sábado, 2 de junho de 2012

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU - Capítulo 54

Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes


CAPÍTULO 54

Personagens deste capítulo:

DELEGADO FONTOURA
ADELAIDE
RENATÃO
SAMUCA
RICARDINHO
D. CONSUELO
DOM JOSÉ
ARAKEN
D. CONSUELO
GOUVEIA NETO
JUREMA
LEOPOLDO
ADVOGADO CELSO BARROSO
MARIO MALUCO
BABI
OLIVEIRA RAMOS

CENA 1  -  TRIBUNAL  -  SALA DO JÚRI  -  INT.  -  NOITE.

NA SALA DO TRIBUNAL, JUREMA ESTAVA SENTADA, ESPERANDO A REMOÇÃO PARA O PRESÍDIO. HAVIA UM SOLDADO NA PORTA. O ADVOGADO CELSO BARROSO ENTROU.

DR. CELSO  -  A senhora desculpe o meu fracasso... Eu esperava um resultado um pouco melhor. Mas não desanime. Vamos continuar lutando.

JUREMA ERGUEU PARA ELE OS OLHOS SECOS.

JUREMA  -  (perguntou, sem nenhum interesse)  Continuar lutando? Ainda há alguma coisa a fazer?

DR. CELSO  -  Sempre há! Amanhã mesmo começarei a lutar pela revisão do processo. Não vai ser fácil, mas também não será impossível conseguir um novo julgamento.

CORTA PARA:

CENA 2  -  “FOLHA DO RIO”  -  SALA DE GOUVEIA NETO  -  INT.  -  NOITE.


O DIRETOR DA “FOLHA DO RIO” FALAVA AO TELEFONE, QUANDO ARAKEN ENTROU EM SEU GABINETE.

GOUVEIA NETO  -  É, sim, a manchete é a primeira: “Condenada a Fera de Ipanema”. (voltou-se para o repórter) E a reportagem do século?

ARAKEN ENTREGOU-LHE ALGUMAS FOLHAS IMPRESSAS NO COMPUTADOR. GOUVEIA NETO LEU AS PRIMEIRAS LINHAS, O TÍTULO, E SE ESPANTOU.

GOUVIEA NETO  -  Ei, mas você está louco? “Um Clamoroso Erro Judiciário”. Mas o jornal não pode dizer isso!

ARAKEN  -  E por que não?

GOUVEIA NETO  -  Porque essa é a sua opinião pessoal. Não é a opinião do Tribunal do Júri, não é a opinião do povo.

ARAKEN  -  (arrancando as folhas de papel das mãos do diretor) Vamos falar claro, Gouveia: não é a opinião que interessa ao Oliveira Ramos,não é isso que você quer dizer?!

GOUVEIA NETO  -  Doutor Oliveira Ramos não tem nada com isso. Eu só lhe pedi pra não envolver o nome da família dele nessa história.

ARAKEN  - (pôs-se em guarda) Mas eu não envolvi ninguém do clã Oliveira Ramos nesta reportagem.

GOUVEIA NETO  -  Ora, mas você quer que o jornal tome uma posição impopular, e isso eu não posso permitir. Não foi só um Júri de sete pessoas que condenou Jurema de Alencar; foi uma população de 190 milhões .

ARAKEN  -  (dominou a sua impaciência) Então faça o que quiser. Corte o que quiser ou jogue no lixo. Eu estou enojado.

ATIROU DE VOLTA A REPORTAGEM SOBRE A MESA DO DIRETOR E SAIU.

CORTA PARA:

CENA  3  -  APARTAMENTO DO DELEGADO FONTOURA  -  SALA  -  INT.  -  NOITE.

O DELEGADO ZÉLIO FONTOURA ATENDEU O TELEFONE. ERA O DETETIVE JONAS.

DELEGADO FONTOURA  -  Fala, Jonas. Sim, acabei de saber da condenação. A TV deu uma edição especial (e mudando de assunto) Tudo bem aí no Distrito? Ah, sim... (fez cara de espanto) Na Curva do Calombo? Mande um choque pra lá.

DESLIGOU O TELEFONE E VOLTOU-SE PARA ADELAIDE.

DELEGADO FONTOURA  -  Do Distrito. O Detetive Jonas pensou que eu ainda não sabia da condenação de Jurema. Agora eu só queria ver a cara do Araken Teixeira, que vivia dizendo que ela era inocente. Hoje vou dormir com a consciência tranquila. A propósito, Mariozinho saiu de moto?

ADELAIDE  -  Acho que sim. Por quê?

DELEGADO FONTOURA  -  (com ar de preocupação)  O Detetive disse que os doidinhos da motocicleta estão na Curva do Calombo, apostando corrida. Será que ele está no meio?

