Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
http://youtu.be/zIuryHGvAVc
CAPÍTULO 23
Participam deste capítulo:
OLIVEIRA RAMOS (Mario Lago)
JOANINHA (Susana Moraes)
SUSI (Maria Claudia)
HELÔ (Dina Sfat)
RENATÃO (Jardel Filho)
SAMUCA (Paulo José)
MISS JULY (Lídia Mattos)
MARIO MALUCO (Osmar Prado)
RICARDINHO (Carlos Vereza)
VERINHA (Djenane Machado)
BABI (Sandra Brea)
DONA DIDI (Gracinda Freire)
MÃOZINHA DE VELUDO (Antero de Oliveira)
MARIA LÚCIA (Aizita Nascimento)
ZÉ GREGÓRIO (Adalberto Silva)
CENA 1 - BOTAFOGO – MIRANTE DONA MARTA – EXT. - FIM DE TARDE.
O SOL ESTAVA SE ESCONDENDO POR TRÁS DO CRISTO REDENTOR E LÁ EMBAIXO, NA ENSEADA DE BOTAFOGO, SURGIAM AS PRIMEIRAS SOMBRAS. VÍTOR E HELÔ ESTAVAM NO MIRANTE DONA MARTA, DE ONDE SE DESCORTINAVA QUASE A CIDADE TODA... LEBLON, IPANEMA, A LAGOA. A CONVERSA, COMO SEMPRE, GIRAVA EM TÔRNO DE NÍVEA.
VÍTOR - Perdoe-me, Helô, mas o seu procedimento para comigo até hoje... Ás vezes acho que compreendeu tudo o que aconteceu, mas outras vezes, penso que me odeia. Você me acha realmente culpado?
HELÔ - Eu tenho que te confessar uma coisa, Vítor.
VÍTOR - Fale.
HELÔ - (olhando-o firme nos olhos) Não sei se a gente pode amar uma pessoa que deseja destruir. Essa palavra amor soa meio cafona hoje em dia. Mas eu amo você desse modo.
A SÚBITA DECLARAÇÃO DEIXOU VÍTOR MUITO PERTURBADO.
VÍTOR - Eu acho melhor nós irmos embora.
HELÔ - Pois se você for embora, eu me atiro daqui!
HELÔ CAMINHOU PARA A BEIRA DO PRECIPÍCIO.
VÍTOR - Não é honesto o que você está fazendo. Saia daí... você pode escorregar. Vamos... por favor!
HELÔ - Só se você me prometer uma coisa...
VÍTOR - O que?
HELÔ - Um beijo. Ou você promete... ou eu pulo daqui!
OS DOIS SE OLHARAM. VÍTOR DEU UM PASSO NA SUA DIREÇÃO E PUXOU-A VIOLENTAMENTE PARA SI. HELÔ SE ABRAÇOU COM ELE, E NUM GESTO IMPULSIVO, BEIJOU-O ARDENTEMENTE. VÍTOR CONSEGUIU AFASTÁ-LA. ESTAVA TRANSTORNADO.
HELÔ - Oh, enfim!... Agora acredito que você seja humano!
VÍTOR - (desolado) Você não devia... não devia ter feito isso!
HELÔ - Você nunca beijou Nívea?
VÍTOR - Não... nunca! Ela sempre compreendeu que eu não podia... até anular os votos. E você me fez pecar!
VÍTOR OLHOU-A COM HORROR. NUM IMPULSO, VOLTOU-SE E CORREU PARA O CARRO.
CORTA PARA:
CENA 2 - APARTAMENTO DE RENATÃO - SALA - INT. - DIA.
RENATÃO ACABARA DE VOLTAR DA PRAIA, AINDA DE SUNGA VERMELHA E ÓCULOS ESCUROS, QUANDO DEPAROU COM UM SAMUCA ASSUSTADO AGUARDANDO-O NA SALA.
RENATÃO - Que cara é essa, velho?
