ela me diz certas coisas. Ir contra o meu pai e minha mãe, por exemplo. Manda-me ir sempre... ao encontro de João Coragem!
   
DR. RAFAEL  -  (curioso)  A senhora ama este homem?
   
MARIA DE LARA  -  (transtornada)  Eu... eu não sei... eu creio que sim, doutor, mas ele é um homem rústico... muito diferente... e não é isso... eu não quero me casar, não quero gostar de ninguém... luto contra isso! E esta voz me manda justamente fazer aquilo que eu não quero.  (voltou-se patética para o especialista)  Diga a verdade, isto é loucura?

Rafael balançou a cabeça lentamente. Encarava o semblante da moça, analisando seus menores movimentos.

DR. RAFAEL  -  De fato, isto é grave. Mas você se amedronta com essa voz porque reconhece nela um sintoma de doença. Se estivesse ficando louca, o que a voz lhe diz poderia amedrontá-la, não a voz em si, compreende?

MARIA DE LARA  -  O senhor não quer dizer... mas o senhor sabe. Qualquer um sabe que quem ouve vozes que não existem não pode estar em seu juízo perfeito. Não pode!

A coisa aconteceu inesperadamente. Lara colocou as mãos sobre a fronte e premiu-a fortemente.

MARIA DE LARA  -  Outra vez a dor de cabeça!

O médico sentiu que o momento era oportuno. Com a voz pausada, leu o papel que trouxera consigo.

DR. RAFAEL  -   Conhece Diana Lemos? (repetiu, mais lentamente)  Conhece Diana Lemos?

Lara se ajoelhara no chão duro de barro. Apertava com força as têmporas, os cabelos caindo-lhe em cascata pelo rosto.

MARIA DE LARA  -  Que dor horrível!
 
DR. RAFAEL  -  (insistia, sem pena)  Sabe quem é Diana Lemos?

Aos poucos os dedos se afrouxaram e as lágrimas começaram a rolar. O choro fraco se transformou num riso zombeteiro, irônico.O médico observava espantado a metamorfose da moça, sem entender direito o que lhe acontecia. Compreendia que algo de extraordinário estava para ocorrer. Quem sabe o segredo de tudo? Ajudou a moça se levantar do chão.

DR. RAFAEL  -  Está se sentindo melhor?

MARIA DE LARA  -  (com expressão diferente)  Muito melhor.

DR. RAFAEL  -  Que foi que sentiu? Dor de cabeça?
 
MARIA DE LARA  -  (orgulhosa)  Não tive dor nenhuma. Ela teve, não eu.

DR. RAFAEL  -  Ela?

MARIA DE LARA  -  Sim, ela. Sempre tem essas dores de cabeça quando eu quero sair. Ela é uma boba, não acha?

Rafael procurava compreender a estranha observação da cliente.

DR. RAFAEL  -  De quem está falando?

MARIA DE LARA  -  De Lara!  (e  provocante)  Sabe que você é simpático? Aposto que dança muito bem...

DR. RAFAEL  -  Voce não é Lara Barros?

MARIA DE LARA  -  Que Lara! Sou Diana Lemos e você sabe disso.

A moça falava com desenvoltura e atrevimento, movimentando-se intensamente no interior da pequena sala. O especialista finalmente compreendera tudo. Olhava o papel e Lara, á procura de um elo de ligação. Diana retirava roupas do interior do baú, jogando-as sobre a mesa.

MARIA DE LARA  -  É aqui que guardo minha roupa. Estou só procurando um vestido de casamento.

DR. RAFAEL  -  Vai casar?

MARIA DE LARA  -  Que remédio? No duro, no duro, gosto do cara. Gosto muito. É o tal de quem Lara foge...

DR. RAFAEL  -  O garimpeiro...

MARIA DE LARA  -  É. A idiota tem preconceitos... coisas de educação... diferença social... besteira. Não tenho nada disso. Sou livre... (rodopiou com o vestido sobre a cabeça) Será que este aqui está bom para a cerimônia?

