domingo, 20 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 34


Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 34

Participam deste capítulo

Ester  -  Gloria Menezes
Cyro  -  Tarcísio Meira
Prof. Valdez  -  Enio Santos
Orjana  -  Neusa Amaral 
Clara  -  Lícia Magna
Júlia  -  Ida Gomes
Comendador Liberato  -  Macedo Neto
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Zoraida  -  Jurema Penna

CENA 1  -  PORTO AZUL  -  CASA DE BÁRBARA  -  SALA  -  INTERIOR  -  DIA

BEM OU MAL O VELHO PROFESSOR VALDEZ IA VIVENDO COMO DEUS DESEJA.  BRIGAS DIÁRIAS COM A EX-MULHER, PROBLEMAS PARA MONTAGEM DE SEU LABORATÓRIO PARTICULAR NO CASARÃO ANTIGO. E AS CONSTANTES REFERENCIAS DE BÁRBARA AO SEGUNDO ESPOSO, O ALEMÃO HANS, “UM HOMEM QUE DEUS TINHA LEVADO DO MUNDO PORQUE O MUNDO É DOS MAUS”. O PROFESSOR VALDEZ AMEAÇARA DIVERSAS VEZES FAZER AS MALAS “E BAIXAR NOUTRO TERREIRO”, NÃO FOSSE A INTERVENÇÃO SEMPRE OPORTUNA DA FILHA.

ORJANA ENCONTROU-O NO SALÃO DE ENTRADA, SENTADO A LER UMA REVISTA SOBRE ASTRONOMIA. ERGUEU A CABEÇA AO SENTIR O OLHAR DA FILHA.

PROF. VALDEZ  -  Que foi?

ORJANA  -  (os lábios trêmulos) Papai... meus pressentimentos... estão me dominando.

PROF. VALDEZ  -  (tirando os óculos) Como?

ORJANA  -  O medo que eu tenho do Cyro se envolver em situações das quais não possa se livrar. O medo de perdê-lo, pai...

PROF. VALDEZ  -  (levantou-se e abraçou a filha) Como assim?

ORJANA  -  Hoje eu soube... que Otto Muller mandou eliminar um rapaz que se apaixonou por Ester Keller.

PROF. VALDEZ  -  E daí?

ORJANA  -  Daí... pode acontecer o mesmo com Cyro. E meus pressentimentos podem se realizar...

PROF. VALDEZ  -  Mas não existe nada que prove que isto pode acontecer.

ORJANA  -  Pai, eu sabia. Se ele voltasse para cá a vida dele estaria correndo perigo. É uma coisa que eu trago dentro de mim, o senhor sabe! Não sei explicar como, nem por que, mas eu tenho medo que ele morra!

PROF. VALDEZ  -  Todos nós temos de morrer um dia!

ORJANA  -  Mas não na idade do Cyro. Me entenda, pai! Se eu morrer amanhã, já terei vivido o suficiente! Cyro, não. Ele ainda não pode morrer!

PROF. VALDEZ  -  Ora, ora, Orjana! Você está mal impressionada! Reaja contra esses pensamentos.

ORJANA  -  Papai, seja franco: o senhor acredita que Cyro não pertença a este mundo?

PROF. VALDEZ  -  (encarou-a com olhos severos) Tenho absoluta certeza!

ORJANA  -  Então que destino terá aqui?

PROF. VALDEZ  -  Um destino bom. Ele é um homem bom. O mundo de onde ele veio só reconhece a paz e ele quer transmitir isso à humanidade cá da terra. Mais nada. Pura e simplesmente isso.

ORJANA  -  Ele nasceu de maneira estranha. Tenho medo que morra da mesma maneira. Que se envolva em situações que o empurrem para este destino, compreende?

PROF. VALDEZ  -  Orjana, se for destino, nós não podemos impedir. Ninguém modifica o destino.

ORJANA  -  Eu, que sou mãe, posso. E vou impedir. Em primeiro lugar, ele tem de se afastar desta mulher.

