quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

O HOMEM QUE DEVE MORRER - Capítulo 116


Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 116

últimos capítulos!

Participam deste capítulo

Baby  -  Claudio Cavalcanti
Inês  -  Betty Faria
Comendador Liberato  -  Macedo Neto
Paulus  -  Emiliano Queiroz
Ester  -  Gloria Menezes
Delegado  -  Vinicius Salvatori
Das Dores  -  Ruth de Souza
Padre Miguel  -  Artur Costa Filho
Naná / Elisa  -  Mary Daniel
Lia  -  Arlete Salles
Dr. Garcia
Inspetor

CENA 1  -  PORTO AZUL  -  HOSPITAL  -  QUARTO DE NANÁ  - INTERIOR  -  NOITE

MILAGRE OU NÃO, NANÁ ACABARA POR RESISTIR AO FERIMENTO. E, MESMO COM O DR. MAX MORTO, ELA CONTINUAVA RECEBENDO ATENÇÕES ESPECIAIS NO HOSPITAL DE PORTO AZUL.

ERA NOITE. UMA LUZ BAÇA ILUMINAVA O QUARTO DA DOENTE.

INÊS  -  (apertando o braço do sogro) Comendador... já limpei os olhos dela três vezes. Continua saindo água... será que isso é lágrima?

COMENDADOR  -  Não é possível. Para ser lágrima... ela deve estar sentindo alguma emoção...

INÊS  -  (baixou o rosto e fitou com atenção o rosto da velha mulher) Comendador... mas ela está sentindo emoção!

E, NA VERDADE, OS OLHOS DE NANÁ PARECIAM REFLETIR ALGUMA COISA INDEFINIDA. LIBERATO APROXIMOU-SE UM POUCO MAIS.

NANÁ  -  Augusto... Inês... Augusto...

INÊS  -  Não estou dizendo?

COMENDADOR  -  Elisa... Elisa, será possível? Você está me vendo? Está me ouvindo?

NANÁ  -  (a voz fraca) Estou... estou.

INÊS  -  Meu Deus do Céu! Isso é fantástico!


NANÁ  -  (voltou a falar, fracamente) Onde... está meu filho? Por que não veio?

INÊS  -  (garantiu) Ele vem, viu? Ele vem!

NANÁ  -  Digam a ele... que eu não tive culpa... fui traída... o Dr. Paulus... falsificou papéis... a procuração... foi o Dr. Paulus... eu juro... foi ele...

INÊS E O COMENDADOR ENTREOLHARAM-SE, AFLITOS. COMPREENDIAM, AGORA, TODA A TRAMA ELABORADA PELO DIABÓLICO ADVOGADO.

COMENDADOR  -  (perguntou, nervoso, sentindo o suor escorrer-lhe pelas costas) Acha que pode repetir isso na presença do delegado?

NANÁ  -  (num esforço, confirmou) Posso... chamem... chamem...

CORTA PARA:
Baby (Claudio Cavalcanti) e Mestre Jonas (Gilberto Martinho)

CENA 2  -  PORTO AZUL  -  DELEGACIA  -  INTERIOR  -  NOITE

ENQUANTO ISSO, MEIO BÊBADA, LIA FORÇOU ENTRADA NA DELEGACIA. VIU O DR. MOREIRA E O INSPETOR REMEXENDO PAPÉIS. A MULHER ENCOSTOU-SE A UMA PILASTRA PARA NÃO DESABAR POR INTEIRO. VIA TUDO RODAR.

LIA  -  Ei... olha aí... olhem para mim! (os dois homens voltaram-se a um só tempo) Tenho uma revelação pra fazer. Dr. Cyro está morto! E sabem quem mandou matar? Sabem? Foram Victor Paulus e meu marido, o prefeito desta cidade! Vocês... estão... me ouvindo? Eu disse... que eles... os dois... mandaram liqui... dar o Doutor Cyro!

DELEGADO  -  (levando-a a sentar-se) Calma! Calma, Dona Lia! Parece que a senhora bebeu demais!

LIA  -  E por que acha que eu bebi? Porque ando desesperada da vida! Me casei com um homem que não gosta de mim. Ele sempre quis se afirmar... entende? Em mim e Ester... porque ele não é um homem pra valer! Não é de nada! Entenderam? Eu bebi pra ter coragem de acusar e devia ter feito isso há muito tempo. Aquele homem... o Alcides, um capanga, chegou lá... dando a notícia da morte do Dr. Cyro! Eles o retiraram da cadeia, para matá-lo! E tem mais: existe um processo aí... de roubo, contra o Dr. Cyro... recepção de roubo... sabe por que até hoje ele não se defendeu? Para me ajudar! Porque é bom... porque não queria me destruir! Mas sabe quem foi que retirou o material do hospital para dar a ele? Fui eu, seu delegado. Eu, a mulher do prefeito. Dei tudo pra ele. Foi a ele que mataram. Esse homem que recebe as bofetadas... que não se defende... só pra fazer a gente entender alguma coisa mais importante do que tudo isso! A bondade humana! Mas ninguém entende! Porque o Dr. Cyro está enganado com essa humanidade! Ninguém é bom! Ele sozinho não pode consertar o mundo!

