Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 30
Participam deste
capítulo
Ester -
Gloria Menezes
Júlia - Ida
Gomes
Lia -
Arlete Sales
Baby -
Claudio Cavalcanti
Catarina -
Lidia Matos
Zoraida - Jurema Penna
Otto -
Jardel Filho
Coice de Mula - Dary
Reis
Pedrão - Waldir Onofre
Daniel -
Paulo Araújo
Pé-na-Cova -
Antonio Pitanga
Cesário -
Carlos Eduardo Dolabela
Ricardo -
Edney Giovenazzi
CENA
1 -
MANSÃO DE OTTO MULLER - QUARTO DE ESTER -
INTERIOR - DIA
A PORTA DO QUARTO DE ESTER SE ABRIU E LIA ENTROU. A
MULHER FUZILOU-A COM OS OLHOS.
LIA - Preciso falar com você!
ESTER - Não tenho nada o que lhe falar.
LIA - (com sarcasmo) Você sabe que tem!
ESTER - Não me venha dizer que está morrendo de
amores por Otto e que eu sou um estorvo à sua felicidade.
LIA - É isso mesmo o que está acontecendo. Depois
que você veio morar aqui, as coisas mudaram entre nós. Ele pretendia se casar
comigo, antes de você chegar!
ESTER - Ora! Eu não empato seus amores! Podem se
casar, podem fingir que se amam, podem ir até pro céu ou pro inferno, eu não
tenho nada com isso!
LIA - (chegou perto da mulher a quem detestava) O
que quer para sair desta casa?
ESTER - Apenas o direito de levar meu filho. Consiga
isso com o seu querido Otto e eu deixarei o caminho livre para você se entregar
a... (riu com ironia) essa paixão que pode explodir dentro do seu peito.
LIA - (estreitou os lábios, irada) Por que lhe
parece absurdo que eu tenha paixão por Otto? Não é um homem como outro
qualquer?
ESTER - Ora, Lia, não me obrigue a falar claro. Você
está apenas interessada numa boa posição, no dinheiro dele.
LIA - E se você estiver enganada?
ESTER - Você é uma mulher normal, não me convence do
contrário.
LIA - Mas eu o amo. Amo Otto como nunca pensei amar
ninguém.
ESTER - Então você é desequilibrada como ele!
LIA - Vou fazer a tentativa de resolver as coisas
por bem. Conversarei com Otto a respeito de lhe entregar o menino.
ESTER - Se conseguir, será um favor. Se não
conseguir, vou lutar com as minhas armas, contra ele...
LIA DEIXOU O QUARTO. MAIS QUE DEPRESSA, ESTER VOLTOU
AOS RECORTES. QUALQUER COISA LHE ESTALOU NA CABEÇA.
ESTER - Júlia!
A SECRETÁRIA ENTROU, COM IVANZINHO.
JÚLIA - Pronto!
ESTER - Tive uma ideia. Vou procurar a mãe de Otávio,
Dona Cândida Sales.
JÚLIA - A mãe do aviador assassinado? Mas para quê?
Vai arranjar complicações!
ESTER - (cheia de malícia) Vou com cuidado. Sei o que
devo fazer.
JÚLIA - Mas... o que pretende, com a visita?
ESTER - Pode ser que Otávio lhe tenha feito
confidências antes de morrer. Isto me ajudaria muito.
PEGANDO DA BOLSA, ESTER DIRIGIU-SE PARA A PORTA.
CORTA PARA:
CENA
2 -
PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO
- SALA -
INTERIOR - DIA
BABY, DE PERNAS PARA O ALTO, APOIADAS NO PEITORIL DA
JANELA, CONVERSAVA AO TELEFONE COM UMA GAROTA, ENQUANTO NA VITROLA TOCAVA UM ANIMADO DISCO DOS ROLLING STONES.
BABY - Não brinca... essa não... é dose pra cavalo!
VIU QUANDO CATARINA PASSOU POR ELE E DESLIGOU A
RADIOVITROLA.
CATARINA - Que pouca vergonha!
