Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 36
Participam deste
capítulo
Baby -
Claudio Cavalcanti
Otto -
Jardel Filho
Ricardo -
Edney Giovenazzi
Paulus -
Emiliano Queiroz
Comendador
Liberato - Macedo Neto
Catarina -
Lidia Mattos
Lia -
Arlete Salles
Pedrão - Waldir Onofre
Daniel -
Paulo Araújo
Pé-na-Cova -
Antonio Pitanga
CENA
1 -
PÁTIO DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS
- EXTERIOR - DIA
OS MINEIROS DEIXARAM O SUBSOLO E AGORA SE REUNIAM NO
PÁTIO DA ADMINISTRAÇÃO PARA DAR AS BOAS-VINDAS AO NOVO PRESIDENTE. ORGULHOSO,
BRINCALHÃO, BABY ERA ABRAÇADO POR TODOS, ENQUANTO SE DIRIGIA DO CARRO ATÉ AOS
ESCRITÓRIOS. UM MENINO PRESENTEOU-O COM UM RAMO DE ROSAS VERMELHAS. BABY
BEIJOU-LHE A CABEÇA, ENQUANTO LHE DAVA DINHEIRO, DE PRESENTE. MAIS ADIANTE A
BANDINHA EXECUTAVA UM DOBRADO.
CORTA PARA:
CENA
2 -
ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS
- INTERIOR - DIA
O PRESIDENTE ENTROU, FINALMENTE, NOS ESCRITÓRIOS DA
ADMINISTRAÇÃO. TINHA VIVA NA MEMÓRIA A HUMILHAÇÃO POR QUE PASSARA E AS PALAVRAS
GROSSEIRAS DO PRIMO. TUDO AGORA ESTAVA MUDADO. HAVIA FLÔRES EM TODAS AS DEPENDÊNCIAS
DO ESCRITÓRIO E O PESSOAL O APLAUDIA, DE PÉ. BABY ENTROU NA SALA DO SUPERINTENDENTE. RICARDO E OTTO CONVERSAVAM.
PAULUS SE MANTINHA CALADO, AO LADO DA JANELA.
OTTO - Você... pretende dirigir as minas... daqui?
BABY - (notou certa intranquilidade no primo) Daqui,
dos escritórios da Companhia, da cidade... até lá de baixo, das galerias... vou
dirigir de todos os lugares (notou que os olhos do alemão refletiam ódio) Vamos
lá ver os galhos.
BABY AJEITOU-SE NA CADEIRA E COMEÇOU A EXAMINAR A
PAPELADA.
OTTO - Os... galhos...
são muitos...
BABY - Vamos lá. Quero saber como está a situação
dos mineiros.
RICARDO - (interveio, com oportunismo) Ontem, sete
mineiros foram despedidos.
BABY - Ah, sim, eu soube. Meu primo está querendo
fazer economia de operários?
OTTO - Não é isso. São sete criminosos. Tentaram
matar o capataz.
BABY - Está provado que foram eles?
OTTO - Bem... os sete negaram na polícia.
BABY - (leu, como que pensando alto, a mão enterrada
nos cabelos) Hum... são sete, hem! Lucas... Cesário... Daniel... Luís
Martins... Pedro... Valdomiro e... Camargo. Muito bem.
BABY OLHOU DISCRETAMENTE PARA O ENGENHEIRO, ENQUANTO
PEGAVA DA CANETA E DAVA A ENTENDER QUE ASSINARIA A DEMISSÃO.
OTTO - Todos eles teriam direito à indenização, mas
o afastamento é por justa causa.
RICARDO - Os sete mineiros estão lá fora, aguardando a
sua decisão.
BABY - (ergueu os olhos para o primo) Taí, é o tipo
do negócio que não tenho vontade nenhuma de fazer. Assinar estas carteiras e
despedir os homens.
OTTO - Mas... é necessário. São... bandidos que
amanhã podem fazer o mesmo comigo, com você!
BABY TOMOU A DECISÃO DEFINITIVA ANTE A ESTUPEFAÇÃO DOS
PRESENTE, À EXCESSÃO DE RICARDO, QUE ÌNTIMAMENTE CONHECIA O PENSAMENTO DO
AMIGO.
BABY - Eu não vou assinar. É definitivo!
OTTO - (explodiu) Não assinando, você me
desautoriza!
BABY - Pois eu o desautorizo. Vou readmitir os
empregados.
OTTO - Mas... por quê? Só pelo prazer de me
espicaçar?
BABY - Não. Porque... acho que esses homens não
merecem ser despedidos. Todos eles tem mais de 10 anos de trabalho, aqui.
