Novela de Toni Figueira
Inspirada na Obra de Dias Gomes
Fonte: http://youtu.be/zIuryHGvAVc
CAPÍTULO 52
Personagens deste capítulo:
VÍTOR
HELÔ
RENATÃO
SAMUCA
RICARDINHO
D. CONSUELO
DOM JOSÉ
JOANINHA
D. CONSUELO
RODOLFO AUGUSTO
JUREMA
JUIZ
PROMOTOR
ADVOGADO DE DEFESA
HELÔ - (encarou-o com firmeza) Não tenho nada a temer! E por favor, deixe-me em paz!
A VOZ DO PROMOTOR FEZ-SE OUVIR NO SALÃO.
PROMOTOR - Solicito a presença da testemunha Jesuíno Romão.
O HOMEM DE MEIA-IDADE ENTROU EM SEGUIDA E FOI SENTAR-SE NO BANCO A ELE DESTINADO.
HELÔ - Quem é esse homem?
ARAKEN - Não faço a menor idéia.
HELÔ - Que estranho...
CORTA PARA:
CENA 9 - APART-HOTEL - APARTAMENTO DE D. CONSUELO - SALA - INT. - DIA.
SAMUCA OUVIA O JULGAMENTO ATRAVÉS DO RÁDIO, QUANDO A CAMPAINHA TOCOU. ERA JOANINHA, QUE ENTROU, OLHANDO EM VOLTA, ADMIRADA.
JOANINHA - Nossa, quanto luxo! O aluguel desse apart deve ser uma fortuna!
SAMUCA - Que bom que você atendeu meu pedido! (e abraçou-a. Joaninha permaneceu estática).
JOANINHA - Ainda não entendi por que insistiu tanto pra eu vir aqui. Cadê ela?
SAMUCA - Saiu com o advogado, Dom José, pra resolver um problema. Eles tão me escondendo algo, mas ainda não sei o que é.
JOANINHA - E se eles chegarem, de repente? Como vai explicar pra sua mulher minha presença aqui?
SAMUCA - Não me importo. Chamei você aqui, Joana, pra que não duvide mais do meu amor por você. Só casei com essa velha porque ela me convenceu, dizendo que tava à beira da morte! E agora, tá mais viva que nós dois e a gente nessa situação, sem saber o que fazer...
JOANINHA - Então, porque não separa dela?
SAMUCA - Aí é que tá o xis da questão... e se ela bater as botas, de repente?...
A PORTA ABRIU-SE E D. CONSUELO ENTROU, EM COMPANHIA DE DOM JOSÉ.
D. CONSUELO - Samuquito! ¿Quién es esta mujer? ¿Qué haces aquí solo?
JOANINHA DEU UM PASSO À FRENTE E ENCAROU D. CONSUELO, DESAFIADORA.
JOANINHA - Quer saber? Vamos botar essa história agora em pratos limpos! O negócio é o seguinte (dirigiu-se a Dom José) Essa dona aí tava de vela na mão. Quis casar com meu noivo pra deixar uma fortuna pra ele. Eu, tonta, fui na conversa e concordei. Daí, ela não cumpriu a palavra, não morreu. E tá embrulhando a gente até hoje com essa história de morre não morre!
D. CONSUELO LEVOU A MÃO AO PEITO, APOIANDO-SE NUMA CADEIRA.
D. CONSUELO - Ai... mi corazón... ai....
SAMUCA E DOM JOSÉ CORRERAM A AMPARÁ-LA.
D. CONSUELO - Mis remédios... depressa, por favor...
SAMUCA CORREU PARA O QUARTO EM BUSCA DOS REMÉDIOS.
DOM JOSÉ - Senhorita, este não é o momento para terem esta conversa. É melhor ir embora, agora.
JOANINHA - Eu vou, mas saibam que eu não vou desistir do Samuca! Nós nos amamos e ninguém vai nos separar! Ninguém!
JOANINHA SAIU, PISANDO FIRME. SAMUCA RETORNOU COM UM COPO D’ÁGUA E OS REMÉDIOS.
SAMUCA - Aqui estão... (procurou Joaninha) Cadê a Joana?
