domingo, 16 de novembro de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 85



Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 85

Participam deste capítulo

Baby  -  Claudio Cavalcanti
Inês  -  Betty Faria
Von Muller  -  Jorge Cherques
Otto  -  Jardel Filho
Lia  -  Arlete Salles
Catarina  -  Lidia Mattos
Coice de Mula  -  Dary Reis
Cyro  -  Tarcísio Meira
Ester  -  Glória Menezes
Paulus  -  Emiliano Queiroz
Comendador Liberato  -  Macedo Netto


CENA 1  -  FLORIANÓPOLIS  -  TRIBUNAL DO JÚRI  -  INTERIOR  -  DIA

FINALMENTE O JULGAMENTO DE BABY FÔRA MARCADO E NO DIA, CENTENAS DE PESSOAS SE AGLOMERAVAM PARA ASSISTIR AO DESENROLAR DOS ACONTECIMENTOS NO TRIBUNAL DO JÚRI DE FLORIANÓPOLIS. DURANTE HORAS DEFESA E ACUSAÇÃO DISCORRERAM SOBRE OS DIVERSOS ASPECTOS DO CASO. BABY CULPADO POR NEGLIGÊNCIA. BABY APENAS UM INCONSEQUENTE! BABY DESEJANDO FUGIR DA VIDA, MAS CONSCIENTE DE QUE NINGUÉM PODERIA PAGAR PELAS SUAS DESDITAS. CABIA, AGORA, AO JÚRI DECIDIR.

O JUIZ CONVOCOU OS JURADOS, A PROMOTORIA E DEFESA, O RÉU, TESTEMUNHAS E, COLOCANDO TEATRALMENTE OS ÓCULOS, PROFERIU A SENTENÇA.

JUIZ  -  De acordo com a resposta dos senhores jurados aos quesitos formulados... declaro o réu, Leandro Liberato, inocente!

BABY RESPIROU ALIVIADO E TODOS OS OLHARES SE CONCENTRAVAM NA SUA MÁSCARA DE DESESPÊRO. CABELOS DESALINHADOS, RUGAS AO REDOR DOS OLHOS CANSADOS E OLHEIRAS ROXAS.

JUIZ  -  Está encerrada a sessão!

SEM MUITA PRESSA, MAS VISIVELMENTE EMOCIONADO, O DR. GARCIA, ADVOGADO DE DEFESA APERTOU AS MÃOS DO RAPAZ.

BABY  -  Obrigado, Dr. Garcia! Muito obrigado, mesmo! (com os olhos marejados) Puxa vida, parece um sonho!

DR. GARCIA  -  Você merece, rapaz!

CORTA PARA:

CENA 2  -  PORTO AZUL  -  VILA DOS PESCADORES  -  CHOUPANA DE MESTRE JONAS  -  EXTERIOR  -  DIA

PESCADOR  -  Ele tá livre! Ele tá livre!

INÊS SURGIU NA JANELA, ONDE GRUPOS DE HOMENS DO MAR VINHAM LHE CONTAR A NOVIDADE. TINHAM OUVIDO PELO RÁDIO.

INÊS  -  Minha nossa! É verdade?

PESCADOR  -  Tá livre. Foi absolvido! Os mineiro tudo, falaro muito bem dele, quando foram interrogado! Foi por isso que ele conseguiu a liberdade!

INÊS  -  Minha mãe de Deus, como isto é maravilhoso!

CORTA PARA:

CENA 3  -  FLORIANÓPOLIS  -  TRIBUNAL DO JÚRI  -  INTERIOR  -  DIA

BABY AINDA SE ENCONTRAVA NO PRÉDIO DO TRIBUNAL, FUMANDO UM CIGARRO, TRANQUILO, RECORDANDO OS ÚLTIMOS ACONTECIMENTOS DE SUA VIDA E A LONGA PRISÃO DE 5 MESES E MEIO. UMA EXISTÊNCIA! OUVIU A VOZ DO COMENDADOR E ERGUEU OS OLHOS PARA O HOMEM DE TERNO NEGRO QUE SE POSTARA À SUA FRENTE.

COMENDADOR  -  Precisamos conversar, não?

BABY  -  Já sei de tudo. Já me disseram que não sou seu filho.

COMENDADOR  -  E você não acha que isso muda tudo?

BABY  -  Já mudou. Senti um alívio muito grande.

COMENDADOR  -  Não falei de seus sentimentos. Estou falando de negócios.

BABY  -  Não quero falar agora de negócios. Não sei nem o que vai ser da minha vida.

COMENDADOR  -  Eu quero lembrar que o fiz dono de toda a minha fortuna...

BABY  -  (ironizou) Esperava que eu morresse de desgosto, não? Queria que desse fim à minha vida. Por isso me doou todos os seus bens. Porque sabia que eles voltariam às suas mãos.

COMENDADOR  -  Eu os doei porque a minha irmã reclamou a posse deles. A justiça está para decidir a questão. Se for a nosso favor... eu os quero de volta!

BABY  -  (sorriu, irônico) Eu sabia que se eu não morresse como esperava, o senhor iria me pedir de volta.