Enterraram a vida inteira para enriquecer a gente. Muitos estão doentes. Exceto
este... Cesário... todos são antigos nas minas (voltou-se para o engenheiro)
Readmita todos eles, Dr. Ricardo. Continuam sendo nossos empregados.
RICARDO - Os... os sete, Baby?
BABY - É. Os sete.
OTTO - (berrou) Isto não pode ficar assim!
BABY ENTREGOU-LHE AS CARTEIRAS, ENFIANDO-AS QUASE NAS
MÃOS SARDENTAS DO PRIMO.
BABY - Manda de volta para o Departamento de
Pessoal. (dirigiu-se ao engenheiro) Vá dar a notícia pros homens. E olhe, todo
mundo está convidado pra festa de hoje à noite na Associação dos Mineiros, aqui
em Valongo. Chope pra todo mundo... (virou-se para o superintendente, que
espumava) Alguma objeção?
OTTO - Você está brincando com fogo, Baby!
O RAPAZ SORRIU, INDIFERENTE. RETIROU UMA ROSA VERMELHA
DO RAMO SOBRE A MESA E CHEIROU-A, ALHEIO AO ÓDIO QUE SE REFLETIA NAS FEIÇÕES DO
HUMILHADO SUPERINTENDENTE DA COMPANHIA.
CORTA PARA:
CENA
3 -
PÁTIO DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS
- EXTERIOR - DIA
COM OS OLHOS VIDRADOS NA PORTA DA ADMINISTRAÇÃO, OS
SETE MINEIROS AGUARDAVAM A ENTREGA DAS CARTEIRAS PROFISSIONAIS COM A ANOTAÇÃO
DE SAÍDA, SEM DIREITO A NADA. PEDRÃO AVISTOU A PORTA ABRIR-SE E O ENGENHEIRO
DIRIGIR-SE A ELES, EM PASSOS APRESSADOS.
PEDRÃO - Cadê as nossas carteira?
RICARDO - (não podia controlar a satisfação) Vocês... estão
readmitidos!
OS HOMENS EMPALIDECERAM E, COMO ACIONADOS POR UM SÓ
DISPOSITIVO, EXPLODIRAM NUM GRITO DE ALEGRIA.
DANIEL - Verdade mesmo, doutô?
RICARDO - Verdade!
PÉ-NA-COVA
- (bradou) Viva o novo Presidente
da Companhia!
O CÔRO ACOMPANHOU-O, SEGUIDO POR CENTENAS DE OUTROS
MINEIROS ESPALHADOS PELO PÁTIO DA ADMINISTRAÇÃO.
MINEIROS - Viva!
RICARDO - Atenção, pessoal! Atenção! Olhem! O novo
presidente da Companhia convida vocês todos para a festa de hoje à noite na
sede da Associação. Não quer que ninguém falte!
OS HOMENS EXPLODIRAM NUM URRO ENSURDECEDOR.
CORTA PARA:
CENA
4 -
PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO
- SALA -
INTERIOR - NOITE.
ENQUANTO A FESTA CHEGAVA AO AUGE, NA ASSOCIAÇÃO DOS
MINEIROS, A VELHA CATARINA, ACOMPANHADA, COMO SEMPRE, PELA SECRETÁRIA DO FILHO,
DECIDIU AVISTAR-SE COM O COMENDADOR, SEU IRMÃO.
O VELHO MILIONÁRIO RECEBEU-A, COM FRIEZA.
COMENDADOR LIBERATO
- (sem interesse) O que a traz
aqui?
CATARINA - Você não foi à festa... da posse do seu
filho?
COMENDADOR LIBERATO
- Você sabe que sou um homem
doente, minha irmã. Mas o que aconteceu com vocês para virem aqui a estas
horas?
LIA - Estamos muito preocupadas, comendador.
COMENDADOR LIBERATO
- Ora essa, com quê?
LIA - Com a sorte do Sr. Otto.
COMENDADOR LIBERATO
- Como assim?
CATARINA - (com um gesto antipático) Não se faça de
ingênuo. Você sabe muito bem a que nós nos referimos, Augusto. Queremos saber
se você pretende prejudicar meu filho.
COMENDADOR LIBERATO
- Catarina, não sei o que você
entende por prejudicar. Acho que no caso o maior prejudicado fui eu. Dei carta
branca ao seu filho e ele estava transformando as minhas minas quase numa
senzala. Oprimindo os empregados para tirar vinganças pessoais...
LIA - Se o senhor está se referindo ao caso dos
sete mineiros, deve ter sido mal informado. Eles são acusados de terem tentado
matar um capataz.
COMENDADOR LIBERATO
- E por que fizeram isso? Porque
o capataz usava com eles a mesma violência...
CATARINA - Você defende os agressores?
