segunda-feira, 14 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 31


Novela de Janete Clair

Adaptação de Antonio Figueira

CAPÍTULO 31

Participam deste capítulo

Cyro  -  Tarcísio Meira
Comendador Liberato  -  Macedo Neto
Otto  -  Jardel Filho
Ricardo  -  Edney Giovenazzi
Pedrão  -  Waldir Onofre
Coice de Mula / Carpinelli  -  Dary Reis

 CENA 1  -  ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS  -  ESCRITÓRIO  -  INTERIOR  -  DIA

OTTO REVIA ALGUNS DOCUMENTOS E PLANTAS COM O ENGENHEIRO, QUANDO O CAPATAZ CHEGOU ACOMPANHADO PELO NEGRO FORTE.

COICE DE MULA  -  Aqui tá o homem, patrão!

RICARDO E OTTO ERGUERAM OS OLHOS.

OTTO  -  Achou minha carteira?

COICE DE MULA  -  Lá embaixo, não. Mas, como foi ele quem pegou o casaco do sinhô...

OTTO  -  Reviste-o! Deve ter sido ele quem roubou!

PEDRÃO  -  (reagiu) Que é isso? Que é que tão pensando?

O CAPATAZ IA REVISTÁ-LO, MAS OS MÚSCULOS DO HÉRCULES BRILHAVAM DE SUOR E COICE PREFERIU NÃO IR À FRENTE.

RICARDO  -  Não façam isto com este homem! Eu o conheço e sei que é um homem de bem.

OTTO  -  (com excessiva calma) Não queremos acusá-lo, queremos revistá-lo.

OTTO -  (segurou as mãos do negro por trás das costas) Reviste-o, Carpinelli. Se a carteira estiver com ele...

COICE DE MULA ENFIOU A MÃO POR ENTRE A CAMISA DO MINEIRO E TROUXE DE LÁ A CARTEIRA, COM ENFEITES DE OURO.

COICE DE MULA  -  O homem é um santo, Doutô Ricardo! (exibiu a prova) Tá aqui a carteira.

RICARDO  -  Não é possível!

OTTO  -  (satisfeito) Sim... é possível. Taí o santarrão que você defende.

PEDRÃO ESTAVA TENSO, MAL PODIA FALAR, REVOLTADO COM A MANOBRA EXECUTADA À PERFEIÇÃO PELOS DOIS HOMENS.

PEDRÃO  -  Isso... é mentira, seu Doutô Ricardo! A carteira num tava comigo. Foi coisa do Seu Capataz!

COICE DE MULA  -  Coisa minha, hem? Você me acha com cara de quê? Sou mágico, por acaso?

OTTO CONTOU O DINHEIRO, INDIFERENTE.

PEDRÃO  -  Mentira! Num roubei nada! Num sabia de carteira nenhuma!

COICE DE MULA  -  Que é que faço, patrão?

OTTO  -  Chame a polícia! Entregue este negro como ladrão!

PEDRÃO  -  (desesperado) Chama a polícia! O diabo, se quisé! Eu num roubei! Ninguém pode me prendê por uma coisa que num fiz!

RICARDO  -  Esperem um pouco... não podem prejudicar assim o pobre homem.

OTTO  -  O que quer você que eu faça? Você é testemunha!

RICARDO  -  Deixem ele comigo... Eu quero conversar com ele. Eu me responsabilizo por ele!

OTTO  -  Tá bem. Eu acredito na palavra do Dr. Ricardo. Em consideração ao pedido dele, deixo este traste continuar. Mas com uma condição...

OS OLHOS DOS HOMENS FIXARAM A CARA MALÉFICA DO SUPERINTENDENTE.

RICARDO  -  Qual?

OTTO  -  Este incidente ficará marcado na ficha de trabalho dele. No dia em que sair da nossa companhia, não poderá trabalhar em qualquer outro lugar. Será um homem manchado. Pode levá-lo de volta ao trabalho, Carpinelli. E... muito cuidado com a sua carteira.

PEDRÃO VOLTOU AO FUNDO DA TERRA QUEIMANDO-SE EM ÓDIO.

CORTA PARA:

CENA 2  -  HOSPITAL DE FLORIANÓPOLÍS  -  SALA DO DIRETOR  -  INTERIOR  -  DIA

DIANTE DA EQUIPE MÉDICA, O DIRETOR DAVA AS BOAS-VINDAS AO CIRURGIÃO.

DIRETOR  -  Dr. Cyro, é certo que o nosso hospital não dispõe dos recursos de uma grande unidade, como a que o senhor dirigia em Londres, mas o equipamento básico e os diversos setores podem trazer bons resultados, certamente. Temos um Centro de estudos com importantes obras de consultas e um programa permanente de debates, e a UTI com aparelhamento moderno e o indispensável à segurança dos pacientes aqui internados. O índice de mortalidade geral é considerado ínfimo e o de pós-operatório, praticamente nulo.

CYRO SORRIU, SATISFEITO ANTE A RECEPTIVIDADE DE SEUS COLEGAS E DA SATISFAÇÃO ESTAMPADA NA FISIONOMIA DE CADA UM.

