quinta-feira, 17 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 33


Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 33

Participam deste capítulo

Ester  -  Gloria Menezes
Otto Muller  -  Jardel Filho
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Comendador Liberato  -  Macedo Neto
Zoraida  -  Jurema Penna

CENA 1  -  FLORIANÓPOLIS  -  RUAS  -  EXTERIOR  -  NOITE

(continuação da última cena do capítulo anterior)

SEM DAR ATENÇÃO AO AVISO DE PAULUS, ESTER GIROU A MAÇANETA E SAIU, ENTROU NO CARRO E RODOU A CHAVE. O MOTOR ATENDEU DE PRONTO. ESTER ACELEROU ENQUANTO DEBREAVA CALMAMENTE. O AUTOMÓVEL DESLOCOU-SE POR ENTRE OS PINGOS DE CHUVA, QUE AUMENTARA DE INTENSIDADE.

DO LADO OPOSTO, ESCONDIDO NA PEQUENA RUA TRANSVERSAL, OTTO MULLER VIU O CARRO APONTAR NO PORTÃO, DESCER A CALÇADA E PASSAR À SUA FRENTE, EM MARCHA REDUZIDA. LIGOU SEU POTENTE MOTOR E SEGUIU À DISTANCIA O AUTOMÓVEL DA MULHER.

ERA-LHE DIFÍCIL ACOMPANHAR O CARRO DA FRENTE, POR CAUSA DO MANTO DE ÁGUA QUE TEIMAVA EM DESABAR SOBRE A TERRA. APENAS AS LUZES VERMELHAS ORIENTAVAM-NO.

FAZIA ALGUNS MINUTOS QUE OS DOIS CRUZAVAM AS RUAS DE FLORIANÓPOLIS QUANDO, AO OLHAR PELO RETROVISOR, ESTER RECONHECEU O AUTOMÓVEL QUE VINHA ATRÁS. O FOCO DE LUZ DE UM POSTE ILUMINARA-O POR INTEIRO.

A MULHER OUVIU, COMO NUM ECO, A VOZ DO ADVOGADO.

PAULUS  -  “Como é que você vai se arranjar, se ele cismar de perseguir o Dr. Cyro? Lembra-se do aviador? O que acontecer com o médico, a responsabilidade será sua! Lembra-se do aviador? Lembra-se do aviador? Do aviador?”

AUTOMÁTICAMENTE ELA LEVOU UMA DAS MÃOS AO OUVIDO, COMO A REPELIR A VOZ INSISTENTE. IMPRIMIU MAIOR VELOCIDADE AO AUTOMÓVEL, PROCURANDO FUGIR À PERSEGUIÇÃO.

CORTA PARA:

CENA 2 - PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO  -  SALA  -  INTERIOR  -  NOITE

O VELHO LIBERATO BEBIA UM COPO DE LEITE E OUVIA INTERESSADO AS PALAVRAS DO FILHO. BABY ANDAVA DE UM LADO PARA OUTRO NO CENTRO DA SALA.

BABY  -  Acho que o senhor tem que saber de uma coisa. No princípio eu estava muito chaterado com a idéia de assumir um cargo tão importante. Tive que romper com uma série de coisas que me agradavam...

COMENDADOR LIBERATO  -  E daí?

BABY  -  Pois é. Tudo isso me aborreceu demais. Porque eu tenho uma maneira de ser e não gosto de mudar. Agora, faço questão absoluta de assumir o cargo, o quanto antes!

LIBERATO QUASE CHOROU DE ALEGRIA.

COMENDADOR LIBERATO  -  (dirigiu-se à governanta, num misto de felicidade e orgulho) Veja se ele está com febre, Zoraida!

ZORAIDA  -  (erguendo as mãos para o céu) Que coisa boa, minha Nossa Senhora! Meu menino criou juízo!

CORREU A ABRAÇAR O RAPAZ QUE SE DESVIOU, FUGINDO AOS EXCESSOS EMOCIONAIS DA EMPREGADA.

