quarta-feira, 23 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 35


Novela de Janete Clair

Adaptação de Antonio Figueira

CAPÍTULO 35

Participam deste capítulo
Ester  -  Gloria Menezes
Cyro  -  Tarcísio Meira
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Comendador Liberato  -  Macedo Neto
Zoraida  -  Jurema Penna
Otto  -  Jardel Filho
Coice de Mula  -  Dary Reis
Ricardo  -  Edney Giovenazzi
Paulus  -  Emiliano Queiroz

CENA 1  -  PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO  -  SALA  -  INTERIOR  -  DIA

(continuação da última cena do capítulo anterior)

O COMENDADOR APERTOU O PEITO, COMO SE SENTISSE UMA DOR REPENTINA. A MOÇA ACUDIU-O.

ESTER  -  (gritou para a governanta) Zoraida, venha cá...

ZORAIDA  -  O Dr. Cyro preveniu. Ele não deve ter emoções.

AS FEIÇÕES DO MILIONÁRIO HAVIAM-SE TRANSFORMADO NUMA MÁSCARA DE CÊRA. O COMENDADOR ESTAVA LÍVIDO, OS LÁBIOS BRANCOS. SUAVA E RESPIRAVA COM DIFICULDADE.

ESTER  -  Acho que fiz muito mal em vir trazer este problema.

COMENDADOR LIBERATO  -  (falava com dificuldade) Não... Não se sinta culpada de nada. O culpado é ele mesmo, o meu próprio filho. Queria fazer dele um homem de bem. Está sendo difícil. Muito difícil, meu Deus do Céu!

ZORAIDA  -  (encaminhou-se para o telefone) Vou chamar o Dr. Cyro.

ESTER ESTREMECEU, E BUSCOU A SAÍDA PARA DEIXAR A SALA.

ESTER  -  Bem... comendador... eu tenho de ir buscar o Ivanzinho...

COMENDADOR LIBERATO  -  Espere um pouco e fique comigo.

O COMENDADOR APERTOU COM FORÇA A MÃO DA MULHER. A VOZ DE ZORAIDA CHEGOU-LHE AOS OUVIDOS.

ZORAIDA  -  (ao telefone) Do hospital? O Dr. Cyro, por favor.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu me sinto, às vezes, muito só, Ester.

ZORAIDA  -  Dr. Cyro? Aqui é da casa do Comendador Liberato. Ele não está passando bem. É possível o senhor vir até aqui?

ESTER TENTOU LIVRAR A MÃO QUE O COMENDADOR RETINHA ENTRE AS SUAS.

MINUTOS DEPOIS, CYRO VALDEZ FREAVA Á PORTA DA MANSÃO.

CYRO  -  (à entrada, dirigiu-se à governanta, entregando-lhe a pasta de aparelhos de exames) Ele piorou?

ZORAIDA  -  Teve uma emoção muito forte...

PARA CYRO ERA COMO SE A VISÃO DE ESTER FOSSE UMA MIRAGEM.

ESTER  -  O comendador... me pediu para esperar...

CYRO  -  (profundamente surpreso) Pensei que estivesse viajando!

ESTER  -  (perturbou-se) Eu estive... Bem, agora o senhor já não está tão só (falou, dirigindo-se ao milionário) Eu não posso ficar mais... está na hora de ir buscar meu filho... Enfim... com licença.

O MÉDICO PERCEBEU A PERTURBAÇÃO DA MULHER A QUEM AMAVA E QUE, DE UMA HORA PARA OUTRA, LHE ESCAPAVA DAS MÃOS. O DEVER OBRIGAVA-O A CUIDAR IMEDIATAMENTE DO PACIENTE. PEGOU-LHE NO PULSO FRIO. CONTOU AS PULSAÇÕES. ABRIU A MALETA E RETIROU O APARELHO DE PRESSÃO.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu pedi a Ester para ficar. Sabia que ela gostaria de vê-lo, doutor. As mãos dela também estavam frias...

CYRO  -  Quieto, por favor... É mais nervoso do que qualquer outra coisa. (pediu à governanta) Deixe-me ver os remédios que está tomando.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu lhe dizia que as mãos de Ester estavam geladas, mas ela queria vê-lo. Eu senti que ela queria vê-lo, Dr. Cyro. E tive um pouco de pena.

CYRO  -  (procurava desviar a conversa para outro polo) Está tudo bem. Não vou perguntar o que aconteceu, mas previno-o mais uma vez, evite as emoções. Seu estado é muito bom.

