quinta-feira, 17 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 32


Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 32

Participam deste capítulo
Ester  -  Gloria Menezes
Otto  -  Jardel Filho
Paulus  -  Emiliano Queiroz
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Tula  -  Lúcia Alves
Ricardo  -  Edney Giovenazzi
Catarina  -  Mirian Pires
Valter Carpinelli/ Coice de Mula  -  Dary Reis
Cesário  -  Carlos Eduardo Dolabella

CENA 1  -  MINAS  -  ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO  -  INTERIOR  -  DIA

CESÁRIO TINHA A CARA PRETA DE PÓ DE CARVÃO E O SUOR A LHE ESCORRER PELO ROSTO IMUNDO. LÁ FORA O SOL QUEIMAVA.

CESÁRIO  -  Mandou me chamar, patrão?

OTTO  -  Sabe que temos novidades, não sabe?

CESÁRIO  -  (mentiu) Não sei de nada. Por quê? Aconteceu alguma coisa?

OTTO  -  (quase rugindo) Não tente me enganar! Você sabe muito bem o que aconteceu ao Carpinelli!

CESÁRIO  -  Não, senhor. Tá doente?

FOI ENTÃO QUE CAROLINA, A ESPOSA DE COICE DE MULA ENTROU NA CONVERSA. ATÉ AÍ ESTIVERA CALADA, RECOLHIDA A UM CANTO DA PEQUENA SALA-ESCRITÓRIO DO SUPERINTENDENTE DAS MINAS.

CAROLINA  -  Deram uma surra no meu marido! (choromingou) Quase mataram ele! Tá lá em casa, quase morto, todo arrebentado. Foi uma surra pra matá!

CESÁRIO  -  (engoliu em sêco) Su... surra?! Como?

OTTO  -  Vários homens lhe prepararam uma emboscada, covardemente, ontem à noite. Para matá-lo.

CESÁRIO  -  É mesmo? Mas, quem?

CAROLINA  -  Válter num viu... Foi agarrado por trás e taparo os olhos dele!

OTTO  -  Mandei medicá-lo e já dei parte na polícia. (bateu o punho na mesa) Vão investigar o atentado, mas, se você sabe de alguma coisa, deve dizer imediatamente.

CESÁRIO  -  (estremeceu) Eu não sei! Como podia sabê, patrão?

OTTO  -  Pois procure saber. Para isso está sendo pago. Você está no meio deles. Tente descobrir até amanhã quem são os autores da covardia. (espetou o dedo no tórax do rapaz) Se apontar os culpados, será promovido. Se não apontar, estará despedido. Pode voltar ao trabalho. E ôlho vivo...

CESÁRIO SAIU, SEM DIZER PALAVRA.

CORTA PARA:

CENA 2  -  MINAS   -  EXTERIOR  -  DIA

JUNTO À ENTRADA DA MINA OS GRUPOS SE REUNIAM PARA COMENTAR OS ASSUNTOS DA COMUNIDADE. NAQUELE DIA O PRATO SE REFERIA À SURRA QUE COICE DE MULA LEVARA DE UM BANDO DE DESCONHECIDOS.

BABY LIBERATO ACOMPANHAVA TULA E O DR. RICARDO QUE SE DIRIGIAM AO ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO. VIRAM QUANDO CESÁRIO DEIXOU O LOCAL, ACABRUNHADO, COM AS FEIÇÕES ESTRANHAMENTE DEFORMADAS PELA PREOCUPAÇÃO.

BABY  -  (dirigiu-se ao engenheiro) ...espera lá, Ricardo. Não precisa de permissão do meu primo. Eu quero que Tula pratique enfermagem no nosso ambulatório. E daí?

RICARDO  -  Acho melhor falar antes com Otto, Baby.

BABY  -  Que nada! Estou te dizendo! Eu mando nesta porcaria ou não mando? Que é que há?

TULA  -  (apreensiva) Sei lá. Teu primo é tão esquisito! É capaz de pensar que estamos passando sobre a autoridade dele.

BABY  -  Vai por mim. Vai lá e diz que você vai praticar enfermagem (apontou o ambulatório a uns 40 metros do barracão) Diz que é estudante de medicina, vai. (empurrou a moça, estimulando-a) Diga ao Dr. Otacílio que o Baby mandou.

RICARDO  -  Me espera lá, minha filha. Vou falar com o Otto e já te encontro no ambulatório.

TULA AFASTOU-SE RUMO AO AMBULATÓRIO DE TIJOLOS, SEM PINTURA E COM AS PORTAS E JANELAS PINTADAS DE BRANCO, COM UMA CRUZ VERMELHA, À ENTRADA.