CORTA PARA:

CENA  4  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT. -  NOITE.   


“ALELUIA” “ALELUIA” “ALELUIA”! JÁ PASSAVAM DE ONZE DA NOITE QUANDO A CAMPAINHA TOCOU INSISTENTEMENTE. KONSTANTÓPULUS JÁ SE RECOLHERA PARA DORMIR E RENATÃO ABRIU A PORTA. BABI ENTROU FEITO UM FURACÃO.

BABI  -  Seu bicão mentiroso! Cachorro!

RENATÃO ARREGALOU OS OLHOS, SEM ENTENDER.

RENATÃO  -  Babi! Mas o que é isso? O que foi que eu fiz?

BABI  -  Você não vale nada, Renatão, não tem o menor escrúpulo!

RENATÃO  -  (segurou-a pelos ombros) Calma! Calma! Quer fazer o favor de me dizer o que aconteceu, antes de me agredir?

BABI  -  Pois bem, eu digo: você falou que ia me apresentar ao Guel Arraes. Há uma semana que tá me enrolando com essa história. Acontece que, hoje à noite, eu fui no “Garota de Ipanema”,  encontrei o Alex Viany e descobri que ele e o Guel são amigos. Me  deu  o   endereço  dele,  eu  fui  até  lá e fiquei com a cara no chão!  Sabe por que, seu Renatão? O Guel Arraes me disse que não tem negócio nenhum com você e nem sequer lhe conhece! Me expulsou da casa dele, me chamou de louca, e disse que esse truque é velho!

RENATÃO EMPALIDECEU.

RENATÃO  -  (balbuciou) Eu... eu posso explicar... não é bem...

BABI NÃO O DEIXOU CONCLUIR. FORA DE SI, ESTALOU UMA BOFETADA NA CARA DO PLAYBOY.

BABI  -  Cafajeste! Que joguinho sujo pra conquistar uma mulher! Deve fazer isso com todas, aposto! Não me procure mais!

RENATÃO  -  (massageando o rosto) Não, Babi, com você é diferente, eu juro! (a jovem encaminhou-se para a porta e não ouviu as palavras finais) Eu... eu me apaixonei por você!

CORTA PARA:

CENA  5  -  LAGOA  -  CURVA DO CALOMBO  -  EXT.  -  NOITE.
RICARDINHO, MARIO MALUCO E O RESTO DA TURMA CONTINUAVAM O PEGA, QUANDO OUVIRAM A SIRENA DO CARRO DA POLÍCIA SE APROXIMANDO.

MARIO MALUCO  -  Vamos se mandá, gente! A cana vem aí!

SAÍRAM EM DISPARADA, RUMO A IPANEMA. PARARAM JUNTO A UMA BANCA DE JORNAIS, ONDE, PENDURADA, A “FOLHA DO RIO” MOSTRAVA EM MANCHETE: “CONDENADA A FERA DE IPANEMA”.

MARIO MALUCO  -  Você esperava que ela fosse condenada?

RICARDINHO  -  Não... mas tinha que acontecer. Ela é muito burra. Tudo isso é porque ela é muito burra...

MARIO MALUCO  -  14 anos... é tempo pra caramba! Ela deve sair de lá um bagulho!

RICARDINHO  -  (sacudiu a cabeça, enervado) E porque você olha pra mim? Eu tenho culpa?

MARIO MALUCO  -  Não tou dizendo isso, cara.

CORTA PARA:

CENA 6  -  APARTAMENTO DE RENATÃO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.


RENATÃO E SAMUCA CONVERSAVAM SOBRE OS ACONTECIMENTOS DO DIA ANTERIOR.

SAMUCA  -  Temos que dar graças a Deus por os advogados não terem se aprofundado na história das fotos... aí a coisa ia ficar feia pra gente!

RENATÃO FEZ UM SINAL DISCRETO, MOSTRANDO KONSTANTÓPULUS, QUE ESCUTAVA A CONVERSA. O MORDOMO RETIROU-SE, AO SER SURPREENDIDO.

SAMUCA  -  Ué, você não tem confiança nele?

RENATÃO  -  Tenho, mas até certo ponto (levantou-se e serviu-se de um uísque. Ofereceu a Samuca)  Quer?

SAMUCA  -  Quero. Hoje tou com vontade de encher a cara. Não por causa da condenação de Jurema, mas devido à minha própria condenação. Ontem a coisa estourou. Minha situação tá complicada... Joaninha tá desesperada. E parece que não vai querer olhar mais pra minha cara.

RENATÃO  -  (parecendo intrigado) Eu acho que a Babi também não...