O DELEGADO OFERECEU UM CAFÉ FORTE À ESPOSA DO PREFEITO. LIA SORVEU-O DE UM TRAGO.

DELEGADO  -  Acha que ela está falando sério?

INSPETRO  -  Acho que sim.

LIA  -  (afirmou) Eu estou falando sério!

NAQUELE MOMENTO INÊS CHEGAVA EXTENUADA E COM VOZ OFEGANTE.

INÊS  -  Delegado! Inspetor! Venham depressa! Dona Naná está recobrando a consciência e está dizendo tudo... tudo!

DELEGADO  -  Tudo o quê, Inês?

INÊS  -  A procuração que falsificaram! Ela não deu autorização pra ninguém fazer aquilo! Ela está acusando só uma pessoa! Só uma!

INSPETOR  -  Quem?

INÊS  -  O Dr. Paulus!

LIA  -  (sorriu com ar de vitória) Eu não estou dizendo? Acredita agora em mim?

CORTA PARA:

CENA 3  -  HOSPITAL  -  QUARTO DE NANÁ  -  INTERIOR  -  NOITE

EM POUCOS MINUTOS O INSPETOR MIGUEZ ALCANÇOU O HOSPITAL DA CIDADE. IA TRANQUILO, CERTO DE QUE TUDO SE DESVENDARIA DAÍ PRA FRENTE. O TERRÍVEL MISTÉRIO DE PORTO AZUL ESTAVA CHEGANDO AO FIM. CUMPRIMENTOU O COMENDADOR LIBERATO AO ENTRAR NO SILENCIOSO E TRISTONHO QUARTO PARTICULAR.

INSPETOR  -  Como está ela?

COMENDADOR  -  Preparada para dizer a verdade. (Naná abriu os olhos e o comendador ajeitou a cabeça da doente no travesseiro largo) Elisa... este senhor é a autoridade... para quem você deve dizer a verdade.

NANÁ MOVIMENTOU-SE COM DIFICULDADE, PROCURANDO UMA POSIÇÃO MAIS CONFORTÁVEL.

NANÁ  -  (balbuciou) Foi tudo uma trama, doutor... e me envolveram... falsificando uma procuração... que eu teria passado para o Dr. Paulus...

INSPETOR  -  Quem falsificou?

NANÁ  -  Von Muller falsificou a assinatura... mas o Dr. Paulus a usou... para impedir os homens de tomarem conta de suas casas... coisa que... jamais eu teria feito.

CORTA PARA:

CENA 4  -  CASA DE ESTER  -  QUARTO  -  INTERIOR  -  NOITE

ESTER  -  Paulus! Como vem entrando assim?!

ESTER LEVANTOU-SE IMPELIDA PELO ÓDIO QUE COMEÇAVA A SENTIR PELO HOMEM RESPONSÁVEL POR TODO O SEU SOFRIMENTO.

SEM DAR RESPOTA, O ADVOGADO ABRIU A GUARDA-ROUPA E, RETIRANDO UMA MALETA DE VIAGEM, COMEÇOU A ENCHÊ-LA COM AS ROUPAS ÍNTIMAS QUE LHE PERTENCIAM. ESTER ENRUBESCEU.

ESTER  -  Que é isso? Que está fazendo?

PAULUS  -  Não tenho tempo para resposta! Vista-se e saia comigo!

ESTER  -  Para onde?

PAULUS  -  Não sei. Tenho de sair daqui imediatamente. Parece que Lia andou dizendo coisas que não devia à polícia!

ESTER  -  Lia contou seus crimes à polícia?

PAULUS  -  Não interessa! (agarrou a mulher, grosseiramente, pelo pulso, magoando-a) Depois conversaremos!

ESTER  -  Largue-me! Ir com você? Quem pensa que eu sou? Um boneco, do qual você faz o que bem entende?

PAULUS  -  (ameaçou) Você não tem saída, Ester!

ESTER  -  Eu não cometi crimes e não preciso fugir!

PAULUS  -  Vai ficar aqui pra quê? Para esperar Dr. Cyro?

ESTER  -  Sim. É isto o que eu vou fazer. Vou esperar por ele. E não há nada que me impeça de aguardar o pai do meu filho.

PAULUS ENFURECEU-SE E SENTIU DESEJO DE ESBOFETEÁ-LA ALI MESMO. MATÁ-LA, TALVEZ.