DOM JOSÉ - Foi embora. Depois vocês conversam. Vamos cuidar de D. Consuelo. Ela precisa muito de você, Samuca.
CONSUELO PISCOU UM OLHO E FINGIU DESFALECER.
SAMUCA - (correu para a porta) Joaninha! Joana!
CORTA PARA:
CENA 10 - APART-HOTEL - CORREDOR - INT. - DIA.
SAMUCA ALCANÇOU JOANINHA NA PORTA DO ELEVADOR.
SAMUCA - Joana, espere! Ia embora sem falar comigo!...
JOANINHA - (encarou-o, indignada) Quer saber, Samuca? Eu disse à velha que ia lutar por você, mas, pensando bem, você não me merece! Não vou mais perder meu tempo com você! Desisto! Não me procure nunca mais! Adeus!
DITO ISTO, A JOVEM ENTROU NO ELEVADOR E FECHOU A PORTA NA CARA DE SAMUCA, QUE FICOU PARADO ALGUNS INSTANTES E VOLTOU PARA O APARTAMENTO, CABISBAIXO.
CORTA PARA:
CENA 10 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
O PORTEIRO ESTAVA SENTADO NO BANCO DAS TESTEMUNHAS.
PROMOTOR - Seu Jesuíno, o senhor conhece a acusada aqui presente?
JESUÍNO - (olhou de relance para Jurema e voltou a cabeça para o Promotor) Conheço, sim senhor, conheço muito. Ela mora no prédio onde eu trabalho.
PROMOTOR - Pois muito bem, seu Jesuíno. Conte-nos o que viu na noite de 3 para 4 de maio.
JESUÍNO - ... ela chegou em casa eram duas horas... estou certo disso porque ela me perguntou... subiu, mas me pediu para ir com ela, pois a fechadura tava meio enguiçada... Eu fui e abri a porta.
PROMOTOR - Onde a acusada guardava a chave?
JESUÍNO - Na bolsa; e dentro da bolsa tinha um revólver.
O PROMOTOR APANHOU O REVÓLVER DE RICARDINHO.
PROMOTOR - Seria este, por acaso?
JESUÍNO - Parece que é... não posso garantir.
ENTRE OS ASSISTENTES, ARAKEN OLHOU PARA JUREMA, PREOCUPADO, E EM SEGUIDA, PARA NELSON MOTA, SENTADO A SEU LADO.
ARAKEN - A coisa ficou feia pro lado dela, agora...
JESUÍNO - ... D. Jurema e seu Ricardinho brigavam constantemente... e da última vez que eu fui falar com ela, atendendo à reclamação dos moradores, soube que ele estava amarrado em outra... que por isso, um dia inda acabava fazendo uma desgraça.
CORTA PARA:
CENA 11 - TRIBUNAL DO JÚRI - HALL – INT. - DIA / REDAÇÃO DA “FOLHA DO RIO” - INT. - DIA.
NELSON MOTA, AO CELULAR, FALAVA COM A REDAÇÃO DO SEU JORNAL.
NELSON MOTA - Olha, Gouveia, eu acho que a coisa tá mal parada pra Jurema. Pode ser que a defesa consiga virar o jogo, mas vai ser difícil. O Promotor mandou uma lenha que vou te contar!...
GOUVEIA NETO - (do outro lado da linha) Você acha que é certa, então, a condenação?
NELSON MOTA - Bem, certa não é. Mas o testemunho do porteiro do edifício foi arrasador. Em todo caso, tem muita água pra rolar.
GOUVEIA NETO - Valeu, Nelson, muito obrigado por me manter informado. (virou-se para o chefe da oficina, parado à sua frente, e deu a ordem) Olha, Euclides, vamos preparar duas manchetes. Uma – “Condenada a Fera de Ipanema”; outra – “Absolvida Jurema de Alencar”. Conforme seja o resultado, tacamos uma ou outra.
CORTA PARA:
CENA 12 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
O PROMOTOR TERMINAVA O SEU LIBELO.
