Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 14
Participam deste
capítulo
Cyro Valdez -
Tarcísio Meira
Comendador
Liberato - Macedo Neto
Ricardo -
Edney Giovenazzi
Ester -
Glória Menezes
Otto Muller -
Jardel Filho
CENA 1 - PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO -
QUARTO - INTERIOR
- NOITE
O MÉDICO DEIXOU O ESTETOSCÓPIO CAIR
CONTRA O PEITO. TINHA CONCLUÍDO O EXAME E O COMENDADOR LIBERATO DESCANSAVA,
APOIADO A VÁRIAS ALMOFADAS, JUSTAPOSTAS. PARECIA BEM. CORADO.
COMENDADOR LIBERATO - Está
tudo bem mesmo, doutor?
CYRO
- (respondeu, sorrindo) Melhor do
que eu esperava. Acho que o senhor não precisa mais de mim. (ordenou, com
otimismo) Levante-se e ande um pouco.
O COMENDADOR, ALGO RECEOSO, APOIOU-SE
EM UM DOS BRAÇOS, ERGUENDO O CORPO E SENTANDO-SE NA POLTRONA. DEVAGAR,
LEVANTOU-SE, PUXANDO UM POUCO DA PERNA.
COMENDADOR LIBERATO - Essa
perna... não sei que diabo tem.
CYRO
- Isso acontece. Com o tempo ela
vai voltando ao normal.
O VELHO LIBERATO MOVIMENTOU-SE COM
DIFICULDADE ATÉ O CENTRO DO QUARTO, RETORNANDO À POLTRONA. SUAVA E RESFOLEGAVA,
ANTE O OLHAR OBSERVADOR DO DR. CYRO VALDEZ.
O MÉDICO ESTALOU OS DEDOS E AJUDOU O
COMENDADOR A SE APOIAR, MAIS UMA VEZ, NO EXATO INSTANTE EM QUE O DR. RICARDO ENTRAVA
NO APOSENTO.
RICARDO - Boa
noite, comendador! Dr. Cyro... como vai o senhor?
CYRO
- Bem, obrigado!
RICARDO, COMO DE HÁBITO, VESTIA-SE
COM APURO. O CABELO ASSENTADO, O BIGODE GRISALHO BEM TRATADO, MÃOS DE UNHAS
CORTADAS RENTES.
COMENDADOR LIBERATO -
(surpreso) Vocês já se conhecem?
CYRO
- Já. O senhor mesmo nos
apresentou. Não se recorda?
COMENDADOR LIBERATO - E
nem precisava. Quem não conhece o Dr. Cyro Valdez? Agora, então, com essas
coisas que andam publicando no jornal a respeito dele... desculpe, doutor, eu
não sei se o senhor gosta de falar sobre esse assunto...
CYRO
- Preferia não falar sobre isso.
E acho que o Dr. Ricardo também prefere.
COMENDADOR LIBERATO -
(cortou o assunto, dirigiu-se ao engenheiro) Qual foi o resultado da
entrevista com o meu sobrinho?
RICARDO - O
Sr. Otto insiste em seu plano de dobrar a produção.
COMENDADOR LIBERATO - É
louco!
RICARDO -
Expus os seus pontos de vista, comendador. A impossibilidade de aumentar
a produção, sem antes resolver alguns problemas dos trabalhadores. Mas ele não
quer ouvir coisa nenhuma. Para ele os mineiros vivem como príncipes e não
trabalham mais porque são preguiçosos...
CYRO
- (revoltou-se ante a revelação)
Desculpem entrar na conversa. Mas, será que esse senhor Otto já desceu no fundo
de uma mina de carvão? Já visitou uma aldeia de mineiros como eu visitei?
(voltou-se para o engenheiro) Aquilo está muito perto do inferno! Não sei como
se pode tratar assim a seres humanos!
COMENDADOR LIBERATO -
(educadamente, fitando Ricardo) Eu acho que o doutor exagera um pouco.
Não é possível que meu sobrinho tenha dito uma coisa dessas!