RICARDO E BABY ENTRARAM NO ESCRITÓRIO DO SUPERINTENDENTE.

CORTA PARA:

CENA 3  -  MINAS  -  ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO  -  INTERIOR  -  DIA

OTTO EXPLODIU À PRIMEIRA PALAVRA DO FUTURO PRESIDENTE DA COMPANHIA.

OTTO  -  Afinal, não sou mais ninguém aqui dentro? Sou um boneco? Marionete?

BABY  -  (irritado) Não é nada disso. Eu disse que a moça podia praticar enfermagem no ambulatório.  Qual é o problema?

OTTO  -  (gritou, vermelho de raiva) É que eu ainda mando nesta joça! E as coisas não podem ser decididas sem a minha autorização! Por enquanto, você não é nada aqui dentro! Nada!

BABY  -  (abriu as duas mãos, com as palmas para a frente) Pera lá, Otto! Pera lá, rapaz! Mais respeito!

RICARDO  -  Sr. Otto... desculpe-me, mas... também... não é assim. Ninguém tentou desautorizar o senhor.

OTTO  -  (ignorou a intervenção do engenheiro, inteiramente descontrolado) Você ainda é apenas o filho do presidente da Companhia! Portanto, não tem sequer o direito de estar aqui!

BABY  -  (fuzilava de raiva) Vamos com calma, Otto!

OTTO  -  Pode se quixar ao seu paizinho! Mas, enquanto você não assumir o cargo... quem manda aqui sou eu! Eu sozinho, entendeu! E é bom que vá indo embora!

BABY  -  (encarou-o, desafiador) Você vai se arrepender, Otto! E não vai demorar, não! Lembre-se disso!

COM O SANGUE FERVENDO NAS VEIAS, BABY VIROU-LHE AS COSTAS E AFASTOU-SE DO BARRACÃO. SEGUNDOS DEPOIS, ACELERAVA O CARRO ESPORTE E PARTIA, ESTRADA À FORA, RUMO À CIDADE.

CORTA PARA:

CENA 4 -  MINAS  -  ESCRITÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO  -  INTERIOR  -  DIA.

DIAS DEPOIS...

O ROSTO DE COICE DE MULA ERA UM AMONTOADO DE CONTUSÕES E NO ALTO DA CABEÇA, PROTEGIDA POR UM CURATIVO, A FERIDA MAIS GRAVE DOÍA-LHE, APESAR DA ANESTESIA APLICADA PELO MÉDICO.   ABAIXO DO OLHO DIREITO,  ARROXEADO, O SANGUE PISADO ADQUIRIA UM ASPECTO FEIO, DE LUTADOR NOCAUTEADO.

CAROLINA E RICARDO OUVIAM O DEPOIMENTO QUE O CAPATAZ PRESTAVA AO SUPERINTENDENTE DAS MINAS.

OTTO  -  Você não conseguiu ver nada, nada?

COICE DE MULA  -  Nada, patrão! Nada, mesmo! A polícia teve lá em casa e fizero muita pergunta. Mas, como é que vão descobri... em quinhentos e tantos trabalhadô... aqueles que tentaro me matar?

OTTO  -  Acontece que não são os quinhentos e tantos. Sabemos que existem alguns suspeitos.

RICARDO  -  Quem?

OTTO  -  Ora, quem? A turma do Pedrão! Está mais do que evidente! A gangue daquele negro ladrão!

RICARDO  -  Acho que nada está evidente. Ninguém pode acusar sem provas. Outras pessoas que odeiam Carpinelli podiam ter-se aproveitado do incidente com Pedrão, para que a culpa recaísse sobre ele.

OTTO  -  (berrou) Ninguém estava na rua naquele momento! É uma graça! Ninguém pode testemunhar nada, nada!

CAROLINA  -  Foi meu filho, Vanderley, quem socorreu o pai. Os home fugiro quando viro ele.

OTTO  -  E o menino será um débil mental que não pode reconhecer os bandidos? Coloquem todos os mineiros, um por um, diante do garoto...

CAROLINA  -  (benzeu-se) Meu menino... não enxerga, patrão!

OTTO  -  Ah, o menino é cego!

VÁLTER CARPINELLI CONFIRMOU COM A CABEÇA, TRISTE.