PROMOTOR - ... acho que não preciso acrescentar muita coisa para vos esclarecer a respeito desse crime... Tantas foram as contradições em que caiu a acusada, que seu álibi ruiu como um castelo de cartas... Estamos, senhores do Conselho de Sentença, diante de um crime friamente premeditado... Esse ar de espanto, essas lágrimas... denunciam a atriz profissional que ela é... embora,
no palco, sempre seja uma canastrona, aqui, neste tribunal, não terá certamente o seu dia de glória!
NO BANCO DOS RÉUS, LÁGRIMAS DE TRISTEZA E HUMILHAÇÃO ROLAVAM, TEIMOSAS, DOS OLHOS DE JUREMA DE ALENCAR.
Inspirada na Obra de Dias Gomes
CAPÍTULO 52
Personagens deste capítulo:
VÍTOR
HELÔ
RENATÃO
SAMUCA
RICARDINHO
D. CONSUELO
DOM JOSÉ
JOANINHA
D. CONSUELO
RODOLFO AUGUSTO
JUREMA
JUIZ
PROMOTOR
ADVOGADO DE DEFESA
CENA 1 - TRIBUNAL DO JÚRI - SALA DAS TESTEMUNHAS DE DEFESA - INT. - DIA.
RENATÃO BEBIA UM COPO DE ÁGUA MINERAL. RICARDINHO, SENTADO A UM CANTO, PARECIA NERVOSO.
RENATÃO - Sabe a impressão que eu tenho? Que prenderam a gente nesta sala porquê se Jurema for absolvida eles pegam um de nós.
VÍTOR - (encarou-o, significativamente) Este raciocínio revela um sentimento de culpa.
RENATÃO - (deu uma risada) Sentimento de culpa? Não tenho nenhum.
VÍTOR - Não tem mesmo? Pois eu tenho. Se eu não tivesse ido a São Paulo naquela noite, talvez isso não tivesse acontecido.
RICARDINHO - (não se conteve) Pois é, ele foi a São Paulo naquela noite. É, o bicão de sacristia tem um bom álibi.
CORTA PARA:
CENA 2 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
NA SALA DO JÚRI, O JUIZ EXIBIA UM REVÓLVER.
JUIZ - (a Jurema) A senhora reconhece esta arma?
JUREMA - Eu acho... acho que é minha.
JUIZ - Quando saiu de casa naquela noite, a senhora levava este revólver dentro da bolsa?
JUREMA - (respondeu prontamente) Não, eu não levava arma nenhuma.
JUIZ - Senhor Promotor, a palavra é sua.
O PROMOTOR LEVANTOU-SE E DIRIGIU-SE AOS JURADOS.
PROMOTOR - Senhores do Conselho de Sentença, em meus longos anos de promotoria, muitos e muitos crimes horrendos passaram pelas minhas mãos. Muitos e muitos criminosos sanguinários tive que acusar. Eu devia, senhores, ser um homem calejado. E sou. No entanto, neste momento, ao olhar para aquela mulher que ali está sentada tranquilamente no banco dos réus, eu sinto um arrepio de horror. Como é possível uma criatura humana, com todo o aspecto de um ser normal, praticar um crime tão horripilante? Que se estará passando com a humanidade, meu Deus, para produzir seres dessa espécie?!
AS PALAVRAS DO ACUSADOR FERIAM PROFUNDAMENTE LEOPOLDO, NO MEIO DOS ASSISTENTES. ARAKEN BALANÇAVA A CABEÇA NUM GESTO DE DESAPROVAÇÃO.
PROMOTOR - ... a opinião pública se comoveu e se revoltou com o martírio imposto a essa moça de vinte anos, plena de vida, que muitos acreditam ter sido uma santa...
JUREMA BAIXOU A CABEÇA. A VOZ DO PROMOTOR ERA NÍTIDA E FIRME.
PROMOTOR - ... Nívea Louzada, moça de boa formação, criada num ambiente sadio... deixou-se um dia namorar por um rapaz chamado Ricardo Miranda... moço mimado, rico, de hábitos pouco recomendáveis, que mantinha uma relação com a acusada...
CORTA PARA:
CENA 3 - APARTAMENTO DE HELÔ - QUARTO - INT. - DIA.
