Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 23
Participam deste
capítulo
Cyro – Tarcísio Meira
Professor Zacarias - Arnaldo
Weiss
Mestre Jonas -
Gilberto Martinho
Lia -
Arlete Salles
André -
Paulo José
Pé-na-Cova -
Antonio Pitanga
Baby -
Claudio Cavalcanti
Inês -
Betty Faria
CENA 1 - FLORIANÓPOLIS -
CENTRO DE ESTUDOS ESPACIAIS
- INTERIOR - DIA
NAS PAREDES MAPAS DO COSMO, COM O SISTEMA SOLAR A CORES E FOTOS DOS PRINCIPAIS PLANETAS – MARTE E VÊNUS EM DESTAQUE, ALÉM DA LUA E DO
COMETA HALLEY.
O PROFESSOR ZACARIAS, NUMA MESA RETANGULAR, ERA LADEADO POR
ANDRÉ, JONAS, PÉ-NA-COVA E LIA.
PROF. ZACARIAS - (deu
início à sessão) Bem... meus amigos. Somente Dona Lia talvez não conheça os
verdadeiros motivos desta sessão (olhou para a mulher e, num rápido preâmbulo,
referiu-se a alguns fatos do passado e à terrível noite de há 31 anos, em Porto
Azul) É por isso que estamos aqui. Três de vocês ainda eram crianças, quando
receberam aquilo que podemos chamar de comunicação... vinda de um ser
extraterreno. (andou até a frente da mesa) Nós, pesquisadores, estamos sempre
fazendo perguntas. E a pergunta que eu faço agora é: por que Lia, André, Lucas
e Jonas tiveram aquele sonho, visão, comunicação, ou como quiserem chamar? Não
pode ter sido por acaso.
MESTRE JONAS -
(levantou-se e pediu) Se o sinhô me dá licença... eu posso respondê, com
toda a certeza que me dá a minha fé. Dr. Cyro é a reencarnação do ente superior
que voltou à terra pra cumpri uma missão.
UM SORRISO DE INCREDULIDADE SURGIU
NOS LÁBIOS DE ANDRÉ E ZACARIAS.
ANDRÉ
- O senhor acha isso mesmo?
MESTRE JONAS - Acho
e tenho certeza. E quem disse, sabe. Mestre Charam, mestre do oriente, meu
Guia... Depois que eu tive aquele sonho, fiquei muito tempo sem sabê o que ele
significava. Até que um dia, levado por um amigo, fui na tenda que frequento
até hoje. Foi lá que Mestre Charam apareceu e escreveu... Explicou que em outra
encarnação, tinha sido um mestre do Oriente... depois tinha encarnado num negro
escravo, pra se purificar de toda a vaidade... e que agora vinha numa
nova missão. Não sei se vocês acreditam... Mas não tenho dúvida sobre a missão
que cada um de nós tem a cumpri.
ANDRÉ - (irônico) Qual é?
MESTRE JONAS - Eu já era home... podia não sê acreditado.
Vocês eram crianças. E ninguém duvida da pureza das crianças.
ANDRÉ - (esmurrou a mesa) Olha, eu respeito sua
crença... mas para mim não é nada disso. Eu vi o lugar onde a nave espacial
aterrou. Meu pai me levou pra ver. Já tinham passado muitos meses... e mesmo
assim as árvores em volta ainda estavam queimadas e não cresceram mais.
LIA - (curiosa) O senhor acha que... que ele veio
numa nave espacial?
ANDRÉ - Ele não. O ser que...
ZACARIAS - (interveio) O pai dele.
ANDRÉ - Isso. E a luz que Orjana viu era da
astronave.
ZACARIAS - E se vocês querem ter a prova definitiva de
que essa astronave realmente desceu em Porto Azul, aqui está... (todos os
olhares concentraram-se nele, que abriu uma gaveta e mostrou um fragmento de
metal desconhecido) Eu recolhi isto no local da aterragem e a análise
demonstrou a existência de substancias desconhecidas em nosso planeta.
O PROFESSOR ENTREGOU O FRAGMENTO AO PRIMEIRO ASSISTENTE NA
FILA À SUA DIREITA. VÁRIAS PESSOAS SE
PRECIPITARAM A OBSERVAR A PEDRA DE FORMAÇÃO ESQUISITA, PARDACENTA.
ANDRÉ - Foi isso... ele veio de outro planeta, de uma
civilização muito mais adiantada que a nossa. Aqui, Orjana foi escolhida para
ser mãe de uma criança que eles vão dirigir, ou melhor, estão dirigindo de lá,
para cumprir uma missão qualquer, que não sei qual é.