PAULUS  -  Sua idiota... a esta hora esse homem já está no outro mundo. Mortinho da silva... com uma bala na cabeça!

ESTER  -  (gargalhou) Não minta, Paulus! Estou farta de suas mentiras!

PAULUS  -  (ergueu os punhos, contraindo as mãos) Ester... Otto mandou matar Cyro. Alcides voltou do local onde o liquidaram. Ele está mortinho! Enterrado! Válter fez todo o serviço! Hoje!

ESTER  -  Mentira! Mentira! Não acredito! É mentira sua! Vá embora! Eu quero esquecer que você existe!

ESTER ACENDEU UM CIGARRO, COM AS MÃOS TRÊMULAS, ENQUANTO O ADVOGADO, COMO UM POSSESSO, DESCEU AS ESCADAS E MERGULHOU NA ESCURIDÃO DAS RUAS.

CORTA PARA:

CENA 5  -  PORTO AZUL  -  RUA  -  EXTERIOR  -  NOITE

PAULUS NÃO CHEGOU A DAR MEIA DÚZIA DE PASSOS. AS MÃOS FEROZES DOS GUARDAS DO DR. MOREIRA O IMOBILIZARAM. O PRÓPRIO DELEGADO ENFIOU-LHE NOS PULSOS AS ALGEMAS CROMADAS. PAULUS BERROU HISTERICAMENTE, QUEBRANDO O SILENCIO PESADO DA MADRUGADA. AJOELHOU-SE DIANTE DOS HOMENS PEDINDO CLEMÊNCIA.

PAULUS  -  Eu não fiz nada! Não tenho culpa de nada! Só obedecia ordens! Não fiz nada!

CORTA PARA:

CENA 6  -  HOSPITAL  -  QUARTO DE NANÁ  -  INTERIOR  -  DIA

BABY SENTOU-SE CUIDADOSAMENTE AO LADO DA MÃE. OUVIU O RESFOLEGAR PROFUNDO DA PACIENTE. AO FUNDO O RUÍDO ESTRIDENTE DE UMA AMBULÂNCIA QUE CHEGAVA.

BABY – (aproximou os lábios do ouvido de Naná e falou) Mãe! Mãe! Está me ouvindo?

NANÁ  -  (balbuciou feliz, os olhos semi-abertos) Estou... meu filho.

BABY  -  Olha... não vai piorar não, viu? Você está legal. Com ótimo aspecto!

NANÁ  -  Não diga isso. Devo estar horrível... sem pintura... não queria que você me visse... assim.

BABY  -  Que nada. Assim é que eu queria te ver.

NANÁ  -  Verdade, mesmo?

BABY  -  No duro. Descobri porque não podia aceitar você como a imagem da mulher que imaginei como mãe.

NANÁ  -  E por quê?

BABY  -  Mãe... a gente imagina muito simples... sem pintura nenhuma... sem cílios postiços... cabelos mais simples... pode ser bobagem da gente. Egoísmo de filho, sei lá... Mas era assim que eu te via. Mãe muito empetecada não convence como mãe.

NANÁ  -  (sorriu) É mesmo? Imagine... e eu que perdi tanto tempo... querendo ficar bonita pra você me achar sempre linda. Pra dizer: “Puxa! Como minha mãe é jovem!”

BABY  -  Mãe... agora tudo mudou. Vai viver comigo... cuidar do seu neto...

NANÁ  -  Mas sou tão desajeitada com criança... sabe... eu nunca... Não sei dizer...

BABY  -  Aprende. Tudo se aprende. Eu também aprendi muita coisa. A gente aprende e não erra nunca mais. O chato é ter de errar tanto para aprender.

NANÁ  -  Você não errou, meu filho. Você é muito bacana.

BABY  -  Puxa, se errei! Acreditei que você fosse capaz de... de fazer aquela coisa horrível contra mim... Você não está chateada, está?

NANÁ  -  Eu te amo, meu filho. Preciso dizer mais alguma coisa?

BABY  -  (beijou-lhe as mãos) Gozado... era assim... assim mesmo, desse jeito... que te imaginava. Nas minhas birras, nas minhas crises de menino frustrado... era assim que eu te chamava: mãe, onde você está? Aí, você me aparecia... assim mesmo... com esse cabelo simples... o rosto pálido... sem pintura.

NANÁ  -  (ergueu-se, num esforço, para abraçar o rapaz) Eu estou aqui... estou aqui para sempre... meu filho! Desta vez é para sempre!

CORTA PARA:

CENA 7  -  DELEGACIA  -  INTERIOR  -  DIA

NA DELEGACIA, DAS DORES TINHA TOMADO CORAGEM. A CONSCIÊNCIA LHE DOERA DEMAIS. DIA E NOITE, NOITE E DIA, AQUELA ANGÚSTIA. FALAVA COM VOZ ENTRECORTADA.