BABY - (despediu-se da vozinha fina do outro lado da
linha) Depois falo contigo. Tenho uma coisinha de família pra resolver. É. A
gente se encontra depois... (jogou o fone no gancho e se levantou) Não gosta de
música, é, tia?
CATARINA - Desse tipo, não!
SEM AVISO PRÉVIO, O RAPAZ DESARRUMOU O PENTEADO DA
VELHA.
BABY - Também não gostei do seu penteado!
CATARINA - É isso que você pretende fazer com os seus
empregados quando não gostar de alguma coisa?
BABY - (deu um salto sobre a poltrona, caindo de
pernas cruzadas e mãos nos braços de couro) Não é isso que meu primo Otto faz?
CATARINA - Otto sabe o que faz! Não é você! Para isso
trabalhou durante muitos anos até chegar ao lugar que ocupa. Ele não recebeu o
cargo de mãos beijadas!
BABY - De mãos beijadas, não. Ele lutou muito
(enumerou pelos dedos) roubou, matou, fez o diabo! Ah, isso fez!
A GOVERNANTA TENTOU CHAMAR A ATENÇÃO DO JOVEM PARA
OUTRO ASSUNTO, EVITANDO A CRISE QUE SE DELINEAVA.
ZORAIDA - Baby... o carro...
BABY - (não lhe deu confiança) Não é verdade? Então
a família não sabe o que ele fez com o pai de Ester, pra ficar no lugar dele? O
velho era o superintendente da Companhia, não era? Ou vocês pensam que eu era
tão criança, não via as coisas? Otto passou uma bela rasteira no velho. Mandou
o coitado pra cadeia. O desgraçado se matou, de vergonha. O caso não veio a
público para encobrir as falhas da família. Não se esqueça que sou da
família...
CATARINA - (fuzilava de raiva) Tudo isso é um amontoado
de mentiras! Só podem sair de uma cabeça desmiolada como a sua! Meu irmão
estava maluco quando resolveu passar a você o cargo da presidência!
BABY SE PÔS DE CABEÇA PARA BAIXO, ESTICANDO AS PERNAS
ANTE O OLHAR DESAPROVADOR DA VELHA.
VOLTOU À POSIÇÃO NORMAL, VERMELHO.
BABY - Olha, até que eu não queria, viu? Mas agora
eu quero. E faço questão de tomar posse logo. Vou fazer miséria dentro da
Companhia! Otto vai ter que rebolar!
CATARINA - (com os olhos brilhando de raiva) É o que
veremos! Otto vai ter de tomar uma atitude! Você não tem maturidade nem
responsabilidade para assumir um cargo tão elevado. Você é um irresponsável
total! Um inconsequente. Você não presta!
BABY - (ria cômicamente, fazendo caretas) Oi, tia...
Oi... Obrigado, obrigado. A gente vai ver quem é que não presta na família. A
gente vai ver. Legal! Legal!
CATARINA - (espumava de ódio) Você ainda não assumiu.
Vai haver a assembleia. Até lá muita coisa pode acontecer!
Paulus (Emiliano Queiroz) e Catarina (Lidia Mattos) |
CORTA PARA:
CENA
2 -
MINAS - INTERIOR
- DIA
O ELEVADOR DESCIA MOROSO PARA O FUNDO DA TERRA,
LEVANDO OTTO MULLER E SEU CAPATAZ. LÁ
EMBAIXO, OS MINEIROS CONVERSAVAM PARA AMENIZAR A DUREZA DO TRABALHO.
PEDRÃO - Foi
milagre mesmo?
PÉ-NA-COVA
- Quem pode dizê? A gente só sabe
que foi o Doutô Cyro olhá pro home e a doença deixou de sê doença ruim...
DANIEL - Isso foi. Pode num tê curado na hora... mas
deixou de sê doença ruim.
CESÁRIO - Tu não se trata direito, pra vê se o Doutô
Cyro te cura. Teus pulmão tá arrebentado.
PEDRÃO - Home discrente taí!
PÉ-NA-COVA
- (em tom de brincadeira) Bem que
ele beija seus santinho de noite. Tá morando lá em casa. Eu vi.
CESÁRIO - Beijei foi o retrato da minha namorada. E
aquilo num é santo, nem aqui nem no inferno.
