Novela de Janete Clair
Adaptação de Antonio
Figueira
CAPÍTULO 48
Participam deste
capítulo
Cyro -
Tarcísio Meira
Ester -
Gloria Menezes
Otto -
Jardel Filho
Von Muller -
Jorge Cherques
Dr. Roberto -
Paulo Cesar Pereio
CENA 1 - FLORIANÓPOLIS - CASA
DE ESTER - SALA - INTERIOR
- NOITE
TALVEZ FÔSSE A PRIMEIRA VEZ, EM MUITOS ANOS, QUE ESTER SE
PERMITIA TELEFONAR PARA OTTO MULLER E CONVIDÁ-LO A IR À SUA CASA. ERA NOITE
QUANDO O ALEMÃO CHEGOU EM SEU CARRO NOVO, AZUL, DE FABRICAÇÃO INGLESA. ESTER
AGUARDAVA-O À PORTA.
ESTER - (parecia amena, carinhosa, talvez) Boa noite,
Otto!
OTTO - (entrou, afogueado) Está sozinha?
ESTER - Não. Tem alguém aqui, esperando por você.
Prepare-se para uma surpresa. Eu não quero lhe causar choque, mas creio que
você vai ficar muito satisfeito de ver essa pessoa...
OTTO MULLER MOBILIZOU SUAS DEFESAS À ESPERA DO PIOR.
A MULHER COM UMA CALMA CONTROLADA, ACENDEU AS LUZES E FALOU
EM ALEMÃO, DIRIGINDO-SE PARA UM PEQUENO COMPARTIMENTO LATERAL. SEGUNDOS DEPOIS
O ESTRANGEIRO, DE OLHOS AZUIS E CARA VERMELHA, SE MOSTROU POR INTEIRO.
OTTO - (explodiu) Que significa isso?
ESTER - (ironizando a situação) Pensei que fosse
ficar contente, Otto!
OTTO ESTAVA APAGADO. O HOMEM APROXIMOU-SE, ABRAÇANDO-O
APERTADAMENTE.
VON MULLER - Filho... ela foi me buscar.
OTTO - (desvencilhou-se com um movimento grosseiro)
Não devia ter vindo!
VON MULLER - Ela disse que você estava me esperando...
OTTO - Não devia ter acreditado nesta mulher! Ela
está sempre pronta a fazer tudo para me contrariar!
ESTER - (fingindo surpresa) A presença do seu pai
contraria você?
OTTO - (desvairado) O que está pretendendo, Ester?
Qual é o seu jogo? Fale claro! Você trouxe este homem aqui, não foi para me ser
agradável!
ESTER - Certamente que não foi, Otto.
OTTO - Então... o que quer?
ESTER - Ele está precisando de dinheiro. Dê o que ele
necessita e deixe-o ir embora.
OTTO - (com as mãos trêmulas, retirou a carteira de
notas) De quanto precisa?
VON MULLER - Muito. Estou passando necessidades.
ESTER - (simulava bondade, mas havia um tom de
gozação em sua voz) Não é justo deixar seu pai passando miséria. Você é um
homem rico. E bondoso, Otto!
O MILIONÁRIO PRATICAMENTE ATIROU NAS MÃOS DO VELHO UM MAÇO DE
NOTAS, COM ESTUPIDEZ.
OTTO - (gritava em alemão) Agora desapareça!
Desapareça! E nunca mais volte aqui! Não ponha os pés nesta terra! Trate de se
esconder. Senão a polícia lhe põe a mão em cima e não é preciso dizer qual será
o seu fim...
O VELHO SAIU A PASSOS APRESSADOS, COM AGILIDADE INCOMUM PARA
UM HOMEM DE SUA IDADE.
ESTER - (encarou o ex-marido) Agora, vamos conversar,
Otto!
OTTO - (estava tenso, com os nervos à flor da pele)
Não fale nada. Cale a boca. É melhor.
ESTER - (balançou a cabeça, negativamente) Não, Otto.
É importante.
OTTO - (curioso) Como encontrou meu pai?
ESTER - Dona Cândida reconheceu-o. Seguiu-o e
descobriu onde ele está vivendo.
OTTO - E logo participou a você... para que, juntas,
me destruíssem. Não foi isso?
ESTER - Não pretendo destruir ninguém. Nem a você,
nem a ele... embora, todos dois mereçam. Mas, não me interessa quem ele é,
embora ache que devia pagar pelos crimes que cometeu. Mas não sou juiz do
mundo. Se ele tem de ser agarrado, não quero que seja por minha culpa. Preferia
que não o fosse...
OTTO - Preferia... então... confessa que tem
intenções...
ESTER - (levantou-se, com tranquilidade) Otto...
procure entender... calmamente... racionalmente... Estou lhe pedindo... quase
implorando... que você me restitua integralmente os direitos sobre meu filho.
Deixe-me viver a minha vida... me dê a liberdade perdida, a que eu tenho
direito. Você não pode mais me escravizar! (uniu as mãos, patèticamente) Estou
implorando! Deixe-me levar meu filho! Nunca mais procurarei você e nós dois
viveremos em paz!
OTTO COMPRIMIU O PEITO À ALTURA DO CORAÇÃO, COMO SE SENTISSE
UMA DOR REPENTINA E FORTE. ESTAVA MAIS PÁLIDO.
OTTO - Você
disse que não quer se aproveitar... mas faz exigências!
ESTER - Eu não quero me aproveitar... mas denunciarei
seu pai, se você não ceder!
