sábado, 10 de janeiro de 2015

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 109



Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 109

Participam deste capítulo

Cyro  -  Tarcisio Meira
Cesário  -  Carlos Eduardo Dolabella
Vanda  -  Dina Sfat
Mestre Jonas  -  Gilberto Martinho
Martins
Tavares
Naná  -  Mary Daniel
Lia  -  Arlete Salles
Otto  -  Jardel Filho
Von Muller  -  Jorge Cherques


CENA 1  -  CAJAZEIRAS  -  CASA DE CYRO  -  SALA  -  INTERIOR  -  DIA

POR ENTRE A NEBLINA QUE FLUÍA E BANHAVA A REGIÃO MONTANHOSA, CYRO SENTIU A PASSADA FIRME DE ALGUÉM QUE SE APROXIMAVA. PULOU DA REDE DE MALHA E ATIROU NO CHÃO A GUIMBA DE CIGARRO, APAGANDO-A COM O PÉ. SEGUROU O COLT COM A MÃO DIREITA. ESGUEIROU-SE ATÉ A PORTA LATERAL.

OUVIU A VOZ DO HOMEM QUE O CHAMAVA COM INSISTENCIA. ERA-LHE FAMILIAR.

CESÁRIO  -  Dr. Cyro! Dr. Cyro! Me deixa entrá, Dr. Cyro!

CYRO  -  (desconfiado) O que você veio fazer aqui?

CESÁRIO  -  Não me senti bem...preciso do seu cuidado... do seu tratamento...

CYRO CONVIDOU-O A SENTAR-SE.

CYRO  -  Como sabia onde eu estava?

CESÁRIO  -  Dei uma bruta caminhada... Eu sabia... tinha ouvido os home falar... mas pode ficar descansado... não disse a ninguém que o senhor tava aqui. Cadê os outro?

CYRO  -  Dormindo. Você veio a pé?

CESÁRIO  -  Vim. Subi essa montanha... não foi mole. Tou fraco pra burro!

CYRO  -  Agora... você vai descansar um pouco e vai descê-la de volta.

CESÁRIO  -  Me deixa ficá aqui... eu quero lhe seguir... lhe ajudá...

CYRO FITOU PROFUNDAMENTE O INIMIGO NOS OLHOS. ALGO LHE PALPITAVA QUE A PRESENÇA DE CESÁRIO LHE TRARIA FUTUROS ABORRECIMENTOS. EXAMINOU-O DEMORADAMENTE.

CYRO  -  Eu não confio em você.

CESÁRIO  -  Por quê? O senhor me salvou a vida! Tou dando prova do meu reconhecimento. Senão teria dito aos soldados onde podiam encontrá o senhor...

CYRO  -  Simplesmente... você não está dizendo a verdade.

CESÁRIO  -  Como sabe?

CYRO  -  Eu conheço tudo... pelos seus olhos!

CESÁRIO  -  O que vê nos meus olhos?

CYRO  -  Vejo que você está mentindo. Está escondendo o verdadeiro motivo que o trouxe aqui...

CESÁRIO ACUSOU A PERTURBAÇÃO QUE AS PALAVRAS DO MÉDICO LHE HAVIAM CAUSADO. TEVE UM ATAQUE SÚBITO DE CHORO.

CYRO  -  Fale... e se sentirá mais calmo.

CESÁRIO  -  Foi o Dr. Paulus! Ele esteve lá na casa do Zeca... hoje de tarde. Tavam lhe procurando... tinha home à beça, do delegado...

CYRO  -  E você prometeu me entregar...

CESÁRIO  -  Não! Eu tapeei eles! Disse que ia lhe enregá... mas não pretendo fazê isso! Falei assim só pra ele lhe deixá em paz! Ele tá querendo lhe agarrá a qualquer preço!

CYRO PERCEBEU A PRESENÇA POR TRÁS DO BANDIDO DE MESTRE JONAS, VANDA, MARTINS E PEDRÃO.

CESÁRIO  -  (continuou) ... aí eu vi que eles iam lhe encontrá aqui. Se vasculhasse este local, de casa em casa, iam lhe encontrá. Eu então despistei ele! E enganei que ia dizê depois onde o senhor tá! Eu lhe juro... lhe juro que não é o que pretendo fazê!

AGARROU-SE ÀS MÃOS DE CYRO, BEIJANDO-AS FRENÈTICAMENTE.

MESTRE JONAS  -  Cyro? O que é isso?

VANDA  -  Ele veio atrás da gente!

MARTINS  -  Esse home é perigoso!

MESTRE JONAS  -  Também acho Cyro!

CYRO  -  Esperem... saiam e me deixem com ele.

