Novela de Janete Clair
Adaptação de Antonio
Figueira
CAPÍTULO 42
Participam deste
capítulo
Cyro -
Tarcísio Meira
Ester -
Gloria Menezes
Bárbara -
Zilka Salaberry
CENA 1 - CASA
DE ESTER - SALA - INTERIOR
- DIA
ESTER AGUARDAVA O DR. CYRO NA VARANDA DA RESIDENCIA DE LUXO.
DEIXARA A CASA DE OTTO DESDE O ACIDENTE, RECOLHENDO-SE À SUA MORADIA
PARTICULAR, ACOLHEDORA, COM VISTA PANORÂMICA PARA O LITORAL CATARINENSE.
CYRO ENTROU, IMPACIENTE.
CYRO - Pensei que tivesse acontecido alguma coisa a você
ou ao menino.
ESTER – (mostrou-lhe um papel, com letra feminina) Veja isto!
CYRO - (leu-o de um só fôlego) O que quer dizer?
ESTER - (à beira de uma crise de histeria) É a prova
de que a atriz de circo foi testemunha ou cúmplice do crime de Otto. Se eu
levar este bilhete à polícia, ela será obrigada a dizer a verdade.
CYRO ACENDEU UM CIGARRO E SENTOU-SE NA CADEIRA DE VIME.
ESTER - (continuou) Vanda Vidal. Ela nega ter
conhecido Otto, mas este bilhete desmente tudo. Ela teve participação importante
na morte de Carlos.
CYRO - Em resumo, a atriz pode esclarecer o crime.
ESTER - Exato. E eu posso arrasar de uma vez com
Otto. Esta pista pode levá-lo à cadeia. Chamei você aqui para lhe dizer que vou
levar o caso adiante.
CYRO - (em tom baixo e sombrio) E o que é que você
pretende? Quer que ele morra? Não vê que levantando esse problema agora será o
mesmo que matar o seu ex-marido?
ESTER - Por que, não?
CYRO - Seria o mesmo que lhe dar um tiro à
queima-roupa. Você seria capaz?
ESTER - (explodiu, irritada) Eu não seria capaz de
nada. Mas a verdade é que eu não tenho nenhum motivo para ter escrúpulos. Ou
talvez você não saiba que esse homem levou meu pai ao suicídio... Certamente
não sabe das torturas que ele me infligiu quando era sua mulher. Você dirá que
eu devo esquecer e perdoar, mas com uma coisa há de concordar. No momento ele é
o único obstáculo à nossa felicidade.
CYRO - Eu sei. Há outras maneiras de se resolver
esse obstáculo. É claro que temos de dar tempo ao tempo...
ESTER - (enérgica) Não (movimentava-se por entre as
cadeiras da varanda) Com Otto Muller não há mais maneira.
CYRO - (franziu a testa, apreensivo) Prefiro
imaginar que você não sabe o que está dizendo.
ESTER - (encarou-o com olhar cruel) Sei, sim, e sei
que no íntimo você também deseja que ele morra.
CYRO - (levantou-se como que impulsionado por uma
mola) Não diga isto! Eu sou um médico! Minha obrigação é salvá-lo a qualquer
preço!
ESTER - Enquanto esteve tratando dele, nunca lhe
passou isto pela cabeça, Cyro? Que bastaria um simples descuido...
CYRO - (cortou, veemente) Não, não, não! Nunca me
passou isto pela cabeça e nem vai passar! Minha missão é salvar vidas!
ESTER - (se alterou) Você tem tantos escrúpulos!
Talvez não saiba que estava marcado para morrer! E se nada lhe aconteceu, foi
apenas pela sua fama aqui... e no resto do mundo.
CYRO - Ainda não me convenci disso, Ester!
ESTER - Quer provas de que o homem que está cuidando
é um assassino?
CYRO - (com firmeza) É problema dele! A mim, compete
salvá-lo!
ESTER - E o
negro Gabriel? Por que foi morto? Só porque espionava Lia tomar banho de
piscina... de maiô! E o meu filho? Ele quer afastá-lo de mim! Teve a coragem de
me confessar na cama do hospital!
CYRO - Sei, sei de tudo isso!
ESTER - E ainda assim ainda acha que ele... merece
continuar vivendo?
CYRO - Não sou juiz, Ester. Não serei eu quem há de
julgá-lo. Eu cumpro o meu dever, como médico. E como homem. E me recuso a
continuar raciocinando nesta base.
ESTER - Quero saber somente uma coisa: se fosse essa
a única maneira de conquistarmos tudo aquilo que desejamos?...
ELE PENSOU DEMORADAMENTE ANTES DE RESPONDER.
CYRO - (com decisão e tristeza na inflexão da voz)
Eu preferia renunciar a tudo!