COMENDADOR  -  Você não é meu filho... deve ter a decência de reconhecer que não tem direito aos meus bens.

BABY  -  Legalmente sou e continuarei sendo seu filho.

AUGUSTO LIBERATO TORCEU A CARA E DECIDIU ABANDONAR O RECINTO. VOLTARIA A CONVERSAR COM O RAPAZ ASSIM QUE TIVESSE UMA DECISÃO DO CASO.

COMENDADOR  -  Se ganharmos a causa... eu irei procurá-lo... onde estiver!

BABY NÃO DISSE NADA. UNIU O DEDO MÉDIO AO POLEGAR, EM ARCO, E ATIROU A GUIMBA DE CIGARRO DE ENCONTRO AO TETO.

CORTA PARA:
Von Muller  (Jorge Cherques)

CENA 4  -  MANSÃO DE OTTO MULLER  -  ESCRITÓRIO  -  INTERIOR  -  DIA

PARA OTTO MULLER O CHOQUE FOI VIOLENTO. E VON MULLER QUE DERA A NOTÍCIA DE SUPETÃO. COMO SE O FILHO ESPERASSE A DECISÃO FAVORÁVEL A BABY LIBERATO. O EX-CARRASCO NAZISTA TINHA AS FEIÇÕES TENSAS E GRAVES AO ANUNCIAR O RESULTADO DO JULGAMENTO.

VON MULLER  -  O homem está livre!

OTTO  -  Baby... absolvido? Absolvido? É um despropósito! Absurdo!

VON MULLER  -  Foi a decisão do júri...

OTTO  -  (bateu com os punhos na escrivaninha) Que justiça é esta? Eu não compreendo! Não aceito! Ele foi responsável pela morte de três mineiros! Devia ser condenado à pena máxima!

COICE DE MULA  -  Pois é... mas o depoimento favorável dos outros parece que influiu muito...

VON MULLER  -  (irritado) Foi só o que influiu. Acreditaram que ele não tivesse detonado a dinamite...

OTTO  -  São uns burros! Como alguém pode ter acreditado nisso?

COICE DE MULA  -  É fato consumado, seu Otto!

OTTO  -  ... e não me fale nesse tom de pacificação. Eu estou muito preocupado com a decisão da justiça. A liberdade de Baby, para mim, tem um significado muito grave. É o início de uma nova luta. Porque eu não vou admitir que ele reassuma a presidência das minas. E com certeza ele tem pretensões a isso...

VON MULLER  -  Filho, não precisa se preocupar (disse, após a saída de Coice de Mula) Eu estar sempre aqui para proteger você...

OTTO  -  Neste caso não há proteção, papai. Baby Liberato representa, no momento, minha maior ameaça. Com ele preso, eu estava sossegado... mas solto... unido ao Dr. Cyro Valdez... são uma força contra mim!

VON MULLER LEMBROU-SE DO PROCESSO MOVIDO PELA ESPOSA CONTRA O IRMÃO.

VON MULLER  -  Se a justiça der ganho de causa a Catarina... herança virá toda para você, filho... e aí, Baby Liberato não vai mais representar perigo...

OTTO  -  Sim... ainda me resta esta esperança. Que a justiça dê ganho de causa a mamãe. Chame ela aqui. Chame Paulus. Quero ver em que pé estão as coisas. Chame todos.

CORTA PARA:

CENA 5  -  PORTO AZUL  -  PREFEITURA  -  EXTERIOR  -  DIA

A ELEIÇÃO TRANSCORREU TRANQUILA E A VITÓRIA DE OTTO CONFIRMOU-SE POR ESMAGADORA MAIORIA. ERA O NOVO PREFEITO DE PORTO AZUL E MUITA GENTE FESTEJAVA NAS RUAS A ASCENSÃO DO HOMEM QUE SIMBOLIZAVA O ESPÍRITO DE LUTA CONTRA A MORTE.

NA FESTA DA POSSE...

OTTO MULLER ENVERGAVA SEU TERNO MAIS MODERNO, DE CORTE ITALIANO. NA PRACINHA REGURGITANTE DE GENTE, A BANDA DE MÚSICA ENTOAVA DOBRADOS CÍVICOS DIANTE DA SEDE DA PREFEITURA. OTTO MULLER APARECEU NA SACADA DO PRÉDIO.

OTTO  -  Que povo maravilhoso! Mal eu cheguei na sacada, me aplaudiram... viu?

LIA  -  Sim, eu vi, Otto.

OTTO  -  Não faça esta cara de mártir. Devia estar muito alegre!

LIA  -  Eu não posso fingir, Otto.

OTTO -   Que mal te aflige? Está sempre com problemas.

LIA  -  Soube que você, mal assumiu, já proibiu Mestre Jonas de armar suas barracas pra vender peixe na praça...

OTTO  -  Exatamente. Fiz isso como primeira medida de higiene. Não gosto de cheiro de peixe na praça.

LIA  -  E o que vai ser daquela pobre gente, Otto?

OTTO  -  Eles que se arrumem. Aqui... eu não admito! E não se meta em meus assuntos! Já está pronta para a recepção?