HELÔ, DEITADA EM SUA CAMA, OUVIA PELO RÁDIO.
PROMOTOR - (off) “... mas um dia, Nívea conheceu o padre Vítor e descobriu nele o homem que deveria amar por toda a vida, se não tivesse sido cruelmente assassinada...”
CORTA PARA:
CENA 4 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
PROMOTOR - ... sim, senhores jurados, Jurema de Alencar, a acusada, se diz inocente... e isso é apenas uma prova de que nem ao menos sente remorso pelo crime que praticou...
CORTA PARA:
CENA 5 - APARTAMENTO DE HELÔ - QUARTO - INT. - DIA.
HELÔ ABRIU O CLOSET, ESCOLHEU UM VESTIDO AZUL CLARO BEM DISCRETO, COLOCOU-O SOBRE A CAMA E, DIANTE DO ESPELHO, CAPRICHOU NA MAQUILAGEM.
CORTA PARA:
CENA 6 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
PROMOTOR - Eu gostaria de chamar a primeira testemunha, D. Marieta Louzada.
MARIETA CAMINHOU ATÉ O BANCO DAS TESTEMUNHAS E ACOMODOU-SE.
PROMOTOR - ... D. Marieta, a senhora conhecia a acusada. Jurema de Alencar?
MARIETA - Não, eu não a conhecia. Meu único contato com ela foi quando atendi seu telefonema para minha filha, Nívea, na noite do crime.
CORTA PARA:
CENA 7 - TRIBUNAL - SALA DAS TESTEMUNHAS - INT. - DIA.
LÁ DENTRO, RICARDINHO ROÍA AS UNHAS, MUITO NERVOSO. RENATÃO, NO MESMO ESTADO, CAMINHAVA DE UM LADO PARA O OUTRO.
CORTA PARA:
CENA 8 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
MARIETA ESTAVA SENDO INTERROGADA AGORA PELO ADVOGADO DE DEFESA.
ADVOGADO DE DEFESA - ... e a senhora disse que Nívea saiu de casa por volta das onze e meia, naquela noite... e que teve a impressão de que ela ia ao encontro de alguém. Logo depois houve o telefonema da acusada... A senhora tem algum elemento para supor que era a acusada a pessoa com quem Nívea ia encontrar-se?
MARIETA - (procurando encobrir a ansiedade da sua voz) Não. Não tenho nenhum elemento para supor isso. Ao contrário, acho que não foi com ela que Nívea foi encontrar-se.
ADVOGADO DE DEFESA - Com quem a senhora acha que ela foi encontrar-se?
PROMOTOR - (gritou) Protesto! A defesa está procurando levar a testemunha a fazer suposições.
JUIZ - Protesto recusado. A testemunha deve responder.
MARIETA HESITOU. OS ASSISTENTES PERMANECIAM RÍGIDOS EM SEUS LUGARES. ELA TROCOU UM OLHAR COM EMILIANO.
MARIETA - Eu não tenho certeza.
MARIETA FOI DISPENSADA PELO PROMOTOR. RODOLFO AUGUSTO FOI O SEGUINTE. TRAJANDO TERNO AZUL E UMA ECHARPE, DIRIGIU-SE, CHEIO DE TREJEITOS AO BANCO DAS TESTEMUNHAS.
PROMOTOR - Senhor Rodolfo Augusto, conte-nos o que o senhor viu ou ouviu na noite do crime.
RODOLFO AUGUSTO - Bem, eu apenas vi um vulto, só um vulto, pois a noite estava muito escura. Parecia mulher. Claro, devia haver mais de um, pois se a moça estava sendo perseguida, devia haver um perseguidor. A menos que eu estivesse vendo fantasmas.
RISOS NO AUDITÓRIO.
RODOLFO AUGUSTO - (disse calmamente) Eu tenho a impressão de que havia também uma outra pessoa.
PROMOTOR - Homem ou mulher?
RODOLFO AUGUSTO - O senhor sabe, hoje em dia é muito dificil a gente diferençar um homem de uma mulher... pela roupa ou pelo cabelo. Eu tenho a impressão de que era mulher também.