RICARDO - Se
dependesse do nosso superintendente, as coisas estariam ainda piores.
COMENDADOR LIBERATO - (fez
uma careta de aborrecimento) Ele tem o maior desprezo pela criatura humana...
eu tenho me colocado contra os exageros dele. Até onde posso. Mas, também é
verdade que uma mina de carvão não pode ser um paraíso. Isto
é... chega quase a ser um inferno, mesmo!
CORTA PARA:
Cyro (Tarcísio Meira) e Ester (Gloria Menezes) |
CENA 2 - CASA DE ESTER
- SALA -
INTERIOR - DIA
OTTO
DECIDIRA PROCURAR A EX-ESPOSA, PESSOALMENTE.
OTTO
- Pensei que não ia me receber.
Há quinze minutos que espero por você nesta maldita sala!
ESTER
- Não sou obrigada a estar
preparada para recebê-lo a qualquer hora do dia ou da noite.
HAVIA ÓDIO NA TROCA DE PALAVRAS E
ESTER EVITAVA OLHAR DIRETAMENTE PARA O EX-MARIDO.
OTTO
- Bem... você já sabe qual foi o
despacho do juiz, creio eu!
ESTER
- Sei também que o despacho é
seu. Esse juiz apenas assinou.
OTTO
- É uma decisão da justiça. Não
cabe discussão.
ESTER
- Eu vou discutir até morrer!
OTTO
- Mas não vai poder impedir que a
justiça se cumpra.
ESTER
- Talvez não possa, Otto. Talvez
você consiga tirar meu filho de mim. Mas eu já lhe avisei: vai pagar um preço
muito alto por isso.
OTTO
- (o dedo em riste) Você não me
mete medo com suas ameaças. Mesmo porque o que você tem é uma arma de dois
gumes: pode me desmoralizar, falar da minha impotência, mas desmoraliza você,
também.
ESTER
- Para mim, se vocês me tiram meu
filho, pouco importa o resto.
OTTO
- Pois bem... eu vim aqui para
lhe fazer uma proposta. Você não precisa se separar do seu filho. Virão so dois
morar comigo.
ESTER
- (espantada) Você está falando
sério?
OTTO
- Acha que ia brincar num momento
desses?
ESTER
- Depois de tudo o que houve,
você acha que eu posso voltar a viver em sua companhia?
OTTO
- (demonstrando indiferença) Isso
não quer dizer que vamos viver juntos. Continuaremos separados, embora morando
sob o mesmo teto. A casa é muito grande. Posso deixar todo o segundo andar para
você. Pode viver lá tão isolada quanto vive aqui.
ESTER
- E todos pensariam que vivemos
juntos, normalmente.
OTTO
- Isso tem importância?
ESTER
- Para você talvez não tenha.
Para mim, seria uma situação humilhante viver sob o mesmo teto com Dona Lia
Sanches.
OTTO
- Ela é minha secretária!
ESTER
- E eu, o que seria, já que não
sou mais sua esposa? Uma hóspede, por acaso?
OTTO
- Você é a mãe do meu filho...
ESTER
- (sorriu com ironia) A mãe do
seu filho...
OTTO
- Onde está ele?
ESTER
- No quarto, dormindo.
OTTO
- (tirando um documento da pasta)
Amanhã você vai ser chamada à presença do juiz. Tem só esta noite para pensar.
Até amanhã (fez menção de retirar-se. Antes, resolveu jogar uma cartada) Ah, é
verdade! Soube que passou mal, uma noite dessas e precisou chamar um médico. O
Dr. Cyro Valdez...
ESTER
- (apesar do abalo, procurou
demonstrar tranquilidade) Foi. Mas já estou bem.
OTTO
- Esse Dr. Cyro parece mesmo que
faz milagres...
DEIXOU A CASA. O RUÍDO DO POSSANTE
MERCEDES PERDEU-SE NA DISTANCIA.
FIM DO CAPÍTULO 14
... e na próxima sexta, capítulo inédito!
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