BABY  -  Pombas! (num tom zombeteiro) Não é nada disso! É que eu resolvi abrir uma guerra contra aquele salafrário, aquele patife do meu primo Otto!

COMENDADOR LIBERATO  -  Menos mal. Até que enfim você compreendeu alguma coisa importante.

BABY  -  Aquele cachorro dos infernos está pensando que pode me passar para trás...

COMENDADOR LIBERATO  -  (exultava) Sua reação é muito boa, filho. Já tenho a impressão de estar falando com alguém que possui uma alma, um coração, enfim... alguém que tem sangue nas veias. Antes, você me parecia um boneco.

BABY  -  (explodiu) Droga! Não é nada disso! Não estou preocupado se sou boneco ou gente! Quero saber quando é que eu vou assumir a porcaria daquele cargo pra poder enfrentar o Otto. Quero esmagar aquele verme careca!

COMENDADOR LIBERATO  -  Quinta-feira faremos a assembléia. Dias depois você assumirá.

BABY  -  Eu vou mandar naquela droga! Otto vai ver uma coisa!

COMENDADOR LIBERATO  -  Otto está precisando de uma boa lição! Uma lição de que não se esqueça jamais... jamais.

CORTA PARA:

CENA 2  -  FLORIANÓPOLIS  -  RUA  -  EXTERIOR  -  NOITE

NUNCA O MALVADO SUPERINTENDENTE PODERIA SABER COMO E POR QUE PERDERA DE VISTA, TÃO DE REPENTE, O CARRO QUE SEGUIA. ESTER MANOBROU PARA A DIREITA E, SE APROVEITANDO DE UM TRECHO AINDA NÃO ILUMINADO, APAGOU AS LUZES DO CARRO ENVEREDANDO POR UMA ESTRADA DE ACESSO À PRINCIPAL, QUE JÁ CONHECIA ANTERIORMENTE. MAIS ALGUMAS CENTENAS DE METROS E SAIRIA POR TRÁS DO CARRO DO EX-MARIDO, EM SENTIDO CONTRÁRIO.

CORTA PARA:

CENA 3  -  MANSÃO DE OTTO MULLER  -  QUARTO DE ESTER  -  INTERIOR  -  NOITE

COM UM SENTIMENTO DE VITÓRIA, MAS COM UMA RÉSTIA DE MEDO, ESTER FUMAVA NO QUARTO, ENQUANTO AGUARDAVA A VISITA INEVITÁVEL DE OTTO MULLER.

OS PASSOS NA ESCADA ADVERTIRAM-NA. ERA CHEGADA A HORA. ACENDEU A LUZ ÀS PRIMEIRAS BATIDAS FORTES CONTRA A MADEIRA DA PORTA. ABRIU-A, COM OLHAR TEMEROSO.

OTTO  -  (entrou e se sentou na poltrona) Assustada?

ESTER  -  O que você quer de mim?

OTTO  -  Fazia tempo que não tínhamos um encontro assim... a sós.

ESTER  -  Por que me seguiu?

OTTO  -  (levantou-se para preparar um drinque) Você... saiu para se encontrar com um homem. Alguém que está virando totalmente sua cabeça. De algum tempo para cá venho notando. Você não é mais a mesma. Está diferente. Há um brilho estranho nos seus olhos.  Deixam transparecer um fogo interior. Eu já havia notado. Fiquei calado esperando que você me confessasse seus amores com outro homem.

ESTER  -  Eu não tenho de lhe dar satisfações dos meus sentimentos. Nem dos meus atos.

OTTO  -  (sorriu friamente) Deixou-o esperando, hem? Isto não é nada delicado! (foi até o telefone e retirou-o do gancho com um movimento rápido) Avise-o... que você não irá... porque teve medo do seu ex-marido.

ESTER  -  (enfiou o aparelho no descanso, com raiva) Eu só faço o que acho que devo fazer. Não é preciso que você ordene.