O PROMOTOR VOLTOU AO SEU LUGAR. NESSE MOMENTO, HELÔ ENTROU NA SALA E FOI SENTAR-SE AO LADO DE ALGUÉM, QUE RECONHECEU SER ARAKEN. PENSOU EM MUDAR DE LUGAR.
ARAKEN - Parabéns!
HELÔ - Parabéns por quê?
ARAKEN - Pela sua coragem de vir aqui.
RENATÃO - Sabe a impressão que eu tenho? Que prenderam a gente nesta sala porquê se Jurema for absolvida eles pegam um de nós.
VÍTOR - (encarou-o, significativamente) Este raciocínio revela um sentimento de culpa.
RENATÃO - (deu uma risada) Sentimento de culpa? Não tenho nenhum.
VÍTOR - Não tem mesmo? Pois eu tenho. Se eu não tivesse ido a São Paulo naquela noite, talvez isso não tivesse acontecido.
RICARDINHO - (não se conteve) Pois é, ele foi a São Paulo naquela noite. É, o bicão de sacristia tem um bom álibi.
CORTA PARA:
CENA 2 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
NA SALA DO JÚRI, O JUIZ EXIBIA UM REVÓLVER.
JUIZ - (a Jurema) A senhora reconhece esta arma?
JUREMA - Eu acho... acho que é minha.
JUIZ - Quando saiu de casa naquela noite, a senhora levava este revólver dentro da bolsa?
JUREMA - (respondeu prontamente) Não, eu não levava arma nenhuma.
JUIZ - Senhor Promotor, a palavra é sua.
O PROMOTOR LEVANTOU-SE E DIRIGIU-SE AOS JURADOS.
PROMOTOR - Senhores do Conselho de Sentença, em meus longos anos de promotoria, muitos e muitos crimes horrendos passaram pelas minhas mãos. Muitos e muitos criminosos sanguinários tive que acusar. Eu devia, senhores, ser um homem calejado. E sou. No entanto, neste momento, ao olhar para aquela mulher que ali está sentada tranquilamente no banco dos réus, eu sinto um arrepio de horror. Como é possível uma criatura humana, com todo o aspecto de um ser normal, praticar um crime tão horripilante? Que se estará passando com a humanidade, meu Deus, para produzir seres dessa espécie?!
AS PALAVRAS DO ACUSADOR FERIAM PROFUNDAMENTE LEOPOLDO, NO MEIO DOS ASSISTENTES. ARAKEN BALANÇAVA A CABEÇA NUM GESTO DE DESAPROVAÇÃO.
PROMOTOR - ... a opinião pública se comoveu e se revoltou com o martírio imposto a essa moça de vinte anos, plena de vida, que muitos acreditam ter sido uma santa...
JUREMA BAIXOU A CABEÇA. A VOZ DO PROMOTOR ERA NÍTIDA E FIRME.
PROMOTOR - ... Nívea Louzada, moça de boa formação, criada num ambiente sadio... deixou-se um dia namorar por um rapaz chamado Ricardo Miranda... moço mimado, rico, de hábitos pouco recomendáveis, que mantinha uma relação com a acusada...
CORTA PARA:
CENA 3 - APARTAMENTO DE HELÔ - QUARTO - INT. - DIA.
HELÔ, DEITADA EM SUA CAMA, OUVIA PELO RÁDIO.
PROMOTOR - (off) “... mas um dia, Nívea conheceu o padre Vítor e descobriu nele o homem que deveria amar por toda a vida, se não tivesse sido cruelmente assassinada...”
CORTA PARA:
CENA 4 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
PROMOTOR - ... sim, senhores jurados, Jurema de Alencar, a acusada, se diz inocente... e isso é apenas uma prova de que nem ao menos sente remorso pelo crime que praticou...
CORTA PARA:
CENA 5 - APARTAMENTO DE HELÔ - QUARTO - INT. - DIA.
HELÔ ABRIU O CLOSET, ESCOLHEU UM VESTIDO AZUL CLARO BEM DISCRETO, COLOCOU-O SOBRE A CAMA E, DIANTE DO ESPELHO, CAPRICHOU NA MAQUILAGEM.