COMENDADOR LIBERATO  -  Quem tem um filho como eu, não pode fugir de emoções fortes.

CYRO GUARDOU OS APARELHOS, APLICOU UMA INJEÇÃO NO COMENDADOR.

CYRO  -  (em voz baixa) Posso lhe fazer um pedido, comendador?

COMENDADOR LIBERATO  -  Você não pede, você manda.

CYRO  -  Estão acontecendo incidentes sérios nas minas, contra os trabalhadores. Uma injustiça gerou uma represália da parte de alguns homens. Essa represália, por sua vez, vai gerar maior revolta. E será assim de agora em diante. Não existirá um meio de parar isto? Com um tratamento melhor aos trabalhadores, semelhante ao que se vê em outras minas deste Estado?

CAMBALEANDO, BABY DESCIA AS ESCADAS, BÊBADO, A TEMPO DE OUVIR AS PALAVRAS DO MÉDICO, E A RESPOSTA DO PAI.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu esperava... colocar um ponto final nesta sitação. Não ignoro o que acontece. Sei que meu sobrinho espalhou esse clima entre os trabalhadores. Para isso fiz tudo para ser substituído por meu filho. Sinto-me impossibilitado de agir. Pensei que ele fosse um homem. Mas... meu filho é um moleque. Um irresponsável.

A VOZ DE BABY EXPLODIU NA SALA, VINDA DO ALTO, ONDE O RAPAZ SE ARRASTAVA, AMPARADO AO CORRIMÃO.

BABY  -  (revoltado) Ele... ele me fez moleque, doutor! Ele me fez! Ele me odeia, doutor!

MINUTOS DEPOIS O RAPAZ JÁ ESTAVA MELHOR, MEDICADO PELO CIRURGIÃO. CYRO FIZERA O RAPAZ INGERIR UM REMÉDIO, DEITANDO-O NO SOFÁ. BABY REFAZIA-SE LENTAMENTE.

BABY  -  Eu vou botar as coisas nos eixos. Olha, pode tomar nota, vou escorraçar meu primo de lá. Como um cachorro, pra fora! Pra fora! Passa! Passa! O senhor vai ver. E depois vou fazer das minas... minas-modelo! Diga isso aos trabalhadores. Cafèzinho toda hora... aperitivo... festas à noite! Vou montar um clube de dança na administração da mina. Chope! Chope! Muito chope para todo mundo! Melhores condições sanitárias. Mais médicos, mais dentistas, mais assistentes sociais, enfermeiras... O senhor vai ver! E escola para os filhos dos mineiros...

AOS POUCOS OS OLHOS DE BABY FORAM-SE CERRANDO. O CALMANTE QUE CYRO LHE DERA COMEÇARA A FAZER EFEITO.

COMENDADOR LIBERATO  -  Acha que se pode esperar alguma coisa dele?

CYRO  -  Penso que sim. Depende muito do senhor.

COMENDADOR LIBERATO  -  Mais do que tenho feito? O que, doutor?

CYRO -  (olhou para o rapaz que dormia e apontou o corpo jogado no sofá) Sabe a côr dos olhos do seu filho?

COMENDADOR LIBERATO  -  (perturbou-se com a pergunta) A côr? São... são... castanhos, ora!

CYRO – (fez um estalo significativo com a língua) Nada disso, comendador. São verdes, sabia?

LIBERATO DESCONCERTOU-SE. É. NÃO SABIA MESMO MUITA COISA SOBRE O FILHO. BABY TINHA RAZÃO DE CERTA FORMA.

CORTA PARA:

Ricardo (Edney Giovenazzi) e Baby (Claudio Cavalcanti)

CENA  2  - ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS  -  INTERIOR  -  DIA.

MUITO RARAMENTE OS OLHOS DE OTTO MULLER REFLETIAM TAMANHO CONTENTAMENTO.

OTTO  -  Então... foram agarrados, hem?

COICE DE MULA  -  (feliz, sorridente) Todos, patrão. Um por um.

OTTO  -  E quem são os culpados? Aqueles mesmos de quem suspeitávamos?

COICE DE MULA  -  Eles mesmos, seu Otto! (e enumerou os detidos contando-os pelos dedos) Pedrão, Lucas Pé-na-Cova, Martins, Valdemiro, Camargo, e... e o Cesário.

OTTO  -  (espantou-se) Cesário também foi prêso?