PÉ-NA-COVA - (olhos arregalados) Qué dizê que o doutô Cyro
tá sendo dirigido de outro planeta?
ANDRÉ - Isso mesmo. Você não acredita?
PÉ-NA-COVA - (pensou por alguns instantes) Eu acho que só
uma pessoa pode dirigir a gente, o destino da gente: é Deus, Nosso Sinhô. Pra
mim, doutô Cyro é um santo, porque os santos é que vêm a mando de Deus.
ZACARIAS - (dirigiu-se a Lia) E a senhora? A senhora
ainda não disse nada.
LIA - Eu não sei... eu não acredito nem desacredito
em tudo o que vocês disseram. Só quero confessar uma coisa muito séria. A única
sensação que toda essa história me causa... é de medo.
MESTRE JONAS - Medo, Dona? Se ele veio pro bem, a senhora
tem medo?
LIA - Tenho. Desde que sonhei e era muito criança.
Não sei por que tenho medo. Só sei que não queria estar envolvida nisso... e
vim aqui... mais pra dizer a vocês todos... que eu quero me desligar de tudo o
que se refere ao Dr. Cyro.
ZACARIAS - (desapontado) Isso é covardia! Desculpe, mas
é covardia. Não há por que ter medo. A missão que ele veio cumprir, a missão
que ele trás, é de paz. A civilização de onde ele veio é muito superior à
nossa. Tão superior que lá não existe mais maldade. Vocês me entendem?
ZACARIAS FALAVA COMO SE TIVESSE CERTEZA DE QUE CYRO DE FATO
ERA UM ENVIADO, E DE QUE O SEU MUNDO FICAVA DISTANTE DALI.
CORTA PARA:
Baby (Claudio Cavalcanti) e Inês (Betty Faria) |
CENA 2 - PORTO
AZUL -
PRAIA BONITA - EXTERIOR
- NOITE
BABY LIBERATO E INÊS SAÍRAM DO CARRO. A MOÇA SENTOU-SE NO
ESTRIBO E DESCALÇOU OS SAPATOS, ENTERRANDO OS PÉS NA AREIA BRANCA. BABY FITAVA
UM BARCO RÚSTICO, AMARRADO A ALGUNS METROS DA PRAIA.
INÊS AGARROU-O PELO PESCOÇO E PUXOU-O PARA SEU LADO, NA
AREIA.
O RAPAZ TINHA A EXPRESSÃO SÉRIA.
INÊS - Puxa! Você tá com uma cara tão feia! Que
bicho te mordeu?
BABY - (sentou-se à força) Não tenho nada. Senta aí
e fica calada que é melhor.
INÊS - Meu irmão, Daniel, vive fazendo pergunta. Tá
querendo sabê quando é que a gente se casa.
BABY OLHOU-A COM UM SORRISO IRÔNICO, LEMBRANDO-SE DO
INCIDENTE NO SUBSOLO DA MINA. DANIEL SALVARA-LHE A VIDA, MAS TINHA TENTADO
AGREDI-LO, DEPOIS, OBRIGANDO-O A ESMURRÁ-LO VIOLENTAMENTE.
BABY - E você, o que disse?
INÊS - Disse pra mãe que você tá com boa intenção.
Aí ela me perguntô: “como é que tu vai casá com um moço que nem sabe o nome
direito! Baby! Baby não é nome de gente! Parece nome de cachorro...”
INÊS RIU GOSTOSAMENTE, PROVOCANDO A IRRITAÇÃO DO NAMORADO. O
RAPAZ LEVANTOU-SE, DE CARA AMARRADA. A MOÇA CESSOU DE GARGALHAR E CORREU ATRÁS
DELE, ABRAÇANDO-O COM AMOR. PASSOU-LHE O BRAÇO PELO PEITO FORTE.
INÊS - Que é que você tem, bem?
BABY - (virou-se e beijou-a nos lábios) Nada. Eu
nunca tenho nada.(apontou para o bote ancorado à distancia) Podíamos ter ido
passear de barco.
INÊS - (ignorou a sugestão e perguntou, curiosa) Não
me leva a mal, bem... mas como é teu verdadeiro nome?
BABY - Leandro.
INÊS - Puxa! É mais bonito do que Baby!
BABY - Agora veja se cala essa boca!
FECHOU-LHE OS LÁBIOS COM O POLEGAR E O INDICADOR. INÊS TENTOU
FALAR, SEM PODER.