CORTA PARA:
Orjana (Neusa Amaral)

CENA 2  -  PORTO AZUL  -  CASA DE BÁRBARA  -  QUARTO DE CYRO  -  INTERIOR  -  NOITE

NO QUARTO SEMI-ESCURO, DEITADO COM AS MÃOS SOB A CABEÇA, O MÉDICO MEDITAVA AOS ÚLTIMOS ACONTECIMENTOS. UMA LEVE PANCADA NA PORTA ALERTOU-LHE OS SENTIDOS.

CLARA  -  (a criada entregou-lhe um envelope) Chegou agora!

CYRO  -  Obrigado!

CYRO ACENDEU A LÂMPADA DO ABAJUR, RASGOU O PAPEL E ABRIU A CARTA. TINHA RECONHECIDO A LETRA DE ESTER. ERA COMO SE A VOZ DA MULHER LHE CHEGASSE AOS OUVIDOS, ENQUANTO DEVORAVA O CONTEÚDO DO BILHETE.

ESTER  -  (voz em off) “Dr. Cyro. Este bilhete tem por objetivo agradecer-lhe toda a sua atenção durante o tempo em que durou a nossa amizade. Amizade que é hoje interrompida por motivos imperiosos.  Peço-lhe   que compreenda e leve em consideração este rompimento. Não procure conhecer causas. Posso dizer-lhe, apenas, que a felicidade do meu filho foi ameaçada. E coloco a felicidade dele acima de qualquer outro sentimento. Não me procure. Esqueça o que se passou. Eu farei o mesmo. Ester Keller”.

O BILHETE, AMASSADO, FOI ATIRADO À CESTA DE LIXO. PROCUROU O TELEFONE. A VOZ DE ESTER PARECIA-LHE PRESENTE AO PEQUENO QUARTO.

ESTER  -  (voz em off) “Posso dizer-lhe apenas que a felicidade do meu filho foi ameaçada. E coloco a felicidade dele acima de qualquer outro sentimento. Esqueça o que se passou. Eu farei o mesmo”.

O TELEFONE CHAMOU VÁRIAS VEZES.

DO OUTRO LADO DA LINHA, JÚLIA ATENDEU.

CYRO  -  Por favor, eu gostaria de falar com Dona Ester. Aqui é o Dr. Cyro Valdez.

JÚLIA  -  Sinto muito, mas Dona Ester não se encontra em casa.

CYRO DESLIGOU O TELEFONE, PENSATIVO. O MUNDO VOLTARA A CAIR-LHE SOBRE A CABEÇA.

CORTA PARA:

CENA 3  -  PALACETE DO COMENDADOR LIBERATO  -  SALA  INTERIOR  -  DIA

POR UMA DESSAS COINCIDENCIAS INEXPLICÁVEIS ESTER OUVIRA TODA A CONVERSA DE OTTO COM PAULUS. INÊS FÔRA LEVADA À MINA E COAGIDA A PRESTAR INFORMAÇÕES SOBRE A EXTENSÃO DE SUA AMIZADE COM O JOVEM PLAYBOY. O MOTIVO DE SUA TENTATIVA DE SUICÍDIO PREVALECIA SOBRE TUDO O MAIS. A MOÇA, MESMO DIANTE DAS PRESSÕES DO CHEFÃO, SE NEGARA A REVELAR A VERDADE.

ESTER TOMOU O CARRO E SE APRESSOU A CONTAR TUDO AO COMENDADOR. ENCONTROU BABY NO VASTO SALÃO DE RECEPÇÃO, ENTREGUE À BEBIDA. O COMENDADOR RECEBEU-A ALEGREMENTE. E COMEÇOU A SER CIENTIFICADO COS ACONTECIMENTOS.

COMENDADOR LIBERATO  -  Mas... você tem certeza, Ester?

ESTER  -  Pela conversa pode-se tirar muitas conclusões. Não estou avisando para provocar desentendimentos. Achei que vocês deviam saber dos planos de Otto. Também é possível que eu esteja enganada...

COMENDADOR LIBERATO  -  Não, não está. Eu sei que o Otto é capaz de qualquer coisa para impedir a posse desse... (olhou desgostoso para o filho que bebia, deitado no sofá, desligado do mundo) desse desmiolado. Você fez muito bem em avisar, minha filha. É mais uma prova inequívoca de sua amizade.