COICE DE MULA  -  Foi. Pra despistá. Dei aqueles cobres pra ele, que o senhor mandou. Ah, e também o Danié, mas esse não tomou parte nas coisa. Só deve pagá porque sabia de tudo e não quis delatar...

OTTO  -  Muito bem. Vamos despedir todos eles.

PAULUS  -  (acabava de entrar) Despedir quem?

OTTO  -  Você não ouviu? Os autores do atentado já foram prêsos.

PAULUS  -  Ótimo!

OTTO  -  Estou mandando despedir a turma toda. Amanhã cedo vai todo mundo pra rua.

COICE DE MULA  -  Só que o Cesário tá no embrulho, e ele é dos nosso.

OTTO  -  (raciocinou com rapidez) Despeça-o, também, para despistar... depois empregue-o outra vez. Quero ver esses sem-vergonhas arranjar emprego noutro lugar!

CORTA PARA:

CENA  3  -  SALA DE REUNIÕES DA COMPANHIA DE MINERAÇÃO NOVO MUNDO -  INTERIOR  -  DIA

OS ROSTOS NÃO REVELAVAM A DECISÃO COLETIVA. LIBERATO FECHOU A ATA E DEU POR ENCERRADA A SESSÃO. OS ACIONISTAS SE LEVANTARAM, SEM ATROPELO.

DURANTE DUAS HORAS OS DEBATES ESTIVERAM ACIRRADOS. ALGUNS DOS ACIONISTAS MANTINHAM RELAÇÕES COM OTTO MULLER, POR INTERESSES DIVERSOS OU COAÇÃO. OUTROS BANDEARAM-SE DE IMEDIATO PARA O COMENDADOR, POR CONHECEREM O TEMPERAMENTO E AS ATITUDES QUE CARACTERIZAVAM O SUPERINTENDENTE. LIBERATO FALOU-LHES DE SUAS APREENSÕES E DAS RAZÕES POR QUE SE AFASTAVA DA DIREÇÃO DA MINA E SUGERIA O NOME DO FILHO.

A VOTAÇÃO FINDARA E O RESULTADO JÁ ERA CONHECIDO.

DR. RICARDO CORREU AO TELEFONE. DISCOU E AGUARDOU QUE O ATENDESSEM.

RICARDO  -  Alô! Alô, Baby! Já terminou a assembléia. Qual o resultado? Você já é o novo presidente da Companhia!

ATENDENDO AO CHAMADO DO COMENDADOR, OTTO MULLER ENTROU NA SALA DE SESSÕES E APROXIMOU-SE DE BABY.

OTTO  -  (vermelho de raiva, mas procurando manter o contrôle) Baby...

BABY  -  Olá, primo... você quer alguma coisa?

OTTO  -  Quero cumprimentá-lo... pela brilhante vitória. Quero que você conte comigo... para tudo...

CORTA PARA:

CENA 4  -  FLORIANÓPOLIS  -  CASA DE RICARDO  -  INTERIOR  -  DIA

O NOVO PRESIDENTE ESTACIONOU O LUXUOSO CARRO DEFRONTE AO PORTÃO DA CASA DO ENGENHEIRO. QUASE NÃO TEVE TEMPO DE FECHAR A PORTA. ESTAVA AGITADO.

RICARDO ESPERAVA-O, IMPACIENTE. ERA PREFERÍVEL CONVERSAREM NUM LOCAL DISTANTE DAS VISTAS DE PESSOAS CURIOSAS. E A CASA DO ENGENHEIRO ERA O RECANTO IDEAL.

BABY  -  (abraçando-o) Pode-se considerar aumentado. Você está falando com o manda-chuva, ou não tá? (sorria alegremente) Vou aumentar todo mundo! Vou botar pra quebrar, você vai ver, Ricardo!

RICARDO  -  Calma, Baby, não é assim! (ria, satisfeito) Vá devagar, senão você quebra a Companhia! E antes de tomar posse!

BABY  -  Por falar nisso, vou tomar posse hoje mesmo. Comigo é assim. Sou da era do jato! Do dinamismo! Tempo é dinheiro! Você está intimado a ir diretamente para Valongo, assistir ao espetáculo do ano (fez um gesto amplo com os braços abertos) O desmiolado Baby Liberato vai assumir responsabilidades!

RICARDO  -  (com sinceridade) Estou muito satisfeito com isso, Baby!

FIM DO CAPÍTULO  35

... e amanhã, capítulo inédito!

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