OTTO  -  (ironizou) Estou sendo... condescendente, compreensivo...

ESTER  -  O que você pretende, Otto? O que você pretende?

HOUVE UMA PAUSA INQUIETANTE ANTES QUE OTTO MULLER ENCHESSE OS COPOS DE UÍSQUE E SE SENTASSE NA POLTRONA, COM AS PERNAS CRUZADAS, DEMONSTRANDO ABSOLUTA TRANQUILIDADE.

OTTO  -  Quem é ele, Ester? Não pode dizer... ou não quer?

ESTER  -  Não quero. Não devo. Sei que você está com alguma idéia na cabeça.

OTTO  -  (riu zombeteiramente) O que seria de um homem sem idéias?

ESTER  -  Idéias contra mim!

OTTO  -  Quero guiá-la, orientá-la. Você pode ter se apaixonado por alguém que não a merece...

ESTER  -  Ele merece...

OTTO  -  Quem?

ESTER  -  O melhor homem do mundo.

OTTO  -  Confessa que está apaixonada?

ESTER  -  Se era isto que queria ouvir... confesso. Estou sim, estou apaixonada. Encontrei alguém para me tirar do inferno em que eu vivo. Minha vida agora tem um sentido e se você fosse um sujeito normal, se tivesse um pingo de humanidade, compreenderia agora que eu tenho direito... direito de procurar uma felicidade que até hoje me foi negada...

OTTO  -  (bebendo um trago da bebida) Quem é ele?

ESTER  -  Eu não vou dizer, Otto.

OTTO  -  (explodiu, num berro) Droga! Está com medo?

ESTER  -  O que você pretende, Otto? O quê?

OTTO  -  Não aceitar este papel que você quer me impor, Ester!

ESTER  -  Papel de quê, se não existe nada entre nós? Se nunca existiu, Otto?

OTTO  -  Você foi minha mulher, isto não quer dizer nada?

ESTER  -  Fui! Não sou mais! Estamos legalmente separados! Por que acha que pode me escravizar, Otto? Que direitos você tem de impedir um outro homem na minha vida?

OTTO  -  Reconheço que não tenho direitos, mas não quero, pronto!

ESTER  -  (sorriu, irônica) Ah, não quer? Não quer por quê? Porque é um fanático egoísta... porque isto fere a sua vaidade... porque atinge profundamente o seu orgulho.

OTTO  -  Que seja! Por isto e por muitas outras coisas! E é bom você se recordar de que a única vez que isto aconteceu, as coisas não acabaram bem.

ESTER  -  (indignada) Você está falando de Otávio Sales?

OTTO  -  Justamente. Falo do aviador.

ESTER  -  Então você confessa que mandou matá-lo?

OTTO  -  Não estou confessando nada! Mas também não quero dizer que o mesmo não vá acontecer com esse seu novo caso!

ESTER  -  (sentindo a ira dominá-la por inteiro) Isto é uma ameaça, Otto?

OTTO  -  É. É uma ameaça, Ester!

APÓS UM SILENCIO DEMORADO, APERTANDO PERIGOSAMENTE A TAÇA DE BEBIDA, OTTO BEBEU UM GOLE E SE SERVIU DE OUTRA DOSE. ESTAVA DE COSTAS PARA A MULHER, PERPLEXA. AO SE VIRAR, ESTAVA NOVAMENTE CALMO, COM A VOZ CONTROLADA E MANSA.

OTTO  -  Uma viagem... será interessante. Ajudará você a esquecer. É interessante para todos nós... principalmente para o seu novo apaixonado... que você esqueça definitivamente... e coloque um ponto final nesta aventura. A partir deste momento. ( colocou o copo sobre a mesa de centro e abriu a porta para deixar o aposento) É uma ordem, Ester!

FIM DO CAPÍTULO 33

 NÃO PERCA, NA PRÓXIMA TERÇA, CAPÍTULO INÉDITO!

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