quinta-feira, 31 de julho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 38



Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 38

Participam deste capítulo

Cyro  -  Tarcísio Meira
Ester  -  Gloria Menezes
Lia  -  Arlete Sales
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Ricardo  -  Edney Giovenazzi
Catarina  -  Lidia Mattos
Paulus  -  Emiliano Queiroz
Pedrão  -  Waldir Onofre
Pé-na-Cova  -  Antonio Pitanga

  
CENA 1  -  VILA DOS MINEIROS  -  BAR DO PEPINO  -  INTERIOR  -  DIA

NO DIA SEGUINTE, O ASSUNTO SE CONCENTRAVA NO DESASTRE SOFRIDO PELO SUPERINTENDENTE DAS MINAS.

NO BAR DO PEPINO, PEDRÃO TOMAVA A PRIMEIRA “DOSE” DO DIA.

PEDRÃO  -  O homão sofreu um acidente, no duro?

PEPINO  -  Sofreu, estou dizendo. Dr. Ricardo me disse.

PEDRÃO  -  E o desgraçado não morreu?

PEPINO  -  Não, não morreu. Teve um mal súbito, no carro... uma dor no coração... aí o bicho capotou.

PÉ-NA-COVA  -  Aquilo é ruindade! O coração dele deve de tá podre!

CORTA PARA:
Cyro, Ester e Paulus

CENA 2  -  SEDE DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS  -  INTERIOR  -  DIA

O ACIDENTE ERA O TEMA DE TODAS AS CONVERSAS.

BABY LIBERATO ESTAVA SENTADO À SUA MESA DE TRABALHO, NA COMPANHIA DO DR. RICARDO. FUMAVA TRANQUILAMENTE, FAZENDO BOLINHAS DE FUMAÇA AZULADA.

BABY  -  No duro que meu primo foi acidentado?

RICARDO  -  Já passei no hospital pela manhã. Quem está tratando dele é o Dr. Cyro.

BABY  -  (com indiferença) Está mal?

RICARDO  -  Enfarte. Pode até morrer.

BABY  -  (sorrindo) Puxa vida! Mas é sorte demais.

RICARDO -  (mostrou-lhe um papel com o timbre da companhia) Otto recomendou que só o abrisse no dia seguinte ao de sua viagem a São Paulo.

BABY  -  (apoderando-se do documento) Vamos ver que ordem maluca foi essa que o primo deixou, antes de viajar.

RICARDO  -  (batendo na folha de papel) Isto aqui, por exemplo, Baby... acho uma loucura.

BABY  ESTICOU AS PERNAS SOBRE A MESA E BOCEJOU, ANTES DE LER O PAPEL QUE RICARDO LHE ENTREGOU.

BABY  -  Dormi mal pra burro, esta noite! (devolveu o papel ao engenheiro) Leia em voz alta.

RICARDO  -  Preste atenção... Otto quer que mande reabrir as minas de cadáveres... você sabe o que é isso?

BABY  -  (puxou a perna da mesa, com agilidade) Hem? Cadáver? Ah, cadáver! Sei. Claro que sei. É alguém que já morreu? Digo... o que quer dizer... minas de cadáveres... Acho que é mina onde se enterra gente...

RICARDO  -  (deu a volta em torno da mesa e mostrou um mapa na parede) Não, Baby... não é nada disso! Chamam-se minas de cadáveres... porque se aproveita nelas o trabalho de mineiros já velhos, aposentados, imprestáveis... até doentes. Inclusive, Baby... é ilegal. Pela lei não pode funcionar e se o Ministério do Trabalho sabe... a multa além de pesada pode vir acompanhada do fechamento temporário das minas. Um prejuízo e tanto para a gente.

BABY  -  Você, o que acha?

RICARDO  -  Acho que a ordem de Otto é absurda!

BABY  -  Pois não execute, pronto!

CATARINA  -  (a voz estridente) Não faça isso!

OS DOIS HOMENS VOLTARAM-SE AO MESMO TEMPO. A MÃE DE OTTO MULLER ACABAVA DE DAR ENTRADA NO ESCRITÓRIO. MUITO PINTADA E COM JÓIAS NO PULSO, DEDOS E PESCOÇO.

CATARINA  -  (continuou) Se meu filho mandou, a ordem tem de ser executada!

PAULUS ACABAVA DE FECHAR A PORTA DO ESCRITÓRIO.

PAULUS  -  Eu e Dona Catarina viemos aqui, justamente para lembrar que Otto deixou algumas ordens.

CATARINA  -  E eu aconselho você a obedecê-las, Baby!

BABY  -  E se eu não obedecer?

CATARINA  -  Pergunte ao seu pai... ele lhe dirá porque deve atender a tudo que Otto determinar. Quero que fique bem claro. Apesar de doente, meu filho continua dirigindo, como antes, a Companhia!