ESTER  -  Ou do meu ódio por Otto. Sei que este não é um ato digno, da minha parte, mas com um homem como Otto, qualquer noção de dignidade fica anulada.

O COMENDADOR ATRAVESSOU A SALA, A PASSOS LENTOS, E SE SENTOU AO LADO DO FILHO.

COMENDADOR LIBERATO  -  Você ouviu. Essa moça... pode desmoralizar você?

BABY  -  (com olhos vermelhos, copo na mão) Ah, pode! Qualquer pessoa pode me desmoralizar! Basta meter na cabeça que teve um caso comigo. Se tem o apoio do Otto, qualquer sujeitinha pode dizer que eu fiz isso e aquilo!

COMENDADOR LIBERATO  -  (segurou com força o braço do rapaz, tentando afastar o copo de bebida) Eu quero saber se essa moça tem algo contra você.

BABY  -  Ora, a moça não é nenhum bebê! O que agrada a Otto é que ela é empregada doméstica. Isso é um prato para um tipo como ele!

COMENDADOR LIBERATO  -  (com sarcasmo) Coisa que para você não teve a menor importância!

BABY  -  No duro que não tem mesmo!

COMENDADOR LIBERATO  -  Você não tem é vergonha! (voltou-se para Ester, calada a um canto da sala) Eu pedi a ele pra mudar de vida. Sabia que isso ia acontecer...

BABY  -  (levantou o copo pesado de álcool) Olha aqui, se acha que é motivo  pra  me  chutar  do  cargo, vai dizendo! Deixa o Otto continuar lá. Deixa ele continuar fazendo as burradas de sempre. Eu não estou fazendo questão, mesmo, de coisa alguma!

BABY APANHOU UMA GARRAFA DE UÍSQUE E SUBIU AS ESCADAS, TROPEÇANDO.

ESTER  -  (dirigiu-se ao comendador) O senhor não pode impedir que Otto tome alguma atitude?

COMENDADOR LIBERATO  -  Tenho que jogar com a sorte. Agora, vai depender muito mais da moça do que do próprio Otto. E eu me sinto ridículo, envolvendo-me em casos tão mesquinhos.

O COMENDADOR APERTOU O PEITO, COMO SE SENTISSE UMA DOR REPENTINA. A MOÇA ACUDIU-O.

ESTER  -  (gritou para a governanta) Zoraida, venha cá...

ZORAIDA  -  O Dr. Cyro preveniu. Ele não deve ter emoções.

AS FEIÇÕES DO MILIONÁRIO HAVIAM-SE TRANSFORMADO NUMA MÁSCARA DE CÊRA. O COMENDADOR ESTAVA LÍVIDO, OS LÁBIOS BRANCOS. SUAVA E RESPIRAVA COM DIFICULDADE.

ESTER  -  Acho que fiz muito mal em vir trazer este problema.

COMENDADOR LIBERATO  -  (falava com dificuldade) Não... Não se sinta culpada de nada. O culpado é ele mesmo, o meu próprio filho. Queria fazer dele um homem de bem. Está sendo difícil. Muito difícil, meu Deus do Céu!

ZORAIDA  -  (encaminhou-se para o telefone) Vou chamar o Dr. Cyro.

ESTER ESTREMECEU, E BUSCOU A SAÍDA PARA DEIXAR A SALA.

ESTER  -  Bem... comendador... eu tenho de ir buscar o Ivanzinho...

COMENDADOR LIBERATO  -  Espere um pouco e fique comigo.

O COMENDADOR APERTOU COM FORÇA A MÃO DA MULHER. A VOZ DE ZORAIDA CHEGOU-LHE AOS OUVIDOS.

ZORAIDA  -  Do hospital? O Dr. Cyro, por favor.

COMENDADOR LIBERATO  -  Eu me sinto, às vezes, muito só, Ester.

ZORAIDA  -  Dr. Cyro? Aqui é da casa do Comendador Liberato. Ele não está passando bem. É possível o senhor vir até aqui?

ESTER TENTOU LIVRAR A MÃO QUE O COMENDADOR RETINHA ENTRE AS SUAS.

FIM DO CAPÍTULO 34


 ... e na próxima quinta, o 35. capítulo!




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