CORTA PARA:
Otto (Jardel), Coice de Mula (Dary Reis), Carolina (Mirian Pires) e Ricardo (Edney Giovenazzi)
CENA 5  -  FLORIANÓPOLIS  -  RUA  -  EXTERIOR  -  NOITE

A CHUVA ESCORRIA PELO PÁRA-BRISA DO CARRO, ENQUANTO OTTO DIRIGIA  COM  HABILIDADE  PELAS  RUAS  VAZIAS  DA  CAPITAL.  PAULUS  FUMAVA, EMBAÇANDO O VIDRO COM A FUMAÇA ARRANCADA DOS PULMÕES. NUMA MANOBRA ÁGIL O MILIONÁRIO COLOCOU O CARRO NUMA DAS RUAS TRANSVERSAIS À DE SUA RESIDENCIA. DESLIGOU O MOTOR E APAGOU OS FARÓIS.

PAULUS  -  Por que parou aqui?

OTTO  -  Vou esperar Ester sair. Ela tem encontro com alguém.

PAULUS  -  Como sabe?

OTTO  -  Eu sei. (olhou o relógio de pulso e o portão de ferro, por onde o carro de Ester deveria sair a qualquer instante) Você não sabe quem é o sujeito com quem ela vai se encontrar?

PAULUS  -  (mentiu) Não, eu não sei de nada.(ajeitou-se para sair do automóvel, e recolheu a capa no banco traseiro) Vou tomar outro rumo, Otto!

OTTO  -  (segurou-o pelo ombro, imobilizando-o) Que foi que descobriu acêrca da filha do pescador?

PAULUS  -  Ela tentou se matar porque Baby lhe deu um fora. Pode-se tirar conclusões do que houve entre eles.

OTTO  -  Ótimo. Traga a moça, amanhã, à minha presença. Não posso esperar mais do que um dia para arrasar com o Baby!

PAULUS  -  Está bem, Otto, até já!

O ADVOGADO ABRIU A PORTA E SAIU DO CARRO. A CHUVA DIMINUÍRA UM POUCO. SEM SER PERCEBIDO E APROVEITANDO A ESCURIDÃO AMBIENTE, PAULUS DEU A VOLTA AO QUARTEIRÃO INGRESSANDO NO PALACETE PELO PORTÃO DOS FUNDOS. AGORA, SE DEFRONTAVA COM ESTER, VESTIDA COM UM COSTUME DE LÃ POR BAIXO DE UMA CAPA NEGRA. PROCURAVA NA BOLSA A CHAVE DO AUTOMÓVEL.

PAULUS  -  Ester!

ESTER  -  (ergueu a cabeça, assustada) O que você quer?

PAULUS  -  Aonde você vai? Não é preciso dizer, escute, apenas. Você não deve sair. Otto está escondido na esquina e vai seguir você.

ESTER  -  (fez um muxôxo) Não diga, doutor!

PAULUS  -  Você não acredita?

ESTER  -  Claro que não!

PAULUS  -  (insistiu, aflito, olhando para a porta de entrada) Ele sabe que você vai ao encontro de alguém. Quer descobrir quem é. Pegá-la em flagrante...

ESTER  -  Eu não tenho de dar conta dos meus atos a esse homem.

PAULUS  -  Você não tem. Mas ele acha o contrário. Como é que você vai se arranjar se ele cismar de perseguir o Dr. Cyro? Lembra-se do aviador?

ESTER  -  (estremeceu ao ouvir a referência ao homem assassinado) Otto não se atreveria a fazer isso!

PAULUS  -  Você conhece Otto melhor do que ninguém!

ESTER  -  E você... por que está bancando o bonzinho?

PAULUS  -  (olhou-a com um misto de amor e adoração) Sabe que eu só quero te proteger. Não é o Dr. Cyro que me interessa. É você, Ester!

SEM DAR ATENÇÃO AO AVISO, ESTER GIROU A MAÇANETA E SAIU, ENTROU NO CARRO E RODOU A CHAVE. O MOTOR ATENDEU DE PRONTO. ESTER ACELEROU ENQUANTO DEBREAVA CALMAMENTE. O AUTOMÓVEL DESLOCOU-SE POR ENTRE OS PINGOS DE CHUVA, QUE AUMENTARA DE INTENSIDADE.

DO LADO OPOSTO, ESCONDIDO NA PEQUENA RUA TRANSVERSAL, OTTO MULLER VIU O CARRO APONTAR NO PORTÃO, DESCER A CALÇADA E PASSAR À SUA FRENTE, EM MARCHA REDUZIDA. LIGOU SEU POTENTE MOTOR E SEGUIU À DISTANCIA O AUTOMÓVEL DA MULHER.

FIM DO CAPÍTULO 32



Nenhum comentário:

Postar um comentário