MESTRE JONAS  -  Não aceita ele e vamo dá o fora daqui. Vão nos encontrá!

CESÁRIO  -  (vendo os três afastarem-se do local) Acredita em mim? Vai me deixá continuá?

CYRO  -  Vou... Mas vejo ainda nos seus olhos... que você tem muita coisa que o atormenta...

CESÁRIO BAIXOU OS OLHOS, FITANDO UM PONTO NO CHÃO. TINHA DE ESCAPAR À FORÇA MAGNÉTICA DOS OLHOS DO HOMEM A QUEM ODIAVA DE MORTE.

CYRO  -  (falou pausadamente) Você fica... até se sentir preparado... pra se livrar disso... que estou vendo... muito dentro de você.

CORTA PARA:


CENA 2  -  MANSÃO DE OTTO MULLER  -  ESCRITÓRIO DE OTTO  -  INTERIOR  -  DIA

WERNER VON MULLER TINHA ACERTADO O DESTINO DE NANÁ. NÃO HAVIA ALTERNATIVA, DIZIA ELE AO FILHO. A MÃE DE BABY JAMAIS PODERIA VOLTAR A BOTAR OS PÉS EM PORTO AZUL.

VON MULLER  -  Não podemos correr esse risco...

OTTO  -  (piscou os olhos nervosamente) Papi, isso quer dizer que...

VON MULLER  -  Iá.

OTTO  - Mas papi... nós já combinamos que não iria correr mais sangue. Você sabe que eu sou muito delicado. Não suporto essa espécie de violência. Meus nervos... meu coração é capaz de não aguentar.

À MENTE DO ALEMÃO VIERAM LEMBRANÇAS DOS DIAS DE VIOLENCIA NA ALEMANHA. ELE E SEUS ASSECLAS A TORTURAR E ASSASSINAR MILHARES DE JUDEUS E PRISIONEIROS DE GUERRA. WERNER VON MULLER SUSPIROU, SAUDOSISTA. UMA MORTE A MAIS NÃO SIGNIFICAVA GRANDE COISA PARA O EX-CORONEL NAZISTA, ACOSTUMADO A MATAR.

VON MULLER  -  Já estamos muito comprometidos com Naná, meu filho. Ela não serr capaz de entenderr nossos nobres razões.

OTTO  -  Papi...

VON MULLER  -  Ser duro parra mim também... mas não haverr outra alternativa. Espero você compreender...

OTTO  -  Compreendo papi... compreendo perfeitamente. Quando vai ser?

VON MULLER  -  Esta noite!

OTTO  -  Quem vai fazer o serviço?

VON MULLER  -  Tavares.

CORTA PARA:

CENA 3  -  CASA NA MATA  -  QUARTO  -  INTERIOR  -   NOITE

FORÇAR AS JANELAS NÃO ADIANTAVA. E A PORTA ESTAVA FECHADA A CADEADO PELO LADO DE FORA. NANÁ VIA A INUTILIDADE DE QUALQUER TENTATIVA DE ESCAPAR DA PRISÃO. NEM MESMO SABIA EM QUE LUGAR SE ACHAVA. DURANTE UNS 30 MINUTOS OS HOMENS A TINHAM CONDUZIDO CONDUZIDO NO CARRO NEGRO. SABIA APENAS QUE, DE UM LADO E OUTRO, PELAS JANELAS, DIVISAVA MATA VIRGEM. ÁRVORES FRONDOSAS E UM RUÍDO ESQUISITO, DE ÁGUA A CORRER, COMO DE UMA CACHOEIRA POSSANTE.

PARADA NO CENTRO DO QUARTO, ELA SENTIU QUE A PORTA SE MOVIA, AOS POUCOS. TREMEU, PREVENDO O PIOR. NÃO CONSEGUIA DESTINGUIR, NA ESCURIDÃO, O VULTO QUE SE ESCONDIA NUMA CAPA NEGRA. VIU SOMENTE O CANO COMPRIDO DO REVÓLVER E O FOGO QUE ESCAPOU CO CANO DA ARMA, LOGO APÓS A DETONAÇÃO. UM TIRO SÓ. O SILENCIO TORNOU A DOMINAR O AMBIENTE.

TAVARES BAIXOU O CANO E ENTROU TRANQUILO NA CABANA ABANDONADA. ACENDEU UM LAMPIÃO E ILUMINOU A CAMA ONDE O CORPO HAVIA CAÍDO. UMA ENORME MANCHA DE SANGUE TOMAVA CONTA DO LENÇOL. TAVARES PREPARAVA-SE PARA O GOLPE FINAL. APONTOU E...

