Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 79
Participam deste
capítulo
Baby -
Claudio Cavalcanti
Cyro - Tarcísio
Meira
Paulus -
Emiliano Queiroz
Mestre Jonas -
Gilberto Martinho
André -
Paulo José
Otto -
Jardel Filho
Ricardo -
Edney Giovenazzi
Pé-na-Cova -
Antonio Pitanga
Daniel -
Paulo Araújo
CENA 1 - MINAS
- GALERIA M-13 - INTERIOR - DIA
FORTES HOLOFOTES ILUMINAVAM A ENTRADA
DA MINA, ENQUANTO OS MINEIROS DESCIAM COM LANTERNAS DE MÃO E OUTRAS INSTALADAS
NOS CAPACETES.
HOUVE UM MURMÚRIO DOS CURIOSOS,
QUANDO UM GRUPO DE HOMENS SURGIU, LIDERADO PELO RAPAGÃO DE BARBA NEGRA. ERA
CYRO VALDEZ.
PAULUS -
(adiantou-se, hostil) Aonde pensa que vai?
CYRO
- Não penso... eu vou ao interior
da mina... tentar fazer alguma coisa!
PAULUS - A
turma de salvamento não conseguiu, não é o senhor quem conseguirá.
JONAS EMPURROU O ADVOGADO COM
BRUTALIDADE.
MESTRE JONAS -
Mocinho... ele disse. A gente vai entrá.
PAULUS - Não.
Não podem. É proibida a entrada de estranhos.
MESTRE JONAS - Não
sou estranho. Meu filho tá lá no fundo.
PAULUS VIROU-SE PARA OS POLICIAS QUE
VIGIAVAM OS ARREDORES.
PAULUS - Não
os deixem entrar! Reajam à altura!
OS GUARDAS LEVANTARAM OS CASSETETES
DE BORRACHA.
MESTRE JONAS - Meu
filho tá lá, gente! Por que não posso entrá?
CYRO
- Nós podemos ajudar a cavar.
OTTO SURGIU, INTROMETENDO-SE NA
DISCUSSÃO.
OTTO
- Nenhum estranho deverá entrar
na mina. Reajam violentamente, se preciso for. (olhou com asco para Cyro
Valdez) Não é de milagres que estamos necessitando... O senhor mais parece um
mendigo... do que um médico. (e irônico) Parece-me que não progrediu muito
desde a última vez que o vi...
CYRO
- E o senhor progrediu muito. Era
um homem morto. Eu o ressuscitei com o coração de um homem bom. Acreditei que
isto pudesse lhe trazer algum benefício. Mas me parece que foi em vão.
OTTO SUSPENDEU A MÃO E A DESCARREGOU
CONTRA O ROSTO DO MÉDICO. CYRO EQUILIBROU-SE PARA NÃO IR AO SOLO E APENAS FITOU
A CARA MALVADA DO SUPERINTENDENTE. VÁRIOS HOMENS AMEAÇARAM REVIDAR. CYRO
LEVANTOU OS BRAÇOS EM SINAL DE PAZ.
MESTRE JONAS -
(gritou, irado) Revida, Cyro!
CYRO
- Se eu revidar, posso matá-lo.
Ninguém conhece melhor do que eu o que vai por dentro dele. (Otto empalideceu)
E eu quero que ele viva ainda por algum tempo...
OTTO
- (olhou para os policias)
Cumpram as minhas ordens!
CORTA PARA:
CENA 2 - MINAS
- GALERIA M-13 -
INTERIOR - DIA
RICARDO -
Bloqueio das pedras e terra é muito grande. Se isto aguentar... talvez
tenhamos de trabalhar mais de 24 horas.
O ENCARREGADO DA FURADEIRA PAROU UM
POUCO PARA LIMPAR O SUOR QUE ESCORRIA DO ROSTO, ENGROSSADO PELO PÓ CARBONÍFERO.
DURANTE ALGUNS SEGUNDOS DE SILENCIO OUVIRAM UMAS PANCADAS RITMADAS.
RICARDO -
Esperem! Não façam barulho!
AS BATIDAS CONTINUARAM NÍTIDAS.
RICARDO SEGUROU UMA PÁ E BATEU COM RITMO
NUMA SALIÊNCIA ROCHOSA. DEPOIS DE PEQUENA PAUSA OUVIU A RESPOSTA, NO MESMO
RITMO COMPASSADO.