SAMUCA  -  Babi?

RENATÃO  -  É... eu dei um azar danado com ela, ontem. Também, como é que eu ia imaginar que o Alex Viany ia dar o endereço do Guel Arraes pra ela? Você tem razão. A bruxa tá solta pro nosso lado. O jeito é encher a cara mesmo!

OS DOIS TOCARAM OS COPOS, NUMA SAUDAÇÃO.

RENATÃO  -  Tin-Tin.

SAMUCA  -  Coitada da Jurema, hem, Renatão?

RENATÃO  -  É... coitada.

O TELEFONE TOCOU. RENATÃO ATENDEU.

RENATÃO  -  Alô! Oi, Marisa (fez cara de impaciência) O que você quer? (pausa) Sei, sei, entendi. Pode ser amanhã? Tá bem, eu vou. Combinado. Até amanhã. (desligou e explicou a Samuca) Era Madame X. Você não vai acreditar! Ela vai mesmo voltar com o marido pra Europa e me pediu pra encontrá-la amanhã, em Niterói, na casa da Tia Coló. Quer se despedir da Carlinha, antes de viajar!

SAMUCA  -  Mas isso é bom demais!

RENATÃO  -  Bom? Esta é a melhor notícia dos últimos tempos! Temos que comemorar! (chamou o mordomo) Konstan! Traga a espingarda!

KONSTANTÓPULUS VOLTOU COM A ARMA. SOB O OLHAR DIVERTIDO DE SAMUCA, RENATÃO FOI ATÉ A JANELA, APONTOU PARA O CÉU E DISPAROU VÁRIAS VEZES.

CORTA PARA:

CENA  7  -  APART-HOTEL  -  APARTAMENTO DE D. CONSUELO  -  SALA  -  INT.  -  DIA.


D. CONSUELO CAMINHAVA, MUITO NERVOSA, DE UM LADO PARA O OUTRO.

D. CONSUELO  -  Se non abro los ojos, aquela mujer, a tal Joaninha, va a llevar Samuquito de mi! Yo no puedo permitir! No voy a permitir! Tengo que hacer algo!

DOM JOSÉ  -  Pero, qué, D. Consuelo? Lo mejor que puede hacer es olvidarse de este tipo y regressar a México inmediatamente.

D. CONSUELO  -  Nunca! Amo Samuca con todas mis fuerzas y no puedo vivir sin él. Aún más ahora que non sé cuánto tiempo tengo que vivir...

D. CONSUELO PAROU DIANTE DA JANELA, PENSATIVA, SOB O OLHAR PREOCUPADO DE DOM JOSÉ.

D. CONSUELO  -  Lo sé! Yo tengo una idea! He encontrado una manera de hacer con que Samuca nunca piense  en separarse de mí. Ven conmigo, Dom José.

D. CONSUELO PEGOU SUA BOLSA E ENCAMINHOU-SE PARA A PORTA.

DOM JOSÉ  -  Dónde vamos? ¿Qué vas a hacer?


D. CONSUELO  -  Nosotros vamos al Banco Oliveira Ramos!

CORTA PARA:

CENA 8  -  APARTAMENTO DE JUREMA  -  SALA  -  INT.  -  DIA.     

RICARDINHO  -  Tou com tanta raiva dela, que se ela entrasse aqui, agora, eu era capaz de acabar com ela de pancada!

NA VIOLENCIA DA FALA, RICARDINHO APANHOU O RETRATO DE JUREMA QUE ESTAVA SOBRE A CÔMODA E ATIROU-O CONTRA A PORTA.  NO MESMO MOMENTO A PORTA SE ABRIU E LEOPOLDO ENTROU, UM POUCO ESPANTADO. MARIO MALUCO RIU. UM RISO NERVOSO.

MARIO MALUCO  -  Caramba, velho, por pouco você não levava com o retrato da fera pela cara!

LEOPOLDO VIU O PORTA-RETRATO QUEBRADO NO CHÃO. ABAIXOU-SE E O APANHOU.

LEOPOLDO  -  (olhando para o filho) Você que fez isso, é?

RICARDINHO  -  (com ar de desafio)  Foi, e daí?

LEOPOLDO  -  (sem perder a serenidade) Eu vim porque pensei que você estivesse arrasado... como eu.

EM SEGUIDA, RECOLOCOU O RETRATO NO LUGAR, COM O VIDRO QUEBRADO.

RICARDINHO  -  Arrasado, eu? Eu tou mesmo é com muita raiva dela! Burra! Burra!

LEOPOLDO  -  Você está sendo injusto, ingrato. Tudo o que ela fez foi pra livrar você da cadeia!