DIRETOR  -  O Hospital se engrandece ao incorporar, nos seus quadros, um cirurgião de sua competência e prestigio.

EM CONCORDÂNCIA ÀS PALAVRAS DO DIRETOR, A EQUIPE MÉDICA APLAUDIU SUAS PALAVRAS DE BOAS-VINDAS.

CORTA PARA:

CENA  3  -  PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO  -  EXTERIOR  -  NOITE

O SEDAN DO DR. CYRO VALDEZ PAROU DIANTE DO PORTÃO DA RESIDENCIA. O MÉDICO SALTOU, BATEU A PORTA E ENTROU NA MANSÃO.

CORTA PARA:


CENA 4  -  PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO  -  SALA  -  INTERIOR  -  NOITE

LIBERATO RECEBEU-O COM A ALEGRIA COSTUMEIRA.

COMENDADOR LIBERATO  -  Como foi seu primeiro dia no hospital, doutor?

CYRO  -  (com simpatia) Muito bom. No primeiro dia percorri as enfermarias, o ambulatório e outras dependências do hospital. Depois visitei alguns pacientes mais necessitados de atenção especial, inclusive de intervenções cirúrgicas imediatas.

O PRÓPRIO COMENDADOR PREPAROU UM DRINQUE, COM MUITO GELO, RODELAS DE LIMÃO E SAN RAFAEL. ENTREGOU UMA TAÇA AO MÉDICO E SENTOU-SE NA POLTRONA RECLINÁVEL.

COMENDADOR LIBERATO  -  Estava para lhe dar uma satisfação dos acontecimentos daquele jantar.

CYRO  -  O senhor não me deve satisfação alguma.

COMENDADOR LIBERATO  -  Deve ter ficado intrigado com a reação do meu sobrinho Otto Muller.

CYRO  -  Confesso que já estou me acostumando às reações esquisitas de seu sobrinho. É um temperamento nervoso, irritável, doentio.

COMENDADOR LIBERATO  -  E sobre Ester Muller? O que me diz?

CYRO  -  Se não me engano, ela já não é mais Muller!

COMENDADOR LIBERATO  -  Desculpe-me, havia me esquecido. De fato, ela já desfez o casamento com ele há algum tempo... então, é... ela... confesso que havia percebido alguma coisa no jantar!

CYRO  -  (cortou) O senhor me mandou chamar aqui, comendador... para falar de Dona Ester?

COMENDADOR LIBERATO  -  Exato. Foi para falar de Ester. Gosto muito daquela moça, e devo a vida ao senhor, Dr. Cyro.

CYRO  -  (franziu a testa, curioso) Aonde quer chegar, comendador?

COMENDADOR LIBERATO  -  Ela tem um passado, sabia?

CYRO  -  Passado?

COMENDADOR LIBERATO  -  É. Um passado! Minha intenção é apenas preveni-lo. Otto é um homem perigoso.

CYRO  -  o senhor não me disse o mais importante. O que aconteceu com Ester?

O VELHO RICAÇO TOMOU UM LONGO TRAGO DA BEBIDA E COMPRIMIU AS LATERAIS DA TESTA, COMO SE FORÇASSE A MENTE A REVIVER UM EPISÓDIO DISTANTE.

COMENDADOR LIBERATO  -  Ninguém conseguiu provar nada, mas nós que conhecemos Otto suficientemente sabemos que ele seria capaz de matar o aviador.

CYRO  -  (impacientando-se) Quem era?

COMENDADOR LIBERATO  -  Um namorado de infância de Ester. Dizem que o rapaz andou perseguindo-a... enfim... estava apaixonado. Foi um crime revoltante. Ele apareceu morto na fazenda de Otto.

CYRO  -  E a polícia... o que concluiu?

COMENDADOR LIBERATO  -  O crime ficou sem solução... falta de provas!

CYRO  -  (perturbado) E ela?

COMENDADOR LIBERATO  -  Quem conhece Ester sabe que ela não teve culpa, mas quem conhece Otto sabe que ele não necessitava de certeza para mandar liquidar o rapaz.

CYRO  -  Compreendo.

COMENDADOR LIBERATO  -  De qualquer maneira, achei que era meu dever avisá-lo.

CYRO  -  Agradeço, comendador, mas isso não me intimida.

COMENDADOR LIBERATO  -  Acho que cumpri com meu dever de amigo, doutor.

CYRO  -  As suspeitas contra Otto Muller foram públicas?

COMENDADOR LIBERATO  -  Não, embora o caso tenha sido muito comentado, as suspeitas contra ele ficaram em família. A polícia interrogou vários suspeitos... inclusive ele, mas as provas eram insuficientes para incriminar qualquer pessoa. Custa-me dizer isso... mas penso que esta moça está proibida para você!

CYRO  -  (agastado) Ninguém está proibido para ninguém. Não há lei humana que dite esta lei absurda. Bem... tome seu remédio direito e evite esforços. Sua aparência é das melhores, comendador.

APERTOU AS MÃOS DO VELHO.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu me acho no direito de lhe pedir muita cautela com este caso, Dr. Cyro.

CYRO  -  Não se preocupe. Boa noite!

FIM DO CAPÍTULO 31

...e na próxima quinta, o capítulo 32!

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