RICARDO - São
eles! Estão vivos! Ânimo, minha gente! São eles!
A CORRENTE DE SATISFAÇÃO PERCORREU
TODOS OS HOMENS E ALCANÇOU A PARTE EXTERNA DA MINA.
MINEIRO -
(gritou para o lado de fora) Estão vivos!
UM VOZERIO ALEGRE ELETRIZOU A PRAÇA.
CYRO SORRIU. JONAS LIMPOU AS
LÁGRIMAS.
CORTA PARA:
CENA 3 - MINAS
- GALERIA M-13 -
INTERIOR - DIA
DENTRO DA GALERIA DESMORONADA, OS
HOMENS ORAVAM CONTRITOS. OS MENOS FERIDOS AJUDAVAM A MINORAR AS DORES DOS
OUTROS, LANHADOS COM FRATURAS NAS COSTELAS E MEMBROS. AOS POUCOS A GALERIA SE
ENCHIA DE ÁGUA, PROVENIENTE DO RIO SUBTERRÂNEO. EM ALGUNS LUGARES MAIS FUNDOS,
O LÍQUIDO COMEÇAVA A FORMAR AUTÊNTICOS LAGOS. PÉ-NA-COVA FIZERA UM LEVANTAMENTO
DA SITUAÇÃO. ELE ESTAVA BEM. PEQUENAS ESCORIAÇÕES E NADA MAIS.
DANIEL GEMIA, COM UM PROFUNDO CORTE
NAS COSTAS E DORES NOS OSSOS PARTIDOS. OUTROS SEIS, OS QUE TRABALHAVAM NAS
CÂMARAS 18 E 19, PARECIAM MAL. UM DELES MORRERA E SEU CORPO BOIAVA NAS ÁGUAS
NEGRAS.
PÉ-NA-COVA RECEBEU O “TROCO”
COMUNICATIVO DA MENSAGEM QUE ENVIARA PARA O OUTRO LADO. AS PANCADAS
SIGNIFICAVAM ESPERANÇA PARA OS CONDENADOS.
PÉ-NA-COVA - É a
turma de salvamento! Vocês tenham paciência! Eles vão tirá a gente daqui!
DANIEL -
(gritou, torturado pelas dores) Quando? Quando a gente tivé tudo
morrido!
CORTA PARA:
CENA 4 - VALONGO
- CASA DE DAS DORES -
INTERIOR - DIA
Ricardo (Edney Giovenazzi) |
NA CASA DE DAS DORES, BABY DELIRAVA, EM
FEBRE, E SE RECUSAVA A ACEITAR A AJUDA DA ESPOSA. DR. CYRO SENTOU-SE À
CABECEIRA DA CAMA E TOMOU-LHE AS MÃOS ENTRE AS SUAS.
OBRIGOU-O A SENTAR-SE, COM
DIFICULDADE.
CYRO
- Vamos conversar... um pouco,
Baby!
BABY
- Por que todo mundo está
pensando mal de mim? Eu não acendi o pavio da dinamite... eles querem me
acusar... mas eu não fui o autor da explosão. Eu queria morrer, mas não ia
levar ninguém comigo...
CYRO
- E sei... eu sei...
O MÉDICO RETIROU O TERMÔMETRO DA
AXILA DIREITA DO AMIGO, 38,9.
BABY
- Droga! Não me responda como se
eu fosse um retardado mental! Eu não estou louco! Eu não fiz aquilo por mal!
Alguém tem de acreditar em mim! Eu não queria que ninguém morresse comigo!
CYRO
- Eu acredito, Baby!
BABY
- (animou-se um pouco, ante a
aquiescência do amigo) Acredita... no duro? Não está fazendo isso... pra me
aquietar?
CYRO
- Acredito, Baby! Eu sei que não
foi você quem acendeu o pavio da dinamite!
BABY
- (agarrou-se apertadamente ao
médico) Como... como sabe?
NUMA VISÃO MENTAL, MUITO CLARA, O
MÉDICO – QUE ENCARAVA O JOVEM FEBRIL, REVIVEU A CENA DO DESPERTAR, NA GALERIA,
E O NERVOSISMO DE BABY AO TENTAR APAGAR O ESTOPIM.
CYRO
- Estou vendo seu pensamento,
Baby. Se você mentir, eu também posso ver! Mas você não está mentindo.