O SILENCIO MOMENTÂNEO FOI INTERROMPIDO PELA CHAGADA DO
SUPERINTENDENTE E DO CAPATAZ.
COICE DE MULA
- Pro trabalho, gente! Pro
trabalho! Vamos largá de papo!
CESÁRIO OLHOU DE SOSLAIO PARA O CAPATAZ, ENQUANTO
PEDRÃO ENVIAVA UM OLHAR DESAFIADOR AO SUPERINTENDENTE.
PEDRÃO - Que milagre, patrão! O senhor aqui, no nosso
inferno...
OTTO - (olhou-os com arrogância) Vim ensinar vocês a
trabalhar como gente!
PEDRÃO - E a gente é animal?
HOUVE UM PRINCÍPIO DE RISO GENERALIZADO.
OTTO - (irado) Calem-se! (retirou o paletó e
atirou-o contra o rosto de Pedrão) Este aqui não sabe nem pegar numa pá! (com
raiva arrancou a pá das mãos de Martins) Não te ensinaram que era assim?
(enterrou-a no carvão despedaçado) Reforcem essas vigas se não querem morrer
soterrados! Depois nos obrigam a pagar indenizações às viúvas! Ao trabalho,
vamos!
OS HOMENS COMEÇARAM A TRABALHAR, ATIVAMENTE.
OTTO APANHOU O PALETÓ, PENDURANDO-O NO BRAÇO E TOMOU O
ELEVADOR, VOLTANDO LÁ PARA CIMA. EM TODAS AS GALERIAS, OS HOMENS PARAVAM, POR
INSTANTES O TRABALHO, PARA AMALDIÇOAR A PRESENÇA DO HOMEM NO INTERIOR DA TERRA.
COICE DE MULA VIU
QUE OTTO PROCURAVA ALGUMA COISA NO BOLSO DO PALETÓ.
COICE DE MULA
- Que foi, patrão?
A SUBIDA HAVIA CHEGADO AO FIM E JÁ SE PREPARAVAM PARA
DEIXAR O ELEVADOR.
OTTO - Perdi lá embaixo a minha carteira. Volta pra
buscá-la.
COICE DE MULA
- (entendeu a manobra) Perdeu?
OTTO - Ou me roubaram... Se não a encontrar, traga
aquele negro que segurou meu paletó.
ENQUANTO O CAPATAZ MANOBRAVA O ELEVADOR E SE INTERNAVA
NAS GALERIAS, RICARDO APROXIMOU-SE DO SUPERINTENDENTE.
RICARDO - Telefonaram há pouco de sua casa. Dona
Catarina está aflita. Disse que o senhor há dois dias não aparece...
OTTO - Minha mãe deve ter feito disso uma tragédia.
Ah, as mães são sempre exageradas!
DIRIGIRAM-SE AMBOS PARA OS ESCRITÓRIOS DA
ADMINISTRAÇÃO.
CORTA PARA:
CENA
3 -
MINAS - INTERIOR
- DIA
PEDRÃO - (sem entender) Carteira de quê? De dinheiro?
COICE DE MULA
- (simulava preocupação) Ninguém
viu, por aqui?
OLHOU O CHÃO, VASCULHANDO-O COM OS OLHOS, REMOVENDO
MONTES DE PÓ, COM AS BOTINAS IMUNDAS.
PÉ-NA-COVA
- Ninguém.
COICE DE MULA
- Me ajudem a procurar, seus
pestes!
CESÁRIO - Que é que tá acontecendo? Por que não deixam
a gente trabalhá direito? Em paz?
COICE DE MULA
- (falou-lhe, num cochicho) O
homão tá uma fera. Tem de ser agora.
CESÁRIO - (confidenciou) O homão me dá enjoo, náusea...
COICE DE MULA
- Quer perdê o emprego, seu
idiota? (avizinhou-se de Pedrão) Você, venha comigo!
PEDRÃO - Eu? Pra quê?
COICE DE MULA
- Tou mandando, não tou?
PEDRÃO SEGUIU-O, DESCONFIADO.
FIM DO
CAPÍTULO 30
...e na próxima terça. capítulo inédito!
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