Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 32
Participam deste
capítulo
Ester -
Gloria Menezes
Otto -
Jardel Filho
Paulus -
Emiliano Queiroz
Baby -
Claudio Cavalcanti
Tula -
Lúcia Alves
Ricardo -
Edney Giovenazzi
Catarina -
Mirian Pires
Valter Carpinelli/
Coice de Mula - Dary Reis
Cesário -
Carlos Eduardo Dolabella
CENA
1 -
MINAS - ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO -
INTERIOR - DIA
CESÁRIO TINHA A CARA PRETA DE PÓ DE CARVÃO E O SUOR A
LHE ESCORRER PELO ROSTO IMUNDO. LÁ FORA O SOL QUEIMAVA.
CESÁRIO - Mandou me chamar, patrão?
OTTO - Sabe que temos novidades, não sabe?
CESÁRIO - (mentiu) Não sei de nada. Por quê? Aconteceu
alguma coisa?
OTTO - (quase rugindo) Não tente me enganar! Você
sabe muito bem o que aconteceu ao Carpinelli!
CESÁRIO - Não, senhor. Tá doente?
FOI ENTÃO QUE CAROLINA, A ESPOSA DE COICE DE MULA
ENTROU NA CONVERSA. ATÉ AÍ ESTIVERA CALADA, RECOLHIDA A UM CANTO DA PEQUENA
SALA-ESCRITÓRIO DO SUPERINTENDENTE DAS MINAS.
CAROLINA - Deram uma surra no meu marido! (choromingou)
Quase mataram ele! Tá lá em casa, quase morto, todo arrebentado. Foi uma surra
pra matá!
CESÁRIO - (engoliu em sêco) Su... surra?! Como?
OTTO - Vários homens lhe prepararam uma emboscada,
covardemente, ontem à noite. Para matá-lo.
CESÁRIO - É mesmo? Mas, quem?
CAROLINA - Válter num viu... Foi agarrado por trás e
taparo os olhos dele!
OTTO - Mandei medicá-lo e já dei parte na polícia.
(bateu o punho na mesa) Vão investigar o atentado, mas, se você sabe de alguma
coisa, deve dizer imediatamente.
CESÁRIO - (estremeceu) Eu não sei! Como podia sabê,
patrão?
OTTO - Pois procure saber. Para isso está sendo
pago. Você está no meio deles. Tente descobrir até amanhã quem são os autores
da covardia. (espetou o dedo no tórax do rapaz) Se apontar os culpados, será
promovido. Se não apontar, estará despedido. Pode voltar ao trabalho. E ôlho
vivo...
CESÁRIO SAIU, SEM DIZER PALAVRA.
CORTA PARA:
CENA
2 -
MINAS - EXTERIOR
- DIA
JUNTO À ENTRADA DA MINA OS GRUPOS SE REUNIAM PARA
COMENTAR OS ASSUNTOS DA COMUNIDADE. NAQUELE DIA O PRATO SE REFERIA À SURRA QUE
COICE DE MULA LEVARA DE UM BANDO DE DESCONHECIDOS.
BABY LIBERATO ACOMPANHAVA TULA E O DR. RICARDO QUE SE
DIRIGIAM AO ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO. VIRAM QUANDO CESÁRIO DEIXOU O LOCAL,
ACABRUNHADO, COM AS FEIÇÕES ESTRANHAMENTE DEFORMADAS PELA PREOCUPAÇÃO.
BABY - (dirigiu-se ao engenheiro) ...espera lá,
Ricardo. Não precisa de permissão do meu primo. Eu quero que Tula pratique
enfermagem no nosso ambulatório. E daí?
RICARDO - Acho melhor falar antes com Otto, Baby.
BABY - Que nada! Estou te dizendo! Eu mando nesta
porcaria ou não mando? Que é que há?
TULA - (apreensiva) Sei lá. Teu primo é tão
esquisito! É capaz de pensar que estamos passando sobre a autoridade dele.
BABY - Vai por mim. Vai lá e diz que você vai
praticar enfermagem (apontou o ambulatório a uns 40 metros do barracão) Diz que
é estudante de medicina, vai. (empurrou a moça, estimulando-a) Diga ao Dr.
Otacílio que o Baby mandou.
RICARDO - Me espera lá, minha filha. Vou falar com o
Otto e já te encontro no ambulatório.
TULA AFASTOU-SE RUMO AO AMBULATÓRIO DE TIJOLOS, SEM
PINTURA E COM AS PORTAS E JANELAS PINTADAS DE BRANCO, COM UMA CRUZ VERMELHA, À
ENTRADA.
