Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 101
Participam deste
capítulo
Ester -
Gloria Menezes
Cyro -
Tarcisio Meira
Mestre Jonas -
Gilberto Martinho
Otto - Jardel
Filho
Paulus -
Emiliano Queiroz
Cesário -
Carlos Eduardo Dolabella
Coice de Mula - Dary
Reis
Delegado -
Vinicius Salvatori
Baby -
Claudio Cavalcanti
Júlia - Ida
Gomes
CENA 1 - VALONGO -
MINAS - EXTERIOR
- DIA
DR. PAULUS GUARDAVA UMA PERCELA DE DÚVIDA. ALGUMA COISA NÃO
CORRIA BEM EM TUDO AQUILO. E RESOLVEU PROCURAR CESÁRIO NAS MINAS DE VALONGO. O
HOMEM COSTUMAVA APARECER POR LÁ.
O NOVO RICO FITOU-O COM ARROGÂNCIA, EXIBINDO OS ANÉIS DE
PEDRAS PRECIOSAS NOS DEDOS GROSSOS.
CESÁRIO - Que é que há?
PAULUS - Você andou afirmando que Ester deu fuga ao
Dr. Cyro, ontem à noite.
CESÁRIO - E deu mesmo, ué. Eu disse a verdade.
PAULUS - Ela nega veementemente.
CESÁRIO - Claro, não ia confirmar, né?
PAULUS - Venha cá. Isto não é despeito seu? Por que
Ester não te dá confiança?
CESÁRIO - Eu, hem?! Ela pode lhe dizer que não me dá
trela... mas as fotos provam o contrário.
PAULUS TREMIA DE ÓDIO. SEGUROU O RAPAZ PELA GOLA.
PAULUS - Olha aqui... falando nisso... eu quero as
tais fotografias de Ester, senão mando você pra cadeia!
CESÁRIO - (gargalhou com ironia) Acho que a gente vai
junto, Dr. Paulus!
PAULUS - (afrouxando o aperto da mão) Eu não sei o que
você está dizendo.
CESÁRIO - Bem... o senhor não é nenhum santo!
PAULUS - Patife! Eu posso dizer à polícia que você
estava premeditando a morte de Júlia, pois mandou que ela preenchesse cheques
em branco, pensando que pudesse retirar o dinheiro dela após a morte!
CESÁRIO - Isso não prova nada. Tem gente que viu Júlia
encher cheque em branco e dar pra mim gastar pra valer. O próprio Coice
presenciou. E eu nunca pensei em matá ela.
PAULUS - Quanto você quer pelas fotos? Quanto,
miserável?
CESÁRIO - Não há dinheiro que me pague aquilo. Já
disse: quero casá com ela!
PAULUS - Seu filho...
PAULUS LEVANTOU O PUNHO PARA AGREDIR O INIMIGO. CESÁRIO
ESQUIVOU-SE COM UM SALTO PARA TRÁS.
CESÁRIO - Cuidado comigo, Dr. Paulus! Não é às minhas
custas que o senhô vai fazê bonito pra Dona Ester.
PAULUS - Ouve lá, bandido. Você me conhece! Se
divulgar uma só daquelas fotos... eu acabo com tua vida!
CESÁRIO FICOU SÓ. ACENDEU UM CIGARRO E OLHOU PARA O CARRO DO
ADVOGADO QUE ACABARA DE PARTIR. MAL PERCEBEU O GURI PRETINHO QUE SE APROXIMOU
CAUTELOSO.
GURI - É seu Cesário?
CESÁRIO - Sou eu.
O MOLEQUE APONTOU PARA O OUTRO LADO DA RUA, POR DETRÁS DE
ALGUMAS ÁRVORES FRONDOSAS.
GURI - Uma mulhé chamada Dona... Júlia, tá lhe
chamando!
CESÁRIO - (empalideceu e o cigarro lhe caiu da mão)
Onde?
GURI - Ali. Num carro perto da estrada!
CESÁRIO ESPIOU PARA O LOCAL ONDE O MENINO DIZIA ESTAR O
AUTOMÓVEL. DE FATO, LÁ ESTAVA ELE. UM CONVERSÍVEL VERMELHO. E, DENTRO, JÚLIA!
COM O MESMO CHAPÉU QUE USAVA QUANDO MORRERA AFOGADA. CESÁRIO COMEÇOU A ANDAR,
AMEDRONTADO. A PASSOS MIÚDOS. A MULHER LHE SORRIU DO INTERIOR DO CARRO.
CESÁRIO - (berrou, horrorizado) Júlia! Júlia!
UMA FORÇA ESTRANHA PARALISOU OS PASSOS DO HOMEM. MEDO! PAVOR!
CESÁRIO NÃO MOVIMENTAVA UM MÚSCULO, ENQUANTO JÚLIA LHE FAZIA SINAIS DO INTERIOR
DO CONVERSÍVEL, SORRINDO SINISTRAMENTE.
CENA 2 -
PORTO AZUL - PREFEITURA
- GABINETE DE OTTO MULLER -
INTERIOR - DIA
OTTO TORNOU A REUNIR O DELEGADO E SEUS HOMENS NO SEU GABINETE
DE TRABALHO.