O médico fez que sim com a cabeça.

MARIA DE LARA  -  Olha,  não queria me amarrar. Sério. Nunca me preocupei com isso. Mas o caso com o grandalhão ficou muito sério. E vem conseqüências por aí... Sabe como é, as coisas acontecem...

DR. RAFAEL  -  Você está... grávida? Tem certeza?

MARIA DE LARA  -  Absoluta! Sabe, faço tudo o que a outra tem medo de fazer. Mas, também, não tenho o direito de desgraçar com a vida dela desse jeito...

Prosseguiu, rindo, com ar de caçoada.

MARIA DE LARA  -  É uma coitada. Mas não pense que não me cansei de aconselhá-la a não ser assim.

Rafael lembrou-se do que Lara lhe tinha dito.

MARIA DE LARA  -  Sim, ela me disse que ouvia uma voz. Que espécie de conselhos você lhe dava?
   
MARIA DE LARA  -   Que conselhos? Ela é gamadona pelo garimpeiro, pensa que eu não sei? Pois reage e tem medo de se entregar a um sentimento mais forte. Vê coisas na casa dela entre o pai e a mãe.. agüenta firme, não faz nada! Mando que ela reaja contra aquele outro tipo. (referia-se a Lourenço)  Ela agüenta tudo quanto é desaforo. Ah, se fosse eu! Já dei na cara dele! Tirei carne das fuças do cretino! Tentei até matar ele.

Diana conversava á vontade. Vez por outra aplicava um tapa de intimidade nas pernas do médico. 

MARIA DE LARA  -  Um dia vou sair e não vou voltar!

DR. RAFAEL  -  Como “sair”?  Você quer dizer... impor a Lara sua personalidade, como agora?

MARIA DE LARA  -  (sorridente)  Isso mesmo!
   
DR. RAFAEL  -  E é sempre possível... “sair, como você diz, sempre que quer?
   
MARIA DE LARA  -  (suspirou, tristonha e irritada)  Quem me dera! Ás vezes posso. Ás vezes, não. Mas lhe garanto uma coisa: está se tornando cada vez mais fácil. Ela está ficando cada vez mais fraca e eu mais forte. Um dia destes, domino-a por completo. E então... adeus, Maria de Lara!

Rafael ouvia atentamente as explicações. Mentalmente organizava um quadro da moléstia. Tudo se lhe abria como num passe de mágica. As duas personalidades conflitantes entravam em choque dentro de um mesmo corpo. Nítido caso de dupla personalidade.

MARIA DE LARA  -  Acho bom aconselhar a coitada a se casar com o grandalhão, doutor! Olha bem o que eu contei. Pode ser que ela reaja e não me deixe “sair”, como deixou agora. O casamento é no dia 7. O padreco está ajeitando tudo.
  
DR. RAFAEL  -  E... se ela não aceitar esse casamento?

MARIA DE LARA  -  Já disse: por mim, não tem nada. Mas por ela...  (riu desenfreadamente)  Nem quero pensar no que vai acontecer... quando ela descobrir. Vou morrer de rir só em pensar na cara dela!  (Imitou Lara benzendo-se)  Meu Deus, que horror! Nem quero pensar!

Os risos aumentaram de intensidade, confundindo-se com os soluços e as lágrimas que denotavam a mudança de personalidade. Diana se afastava e Lara voltava a existir. Rafael observava detidamente as expressões e modificações radicais que se processavam diante de seus olhos.

DR. RAFAEL  -  Por que está chorando?

A voz de Lara expressava timidez e angústia.

MARIA DE LARA  -  (quase num sussurro)  Desculpe-me, doutor... mas tenho tanto medo... de enlouquecer!
  
DR. RAFAEL  -  (falou para si mesmo)  Espantoso! Lara!

O mistério de Diana Lemos deixara de existir.

CENA 3  -  RANCHO CORAGEM  -  QUARTO DE JOÃO E JERÔNIMO  -  INT.  -  DIA.