DAS DORES  -  ...aí Mestre Jonas foi buscá o Doutô Cyro. Levou ele até Dona Zélia... e ela fez aquele pedido doido. Ele recuso. Mas no dia seguinte... ela mandô me chamá às pressas...

O DELEGADO RESPIROU FUNDO. O ESCRIVÃO ANOTAVA O DEPOIMENTO.

DAS DORES  -  Isso foi tudo. Quem matô Dona Zélia... foi eu... mas foi sem querer...

DELEGADO  -  E o marido dela tinha conhecimento de tudo?

DAS DORES  -  Tinha sim, doutô. Mas quando eu procurei ele pra dizê que ia contá a verdade, ele, mais aquele estrangeiro do inferno, que já tá com o Cão... me ameaçaro. Dissero que ia matá meu filho. E por diversas veiz tentaro. Até agrediro meu Luca. E a noiva do meu Luca. Eles queriam que eu me calasse pra comprometê Doutô Cyro.

O PADRE MIGUEL INTERVEIO AUXILIANDO A NEGRA. O VIGÁRIO TINHA SIDO A FORÇA MAIOR NA DECISÃO DE DAS DORES EM REVELAR TUDO. PADRE MIGUEL ABRAÇOU A VELHA HUMILDE.

PADRE MIGUEL  -  A pobre mulher estava apavorada. Ela até agora não estava preparada para enfrentar as consequências de sua culpa.

DAS DORES  -  Tinha muito medo... O que vai me acontecê? Vão me prendê? Tou perdida, não tou?

INSPETOR  -  Não. O delegado vai instaurar o processo. Pode aguardar o julgamento em liberdade.

CORTA PARA:

CENA 8  -  HOSPITAL  -  QUARTO DE NANÁ  -  INTERIOR  -  DIA

O DR. GARCIA ENTREGOU A ESFEROGRÁFICA A ELISA LIBERATO.

DR. GARCIA  -  A senhora só tem de assinar estes papéis para ficar tudo legalizado.

COMENDADOR  -  (perguntou, carinhoso) Você aguenta?

NANÁ  -  Aguento, sim.

NANÁ ASSINOU, COM LETRA FIRME, OS DOCUMENTOS QUE O ADVOGADO COLOCOU NUMA PRANCHA À SUA FRENTE. BABY E INÊS APRECIAVAM A DISPOSIÇÃO DA VELHA. O ADVOGADO VOLTOU A FALAR. COM AR DE CONTENTAMENTO.

DR. GARCIA  -  Deste momento em diante, não existe nenhum problema nas ex-propriedades Liberato, em Porto Azul. Agora elas pertencem aos seus novos donos.

BABY  -  (pulou como um menino que ganhou um brinquedo) A rapaziada vai ficar contente pra burro. Eu vou dar a noticia a eles. E vou dizer também que, tanto a minha mãe, quanto o meu pai... foram muito bacanas... porque entenderam bem a minha intenção. Afinal... tudo deu certo!

INÊS  -  Por que é que as coisas não podem ser tão simples? Depois você diz que eu sou burra, Leandro. Eu não entendo mesmo. As pessoas deviam seguir uma linha certa... direta. Eu quero aquilo... vou até o fim. Mas olha... a linha tem de ser torta, perigosa, sofrida... até chegar a esse final bacana a que a gente chegou.

BABY NOTOU AS LÁGRIMAS QUE ENCHIAM OS OLHOS DA ESPOSA. ABRAÇOU-A.

BABY  -  Você não entende porque é muito burrinha. E, agora, vamos acabar com tanta conversa. Mamãe precisa descansar... (beijou a testa de Naná e virou-se para o pai) Você não vem?

COMENDADOR  -  Não... eu fico... estou sempre aqui... agora não nos separamos mais...

NANÁ ESTENDEU A MÃO E APERTOU FRACAMENTE A DO VELHO.

NO CORREDOR DO HOSPITAL, NUM ÚLTIMO OLHAR PARA OS DOIS, INÊS BALANÇOU A CABEÇA, SORRIDENTE.

INÊS  -  Puxa! Dá gosto ver esses dois. Quanto o comendador gostava dela! Teve de ver ela quase morta pra esquecer tudo e perdoar. Isso é que é amor, viu, seu bobo?

BABY  -  (beliscou-a no braço) É... tudo fica esquecido. O erro dela foi grande... mas a vingança dele também foi imensa.

INÊS  -  Puxa! É romântico demais! Leandro... eu quero ser amada assim! Com essa loucura!

Baby  -  Vá! Vá! Deixa de fazer drama!

FIM DO CAPITULO 116






Nenhum comentário:

Postar um comentário