COMENDADOR LIBERATO
- Não, não. Em absoluto. Mas
quero acusar Otto de ter iniciado esta questão. E não foi o primeiro caso. Sou
contra as atitudes extremas de Otto. Sou contra os métodos que ele usa para
lidar com os empregados.
CATARINA - (contorcia-se em ira) Muito bem. Você já
disse claramente o que pensa a respeito do meu filho. Agora eu quero saber
também, honestamente, o que você pretende fazer com relação a ele.
COMENDADOR LIBERATO
- (com sinceridade) Preciso dele.
Fora seu gênio, é um homem de trabalho, bom administrador, reconheço. Seu cargo
será o mesmo, é evidente, porém...
LIA - Porém?
COMENDADOR LIBERATO
- Não com a mesma força de antes.
Ele apenas receberá ordens.
O ROSTO DA VELHA SE TRANSFORMOU NUMA MÁSCARA DE RAIVA.
REMEXEU, COM MÃOS NERVOSAS, O FUNDO DA BOLSA DE COURO. RETIROU UM PAPEL
AMARELADO PELO TEMPO.
CATARINA - Pois muito bem, Augusto. Eu vim lhe trazer
isto... uma carta do nosso pai... para você relembrar certas coisas.
COMENDADOR LIBERATO
- (tomou-lhe a carta, apreensivo)
O que é?
CATARINA - Jamais mostrei a você e nunca mostrarei a
ninguém. Leia. Faço uso dela... em último recurso... quase em desespero de
causa... para que você saiba... para que tenha absoluta certeza... de que meu
filho não será afastado do cargo... e deve continuar com a mesma força de
antes.
À MEDIDA QUE LIA A CARTA, O COMENDADOR FICAVA PÁLIDO,
LÍVIDO COMO ALGUÉM SURPREENDIDO POR UM FANTASMA. ALGO DE MUITO IMPORTANTE
ESTAVA ENCERRADO NAS LINHAS ESCRITAS POR UM HOMEM HÁ MUITOS ANOS ATRÁS. O
TRUNFO DA VELHA CATARINA PARECIA SER DEFINITIVO.
CORTA PARA:
CENA
5 -
PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO
- QUARTO DO COMENDADOR -
INTERIOR - DIA.
DOIS DIAS DEPOIS, BABY, COM AS VESTES SUJAS DE CARVÃO, PROCUROU O PAI, NERVOSAMENTE.
BABY - Preciso falar com o senhor.
COMENDADOR LIBERATO
- Esteve nas minas?
BABY - Estive lá e me disseram que Otto continua
dando aquelas ordens absurdas dele. Eu vou botar ele pra correr. É isto que vim
avisar.
COMENDADOR LIBERATO
- Sente-se, meu filho. Queria
mesmo lhe falar sobre isso.
BABY - Há algum impedimento? Como é esse negócio de
acionista? Me explica, não saco nada. Se ele não pode ser jogado fora, a gente
dá umas férias pra ele, ou licença, pra nunca mais voltar.
COMENDADOR LIBERATO
- Não pode ser assim, Baby!
BABY - Não pode como? Não tínhamos combinado que a
primeira coisa que eu ia fazer era dar um chute no Otto?
COMENDADOR LIBERATO
- Você não pode dar chute nele.
Você não pode fazer nada disso...
BABY - (intrigado, curioso) Mas, por quê?
COMENDADOR LIBERATO
- Porque... porque você ainda não
tem experiência de direção... depende muito dele. Pelo menos no princípio...
BABY - Ricardo está me assessorando. Ele entende das
minas muito mais do que Otto!
COMENDADOR LIBERATO
- Entende de minas... não de dirigir
uma Companhia, Baby!
BABY - (espalmou as mãos sobre as pernas) Bom...
então volta tudo à estaca zero! Este espalhafato todo pra eu assumir a direção
e depois as coisas voltam a ser as mesmas de antes!
COMENDADOR LIBERATO
- Ainda dependemos de Otto.
Convença-se disso e... assunto encerrado!
BABY - (colérico) Essa não! Essa não! Vai me dizer
que ele vai ter a mesma autoridade de antes?
COMENDADOR LIBERATO
- (o rosto sombrio como se
noticiasse a morte de um parente) Sim. Otto tem de continuar com a mesma força
de antes. É claro que você pode lhe cortar uns excessos... mas as coisas... não
podem ser mudadas como pensávamos... assim... tão de repente. Tão...
radicalmente.
SEM MAIS PALAVRAS, O VELHO COMENDADOR AFASTOU-SE DA
SALA, IGNORANDO A REAÇÃO VIOLENTA DO FILHO. BABY ATIROU NO CHÃO UM VASO DE
CRISTAL QUE ADORNAVA O CENTRO DA MESINHA DE MÁRMORE.
FIM DO
CAPÍTULO 36
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