CORTA PARA:
CENA 6 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
PROMOTOR - Eu gostaria de chamar a primeira testemunha, D. Marieta Louzada.
MARIETA CAMINHOU ATÉ O BANCO DAS TESTEMUNHAS E ACOMODOU-SE.
PROMOTOR - ... D. Marieta, a senhora conhecia a acusada. Jurema de Alencar?
MARIETA - Não, eu não a conhecia. Meu único contato com ela foi quando atendi seu telefonema para minha filha, Nívea, na noite do crime.
CORTA PARA:
CENA 7 - TRIBUNAL - SALA DAS TESTEMUNHAS - INT. - DIA.
LÁ DENTRO, RICARDINHO ROÍA AS UNHAS, MUITO NERVOSO. RENATÃO, NO MESMO ESTADO, CAMINHAVA DE UM LADO PARA O OUTRO.
CORTA PARA:
CENA 8 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
ADVOGADO DE DEFESA - ... e a senhora disse que Nívea saiu de casa por volta das onze e meia, naquela noite... e que teve a impressão de que ela ia ao encontro de alguém. Logo depois houve o telefonema da acusada... A senhora tem algum elemento para supor que era a acusada a pessoa com quem Nívea ia encontrar-se?
MARIETA - (procurando encobrir a ansiedade da sua voz) Não. Não tenho nenhum elemento para supor isso. Ao contrário, acho que não foi com ela que Nívea foi encontrar-se.
ADVOGADO DE DEFESA - Com quem a senhora acha que ela foi encontrar-se?
PROMOTOR - (gritou) Protesto! A defesa está procurando levar a testemunha a fazer suposições.
JUIZ - Protesto recusado. A testemunha deve responder.
MARIETA HESITOU. OS ASSISTENTES PERMANECIAM RÍGIDOS EM SEUS LUGARES. ELA TROCOU UM OLHAR COM EMILIANO.
MARIETA - Eu não tenho certeza.
MARIETA FOI DISPENSADA PELO PROMOTOR. RODOLFO AUGUSTO FOI O SEGUINTE. TRAJANDO TERNO AZUL E UMA ECHARPE, DIRIGIU-SE, CHEIO DE TREJEITOS AO BANCO DAS TESTEMUNHAS.
PROMOTOR - Senhor Rodolfo Augusto, conte-nos o que o senhor viu ou ouviu na noite do crime.
RODOLFO AUGUSTO - Bem, eu apenas vi um vulto, só um vulto, pois a noite estava muito escura. Parecia mulher. Claro, devia haver mais de um, pois se a moça estava sendo perseguida, devia haver um perseguidor. A menos que eu estivesse vendo fantasmas.
RISOS NO AUDITÓRIO.
RODOLFO AUGUSTO - (disse calmamente) Eu tenho a impressão de que havia também uma outra pessoa.
PROMOTOR - Homem ou mulher?
RODOLFO AUGUSTO - O senhor sabe, hoje em dia é muito dificil a gente diferençar um homem de uma mulher... pela roupa ou pelo cabelo. Eu tenho a impressão de que era mulher também.
O PROMOTOR VOLTOU AO SEU LUGAR. NESSE MOMENTO, HELÔ ENTROU NA SALA E FOI SENTAR-SE AO LADO DE ALGUÉM, QUE RECONHECEU SER ARAKEN. PENSOU EM MUDAR DE LUGAR.
ARAKEN - Parabéns!
HELÔ - Parabéns por quê?
ARAKEN - Pela sua coragem de vir aqui.
HELÔ - (encarou-o com firmeza) Não tenho nada a temer! E por favor, deixe-me em paz!
A VOZ DO PROMOTOR FEZ-SE OUVIR NO SALÃO.
PROMOTOR - Solicito a presença da testemunha Jesuíno Romão.
O HOMEM DE MEIA-IDADE ENTROU EM SEGUIDA E FOI SENTAR-SE NO BANCO A ELE DESTINADO.
HELÔ - Quem é esse homem?