RICARDO E BABY ENTRARAM NO ESCRITÓRIO DO
SUPERINTENDENTE.
CORTA PARA:
CENA
3 -
MINAS - ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO -
INTERIOR - DIA
OTTO EXPLODIU À PRIMEIRA PALAVRA DO FUTURO PRESIDENTE
DA COMPANHIA.
OTTO - Afinal, não sou mais ninguém aqui dentro? Sou
um boneco? Marionete?
BABY - (irritado) Não é nada disso. Eu disse que a
moça podia praticar enfermagem no ambulatório.
Qual é o problema?
OTTO - (gritou, vermelho de raiva) É que eu ainda
mando nesta joça! E as coisas não podem ser decididas sem a minha autorização!
Por enquanto, você não é nada aqui dentro! Nada!
BABY - (abriu as duas mãos, com as palmas para a
frente) Pera lá, Otto! Pera lá, rapaz! Mais respeito!
RICARDO - Sr. Otto... desculpe-me, mas... também... não
é assim. Ninguém tentou desautorizar o senhor.
OTTO - (ignorou a intervenção do engenheiro,
inteiramente descontrolado) Você ainda é apenas o filho do presidente da
Companhia! Portanto, não tem sequer o direito de estar aqui!
BABY - (fuzilava de raiva) Vamos com calma, Otto!
OTTO - Pode se quixar ao seu paizinho! Mas, enquanto
você não assumir o cargo... quem manda aqui sou eu! Eu sozinho, entendeu! E é
bom que vá indo embora!
BABY - (encarou-o, desafiador) Você vai se
arrepender, Otto! E não vai demorar, não! Lembre-se disso!
COM O SANGUE FERVENDO NAS VEIAS, BABY VIROU-LHE AS
COSTAS E AFASTOU-SE DO BARRACÃO. SEGUNDOS DEPOIS, ACELERAVA O CARRO ESPORTE E
PARTIA, ESTRADA À FORA, RUMO À CIDADE.
CORTA PARA:
CENA 4
- MINAS
- ESCRITÓRIO DA
ADMINISTRAÇÃO - INTERIOR
- DIA.
DIAS DEPOIS...
O ROSTO DE COICE DE MULA ERA UM AMONTOADO DE CONTUSÕES
E NO ALTO DA CABEÇA, PROTEGIDA POR UM CURATIVO, A FERIDA MAIS GRAVE DOÍA-LHE,
APESAR DA ANESTESIA APLICADA PELO MÉDICO.
ABAIXO DO OLHO DIREITO,
ARROXEADO, O SANGUE PISADO ADQUIRIA UM ASPECTO FEIO, DE LUTADOR
NOCAUTEADO.
CAROLINA E RICARDO OUVIAM O DEPOIMENTO QUE O CAPATAZ
PRESTAVA AO SUPERINTENDENTE DAS MINAS.
OTTO - Você não conseguiu ver nada, nada?
COICE DE MULA
- Nada, patrão! Nada, mesmo! A
polícia teve lá em casa e fizero muita pergunta. Mas, como é que vão
descobri... em quinhentos e tantos trabalhadô... aqueles que tentaro me matar?
OTTO - Acontece que não são os quinhentos e tantos.
Sabemos que existem alguns suspeitos.
RICARDO - Quem?
OTTO - Ora, quem? A turma do Pedrão! Está mais do
que evidente! A gangue daquele negro ladrão!
RICARDO - Acho que nada está evidente. Ninguém pode
acusar sem provas. Outras pessoas que odeiam Carpinelli podiam ter-se
aproveitado do incidente com Pedrão, para que a culpa recaísse sobre ele.
OTTO - (berrou) Ninguém estava na rua naquele
momento! É uma graça! Ninguém pode testemunhar nada, nada!
CAROLINA - Foi meu filho, Vanderley, quem socorreu o
pai. Os home fugiro quando viro ele.
OTTO - E o menino será um débil mental que não pode
reconhecer os bandidos? Coloquem todos os mineiros, um por um, diante do
garoto...
CAROLINA - (benzeu-se) Meu menino... não enxerga,
patrão!
OTTO - Ah, o menino é cego!
VÁLTER CARPINELLI CONFIRMOU COM A CABEÇA, TRISTE.
