quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

IRMÃOS CORAGEM - Capítulo 106


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO 106
PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:
JOÃO
MÁRCIA
DELEGADO FALCÃO
ALBERTO
BRANCA
PEDRO BARROS
PADRE BENTO
DR. MACIEL
JERÔNIMO
RODRIGO

CENA 1  -  COROADO  -  DELEGACIA  -  CELA DE JOÃO  -  INT.  -  DIA.

Depois dos primeiros dias de vigilância cerrada, os homens do delegado já não encaravam João Coragem como um bicho-de-sete-cabeças. Um homem como qualquer outro. Com rompantes naturais e uma firmeza de caráter que, a cada dia, mais atraía a consideração e o bem-querer dos próprios guardas. Longe de Falcão eles procuravam dar um tratamento humano ao garimpeiro. Mas, perto ou longe do delegado, ele, como prisioneiro de excelente comportamento, podia receber visitas fora da cela e desalgemado.

A presença de Márcia enterneceu o corpulento garimpeiro. Márcia beijou-o com ternura e abraçaram-se demoradamente.


JOÃO  -  Cê tá bem, Márcia?

MÁRCIA  -  Estou...

JOÃO  -  O nenê?

MÁRCIA  -  Também.

JOÃO  -  Já tá de barriga?

Ela fez que sim e se levantou para que o marido a visse por inteiro. Num gesto instintivo, João Coragem mediu com a mão o ventre da esposa. Circundou-o com a mão pesada, correndo levemente por toda a sua extensão.

JOÃO  -  (risonho e franco)  Me dá até orgulho!

MÁRCIA  -  É mesmo?

JOÃO  -  É sim! Você num sente um troço aqui dentro? Só de pensá que vai tê um filho meu?

MÁRCIA  -  Sinto... é gozado, não?

JOÃO  -  Sabe que parecemo dois bôbo?

Riram felizes.

MÁRCIA  -  Dois bobos?

JOÃO  -  Uai... a gente é bobo, mesmo. Quem é que tem alguma coisa com isso? Essas noite toda... eu fiquei preocupado... (e ante a expressão de interrogação da esposa, completou) Com o nome dele, ora! Cê num se preocupa?

MÁRCIA  -  As preocupações são tantas, João, que eu confesso... não me lembrei de que o nosso filho precisa ter um nome.

JOÃO  -  Mas tem que pensá, uai! Pois fiz as conta. Ele vai nascê daqui a 4 mês. A gente num tem muito tempo, não!

MÁRCIA  -  (tentou desviar o assunto)  João... escute, não é justo...

JOÃO  -  Escuta  (interferiu, para quem o assunto do filho passara a ser o mais importante da face da terra)  Tá fazeno ropa pra ele?

MÁRCIA  -  Não, ainda não.

JOÃO  -  Coisa da melhor qualidade... já é tempo docê pensá em fazê ropa prêle.

MÁRCIA  -  Tem tempo...

JOÃO  -  Tempo, não senhora. O tempo voa. E no nome dele... a gente precisa pensá logo.

MÁRCIA  -  Se for homem, se chamará João, pronto!

JOÃO  -  Num quero. Já tem o filho do Braz, que é home e João. Fica João demais nessa terra. A gente arranja outro. Que tal Bastião?

A mulher não suportou a comicidade do nome e do modo do marido pronunciá-lo e riu.

MÁRCIA  -  Nossa Mãe!

JOÃO  -  Uai! O nome do meu pai. Sebastião Coragem!

MÁRCIA  -  Ah, Sebastião, sim! Bastião, não! (tornou a rir, afagando a mão e o pulso do marido).

JOÃO  -  Apelida ele logo de Tião!

MÁRCIA  -  Não! Nada de apelido!

JOÃO  -  Se for mulhé, a gente bota o nome da minha mãe ou da tua. Combinado?

MÁRCIA  -  Combinado.

O guarda bateu com a chave na barra de ferro, lembrando ao casal que o tempo de entrevista estava esgotado.