ESTER - (com a voz rouca, irreconhecível) Preferia
renunciar... a mim?
CYRO - (repetiu, hesitante) Preferia.
ESTER - (deu-lhe as costas, fitando o mar) É o que eu
queria saber. Agora tenho certeza: você não me ama. Adeus, Cyro. Saia desta
casa... para sempre!
CYRO - Ester, você não está sendo racional...
ESTER - (explodiu de vez, enlouquecida) Saia desta
casa, já disse! Não quero mais vê-lo, nunca mais! E saiba o que eu penso de
você, agora: você é um covarde! Um covarde!
CYRO - (humilhou-se com o insulto) Covarde, porque
não sou assassino? Porque respeito a vida humana? (levantou-se, vermelho de
raiva) Adeus, Ester!
ESTER - Vou lhe provar que você seria a próxima
vítima de Otto Muller! Vou lhe provar, Dr. Cyro!
CENA 2 -
HOSPITAL - CONSULTÓRIO DE CYRO - INTERIOR - DIA
FOI GRANDE A SURPRESA DO MÉDICO AO RETORNAR AO CONSULTÓRIO
NAQUELA MANHÃ. DONA BÁRBARA, A AVÓ, ESPERAVA-O, TRANQUILAMENTE SENTADA DIANTE
DE SUA MESA DE ATENDIMENTO.
CYRO - (parou ao ver a velha, risonha) Minha avó...
que foi isso? Milagre?
ABRAÇOU-A E BEIJOU, CARINHOSAMENTE.
BÁRBARA - Precisava muito falar com você. E não podia
ser lá em casa. Peguei o carro e me mandei pra Florianópolis. Fiz mal?
CYRO - Não... claro que não! Mas o que há?
PUXOU O BANQUINHO DE FERRO E SE SENTOU FRENTE A FRENTE COM A
AVÓ.
BÁRBARA - Eu vou dizer, Cyro... mas venha cá (pegou
carinhosamente no rosto do rapaz, afagando-o) Você sabe que sou uma velha
turrona, não sabe?
CYRO - Sei e a adoro assim, como a senhora é.
BÁRBARA - Sabe também que eu já te quero muito bem, não
sabe?
CYRO - (sorriu, fazendo que sim com a cabeça) Mas...
a que vem essa declaração de amor fora de hora?
BÁRBARA - (baixou os olhos, meio acanhada) É que tenho
algo muito sério a lhe dizer... e estou sem coragem.
CYRO - (prensou as mãos da avó entre as suas,
olhando-a fundo) Fale, velhinha, e não se incomode com o resto!
BÁRBARA - Você entrou na minha vida... de um jeito
que... agora parece que só vivo para pensar em você, nos seus problemas, na sua
tranquilidade... na sua vida, enfim...
BÁRBARA ENXUGOU UMA LÁGRIMA INDISCRETA.
CYRO - (brincou) Mas é mesmo uma declaração de amor!
BÁRBARA - É sim, meu filho. É uma declaração de amor!
CYRO - Que esse amor não seja sofrimento para a
senhora. Vamos lá, o que está lhe afligindo tanto?
BÁRBARA - É que você entrou aqui... agora mesmo... e eu
já o conheço tão bem... senti que você veio com um problema.
CYRO - (foi sincero) É... estou com problemas.
BÁRBARA - E eu sei também que você poderia
resolvê-los... se quisesse... porque tudo para você poderia ser facilitado.
CYRO - Quero resolver meus problemas como um homem
comum. Quero acreditar que sou um homem como outro qualquer.
BÁRBARA - Você sabe que não é.
CYRO - Eu não sei de nada. Sei apenas que minha
mente me leva mais além...
BÁRBARA - Muito além...
CYRO - E isto não pode ser encarado como um fato
sobrenatural.
BÁRBARA - (olhou-o, séria) Cyro, use agora o poder de
sua mente... e tente ver o que está se passando neste momento, em sua casa!
CYRO - Não me peça isso, vovó. Acabei de lhe dizer
que quero fugir a qualquer coisa nesse sentido.
BÁRBARA - (segurou a mão do neto com força) Vim
avisá-lo, Cyro. Estou preocupada. Um casal tem feito perguntas a sua mãe. E ela
fez a essas pessoas uma revelação espantosa, pela primeira vez em sua vida.
Disse que existe uma marca daquela noite do espanto...
CYRO - (com os olhos esbugalhados) Uma marca!
BÁRBARA - É. Uma marca no corpo de sua mãe. Não sei com que propósito esse
casal está interessado nisso. Mas eu creio que não deve ser para boa coisa. Se
existe realmente alguma prova, não deve ser vulgarizada assim.
CYRO - Naturalmente. Isso pode levar a
interpretações maldosas.
FIM DO CAPÍTULO 42
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