LIA  -  Estou indisposta, Otto!

DONA CATARINA CHEGOU, ENTUSIASMADA.

CATARINA  -  O povo confia em você, meu amor!

OTTO  -  E eu não vou decepcionar o povo!

CORTA PARA:

CENA 6  -  PORTO AZUL  -   PREFEITURA  -  AUDITÓRIO  -  INTERIOR  -  DIA

O PEQUENO AUDITÓRIO ESTAVA ENTUPIDO DE PARTIDÁRIOS DO ALEMÃO. GENTE DA PLEBE., DE MISTURA COM AS AUTORIDADES DA CIDADEZINHA.

OTTO  -  (levantou-se para falar) Acabo de ser investido oficialmente no cargo de prefeito desta cidade que eu amo. Mas essa investidura não teria para mim o mesmo valor... se eu não viesse aqui, agora, receber do povo a sua ratificação (aplausos demorados) É do povo desta cidade que recebo a nobre incumbência de administrá-la. E é com os olhos voltados para este mesmo povo, para o seu progresso e bem-estar, que eu hei de fazer de Porto Azul uma das mais prósperas cidades deste grande Estado brasileiro!

APLAUSOS ENTUSIASMADOS.

OTTO  -  (continuou) Conforme a minha plataforma política, prometo duplicar a extração de carvão, carvão esse que, se escoando pelo porto desta cidade, trará os recursos necessários para o seu desenvolvimento cada vez maior. (deu um murro violento na mesa de mogno) Eu, Otto Muller, prometo fazer de Porto Azul uma grande cidade. Eu, Otto Muller, prometo moralizar esta cidade. Eu, Otto Muller, prometo acabar com a exploração, a pouca vergonha, a ignorância, e o fanatismo que  tomaram conta de Porto Azul. Eu, Otto Muller, prometo dar amor, paz, concórdia, união e felicidade geral para todos quantos residem nesta parte privilegiada de Santa Catarina. Meu povo, muito obrigado! Obrigado, mesmo!

ENQUANTO O POVO APLAUDIA E GRITAVA DELIRANTEMENTE, OTTO ENCOSTOU A MÃO NO CORAÇÃO, PALPITANTE, CANSADO. A BANDA ATACOU O AVANTE, CAMARADAS!

CORTA PARA:

CENA 7  -  FLORIANÓPOLIS  -  CASA DE ESTER  -  VARANDA  -  EXTERIOR  -  DIA

BRUTALMENTE, CYRO ARRASTOU ESTER ATÉ A VARANDA DE SUA RESIDENCIA. ESPERARA-A DURANTE HORAS DIANTE DO PORTÃO DE ENTRADA. ELA REAGIU, MAS A MÃO DO MÉDICO GRUDAVA-SE AO SEU PULSO.

ESTER  -  O que é que você quer?

CYRO  -  Obter uma certeza!

AGARROU-A, APERTADAMENTE, E BEIJOU-A COMO UM ANIMAL NO CIO. AOS POUCOS A MULHER DEIXOU-SE DOMINAR, ENTREGANDO-SE AO CARINHO DO MARIDO. PERDERA POR COMPLETO O DESEJO DE REAGIR. APENAS UMA VONTADE INCONTROLÁVEL DE ENTREGAR-SE, ALI MESMO, AO HOMEM QUE A ENLOUQUECIA. CYRO ABRANDOU O ABRAÇO E DESCOLOU OS LÁBIOS DA BOCA DA MULHER.

ESTER  -  (respirou fundo) Agora obteve a certeza? É isso que queria saber? Eu ainda sou louca por você. É isso o que queria saber? Pois sou sim. Mas cada vez que eu tenho a certeza disso, mais me envergonho. Mais me castigo. Ou você acha que o simples fato de me trazer aqui e me beijar, vai fazer com que eu me entregue totalmente a você?

CYRO  -  Só quero que você saiba que é inútil lutar contra isso, Ester!

ESTER  -  Inútil? Será preciso repetir tudo de novo? Será que você não compreende? Para mim, meu filho morreu e eu tive toda a culpa! Porque não o livrei da bala que se destinava a você! (a voz mal conseguia deixar a garganta; falava aos arrancos) E quanto mais eu te amo... mais eu me sinto culpada! É por isso que eu quero que você morra! Porque só assim eu me sentirei vingada!

CYRO CHOCOU-SE COM AS PALAVRAS RUDES DA MULHER, ENQUANTO ESTER FUGIA PARA O INTERIOR DA CASA. PAULUS APARECEU.

PAULUS  -  Ester! Ester! (virou-se para o médico) O que você fez com ela, seu...

CYRO SENTIU ÍMPETO DE ESBORRACHAR-LHE A CARA COM UM MURRO. CONTROLOU-SE CERRANDO OS PUNHOS.

CYRO  -  Por enquanto, nada. Mas vou fazer com você, se continuar enganando Ester.

PAULUS  -  O que... o que você acha que pode fazer contra mim?

CYRO  -  Pretendo provar que você é um refinado canalha!

FIM DO CAPÍTULO 85


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