CORTA PARA:

CENA 2  -  COROADO  -  DELEGACIA  -  INT.  -  DIA.

Falava-se em Coroado sobre muita coisa: os amores de Jerônimo e Potira; o casamento do prefeito; a prisão de João Coragem e Alberto D’Ávila; a separação de Pedro Barros e Estela; o roubo do diamante, etc., etc. Um assunto vinha polarizando as atenções da cidade nos últimos dias: a determinação judicial para a exumação do cadáver de Lourenço. A Justiça deseja comprovar a veracidade de certas acusações. Destruir ou confirmar a tese de que o corpo sepultado não era o do homem de confiança do Coronel Pedro Barros. Falcão, a propósito do caso, dava ordens a seu ajudante, na delegacia:


DELEGADO FALCÃO  -  ... dentista, sim. O Dr. Moreira, que tratou dos dentes do Lourenço, antes dele deixar o coronel. Já conversei com o doutor. Você fala com ele pra vir aqui. A palavra do dentista é muito importante. E se apresse. Olhe aí... já estamos quase em cima da hora.

O ajudante saiu correndo.

CENA  3  -  DELEGACIA  -  SALA DE VISITAS  -  INT.  -  DIA.

Na sala de visitas da delegacia, onde os presos normalmente recebiam parentes e amigos, Alberto evitava o olhar da mulher de negro.


ALBERTO  -  Nem olha pra mim, mãe!

BRANCA  -  (de costas, falava com frieza)  Eu disse, sim... que preferia te ver morto, do que atrás das grades de uma prisão.

ALBERTO  -  Tá sendo cruel, mãe!

BRANCA  -  Sofri muito... fiz tudo pra você não chegar a esse ponto. Eu sabia que não ia aguentar.

O rapaz abaixou a voz; havia um brilho estranho nos seus olhos e nervosismo nos seus gestos.


ALBERTO  -  Não é caso disso, agora. Daqui a pouco... vão desenterrar... o homem que tá lá... no lugar do meu pai. E eu dou graças a Deus que as coisas se resolvam. Nem eu, nem a senhora, nenhum de nós, é delator. Os fatos aconteceram, normalmente.

BRANCA  -  Eu não queria que isso acontecesse.  Queria, sim, que João Coragem pagasse até o fim por esse crime...

Estava comprovada, mais uma vez, a falta de dignidade, de caráter, de bom senso, da esposa de Lourenço. Tão assassina quanto o marido, ou talvez pior, porque arrasava a vida e o destino de um homem que nada tinha a ver com seus problemas íntimos. Ela mesma não saberia explicar o porquê de sua raiva contra o garimpeiro.


ALBERTO  -  Agora não adianta a gente querer ou não.  Tudo vai se encaminhar para inocentar João. Porque aquele homem... eles vão ver direito... não é meu pai.

A porta da saleta se abriu e a figura antipática do delegado encheu o espaço vazio.


DELEGADO FALCÃO  -  Vim buscar os dois. O corpo de Lourenço já taí. Pra ser reconhecido. E eu garanto que, desta vez... com o depoimento até do dentista dele, não pode haver engano.

BRANCA  -  Já está aí?

DELEGADO FALCÃO  -  Meu modo de dizer. Aí, que eu me refiro, é fora da terra... lá na sepultura... só esperando a gente. Os homens já vieram avisar.

ALBERTO  -  Eu vou também?

DELEGADO FALCÃO  -  Você e João. Bem escoltados, é claro. Dessa vez eu não quero que haja a menor dúvida.

Fez sinal com a mão e um guarda apareceu, algemando o rapaz. João já os esperava na ante-sala da delegacia.

CORTA PARA:

CENA  4  -  COROADO  -  CEMITÉRIO  -  SEPULTURA DE LOURENÇO  -  EXT.  - DIA.