RICARDINHO  -  Você a defende porque está gamado por ela!

LEOPOLDO PERDEU A SEGURANÇA, VENDO SEU JOGO DESCOBERTO.

LEOPOLDO  -  Não é verdade. Você está louco! Confunde uma amizade desinteressada...

RICARDINHO  -  Desinteressada? Corta essa!

RICARDINHO RIU, DEBOCHADO.

LEOPOLDO  -  Você sabe que Jurema tem idade pra ser minha filha!

RICARDINHO  -  Sei, e por isso mesmo você deve se mancar. Um velhote como você, devagar, quase parando...

MARIO MALUCO DEU UMA GARGALHADA NERVOSA. LEOPOLDO ESTAVA À BEIRA DE UMA CRISE DE NERVOS.

LEOPOLDO  -  Pare com isso! Tenha ao menos um pouco de respeito, senão a mim, ao menos a ela, que vai passar 14 anos no fundo de um cárcere!

RICARDINHO  -  Azar dela!

LEOPOLDO NÃO SE CONTEVE. AVANÇOU PARA O FILHO E DEU-LHE UMA BOFETADA. RICARDINHO CAIU. MAS, PASSADA A SURPRESA, LEVANTOU-SE E ARREMETEU CONTRA LEOPOLDO, DISPOSTO A SURRÁ-LO.

MARIO MALUCO  -  (gritou) Ricardinho! É seu pai! Você mata ele!

O PUNHO DE RICARDINHO SE IMOBILIZOU NO AR. ELE SAIU DE CIMA DO PAI, LENTAMENTE. SENTOU-SE NO CHÃO, COM O ROSTO ENTRE AS MÃOS E TEVE UMA CRISE NERVOSA. OS NERVOS HÁ MUITO TEMPO REPRESADOS, FIZERAM-SE EM PEDAÇOS. RICARDINHO SOLUÇAVA COMO UMA CRIANÇA.

LEOPOLDO SE APROXIMOU, APIEDADO.

RICARDINHO  -  Vá-se embora daqui! Eu não tenho pai! Eu não tenho pai!

LEOPOLDO OLHOU PARA MÁRIO.

MARIO MALUCO  -  Te manda, velho. Pode deixar, eu cuido dele.

LEOPOLDO  -  Eu vou. Foi um erro ter vindo aqui!

RICARDINHO  -  (soluçando) Eu não tenho pai! Eu não tenho pai!

CORTA PARA:

CENA  9  -  BANCO OLIVEIRA RAMOS  -  SALA DE OLIVEIRA RAMOS  -  INT.  -  DIA.

D. CONSUELO, EM COMPANHIA DE DOM JOSÉ, ESTAVA SENTADA À MESA DO BANQUEIRO, QUE A RECEBEU COM UM LARGO SORRISO NO ROSTO.

OLIVEIRA RAMOS  -  É um prazer recebê-la, D. Consuelo. Em que posso servi-la?

D. CONSUELO  -  Gracias, Dr. Oliveira. Es usted muy amable. Necesito un préstamo. Tengo la intención de realizar investimientos en Brasil y eligió a su banco para hacer mis transacciones. Todos mis investimientos, activos, se encuentran en México y quiero llevar todo a este país, he elegido como mi nueva casa.


OLIVEIRA RAMOS  -  Fico muito contente com a notícia e honrado em poder contar com a sua confiança. Faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para atendê-la da melhor maneira possível!

D. CONSUELO FALOU, SOB O OLHAR DE DESESPÊRO DE DOM JOSÉ.

D. CONSUELO  -  Muy bien. Como ya he dicho, necesito un préstamo. Se trata de una pequeña fortuna, ya que la intención de comprar una casa bonita, un buen automóvil y un yate! Estas son las cosas que tengo en México y que tengo mucha necessidad en Brasil!


OLIVEIRA RAMOS  -  Compreendo. Muito justo, D. Consuelo. Se pretende fixar residência em nosso país, não pode abrir mão de, digamos assim, “pequenos confortos” a que estava acostumada! De quanto a senhora precisa?

FIM DO CAPÍTULO 54

e no próximo capítulo...

*** Marisa vai à casa da Tia Coló despedir-se da filha.

*** Leopoldo visita Jurema na prisão.

*** O Dr. Celso Barroso vai à casa de Marieta e ela conta-lhe sobre o medalhão encontrado junto ao corpo de Nívea. Muito interessado na história, o advogado vai à procura de Helô.

*** Entra em cena uma nova personagem: a piriguete a louca pela fama Maria Regina. E adivinhem em que porta ela vai bater? Se imaginaram Renatão, acertaram em cheio!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 55 DE


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