SAMUCA - (levantou-se, foi até a janela e olhou para a rua, escondido atrás da cortina) Seu amigo tá numa sinuca de bico, Renatão. Ou eu assalto um banco amanhã, ou depois de amanhã estou desmoralizado. Entro pelo cano.
RENATÃO - (dirigiu-se ao mordomo) Konstan, prepara um uísque pra mim e pro Samuca! (e para o amigo) Explica isso direito. Me dá detalhes. Talvez possa ajudar, quem sabe...
SAMUCA - Tá. Eu tava trabalhando, lá no Banco Oliveira Ramos... quando fui descoberto pelo “Mãozinha de Veludo”, um camarada que eu conheci... bem, no tempo em que ainda não era uma das “reservas morais da nação”... naquela época participei com ele de alguns golpes... coisa pequena, sem importância, entende?
RENATÃO - Entendi, continue...
SAMUCA - Bem... ele queria dar um golpe no banco e que eu participasse... Pra escapar, inventei que ia dar um golpe sozinho e que depois dividia com ele. Marquei o golpe pra amanhã.
RENATÃO - E agora?
SAMUCA - Agora, pergunto eu. Amanhã, sabendo que não dei golpe nenhum, ele pode me obrigar a ser cúmplice do golpe que ele e seu bando vão dar. Sabe, Renatão, tenho vontade de morrer!
RENATÃO PENSOU UM POUCO. SÚBITO, TEVE A IDÉIA.
RENATÃO - Taí, velho, você podia morrer mesmo! A gente fazia o seu enterro e depois de uns tempos você aparecia! (entusiasmou-se ainda mais com a idéia) Claro que a gente dava um jeito de você sair antes do caixão! Mas o importante é que, amanhã, você vai estar dentro de um, cercado de rosas!
SAMUCA FEZ UMA CARA COMO SE A BEBIDA QUE ESTAVA TOMANDO CUSTASSE A PASSAR NA GARGANTA.
SAMUCA - Poxa... não tem uma idéia melhor, não? Não curto esse negócio de caixão, cadáver, enterro, cemitério...
RENATÃO - Essa idéia é ótima, velho! Esquece esse medo e vamos agir! É o único jeito de se livrar do Mãozinha de Veludo. Fica tranquilo, eu vou te ajudar.
SAMUCA - Não sei, não. Tou achando essa idéia muito maluca!...
CORTA PARA:
CENA 3 - APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS - SALA - INT. - TARDE.
HELÔ NÃO SAIU DE CASA NO DIA SEGUINTE. TELEFONOU DIVERSAS VEZES PARA A CASA DE EMILIANO, PORÉM VÍTOR NUNCA ESTAVA. JÁ ERA BASTANTE TARDE QUANDO, FINALMENTE, CONSEGUIU O QUE DESEJAVA.
HELÔ - (ao celular) Vítor? São três horas da tarde. Estou tentando falar com você desde cedo. Por que não atendeu o celular?
O RAPAZ NÃO RESPONDEU. ESTAVA EM CONFLITO. DO OUTRO LADO, A VOZ DA MOÇA PROCURAVA CONTROLAR-SE.
MAS SÚBITO, EXPLODIU:
HELÔ - Vítor, por que não responde? Tem medo? Medo de mim? Você não é um homem, você é um covarde! Covarde!
A MOÇA SENTIU QUE ELE HAVIA DESLIGADO. DESLIGOU TAMBÉM, CHOCADÍSSIMA. A NEUROSE COMO QUE AFLOROU-LHE À TONA. SEUS OLHOS ADQUIRIRAM UM BRILHO ESTRANHO. ELA SENTIU A NECESSIDADE PREMENTE DE LIBERTAR SUA AGRESSIVIDADE REPRIMIDA. OLHOU EM VOLTA, COMO SE PROCURASSE ALGUÉM A QUEM AGREDIR. LÁ ESTAVA SUSI, DEITADA NUM SOFÁ, LENDO UMA REVISTA. AVANÇOU EM SUA DIREÇÃO, O OLHAR DESVAIRADO.