Corroído pelo tempo, madeira apodrecida, pedaços de pano, em meio a pregos enferrujados, o caixão descansava sobre a terra revolvida, ao lado da sepultura. Um mau cheiro repulsivo penetrava as narinas dos presentes, trazido pelo vento. O pequeno grupo ali estava, pronto para o trabalho macabro de identificação do morto. O Dr. Maciel, o Dr. Rodrigo, o juiz da Comarca, João, Alberto, Branca, Pedro Barros, que acabara de chegar em seu carro, dirigido por Oto e o novo promotor de Coroado. Falcão apresentava-o cerimoniosamente:


DELEGADO FALCÃO  -  Este é o nosso novo promotor, Dr. Luís. (olhou em volta)  Tá todo mundo aqui? Ah, falta o Dr, Moreira, o dentista. (o odontólogo acabava de surgir à entrada do campo santo. De negro, com óculos de aros de tartaruga e lentes grossas. Falcão avistou-o)  O homem tá chegando!  (o grupo rodeou o caixão, alguns levando lenços ao nariz)  Vamos lá, minha gente, quanto antes ficar livre disso, melhor! (ordenou aos coveiros)  Abram aí essa tampa! (um murmúrio percorreu o pequeno grupo. Falcão elevou a voz) Como é? Alguém tem ainda dúvida?

BRANCA  -  (explodiu, com as duas mãos apertando as faces)  Meu Deus! É ele mesmo!

ALBERTO  -  (bradou, surpreso)  Gente! Este é meu pai!

PEDRO BARROS  -  Não tem dúvida! Este é Lourenço!

A voz do Padre Bento, retardatário, destacou-se dentre as demais.

PADRE BENTO  -  Deus Nosso Senhor Jesus Cristo seja louvado!

Com interesse científico, Maciel se aproximou do caixão, esquecendo-se do cheiro repugnante.


DR. MACIEL  -  Impressionante! (todos os olhares voltaram-se para o médico)  Pelo tempo... devia estar em pior estado!

PEDRO BARROS  -  Apesar do rosto... a gente nota que é o Lourenço.

DELEGADO FALCÃO  -  (chamou o dentista)  Vem cá, seu Moreira. Quem vai dar a última palavra é o senhor.

Com a mão enluvada o dentista afastou os lábios do cadáver. Gengivas arroxeadas e em decomposição davam ao quadro um aspecto fantasmagórico. Moreira examinou a arcada dentária, forçou o desencaixe dos maxilares e constatou o trabalho executado. Balançou a cabeça, confirmando. Era Lourenço.

JERÔNIMO  -  (conversava baixinho com o irmão, algemado)  Sinto muito, mano... mas parece que não tem dúvida. Não desanima... A gente te livra disso!

ALBERTO  -  (desesperado ante a realidade daquilo que julgava mentira, indagava da mãe, também pálida e trêmula)  É meu pai mesmo... a senhora viu? É ele! Isso não quer dizer nada?

BRANCA  -  E você tinha alguma dúvida de que não fosse ele?

O razoável estado de conservação do corpo era motivo de especulações entre os homens de maior cultura.


DR. MACIEL  -  Repito que pelo tempo, ele está bem conservado...

RODRIGO  -  (com uma ponta de suspeita)  Isto quer dizer alguma coisa?

DR. MACIEL  -  Não... isto às vezes acontece... dependendo muito do terreno onde foi enterrado. O daqui é propício à conservação. É impressionante! O rosto está como no dia em que foi enterrado. A mesma deformação proposital...

FIM DO CAPÍTULO  106
Sinhana (Zilka Salaberry) e Falcão (Carlos E. Dollabela)

e no próximo capítulo...

*** Branca, transtornada, conta para Laport, seu atual marido, que o cadáver exumado era mesmo de Lourenço. Laport, por sua vez, diz a ela que chegou a hora de contar o que sabe sobre o paradeiro de Lourenço!

***  Lázaro procura João na delegacia para dizer-lhe que está arrependido e quer o seu perdão!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 107 DE





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