BABY
- Se você pode mesmo ver... veja
se consegue descobrir quem acendeu o estopim? Não fui eu! Portanto... veja se
pode ver!
CYRO
- Posso ver o que está na sua
mente. O que se passou com você. Se você não viu quem acendeu o estopim, porque
estava dormindo, eu também não posso ver.
Isto não está fixado na sua mente.
CORTA PARA:
CENA 5 - MINAS - ENTRADA DA GALERIA M-13 -
EXTERIOR - DIA
MINEIRO -
(anunciou, vindo do fundo da terra) Houve outro desabamento!
RICARDO -
(preocupado) Algum ferido?
MINEIRO - Não.
Coisa leve. A gente correu a tempo.
O ENGENHEIRO RETORNOU AO SUBSOLO ONDE
OS HOMENS TRABALHAVAM INCESSANTEMENTE. BAGAS DE SUOR CAINDO PELOS CORPOS
SUADOS, FERIDOS, CANSADOS.
CORTA PARA:
CENA 6 - ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS -
ESCRITÓRIO - INTERIOR
- DIA
O DIA NASCERA. E DEPOIS OUTRO, DE SOL
CLARO, QUENTE. OS REPÓRTERES INSISTIAM EM SABER DETALHES DO ACIDENTE. RICARDO
RESOLVEU ATENDÊ-LOS. VÁRIOS CARROS DE REPORTAGENS ESTACIONAVAM NOS ARREDORES DA
PRACINHA.
OS JORNALISTAS SE AGRUPARAM EM TORNO
DA MESA, NO ESCRITÓRIO.
RICARDO - Como
já disse... houve um desmoronamento na câmara 20, da galeria M-13
REPÓRTER 1 - Há
quantos dias os homens estão lá?
RICARDO -
Quase 3. É isso... dois e meio.
REPÓRTER 2 - Os
nomes dos soterrados, por favor?
RICARDO - São
oito: Lucas, Daniel, Vieira, Inácio, Junqueira, Mário Sales, Tião, Laurindo...
é, são estes. Não reparem... estou tremendamente cansado. Há dois dias sem
dormir, praticamente. Estou morrendo em pé... mas quando penso naqueles
homens...
REPÓRTER 3 - O
que está sendo feito para retirá-los?
RICARDO -
Mandamos abrir uma passagem por outra galeria... vai demorar um pouco
mais, porém, é menos arriscado.
CORTA PARA:
CENA 7 - MINA ABANDONADA -
INTERIOR - DIA
CYRO VALDEZ REUNIU SEU GRUPO NA
ENTRADA DA MINA ABANDONADA, DO OUTRO LADO DA DE VALONGO. E DEPOIS DE ALGUNS
MINUTOS DE ORIENTAÇÕES, ENTROU SOZINHO PELOS CORREDORES ESCUROS E PERIGOSOS. OS
RATOS DISPERSARAM-SE AMEDRONTADOS E DEZENAS DE MORCEGOS ESVOAÇARAM PELAS
GALERIAS SILENCIOSAS.
O MÉDICO SENTIU PASSADAS ATRÁS DE SI
E SE VOLTOU, ASSUSTADO.
CYRO
- O que veio fazer, André? Você
me seguiu?
ANDRÉ
- Segui. Vi o senhor sair do
Valongo e fiquei curioso.
CYRO
- Preciso encontrar uma solução
para salvar aquela pobre gente antes que seja tarde demais.
TINHAM-SE APROFUNDADO EM DEMASIA E
PELOS CÁLCULOS JÁ SE ENCONTRAVAM NA DIREÇÃO DO LOCAL ACIDENTADO. CYRO PAROU
PENSANDO TER OUVIDO ALGUMA COISA.
CYRO
- Espere... você está percebendo
um som?
ANDRÉ BOTOU A MÃO EM CONCHA JUNTO AO
OUVIDO.
ANDRÉ
- Não... não ouço nada!
CYRO
- Apure bem o ouvido. Tente
ouvir... parecem batidas.
ANDRÉ
- Agora sim!
CYRO
- Será possível... que esta mina
velha... tenha ligação com as minas novas?
ANDRÉ
- (saltando por velhos trilhos
enferrujados) Quem sabe?
CYRO
- (tentava localizar o ruído,
encostando o ouvido contra o solo) É aqui embaixo, André. Aqui embaixo!
FIM DO CAPÍTULO 79
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