O quarto dos irmãos Coragem pela manhã era a imagem inequívoca do desleixo masculino. Colchas, travesseiros, roupas e objetos atirados para todos os lados. Potira tentava pôr uma ordem na bagunça.  Imersa em pensamentos, quase não percebeu a presença de Jerônimo.

JERÔNIMO  -  Potira, vem cá!

O rapaz se sentou na beira da cama, puxando-a para perto de si. Rodou a aliança no dedo moreno da mestiça.

JERÔNIMO  -  Tá contente, não tá? Vai sê mulhé de doutô!

Potira deitou meigamente a cabeça nos joelhos do amado. As mãos correram-lhe das pernas ao peito, numa carícia animal.

JERÔNIMO  -  (alisando-lhe os cabelos)  É o sonho de muita moça... arranjá bom casamento.

POTIRA  -  (ergueu os olhos súplices)  O sonho... é casá por amor.

JERÔNIMO  -  Cê gosta dele depois...

POTIRA  -  Não fala nada. É melhor... Cê não me perdeu. Não tou casada. Mãe disse que entre nós não existe nenhum mal. Padrinho fez um juramento...

JERÔNIMO  -  Eu sei. Ela me disse.

POTIRA  -  Basta você querê, Jeromo. Basta uma palavra sua... um sinal seu... e eu me entrego a você de corpo e alma.

As mãos crispadas pelo desejo magoavam  o peito do rapaz. A proximidade de Potira, a ânsia refletida em seus olhos, a respiração curta e acelerada esmagavam a resistência de Jerônimo.
 
JERÔNIMO  -  (carinhosamente, afastou de si o corpo sensual da mestiça)  Cê pensa bem, índia. Pensa na maldade que ia fazê com meu melhor amigo. O home que realizô uma coisa que eu desejava há tanto tempo. Um home que tem sido nosso amigo do peito. Que arrisca a vida por uma causa. Que pensa nos outros sem egoísmo. Que decidiu terminá com as injustiça nessa terra e conseguiu... Um home bão, justo, honesto...

Potira, desesperada, agarrou-se ao rapaz.


POTIRA  -  Sei de tudo isto, mas ele não é seu irmão. É só um amigo.

JERÔNIMO  -  Mas gosta de você e pediu você em casamento...

POTIRA  -  E a gente vai sacrificá uma coisa tão bonita que é tudo o que a gente sente um pelo outro. E vou casá com ele... sem gostá... Vou fazê ele ainda mais desgraçado... Tudo porque ele é bão e você seu melhor amigo?

Jerônimo apertou amorosamente a moça contra seu peito. Seus lábios tocaram de leve a pele morena e acetinada. O calor dos corpos unidos acendia o fogo dos instintos, renovando o desejo incontrolável que o impelia a possuí-la inteiramente para si. A visão de Rodrigo feliz, sorridente se interpôs entre os dois.

JERÔNIMO  -  Cê me esquece, índia...

POTIRA  -  Vou fazê força, Jeromo. Só quero um beijo de despedida.

Os lábios se uniram num longo beijo.

FIM DO CAPÍTULO 33
Jerônimo (Claudio Cavalcanti) e Potira (Lucia Alves)

E NO PRÓXIMO CAPÍTULO...

***PREOCUPADO COM A SITUAÇÃO DE RITINHA EM TER QUE DEIXAR O APARTAMENTO, DUDA FAZ AS MALAS E PREPARA-SE PARA VIAJAR PARA O RIO EM SEGRÊDO, QUANDO O TÉCNICO FAUSTO PAIVA O SURPREENDE, DE MALA NA MÃO!

***DR. RAFAEL REVELA A PEDRO BARROS, SUA MULHER ESTELA E TIA DALVA QUE MARIA DE LARA É DIANA LEMOS E QUE A FILHA DO CORONEL PRECISA CASAR COM JOÃO CORAGEM. FURIOSO, PEDRO BARROS PARTE PRA CIMA DO PSIQUIATRA!


NÃO PERCA O CAPÍTULO 34 DE

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