CORTA PARA:
Otto (Jardel), Coice de Mula (Dary Reis), Carolina (Mirian Pires) e Ricardo (Edney Giovenazzi) |
CENA
5 -
FLORIANÓPOLIS - RUA
- EXTERIOR -
NOITE
A CHUVA ESCORRIA PELO PÁRA-BRISA DO CARRO, ENQUANTO
OTTO DIRIGIA COM HABILIDADE
PELAS RUAS VAZIAS
DA CAPITAL. PAULUS FUMAVA, EMBAÇANDO O VIDRO COM A FUMAÇA ARRANCADA DOS
PULMÕES. NUMA MANOBRA ÁGIL O MILIONÁRIO COLOCOU O CARRO NUMA DAS RUAS
TRANSVERSAIS À DE SUA RESIDENCIA. DESLIGOU O MOTOR E APAGOU OS FARÓIS.
PAULUS - Por que parou aqui?
OTTO - Vou esperar Ester sair. Ela tem encontro com
alguém.
PAULUS - Como sabe?
OTTO - Eu sei. (olhou o relógio de pulso e o portão
de ferro, por onde o carro de Ester deveria sair a qualquer instante) Você não
sabe quem é o sujeito com quem ela vai se encontrar?
PAULUS - (mentiu) Não, eu não sei de nada.(ajeitou-se
para sair do automóvel, e recolheu a capa no banco traseiro) Vou tomar outro
rumo, Otto!
OTTO - (segurou-o pelo ombro, imobilizando-o) Que
foi que descobriu acêrca da filha do pescador?
PAULUS - Ela tentou se matar porque Baby lhe deu um
fora. Pode-se tirar conclusões do que houve entre eles.
OTTO - Ótimo. Traga a moça, amanhã, à minha
presença. Não posso esperar mais do que um dia para arrasar com o Baby!
PAULUS - Está bem, Otto, até já!
O ADVOGADO ABRIU A PORTA E SAIU DO CARRO. A CHUVA
DIMINUÍRA UM POUCO. SEM SER PERCEBIDO E APROVEITANDO A ESCURIDÃO AMBIENTE,
PAULUS DEU A VOLTA AO QUARTEIRÃO INGRESSANDO NO PALACETE PELO PORTÃO DOS
FUNDOS. AGORA, SE DEFRONTAVA COM ESTER, VESTIDA COM UM COSTUME DE LÃ POR BAIXO
DE UMA CAPA NEGRA. PROCURAVA NA BOLSA A CHAVE DO AUTOMÓVEL.
PAULUS - Ester!
ESTER - (ergueu a cabeça, assustada) O que você quer?
PAULUS - Aonde você vai? Não é preciso dizer, escute,
apenas. Você não deve sair. Otto está escondido na esquina e vai seguir você.
ESTER - (fez um muxôxo) Não diga, doutor!
PAULUS - Você não acredita?
ESTER - Claro que não!
PAULUS - (insistiu, aflito, olhando para a porta de
entrada) Ele sabe que você vai ao encontro de alguém. Quer descobrir quem é.
Pegá-la em flagrante...
ESTER - Eu não tenho de dar conta dos meus atos a
esse homem.
PAULUS - Você não tem. Mas ele acha o contrário. Como
é que você vai se arranjar se ele cismar de perseguir o Dr. Cyro? Lembra-se do
aviador?
ESTER - (estremeceu ao ouvir a referência ao homem
assassinado) Otto não se atreveria a fazer isso!
PAULUS - Você conhece Otto melhor do que ninguém!
ESTER - E você... por que está bancando o bonzinho?
PAULUS - (olhou-a com um misto de amor e adoração)
Sabe que eu só quero te proteger. Não é o Dr. Cyro que me interessa. É você,
Ester!
SEM DAR ATENÇÃO AO AVISO, ESTER GIROU A MAÇANETA E
SAIU, ENTROU NO CARRO E RODOU A CHAVE. O MOTOR ATENDEU DE PRONTO. ESTER
ACELEROU ENQUANTO DEBREAVA CALMAMENTE. O AUTOMÓVEL DESLOCOU-SE POR ENTRE OS
PINGOS DE CHUVA, QUE AUMENTARA DE INTENSIDADE.
DO LADO OPOSTO, ESCONDIDO NA PEQUENA RUA TRANSVERSAL,
OTTO MULLER VIU O CARRO APONTAR NO PORTÃO, DESCER A CALÇADA E PASSAR À SUA
FRENTE, EM MARCHA REDUZIDA. LIGOU SEU POTENTE MOTOR E SEGUIU À DISTANCIA O
AUTOMÓVEL DA MULHER.
FIM DO
CAPÍTULO 32
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