ARAKEN - Não faço a menor idéia.
HELÔ - Que estranho...
CORTA PARA:
CENA 9 - APART-HOTEL - APARTAMENTO DE D. CONSUELO - SALA - INT. - DIA.
SAMUCA OUVIA O JULGAMENTO ATRAVÉS DO RÁDIO, QUANDO A CAMPAINHA TOCOU. ERA JOANINHA, QUE ENTROU, OLHANDO EM VOLTA, ADMIRADA.
JOANINHA - Nossa, quanto luxo! O aluguel desse apart deve ser uma fortuna!
SAMUCA - Que bom que você atendeu meu pedido! (e abraçou-a. Joaninha permaneceu estática).
JOANINHA - Ainda não entendi por que insistiu tanto pra eu vir aqui. Cadê ela?
SAMUCA - Saiu com o advogado, Dom José, pra resolver um problema. Eles tão me escondendo algo, mas ainda não sei o que é.
JOANINHA - E se eles chegarem, de repente? Como vai explicar pra sua mulher minha presença aqui?
SAMUCA - Não me importo. Chamei você aqui, Joana, pra que não duvide mais do meu amor por você. Só casei com essa velha porque ela me convenceu, dizendo que tava à beira da morte! E agora, tá mais viva que nós dois e a gente nessa situação, sem saber o que fazer...
JOANINHA - Então, porque não separa dela?
SAMUCA - Aí é que tá o xis da questão... e se ela bater as botas, de repente?...
A PORTA ABRIU-SE E D. CONSUELO ENTROU, EM COMPANHIA DE DOM JOSÉ.
D. CONSUELO - Samuquito! ¿Quién es esta mujer? ¿Qué haces aquí solo?
JOANINHA DEU UM PASSO À FRENTE E ENCAROU D. CONSUELO, DESAFIADORA.
JOANINHA - Quer saber? Vamos botar essa história agora em pratos limpos! O negócio é o seguinte (dirigiu-se a Dom José) Essa dona aí tava de vela na mão. Quis casar com meu noivo pra deixar uma fortuna pra ele. Eu, tonta, fui na conversa e concordei. Daí, ela não cumpriu a palavra, não morreu. E tá embrulhando a gente até hoje com essa história de morre não morre!
D. CONSUELO LEVOU A MÃO AO PEITO, APOIANDO-SE NUMA CADEIRA.
D. CONSUELO - Ai... mi corazón... ai....
SAMUCA E DOM JOSÉ CORRERAM A AMPARÁ-LA.
D. CONSUELO - Mis remédios... depressa, por favor...
SAMUCA CORREU PARA O QUARTO EM BUSCA DOS REMÉDIOS.
DOM JOSÉ - Senhorita, este não é o momento para terem esta conversa. É melhor ir embora, agora.
JOANINHA - Eu vou, mas saibam que eu não vou desistir do Samuca! Nós nos amamos e ninguém vai nos separar! Ninguém!
JOANINHA SAIU, PISANDO FIRME. SAMUCA RETORNOU COM UM COPO D’ÁGUA E OS REMÉDIOS.
SAMUCA - Aqui estão... (procurou Joaninha) Cadê a Joana?
DOM JOSÉ - Foi embora. Depois vocês conversam. Vamos cuidar de D. Consuelo. Ela precisa muito de você, Samuca.
CONSUELO PISCOU UM OLHO E FINGIU DESFALECER.
SAMUCA - (correu para a porta) Joaninha! Joana!
CORTA PARA:
CENA 10 - APART-HOTEL - CORREDOR - INT. - DIA.
SAMUCA - Joana, espere! Ia embora sem falar comigo!...
JOANINHA - (encarou-o, indignada) Quer saber, Samuca? Eu disse à velha que ia lutar por você, mas, pensando bem, você não me merece! Não vou mais perder meu tempo com você! Desisto! Não me procure nunca mais! Adeus!
DITO ISTO, A JOVEM ENTROU NO ELEVADOR E FECHOU A PORTA NA CARA DE SAMUCA, QUE FICOU PARADO ALGUNS INSTANTES E VOLTOU PARA O APARTAMENTO, CABISBAIXO.