LIA  -  Tavares! O que é isso?

TAVARES  -  (aterrorizado) A senhora?

LIA  -  O que foi que você fez? (abaixou-se e examinou o corpo da velha) O que foi, hem? Naná! Naná! Oh, meu Deus... será que ela está morta? (voltou-se acusadora, para o pistoleiro) Sabe por que eu vim aqui? Sabe? Porque pensei que você fosse humano. Porque pensei que quisesse me ajudar a salvar Cyro! Eu sei que você conhece o assassino de sua mulher! E não foi o Dr. Cyro! E é isso... isso que você tem a me oferecer! (Tavares recuou, assustado) Você não é humano! É um monstro... uma fera! Um assassino frio e covarde... igual a meu marido, ao Dr. Paulus e ao velho alemão! São todos iguais! Animais!

TAVARES ABRIU A PORTA COM UM PONTAPÉ E DESAPARECEU NA ESCURIDÃO. LIA VOLTOU A EXAMINAR O CORPO

ENSANGUENTADO DA VELHA. A HEMORRAGIA TINHA DE SER CONTIDA. ELA GEMIA DEBILMENTE.  QUASE SEM FORÇAS.

CORTA PARA:

CENA 4  -  MANSÃO DE OTTO MULLER  -  SALA  -  INTERIOR  -  NOITE

EM POUCOS MINUTOS O BANDIDO ALCANÇOU A RESIDENCIA DE WERNER VON MULLER. CONTOU-LHE EM RÁPIDAS PALAVRAS O QUE TINHA HAVIDO NA CABANA, E A PARTICIPAÇÃO DA MULHER DO PATRÃO. VON MULLER ANDAVA NERVOSAMENTE DE UM LADO PARA O OUTRO, COM AS MÃOS CRUZADAS NAS COSTAS.

VON MULLER  -  Você serr muito incompetente. Muito. Como pode errarr um tiro a curta distancia?

TAVARES  -   Eu já expliquei... Eu não errei. Foi ela que me impediu de dar o segundo tiro.

VON MULLER  -  Mas o primeiro você errarr. Aí está seu falha.

TAVARES  -  Estava muito escuro... e eu pensei que ela estivesse deitada. Quando abri a porta... vi que ela tava de pé, no meio do quarto. Cheguei a levar um bruto susto!

VON MULLER  -  Aí estarr outro falha. Você ficarr assustado. Os pessoas devem ter nervos de aço. Fortes. Assim como os meus... os de meu raça.

TAVARES  -  Mas... se Dona Lia não tivesse chegado...

VON MULLER  -  Não ter o menor importância Dona Lia ter chegado. Por que você não terminou seu tarefa? Por que você não deu segundo tiro? Mesmo em presença de Dona Lia? Quais erram seus ordens? A gente nunca deve deixarr de cumprir ordens dos comandos!

TAVARES  -  Mas...

VON MULLER  -  Parra cumprir seu ordem... você podia ter atirado até em Dona Lia!

TAVARES ESPANTOU-SE COM A DECLARAÇÃO DO VELHO. VIU QUANDO OTTO, DE ROUPÃO, DESCIA AS ESCADAS, ARFANTE.

OTTO  -  Que está havendo, papi? Já é a segunda vez que me acordam esta noite...

VON MULLER FEZ UM SINAL AUTORITÁRIO E O PISTOLEIRO ABANDONOU A SALA.

VON MULLER  -  Acontecerr coisa muito grave.

OTTO  -  o que foi, papi?

VON MULLER  -  Seu mulher interferir outra vez nossos planos.

OTTO  -  Lia? Ela está lá em cima dormindo, sossegadinha!

VON MULLER  -  Ela devia estarr lá em cima dormindo sossegadinho... mas não estarr...

OTTO  -  Não?!

VON MULLER  -  Não.

VON MULLER BALANÇOU A CABEÇA LENTA E SIGNIFICATIVAMENTE.

OTTO AGITOU-SE E CORREU ATÉ AO PÉ DA ESCADA.

OTTO  -  (gritou para cima) Lia! Lia!

VON MULLER  -  Ela estarr com Naná...

OTTO  -  Como?

VON MULLER  -  Ela acaba de impedirr Tavares de matar o Naná!

OTTO ABRIU A BOCA ADMIRADO COM A REVELAÇÃO.

OTTO  -  Como? Como? Então ela teve coragem?

VON MULLER  -  Ela botou o Tavares pra correrr...

COM A MÃO PRESSIONANDO O PEITO ARFANTE, OTTO ESTATELOU-SE NO SOFÁ, CHORANDO.

FIM DO CAPÍTULO 109

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