HELÔ - Sabe, eu odeio você! Por que não vai embora, sua vigarista duma figa! Esta casa é da minha mãe, está ouvindo? Ela vai voltar um dia e você vai ter que sair!
MISS JULY ENTROU NA SALA E AINDA CHEGOU A OUVIR AS ÚLTIMAS PALAVRAS. SUSI CORREU PARA ELA, RILHANDO OS DENTES.
SUSI - Miss July! Obrigada por chegar... Você me salvou de ser assassinada por essa fera!
CORTA PARA:
CORTA PARA:
CENA 4 - APARTAMENTO DE RENATÃO - SALA - INT. - TARDE.
QUEM PRIMEIRO SOUBE DA TRÁGICA NOTÍCIA FOI JOANINHA, NAMORADA DE SAMUCA.
JOANINHA - Acidente? Mas como?
RENATÃO - (ao telefone) É preciso calma, Joaninha. Você sabe, Samuca era meu melhor amigo...
JOANINHA - Era? (soltou um grito como se tivesse sido ferida e caiu desmaiada).
RENATÃO DESLIGOU. SAMUCA FITAVA-O, APREENSIVO, TENSO.
SAMUCA - Ela tá bem? Qual foi a reação dela?
RENATÃO - Desmaiou. Agora é a vez do Oliveira Ramos. Ligando.
CONCENTRADO NO PAPEL DE AMIGO INCONSOLÁVEL DO MORTO, RENATÃO DISCOU OS NÚMEROS DO BANQUEIRO.
CORTA PARA:
CENA 5 - APARTAMENTO DE OLIVEIRA RAMOS - ESCRITÓRIO - INT. - NOITE.
OLIVEIRA RAMOS - (sem acreditar no que ouvia) Incrível, meu Deus, um rapaz tão forte e tão moço!... Foi colapso? Nossa Senhora, isso me deixa bastante preocupado com Helô! Vai seu um choque pra ela...
RENATÃO - Pois é. O velório vai ser no salão da Pensão Primavera, da D. Didi. Se quiserem aparecer lá, pra dar um último adeus... Coitado do Samuca. Pra morrer, basta estar vivo...
CORTA PARA:
CENA 6 - PENSÃO PRIMAVERA - SALÃO - INT. - DIA.
A SALA DA PENSÃO DE DONA DIDI FOI TRANSFORMADA EM CÂMARA MORTUÁRIA. JOANINHA ESTAVA SENTADA NO SOFÁ, SENDO CONSOLADA POR MARIA LÚCIA. ALBERTO, COMPANHEIRO DE QUARTO DO MORTO E ZÉ GREGÓRIO ESTAVAM DE PÉ, EM ATITUDE APROPRIADA À SITUAÇÃO, QUANDO O TELEFONE TOCOU.
MARIA LÚCIA - Alô? Sim. Pensão Primavera. Quem quer falar com ele? Mãozinha de Veludo?
RENATÃO OUVIU E CORREU PARA JUNTO DO TELEFONE.
RENATÃO - Pode deixar, minha filha, eu atendo! (e com voz fúnebre) Alô, o senhor deseja falar com o Samuca? Olha, infelizmente, ele não vai poder atender, meu amigo. O nosso Samuca faleceu hoje. O corpo está sendo velado aqui mesmo, na pensão da Dona Didi. Aliás, o corpo vai ser levado, ainda hoje, para ser enterrado em Itapetininga, a pedido de uma tia dele, que mora lá.
RENATÃO DESLIGOU E APROXIMOU-SE DO CAIXÃO. SAMUCA ABRIU UM ÔLHO.
RENATÃO - (num sussurro) Como vai a coisa? Muito mal? As flores dão vontade de espirrar? Aguenta firme, que o Mãozinha de Veludo deve vir. É bom que ele veja você.