OTTO - Acabamos de obter informações certas. Cyro
Valdez encontra-se novamente na Vila dos Pescadores. Hoje até deu consultas.
Não é, Válter?
COICE DE MULA - (fez que sim com a cabeça e completou) É,
chefe. Foi a notícia que um dos homens me trouxe. Vanda Vidal também está lá,
com ele.
DELEGADO - Era de se supor.
OTTO - (coçando a careca) Bom, agora o senhor deve
saber o que fazer para agarrá-lo.
DELEGADO - Sim. O senhor deve confiar em mim. Estou
preparando uma batida na Vila... de surpresa. Deve imaginar que os companheiros
dele devem estar preparados e prontos para defendê-lo.
OTTO - É por isso que lhe dou o prazo... que se
esgota amanhã. Até lá ele pode voltar à cidade. Tem audácia suficiente para
tanto.
CORTA PARA:
CENA 3 -
PORTO AZUL - CASA DE CESÁRIO -
SALA - INTERIOR
- NOITE
CESÁRIO ESPANTOU-SE ANTE A APARIÇÃO DE CYRO EM SUA CASA. O
MÉDICO ESTAVA DISPOSTO A TUDO PARA RESOLVER O CASO DAS FOTOGRAFIAS.
CYRO - Quero as fotos de Ester, seu moleque!
CESÁRIO REAGIU ATIRANDO UMA CAIXA CONTRA O ANTAGONISTA. CYRO
ABAIXOU-SE E DESFERIU UM SOCO NA CARA DO BANDIDO.
OS DOIS HOMENS ROLARAM NO CHÃO SUJO DA RESIDENCIA, ENQUANTO
CESÁRIO PROCURAVA ALCANÇAR UMA ARMA QUALQUER. UM DIREITO BEM APLICADO TONTEOU O MINEIRO. CESÁRIO
AMOLECEU. E CYRO TORNOU A BATER, MARTELANDO A CARA DO ADVERSÁRIO.
CYRO - Vamos, eu não quero te matar. Vamos, diga
onde estão as fotos.
CESÁRIO LEVANTOU-SE, CAMBALEANTE, SOB OS OLHOS ATENTOS DO
MÉDICO. ABRIU UM ARMÁRIO E RETIROU UM ENVELOPE. CYRO EXAMINOU, SEMPRE ATENTO
AOS GESTOS DO OUTRO. CESÁRIO RESFOLEGAVA RUIDOSAMENTE. ALI ESTAVAM, NEGATIVOS E
ORIGINAIS.
CYRO - Isso é tudo?
CESÁRIO - É. Agora veja se não me enche a paciência!
A TRANQUILIDADE DE ESTER ESTAVA GARANTIDA. RESTAVA AGORA
ENVIAR-LHE AS FOTOS COMPROMETEDORAS.
CORTA PARA:
CENA 4 - CASA
DE ESTER - SALA - INTERIOR
- DIA
ESTER ABRIU A PORTA E DEU DE CARA COM UM MENINO MALTRAPILHO,
PELE ACINZENTADA, OLHINHOS VIVOS. O GAROTO, SEM DIZER PALAVRA, ENTREGOU-LHE UM
ENVELOPE.
ESTER - Que é?
MENINO - Mandaro entregá à senhora.
ANTES QUE ESTER LHE PERGUNTASSE OUTRA COISA, O GURI
DESAPARECEU. COM AR DE PREOCUPAÇÃO, ELA FECHOU A PORTA, RASGOU A BORDA DO ENVELOPE E RETIROU O BILHETE. ERA DE
CYRO.
CYRO - (voz em off) “Você está livre da perseguição
absurda do Cesário. Envio as fotos e os respectivos negativos para
tranquilizá-la. Não se deixe dominar por mais ninguém. O próximo de quem
pretendo livrá-la é do Dr. Paulus. Seu para sempre... Cyro”.
NERVOSAMENTE, ENTREABRIU O ENVELOPE E VIU, NO INTERIOR, UM
OUTRO MENOR, VOLUMOSO. NÃO CONSEGUIU CONTROLAR OS NERVOS. SENTIU QUE PAULUS A
OBSERVAVA INTRIGADO E SÓ PERCEBEU QUE O ADVOGADO ESTAVA DE POSSE DO ENVELOPE
QUANDO A VOZ ENJOADA RONCOU, NUM ÍMPETO, ÀS SUAS COSTAS.
PAULUS - Muito bem! Isso prova tudo! Ele esteve aqui,
Cesário não mentiu! Ele esteve e você o protegeu! Em pagamento ele conseguiu
retirar as fotos do Cesário!
NUM MOVIMENTO RÁPIDO, ESTER ARRANCOU-LHE O ENVELOPE DAS MÃOS
E RASGOU-O. APANHOU A CAIXA DE FÓSFOROS JUNTO AO MAÇO DE CIGARROS E QUEIMOU OS
NEGATIVOS, UM A UM.