OTTO - (tenso, inteiramente fora de si) Pois faça o
que quiser! Denuncie-o! (agarrou o telefone com raiva, enfiando-o por entre as
mãos da mulher) Chame a polícia internacional! Avise o Serviço Secreto de
Israel! Werner Von Muller Leoschen, criminoso de guerra, sentenciado e
fugitivo, encontra-se aqui! Vamos! Denuncie!
ESTER - Será possível, Otto, que você tenha coragem
de permitir uma coisa destas... e tudo para quê? Para alimentar um capricho?
OTTO - Eu não lhe darei os direitos sobre meu filho!
Denuncie e eu desmentirei... direi que você está louca!
ESTER - Não se esqueça de que foi Dona Cândida Sales
quem o viu!
OTTO - Direi que as duas estão loucas! Que estão
armando uma trama contra mim... para... para me matar! E vão conseguir! Vão...
conse...
O HOMEM EMBORCOU COM A MÃO DIREITA CONTRA O LADO ESQUERDO DO PEITO.
COMPRIMINDO-O FORTEMENTE. GEMIA ENQUANTO PROCURAVA ALGUMA COISA NO BOLSO DO
PALETÓ.
ESTER - (empalideceu com a expressão de sofrimento do
homem a quem odiava) O que é, Otto?
OTTO - (falou com dificuldade) O... re... médio!
ESTER - (rebuscou os bolsos com mãos ávidas) Não está
com você, Otto! Não está! O que é que eu faço?
NA TENTATIVA DE ERGUER-SE DA POLTRONA, OTTO MULLER AUMENTOU
OS ESFORÇOS FÍSICOS. A DOR SE TORNOU MAIS DIFUSA E VIOLENTA E O CORPO IMENSO
TORNOU-SE FLÁCIDO COMO O DE UM BONECO DE PALHA.
OTTO MULLER DESABOU CONTRA O CHÃO, ESTICANDO-SE SOBRE O TAPETE DA SALA
DE RECEPÇÕES DA CASA DE ESTER. ARROXEADO NO PESCOÇO. COMPLETAMENTE SEM COR NA
CARA HEDIONDA.
ESTER, PROCURANDO ACALMAR-SE, VERIFICOU QUE ELE RESPIRAVA.
COM DIFICULDADE, MAS RESPIRAVA. ESTAVA VIVO. CORREU AO LIVRO DE TELEFONES,
SOBRE A MESINHA, E DISCOU UM NÚMERO.
ESTER - Dr. Cyro? Cyro... Ester. Venha depressa! Acho
que Otto está morrendo. Não! Na minha casa. Aqui.
CORTA PARA:
CENA 2 - CASA
DE ESTER - SALA -
INTERIOR - NOITE.
CYRO PAROU O CARRO DIANTE DA PORTA DE ENTRADA E, MAL FECHOU A
PORTA, CORREU PARA O INTERIOR DA CASA.
CYRO - Como foi isso?
OTTO ESTAVA CAÍDO SOBRE O TAPETE. CYRO EXAMINOU-LHE OS OLHOS,
REVIRADOS. PULSAÇÃO QUASE NENHUMA. PRESSÃO TERRÍVELMENTE BAIXA. ABRIU A MALETA
E PREPAROU UMA INJEÇÃO.
ESTER - Discutimos!
CORTA PARA:
CENA 3 -
FLORIANÓPOLIS - HOSPITAL
- QUARTO DE OTTO -
INTERIOR - NOITE
OS DOIS MÉDICOS TROCAVAM IDÉIAS A RESPEITO DO CASO.
MOMENTANEAMENTE, CYRO VALDEZ TINHA CONSEGUIDO ESTACIONAR O PROCESSO EVOLUTIVO
DO MAL CARDÍACO. MAS ERA QUESTÃO DE MINUTOS. ALI ESTAVA O ELETROCARDIOGRAMA
CONFIRMANDO SUAS APREENSÕES. MOSTROU AS LINHAS IRREGULARES E UMA MANCHA
OVALÓIDE QUE APARECIA NO FLANCO ESQUERDO DO MÚSCULO VISTO ATRAVÉS DE UMA CHAPA
RADIOGRÁFICA.
CYRO - Que é que você acha disso?
DOUTOR ROBERTO OLHOU DETIDAMENTE. A VEIA NO LADO DIREITO DA
FRONTE PULSAVA DE FORMA ESQUISITA.
DR. ROBERTO - É sério. Com agravamento... Um enfarte
gravíssimo.
O CORPO DE OTTO ESTENDIA-SE EM CIMA DA MACA.
CYRO - (dirigiu-se ao enfermeiro-assistente) Vamos
levá-lo. Com muito cuidado... vamos.
UMA ESPUMA ESBRANQUIÇADA COMEÇOU A ESCORRER PELO CANTO DA
BOCA DO PACIENTE. CYRO MASSAGEOU A REGIÃO DO ESTERNO, ENQUANTO O COLEGA
APLICAVA-LHE OUTRA INJEÇÃO REANIMADORA. OTTO PIORAVA A CADA SEGUNDO.
CYRO - A área do enfarte é muito extensa. O coração
está batendo mal... já fibrilou algumas vezes. A resposta ao tratamento clínico
é nula. (olhou fundo nos olhos do colega assistente) Estou pensando em termos
de cirurgia das coronárias, apesar do péssimo resultado da
coronariografia. A cirurgia é quase impossível numa situação destas. Só existe
uma solução para salvá-lo. Um transplante!
DR. ROBERTO - Transplante!
CYRO - Não há outra saída. Neste estado ele não
resistirá mais que alguns dias. Nada mais.
FIM DO CAPÍTULO 48
Nenhum comentário:
Postar um comentário