RENATÃO PERCEBEU QUE JOANINHA ESTAVA OLHANDO PARA ELE E FINGIU REZAR, SUSSURRANDO PALAVRAS INCOMPREENSÍVEIS. FOI SALVO PELA ENTRADA PROVIDENCIAL DE MARIO MALUCO, VERINHA, RICARDINHO, BABI E OUTROS COLEGAS DA TURMA.
MARIO MALUCO - (achegou-se ao caixão) Coisa besta, hem? Ele nem parece que está morto! Coitado, era gente boa, apesar de ter roubado minha moto uma vez...
DONA DIDI APARECEU NO ALTO DA ESCADA.
DONA DIDI - (dirigiu-se a Zé Gregório, o marido) De onde veio essa turma de gente esquisita? Que Deus me perdoe, mas seu Samuca tinha umas amizades...
DAÍ A INSTANTES CHEGARAM OLIVEIRA RAMOS E SUSI. O BANQUEIRO CUMPRIMENTOU RENATÃO, COM AR DE PESAR.
OLIVEIRA RAMOS - Não consigo acreditar que este rapaz tenha morrido. Quem diria, hem, Renatão! Um rapaz tão bom, tão ajuizado!
O HOMEM MAL ENCARADO, FISIONOMIA DURA E DESCONFIADA, BARBA POR FAZER, ENTROU, ATRAINDO A ATENÇÃO DE RENATÃO.
RENATÃO - (aproximando-se) Boa tarde... era amigo do Samuca?
SEM RESPONDER, O HOMEM ACERCOU-SE DO CAIXÃO, HESITANTE. OLHOU DEMORADAMENTE O CORPO IMÓVEL, CERCADO DE FLORES.
RENATÃO - (quase sussurrando ao ouvido do sujeito) Coitado do Samuca... Parece que tinha uma doença contagiosa, e nem sabia... morreu de repente...
MÃOZINHA DE VELUDO ARREGALOU OS OLHOS, ASSUSTADO.
MÃOZINHA DE VELUDO - Con... con.. tagiosa?
RENATÃO - Fale baixo, porque muita gente que está aqui não sabe. Se soubessem, nem teriam vindo. Esta sala estaria vazia.... Ia ser um velório muito triste...
INCONTINENTI, O HOMEM DEU DOIS PASSOS PARA TRÁS, COM A MÃO COBRINDO O NARIZ.
MÃOZINHA DE VELUDO - Eu... só queria dar um último adeus pro Samuca. Vou indo... até!
MÃOZINHA DE VELUDO DIRIGIU-SE PARA A PORTA, A PASSOS RÁPIDOS. RENATÃO SEGUIU-O.
RENATÃO - Espera, meu amigo... qual seu nome?... O senhor, quem é?
MÃOZINHA - Mãozinha de Veludo... é assim que o pessoal me conhece...
RENATÃO - Sabe o que é,seu Mãozinha... é que tá faltando uma pessoa pra segurar uma alça do caixão. O pessoal que tá aqui tá com medo de pegar a doença. Tenho certeza de que o senhor, como amigo dele, não vai se negar. Aposto que nem vai pensar em doença num momento triste como esse!... Afinal, o mais importante é a amizade... O espírito cristão, a solidariedade...
MÃOZINHA DE VELUDO - (cortou) Fui!
... E PRECIPITOU-SE PARA A RUA, SEM OLHAR PARA TRÁS.
FIM DO CAPÍTULO 23
Renatão (Jardel Filho) |
*** A farsa de Renatão e Samuca forjando seu enterro começa a se complicar, com a chegada de uns tios de Samuca e a intervenção de Oliveira Ramos, que, por sua vez, fez questão de tomar todas as providencias, inclusive com a remoção do caixão para a capela do Cemitério São João Batista. E agora, Renatão e Samuca, como vão sair dessa?
NÃO PERCA O CAPÍTULO 24 DE
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