PAULUS - Mas... onde nós estamos, Ester? Tudo voltou
de novo entre você e ele! Você perdeu totalmente o brio, a dignidade! Voltou a
se deixar dominar por esse homem...
ESTER - Cale a boca!
PAULUS - Se está pensando em voltar para Cyro, prova
que esqueceu Ivanzinho. Esqueceu que seu filho morreu do tiro que devia matar aquele cão. Você já se esqueceu disso também? Já
se esqueceu de tudo, Ester?
ESTER - Não seja louco! Não admito que me fale assim!
PAULUS - (aos berros) Este homem é a sua perdição!
Você perdeu a cabeça, a vergonha!
ESTER EXPLODIU, COM AS MÃOS ENTRE OS CABELOS, VIZUALIZANDO A
IMAGEM DO FILHO MORTO.
ESTER - Pare, Paulus! Pare! Eu nunca mais quero ver
Cyro! Devo confessar que cometi uma fraqueza. Mas nunca mais quero vê-lo! Você
tem de me ajudar, Paulus!
PAULUS - Ajudo! Ajudo, sim! Mas só depois de vê-lo na
cadeia!
A PASSOS APRESSADOS, O ADVOGADO CRUZOU A SALA, ABRIU A PORTA
E SAIU ENFURECIDO.
CORTA PARA:
CENA 5 - CASA
DE CESÁRIO - EXTERIOR
- NOITE
OS HOMENS MOVIMENTARAM-SE COM RAPIDEZ, ENVOLVERAM A
RESIDENCIA DE CESÁRIO E, A UM GESTO DO ADVOGADO, FORÇARAM PORTAS E JANELAS.
DELEGADO - Saia daí, Cyro Valdez! Ou morre, agora!
ANTE O SILENCIO, OS POLICIAIS COMEÇARAM A ATIRAR.
CINCO MINUTOS DEPOIS, A CASA TINHA O ASPECTO DE UMA FORTALEZA
BOMBARDEADA. AOS GRITOS DE “PEGAMOS”, O GRUPO INVADIU A RESIDENCIA.
NEM CYRO, NEM CESÁRIO LÁ SE ENCONTRAVAM.
MAS ALGO DE SÉRIO TINHA ACONTECIDO COM O MÉDICO, NOS
PRIMEIROS LANCES DA LUTA. CYRO SE FERIRA COM ALGUMA GRAVIDADE.
XXX
OTTO ESPUMAVA DE RAIVA E AMEAÇAVA DESABAR O MUNDO. MAIS UMA
VEZ SEUS HOMENS HAVIAM FALHADO NA TENTATIVA DE PRENDER O RIVAL. O SONHO DE VER
CYRO NO XADREZ TORNARA-SE UMA OBSESSÃO PARA O PREFEITO.
E AS BATIDAS PROSSEGUIAM INTERMINÁVEIS, COM HOMENS ARMADOS
ATÉ OS DENTES VASCULHANDO PORTO AZUL E AS CIDADES PRÓXIMAS. O ÓDIO DE OTTO
SOMADOS AOS DESEJOS HOMICIDAS DE PAULUS TRANSFORMARAM A REGIÃO NUMA ALAGOAS DO
SUL. A VIDA VALIA MUITO POUCO PARA QUEM NÃO FOSSE PARTIDÁRIO DOS PROPÓSITOS DO
PREFEITO E SEU BANDO.
CORTA PARA:
CENA 6 - PORTO
AZUL -
RUA - EXTERIOR
- NOITE
ERA NOITE, QUANDO CYRO, APROVEITANDO-SE DAS SOMBRAS E APOIADO
NUMA BENGALA, APROXIMOU-SE DAS CASAS DA VILA LIBERATO. VINHA LADEADO POR BABY E
JONAS. NUM INSTANTE OS MORADORES SE AGRUPARAM NA PEQUENA PRAÇA QUE O MATO JÁ
TRANSFORMARA EM UM RECANTO PERIGOSO, À NOITE.
CYRO - (ergueu a voz, para que todos o ouvissem) Não
queremos o sacrifício de ninguém... se não tem para onde ir, nós
compreendemos e esperamos. Mas apelamos para a compreensão de todos vocês... Os atuais donos destas
residências precisam vir para cá.
OS HOMENS COCHICHARAM ENTRE SI.
MESTRE JONAS - Ajudamo
até a procurá casa procêis..
CYRO - Isso. Até ajudamos. Para eles é muito
importante morar em suas próprias casas. Queremos que entendam... nossa
pretensão não é prejudicar nenhum de vocês.
UM DOS HOMENS – O MAIS VELHO, PARECENDO LÍDER DO GRUPO –
ADIANTOU-SE E APERTOU A MÃO DE CYRO, COM FIRMEZA. O COMPROMISSO PARECIA SELADO.
PELO MENOS OS ENTENDIMENTOS TINHAM ALCANÇADO UM NÍVEL SATISFATÓRIO. NINGUÉM SE
SENTIRA MAGOADO, NEM REAGIRA DIANTE DAS PONDERAÇÕES DO FUGITIVO.
FIM DO CAPÍTULO 101
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