Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 38
Participam deste
capítulo
Cyro - Tarcísio
Meira
Ester -
Gloria Menezes
Lia -
Arlete Sales
Baby -
Claudio Cavalcanti
Ricardo -
Edney Giovenazzi
Catarina -
Lidia Mattos
Paulus -
Emiliano Queiroz
Pedrão - Waldir Onofre
Pé-na-Cova -
Antonio Pitanga
CENA 1 - VILA
DOS MINEIROS - BAR DO PEPINO
- INTERIOR - DIA
NO DIA
SEGUINTE, O ASSUNTO SE CONCENTRAVA NO DESASTRE SOFRIDO PELO SUPERINTENDENTE DAS
MINAS.
NO BAR DO
PEPINO, PEDRÃO TOMAVA A PRIMEIRA “DOSE” DO DIA.
PEDRÃO - O
homão sofreu um acidente, no duro?
PEPINO -
Sofreu, estou dizendo. Dr. Ricardo me disse.
PEDRÃO - E o
desgraçado não morreu?
PEPINO - Não,
não morreu. Teve um mal súbito, no carro... uma dor no coração... aí o bicho
capotou.
PÉ-NA-COVA -
Aquilo é ruindade! O coração dele deve de tá podre!
CORTA PARA:
Cyro, Ester e Paulus
CENA 2 - SEDE
DA ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS - INTERIOR
- DIA
O ACIDENTE
ERA O TEMA DE TODAS AS CONVERSAS.
BABY
LIBERATO ESTAVA SENTADO À SUA MESA DE TRABALHO, NA COMPANHIA DO DR. RICARDO.
FUMAVA TRANQUILAMENTE, FAZENDO BOLINHAS DE FUMAÇA AZULADA.
BABY - No
duro que meu primo foi acidentado?
RICARDO - Já passei no hospital pela manhã. Quem está
tratando dele é o Dr. Cyro.
BABY - (com indiferença) Está mal?
RICARDO - Enfarte. Pode até morrer.
BABY - (sorrindo) Puxa vida! Mas é sorte demais.
RICARDO - (mostrou-lhe
um papel com o timbre da companhia) Otto recomendou que só o abrisse no dia
seguinte ao de sua viagem a São Paulo.
BABY - (apoderando-se do documento) Vamos ver que
ordem maluca foi essa que o primo deixou, antes de viajar.
RICARDO - (batendo na folha de papel) Isto aqui, por
exemplo, Baby... acho uma loucura.
BABY ESTICOU AS PERNAS
SOBRE A MESA E BOCEJOU, ANTES DE LER O PAPEL QUE RICARDO LHE ENTREGOU.
BABY - Dormi mal pra burro, esta noite! (devolveu o
papel ao engenheiro) Leia em voz alta.
RICARDO - Preste atenção... Otto quer que mande reabrir
as minas de cadáveres... você sabe o que é isso?
BABY - (puxou a perna da mesa, com agilidade) Hem?
Cadáver? Ah, cadáver! Sei. Claro que sei. É alguém que já morreu? Digo... o que
quer dizer... minas de cadáveres... Acho que é mina onde se enterra gente...
RICARDO - (deu a volta em torno da mesa e mostrou um
mapa na parede) Não, Baby... não é nada disso! Chamam-se minas de cadáveres...
porque se aproveita nelas o trabalho de mineiros já velhos, aposentados,
imprestáveis... até doentes. Inclusive, Baby... é ilegal. Pela lei não pode
funcionar e se o Ministério do Trabalho sabe... a multa além de pesada pode vir
acompanhada do fechamento temporário das minas. Um prejuízo e tanto para a gente.
BABY - Você, o que acha?
RICARDO - Acho que a ordem de Otto é absurda!
BABY - Pois não execute, pronto!
CATARINA - (a voz estridente) Não faça isso!
OS DOIS HOMENS VOLTARAM-SE AO MESMO TEMPO. A MÃE DE OTTO
MULLER ACABAVA DE DAR ENTRADA NO ESCRITÓRIO. MUITO PINTADA E COM JÓIAS NO
PULSO, DEDOS E PESCOÇO.
CATARINA - (continuou) Se meu filho mandou, a ordem tem
de ser executada!
PAULUS ACABAVA DE FECHAR A PORTA DO ESCRITÓRIO.
PAULUS - Eu e Dona Catarina viemos aqui, justamente
para lembrar que Otto deixou algumas ordens.
CATARINA - E eu aconselho você a obedecê-las, Baby!
BABY - E se eu não obedecer?
CATARINA - Pergunte ao seu pai... ele lhe dirá porque
deve atender a tudo que Otto determinar. Quero que fique bem claro. Apesar de doente,
meu filho continua dirigindo, como antes, a Companhia!