DE REPENTE, OS OLHOS DO RAPAZ FITARAM ALGO, MUITO ALÉM. UM
VULTO. UMA SILHUETA CONTRA O SOL QUE SE PUNHA.
BABY - Olha, bem! Quem será aquele louco? Veja! Lá,
naquele penhasco!
BABY APONTAVA A FORMA VAGA, DESENHADA CONTRA O CÉU EM SANGUE.
IMÓVEL, CYRO FITAVA O OCEANO, DESLIGADO DO MUNDO.
INÊS - Leandro. (abraçou-o) Gosto tanto do teu nome.
.. só vou te chamar assim, de agora em diante.
BABY - (afastou-a, grosseiro) Não vai haver de agora
em diante!
INÊS - (estremeceu) Não... vai... havê o quê?
BABY - Não vai haver de hoje em diante, droga! É
surda? Não ouve? Não vai haver mais de hoje em diante, pronto! Acabou! Entendeu
bem? Acabou tudo o que existe entre nós!
INÊS - (atônita) Explica bem... por que. Por quê?
BABY - (virou-lhe as costas) Problemas... problemas,
lá com meu velho. Você não levou muito a sério nosso namoro, não é?
INÊS - Eu levei... levei mesmo, viu?
BABY - Pois fez mal! Eu te iludi alguma vez? Iludi?
INÊS - (se continha para não explodir) Não, mas...
BABY - Falei em casamento, falei?
INÊS - Nunca.
BABY - Então...
INÊS - Então... eu pensei, né? Pensei que você...
gostava de mim!
BABY - (riu nervosamente, fitando-a) E gosto... o
que eu não quero é me casar agora, nem nunca, tá? Sinto, no duro que sinto.
Você é uma menina bacaninha. De toda garota que eu conheci, você até que era a
mais legal. Com toda tua pureza. Mas... eu não presto. A verdade é esta. Não
nasci pra namorar bonitinho, só beijinhos. Não nasci pra casar. Nada disso. Sou
um homem sem destino, sem nada... Sou vazio.
INÊS - (agarrou-lhe o braço, com brutalidade)
Leandro! Não faz isso comigo, não faz! Tou te pedindo!
BABY - Sou vazio! Ôco! Sabe bem o que é isso? Não me
agarro a ninguém! Não consigo, tá? Olha... espera! (Inês o agarrava mais forte
ainda, ele esforçava-se para sair, lutando, quase) Espera aí, garota! Tenho um
negócio pra te dar!
INÊS - Não quero nada, Leandro! Quero você!
BABY CONSEGUIU RETIRAR A CARTEIRA DE NOTAS. PUXOU UM MAÇO.
COM UMA DAS MÃOS AFASTOU O CORPO ESGUIO DA NAMORADA.
BABY - Olha... tome isso... pra você comprar alguma
coisa.
INÊS APERTOU AS MÃOS, CRUZANDO-AS NAS COSTAS, RECUSANDO-SE A
ACEITAR O DINHEIRO. LÁGRIMAS ESCORRIAM-LHE PELO ROSTO BELO. O MILIONÁRIO TENTOU
COLOCAR O MAÇO ENTRE AS MÃOS CERRADAS. INÊS FEZ QUE NÃO COM A CABEÇA,
DESARVORADA. DENTES TRINCADOS.
BABY - Aceita, vá... Não quero te ofender. É pra
você comprar qualquer coisa.
PERCEBENDO QUE A MOÇA NÃO QUERIA MESMO ACEITAR O DINHEIRO,
BABY ATIROU O BOLO DE NOTAS SOBRE A AREIA DA PRAIA.
BABY - Olha... fica aí... você pega depois. Eu vou
indo... e não me acompanhe, por favor. Não vai adiantar. Eu não posso voltar
atrás. Sinto muito... sinto mesmo.
O MOTOR DO CONVERSÍVEL RONCOU NA ESTRADA E O CARRO
DESAPARECEU DENTRO DA NOITE.
AJOELHADA, COM A CABEÇA ENTRE AS MÃOS, INÊS FICOU A CHORAR,
SOLUÇANDO. POR ENTRE A NÉVOA DAS LÁGRIMAS, VIU O BARCO BALANÇANDO, AO SABOR DAS
ONDAS. CORREU ATÉ ELE. DESANCOROU-O. ABRIU A VELA SURRADA, GASTA, E EMBICOU A
PROA NA DIREÇÃO DO MAR ALTO. O PEQUENO BOTE SE PERDEU NA ESCURIDÃO DO OCEANO.
FIM DO CAPÍTULO 23
E NA PRÓXIMA SEXTA, O 24. CAPÍTULO!
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