CORTA PARA:
CENA 10 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
O PORTEIRO ESTAVA SENTADO NO BANCO DAS TESTEMUNHAS.
PROMOTOR - Seu Jesuíno, o senhor conhece a acusada aqui presente?
JESUÍNO - (olhou de relance para Jurema e voltou a cabeça para o Promotor) Conheço, sim senhor, conheço muito. Ela mora no prédio onde eu trabalho.
PROMOTOR - Pois muito bem, seu Jesuíno. Conte-nos o que viu na noite de 3 para 4 de maio.
JESUÍNO - ... ela chegou em casa eram duas horas... estou certo disso porque ela me perguntou... subiu, mas me pediu para ir com ela, pois a fechadura tava meio enguiçada... Eu fui e abri a porta.
PROMOTOR - Onde a acusada guardava a chave?
JESUÍNO - Na bolsa; e dentro da bolsa tinha um revólver.
O PROMOTOR APANHOU O REVÓLVER DE RICARDINHO.
PROMOTOR - Seria este, por acaso?
JESUÍNO - Parece que é... não posso garantir.
ENTRE OS ASSISTENTES, ARAKEN OLHOU PARA JUREMA, PREOCUPADO, E EM SEGUIDA, PARA NELSON MOTA, SENTADO A SEU LADO.
ARAKEN - A coisa ficou feia pro lado dela, agora...
JESUÍNO - ... D. Jurema e seu Ricardinho brigavam constantemente... e da última vez que eu fui falar com ela, atendendo à reclamação dos moradores, soube que ele estava amarrado em outra... que por isso, um dia inda acabava fazendo uma desgraça.
CORTA PARA:
CENA 11 - TRIBUNAL DO JÚRI - HALL – INT. - DIA / REDAÇÃO DA “FOLHA DO RIO” - INT. - DIA.
NELSON MOTA, AO CELULAR, FALAVA COM A REDAÇÃO DO SEU JORNAL.
NELSON MOTA - Olha, Gouveia, eu acho que a coisa tá mal parada pra Jurema. Pode ser que a defesa consiga virar o jogo, mas vai ser difícil. O Promotor mandou uma lenha que vou te contar!...
GOUVEIA NETO - (do outro lado da linha) Você acha que é certa, então, a condenação?
NELSON MOTA - Bem, certa não é. Mas o testemunho do porteiro do edifício foi arrasador. Em todo caso, tem muita água pra rolar.
GOUVEIA NETO - Valeu, Nelson, muito obrigado por me manter informado. (virou-se para o chefe da oficina, parado à sua frente, e deu a ordem) Olha, Euclides, vamos preparar duas manchetes. Uma – “Condenada a Fera de Ipanema”; outra – “Absolvida Jurema de Alencar”. Conforme seja o resultado, tacamos uma ou outra.
CORTA PARA:
CENA 12 - TRIBUNAL - SALA DO JÚRI - INT. - DIA.
O PROMOTOR TERMINAVA O SEU LIBELO.
PROMOTOR - ... acho que não preciso acrescentar muita coisa para vos esclarecer a respeito desse crime... Tantas foram as contradições em que caiu a acusada, que seu álibi ruiu como um castelo de cartas... Estamos, senhores do Conselho de Sentença, diante de um crime friamente premeditado... Esse ar de espanto, essas lágrimas... denunciam a atriz profissional que ela é... embora,
no palco, sempre seja uma canastrona, aqui, neste tribunal, não terá certamente o seu dia de glória!
NO BANCO DOS RÉUS, LÁGRIMAS DE TRISTEZA E HUMILHAÇÃO ROLAVAM, TEIMOSAS, DOS OLHOS DE JUREMA DE ALENCAR.
FIM DO CAPÍTULO 52
e no próximo capítulo...
*** Renatão,Vítor e Ricardinho são interrogados no tribunal.
*** A repercussão do resultado do julgamento.
*** Renatão,Vítor e Ricardinho são interrogados no tribunal.
*** A repercussão do resultado do julgamento.
NÃO PERCA O CAPÍTULO 53 DE
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