BABY  -  Vocês entraram sem ordem, no meu escritório, bagunçando a sala do presidente. Vem aqui me dar ordens e ainda exigir que eu cumpra aquilo que está absolutamente fora de propósito. Fora da lei. E que pode vir a prejudicar toda a estrutura da mina, apenas pela vaidade de querer que uma ordem do miserável do Otto seja cumprida! Isto, numa reunião de assembleia, é motivo para botar esse alemão no olho da rua.

A VELHA TRINCOU OS DENTES DE ÓDIO.

RICARDO  -  Como está passando o senhor Otto?

CATARINA  -  (fitando o rosto do sobrinho) Ele não vai morrer... podem ficar certos! Vamos, Paulus!

BATERAM COM ESTRÉPITO A PORTA DE MADEIRA, ANTE O OLHAR DESAFIADOR DO NOVO PRESIDENTE DA COMPANHIA.

BABY  -  Que pena que ele não morreu!

RICARDO  -  Bem, meu caro, acho que você tem de tomar uma atitude. É agora ou nunca!

BABY  -  Vamos lá (levantou-se) Temos de ter uma conversa séria com o velho.

CORTA PARA:

CENA 3  -  HOSPITAL  -  QUARTO DE OTTO  -  INTERIOR  -  DIA

DEPOIS DOS PRIMEIROS EXAMES DO DIA, CYRO VALDEZ CONFIRMAVA A GRAVIDADE DO ESTADO DE OTTO.

CYRO  -  Por um verdadeiro milagre ele não morreu. Um caso em mil, tem anotado resistência a este tipo de distúrbio cardíaco.

O MÉDICO TOMOU A PRESSÃO DO PACIENTE, REGISTROU OS BATIMENTOS E OLHOU, MAIS UMA VEZ, O TRAÇADO DO ELETROCARDIOGRAMA.

LIA  -  (apreensiva, diante das feições sérias do médico) Como está ele, doutor?

CYRO  -  Suprimi alguma medicação. O coração suportou mas o enfarte é extenso e grave. Muito grave ainda.

A MAÇANETA DA PORTA GIROU E A ENFERMEIRA APARECEU ACOMPANHADA POR ESTER. LIA IMPEDIU QUE A EX-ESPOSA DE OTTO ENTRASSE NO QUARTO.

ESTER  -  Quero ver Otto.

LIA  -  Quer ver... ou quer matá-lo?

ESTER  -  Não seja estúpida, Lia!

CYRO APROXIMOU-SE DA PORTA E SAIU PARA O CORREDOR.

LIA  -  (arrogante, pronta a investir contra a mulher) Você desejou que ele morresse, não desejou?

ESTER  -  Não. Eu nunca desejei a morte de Otto. Só queria a minha liberdade. Para isso, não era preciso que ele morresse...

CYRO  -  (aproximou-se das duas) Por favor... este não é local para discussões!

ESTER  -  Cyro, quero ver Otto.

LIA  -  Dr. Cyro é responsável. Não acredito que deixe você se aproximar.

CYRO  -  Por que... você quer vê-lo?

ESTER  -  Preciso, Cyro.

LIA  -  Ela nunca se importou com ele!

ESTER  -  (implorou) Por favor...

CYRO  -  Eu sinto. Não posso deixá-la entrar.

LIA  -  (sorriu, triunfante) É por isso que confio no senhor, Dr. Cyro.

CYRO  -  É o estado dele, Ester. É gravíssimo. Qualquer emoção lhe será fatal.

ESTER  -  (os olhos encheram-se de lágrimas) Eu compreendo.. compreendo, sim.

AFASTOU-SE A PASSOS RÁPIDOS PELO CORREDOR SILENCIOSO DO HOSPITAL.

LIA  -  Muito obrigada, doutor!

CYRO  -  (explodiu, sem grosseria, mas com voz implacável, baixa e tensa) Não é preciso agradecer. Não a proibi de entrar para agradar a senhora. Proibi porque a presença dela poderia causar emoção ao paciente.

ENTROU NO QUARTO, DIRIGIU-SE PARA A ENFERMEIRA, POSTADA JUNTO À CAMA DE OTTO MULLER E PEDIU A FICHA DO DOENTE. ESCREVEU ALGUMAS ANOTAÇÕES, DEVOLVENDO-A À MOÇA.

CYRO  -  (dirigiu-se a Lia, encostada à mesinha de cabeceira) A senhora está como acompanhante?

LIA  -  Estou.

CYRO  -  Mas ninguém deve entrar neste quarto, nem a própria mãe dele. E isto é um hospital, não uma casa particular. Não se pode abrir privilégios, seja qual for a condição social do doente.

LIA  -  Certo, doutor.

CYRO  -  (à enfermeira) Esteja atenta. Qualquer anormalidade, avise o médico residente. Dr. Roberto me comunicará imediatamente.


FIM DO CAPÍTULO 38


Nenhum comentário:

Postar um comentário