BABY - Vocês entraram sem ordem, no meu escritório,
bagunçando a sala do presidente. Vem aqui me dar ordens e ainda exigir que eu
cumpra aquilo que está absolutamente fora de propósito. Fora da lei. E que pode
vir a prejudicar toda a estrutura da mina, apenas pela vaidade de querer que
uma ordem do miserável do Otto seja cumprida! Isto, numa reunião de assembleia,
é motivo para botar esse alemão no olho da rua.
A VELHA TRINCOU OS DENTES DE ÓDIO.
RICARDO - Como está passando o senhor Otto?
CATARINA - (fitando o rosto do sobrinho) Ele não vai
morrer... podem ficar certos! Vamos, Paulus!
BATERAM COM ESTRÉPITO A PORTA DE MADEIRA, ANTE O OLHAR
DESAFIADOR DO NOVO PRESIDENTE DA COMPANHIA.
BABY - Que pena que ele não morreu!
RICARDO - Bem, meu caro, acho que você tem de tomar uma
atitude. É agora ou nunca!
BABY - Vamos lá (levantou-se) Temos de ter uma
conversa séria com o velho.
CORTA PARA:
CENA 3 -
HOSPITAL - QUARTO DE OTTO -
INTERIOR - DIA
DEPOIS DOS PRIMEIROS EXAMES DO DIA, CYRO VALDEZ CONFIRMAVA A
GRAVIDADE DO ESTADO DE OTTO.
CYRO - Por um verdadeiro milagre ele não morreu. Um
caso em mil, tem anotado resistência a este tipo de distúrbio cardíaco.
O MÉDICO TOMOU A PRESSÃO DO PACIENTE, REGISTROU OS BATIMENTOS
E OLHOU, MAIS UMA VEZ, O TRAÇADO DO ELETROCARDIOGRAMA.
LIA - (apreensiva, diante das feições sérias do
médico) Como está ele, doutor?
CYRO - Suprimi alguma medicação. O coração suportou
mas o enfarte é extenso e grave. Muito grave ainda.
A MAÇANETA DA PORTA GIROU E A ENFERMEIRA APARECEU ACOMPANHADA
POR ESTER. LIA IMPEDIU QUE A EX-ESPOSA DE OTTO ENTRASSE NO QUARTO.
ESTER - Quero ver Otto.
LIA - Quer ver... ou quer matá-lo?
ESTER - Não seja estúpida, Lia!
CYRO APROXIMOU-SE DA PORTA E SAIU PARA O CORREDOR.
LIA - (arrogante, pronta a investir contra a
mulher) Você desejou que ele morresse, não desejou?
ESTER - Não. Eu nunca desejei a morte de Otto. Só
queria a minha liberdade. Para isso, não era preciso que ele morresse...
CYRO - (aproximou-se das duas) Por favor... este não
é local para discussões!
ESTER - Cyro, quero ver Otto.
LIA - Dr. Cyro é responsável. Não acredito que
deixe você se aproximar.
CYRO - Por que... você quer vê-lo?
ESTER - Preciso, Cyro.
LIA - Ela nunca se importou com ele!
ESTER - (implorou) Por favor...
CYRO - Eu sinto. Não posso deixá-la entrar.
LIA - (sorriu, triunfante) É por isso que confio no
senhor, Dr. Cyro.
CYRO - É o estado dele, Ester. É gravíssimo. Qualquer
emoção lhe será fatal.
ESTER - (os olhos encheram-se de lágrimas) Eu
compreendo.. compreendo, sim.
AFASTOU-SE A PASSOS RÁPIDOS PELO CORREDOR SILENCIOSO DO
HOSPITAL.
LIA - Muito obrigada, doutor!
CYRO - (explodiu, sem grosseria, mas com voz
implacável, baixa e tensa) Não é preciso agradecer. Não a proibi de entrar para
agradar a senhora. Proibi porque a presença dela poderia causar emoção ao
paciente.
ENTROU NO QUARTO, DIRIGIU-SE PARA A ENFERMEIRA, POSTADA JUNTO
À CAMA DE OTTO MULLER E PEDIU A FICHA DO DOENTE. ESCREVEU ALGUMAS ANOTAÇÕES,
DEVOLVENDO-A À MOÇA.
CYRO - (dirigiu-se a Lia, encostada à mesinha de
cabeceira) A senhora está como acompanhante?
LIA - Estou.
CYRO - Mas ninguém deve entrar neste quarto, nem a
própria mãe dele. E isto é um hospital, não uma casa particular. Não se pode
abrir privilégios, seja qual for a condição social do doente.
LIA - Certo, doutor.
CYRO - (à enfermeira) Esteja atenta. Qualquer
anormalidade, avise o médico residente. Dr. Roberto me comunicará imediatamente.
FIM DO CAPÍTULO 38
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